Highside de Márquez em Jerez
A tentativa de Márquez em disputar o segundo GP de
Jerez no último fim de semana, menos de uma semana depois da cirurgia no braço
fraturado, mesmo frustrada atingiu parte de seus objetivos. Como todos os
grandes campeões que o precederam, Marc Márquez não quer apenas vencer, quer
dominar, impor a sua superioridade sobre todos os competidores, não apenas ser
o mais veloz. Seus rivais devem temer qualquer disputa com ele, Marc é capaz de
fazer o impossível, coisas que não podem ser replicadas por seus concorrentes.
No dia 20/07 todo a mídia especializada comentava sua brilhante recuperação na 1ª prova e como havia jogado fora o campeonato por não ter se contentado com o pódio, arriscando até cometer um erro bobo e desnecessário. Desde 22/07 a tônica passou a ser a força de vontade, a resiliência física e mental de considerar competir naquele estado. Marc Márquez provou aos seus rivais que está disposto a ir mais longe do que eles imaginavam.
Braço inflamado de Marc Márquez
A atitude e postura do campeão, um herói para
alguns e um maníaco imprudente para outros, por paradoxal que pareça é bem
recebida por seus colegas competidores. Aleix Espargaro, da Aprilia, sintetizou
o sentimento da maioria dos pilotos: “É assim que somos. Isto é a MotoGP”. Demonstrações
de força de espírito extraordinária, que beira a insanidade, não são novidade
em corridas de motos. Já são lendárias atitudes como a do piloto Dale
Quarterley da AMA Superbike, que esmagou o dedo mindinho em um acidente nos
testes que antecediam uma Prova em Laguna Seca na década de 80. Atendido no
hospital o cirurgião ponderou 3 procedimentos possíveis, uma série de cirurgias
para reconstruir o dedo, um pino que o imobilizaria definitivamente ou a
amputação, que talvez o habilitasse a correr no dia seguinte. Dale escolheu a
terceira opção e alinhou para a corrida no dia seguinte. Desde então passou a
ser conhecido como “Fingerless”.
Em 2012 o britânico Cal Crutchlow quebrou o
tornozelo esquerdo no FP3 do GP da Inglaterra. Os médicos prescreveram um
repouso de oito a 10 semanas, devia ficar ausente de 4 etapas da temporada. Era
o GP na casa do piloto, uma rara oportunidade de estar próximo de seus
torcedores. Cal simplificou o conselho dos médicos: "Não colocar peso no
pé por oito a dez semanas implica, para um piloto, um tempo entre 8 e dez
horas". Quando voltou para o paddock afirmou aos médicos do circuito que
estava apto para correr, foi submetido a um rigoroso teste de aptidão e alinhou
para a largada no fim do grid por não ter participado da qualificação. Chegou
em 7º.
Em 2013 Jorge Lorenzo estava na disputando com Dani
Pedrosa a liderança do mundial quando em uma queda no FP2 em Assen quebrou a
clavícula. Como estava com a vaga garantida no Q2 pelo tempo obtido no FP1,
fretou um jato, voou para Barcelona e foi operado na mesma noite. Voltou para a
Holanda e participou da prova, largou na 12ª posição e chegou em 5º.
Marc Márquez decidiu não participar da 2ª prova de
Jerez porque seu braço inflamou devido as características do circuito, que
exigem muito esforço do lado direito. Pilotos são dedicados, porém a
racionalidade se sobrepõem à imprudência. Quando não há condições sabem que
está em risco, além da sua própria integridade, a dos outros competidores.
Este tempo reduzido para a recuperação de fraturas são resultados de uma técnica cirúrgica de fixação e revestimento de ossos. A técnica conhecida pelo acrônimo ORIF (Open Reduction Internal Fixation), consiste em realinhar os pedaços de ossos quebrados e com pinos, placas e parafusos realizar a fixação interna. O ORIF existe desde o final do século XIX, mas a tecnologia só foi aperfeiçoada por engenheiros médicos nas últimas décadas. O médico que atendeu Márquez utilizou a técnica ORIF no úmero direito que ele quebrou no domingo anterior. O atual campeão estava rodando com um bom ritmo no FP3 e FP4, quando sobreveio uma inflamação, provavelmente originada da trepidação do guidão e do esforço de frenagem (até 2 g), que restringiu a força no braço.
Fabio Quartararo já é o piloto francês mais bem-sucedido em mais de 70 anos de campeonatos mundiais da classe principal. Sua segunda vitória consecutiva o habilita a aspirar o título deste ano, mesmo porque ainda não está garantido sequer o número de etapas desta temporada. O calendário provisório indica 13, porém ainda podem haver cancelamentos em função da pandemia. O piloto parece ter personificado o que foi chamado no final da era Bridgestone na MotoGP de “Modo Lorenzo”. O espanhol aperfeiçoou a arte de fugir do apagar das luzes para liderar cada volta.
Valentino Rossi & Maverick Vinales
As motos Yamaha só tiveram a sua supremacia
ameaçada pela Ducati de Peco Bagnaia, que escalou posições até chegar na
vice-liderança, quando seu motor falhou. A Yamaha colocou 3 motos nas primeiras
posições e a pior classificada, embora o resultado muito comemorado, foi a de
Valentino Rossi. A Honda foi representada por Nakagami (4º) e Alex Márquez que
fez uma ótima prova, partiu da última posição para finalizar em 8º. Duas Suzuki
marcaram presença entre os top 10, Joan Mir em 5º e Alex Rins em 10º, Pol Espargaro
conduziu a única KTM até a sétima colocação e as Ducati de Dovizioso (6º) e
Johann Zarco (9º) fecharam a relação dos 10 primeiros.
A euforia dos resultados no início da temporada, 5
pódios dos 6 possíveis, não entusiasma muito os dirigentes da Yamaha e é
acompanhada por uma grande preocupação por seus engenheiros por falhas de
motor, duas na primeira semana (Vinales nos treinos e Rossi na prova) e
Morbidelli na segunda prova. No último fim de semana os quatro pilotos
utilizaram motores novos, o segundo de um total de cinco. Maverick Vinales já
perdeu um motor, o que pode complicar as suas aspirações ao título.
Se confiabilidade dos motores Yamaha eventualmente
pode ser um problema, a falta de potência com certeza é. Os motores V4 tem
aproximadamente 30 HPs mais sobre o motor em linha da M1, não foi significativo
no circuito plano de Jerez com uma reta curta de pouco mais de 600 metros, pode
ser desastroso no resto previsto da temporada. Nos circuitos de Brno, Red Bull
Ring, Misano, Barcelona, Le Mans, Aragão e Valência a vantagem da velocidade
nas curvas da Yamaha pode não fazer a diferença, em todas elas a potência das
Motos V4 deve ser privilegiada. Na República Checa o circuito apresenta um
desnível de 75 metros, em 2019 a Yamaha melhor colocada foi a de Valentino
Rossi em 6º a 9 segundos do vencedor. O Red Bull Ring já foi definido como três
provas de quilometro de arrancada intermediadas por um balão, o atual traçado
tem a exclusividade de vitórias da Ducati, em 2019 Fábio Quartararo classificou
em 3º, a 6 segundos do vencedor Andrea Dovizioso.
Os engenheiros da Yamaha nunca param de trabalhar
para conseguir mais potência do motor da M1, mas um 4 cilindros em linha
simplesmente não é tão robusto quanto um V4. Quanto mais alteram para aumentar
a potência, maior a probabilidade dos motores apresentarem problemas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário