A MotoGP foi
caracterizada nos últimos anos como uma disputa entre excelência de
equipamentos e técnicas de pilotagem. Não é novidade que as máquinas da Honda
são configuradas para atacar curvas com frenagens agressivas e mudar de
trajetória em espaços muito curtos, para permitir levantar a moto rapidamente e
retomar a velocidade. Outros equipamentos são mais eficientes com abordagens
mais fluidas, utilizando um traçado com um raio maior para contornar os cantos,
mantendo a mesma velocidade angular em ambas as rodas na frenagem e na
retomada. Uma das técnicas privilegia a aproximação mais veloz, rápida
desaceleração e retomada mais cedo, a outra mantém maior velocidade no meio da
curva.
As temporadas de 2016
e, principalmente, 2017 acrescentaram um importante fator adicional para a
disputa, a sensibilidade dos pilotos ao gerenciamento dos pneus. Não é apenas
acelerar o máximo possível, é necessário que o equipamento esteja nas melhores
condições, leia-se com aderência, até o final da prova. Com sete das dezoito
provas realizadas, os resultados indicam que os que selecionam o composto mais
adequado e identificam melhor como administrar o desgaste dos pneus em relação
às condições de aderência das pistas são recompensados. Um exemplo didático foi
o GP da Catalunha em Barcelona, a análise dos resultados indica entre os quatro
primeiros colocados três pilotos muito experientes, com idades acima de trinta
anos, e um tricampeão mundial, todos inteligentes, pilotam para equipes de
fábrica e contam com pessoal de apoio muito experiente. Andrea Dovizioso, Marc
Márquez, Dani Pedrosa e Jorge Lorenzo fizeram o melhor possível para as
condições da prova, controlaram o desgaste de pneus com a alta temperatura
do piso e obtiveram as melhores colocações. Lorenzo chegou a ocupar
o oitavo lugar a poucas voltas do final, com o equipamento mais
conservado recuperou-se nas últimas voltas e chegou em quarto.
A Michelin tem sido a
única unanimidade nos bastidores da MotoGP, e não de forma elogiosa. O
comportamento dos pneus da fabricante francesa lembra um comercial antigo de um
bonequinho imitando um fuzileiro naval americano, “Cada dia uma nova aventura”.
Nunca a disputa esteve tão indefinida, é impossível indicar um favorito para a
próxima prova. O que já é consenso é que o Michelin tem uma janela operacional
muito estreita, que fica ainda mais crítica em determinadas pistas. A prova de
Jerez foi definida pelo gerenciamento de pneus em uma pista com baixa
aderência, condições agravadas em Barcelona pelo desgaste extremamente alto. Um
raciocínio simples indica que desgaste e aderência estão relacionados, maior
desgaste implica em menor aderência, porém este comportamento não é linear com
os pneus franceses.
Dois pilotos que
estão no topo da tabela apresentaram posturas diametralmente opostas para
administrar o conjunto moto/pneus em Barcelona. Marc Márquez, conhecido por seu
estilo agressivo, foi o campeão de quedas nos dias que antecederam o GP
procurando identificar o limite de aderência na pista. Maverick Vinales,
que lidera a pontuação geral no campeonato, estava perplexo,
"Honestamente, é um drama, não sei o que estou fazendo de errado. Estou
pilotando como no Qatar, Argentina e em outras provas. Não tenho ideia do
que está acontecendo. A moto funciona em algumas corridas e em outras não”.
Alguns arriscam uma explicação simplista que o chassi 2016 da Yamaha, que
equipa a satélite Tech3 (Johan Zarco & Jonas Folger) com alguns resultados
melhores que os da equipe oficial, tem um desempenho melhor que o chassi 2017.
Esta ideia é contestada por Vinales e Rossi, Valentino explica que em retomadas
de aceleração a versão 2017 depende mais do pneu traseiro, que em algumas
condições ainda não suficientemente explicadas, não é o ideal.
Quando a fornecedora
exclusiva de pneus era a Bridgestone, com um comportamento mais previsível e
janela de operação mais ampla, os maiores orçamentos eram privilegiados, por
aplicarem mais recursos no desenvolvimento do equipamento e em análise de
dados, buscando uma combinação perfeita. Engenheiros e pilotos tinham uma
noção exata do que esperar dos pneus nas pistas e entre 2011 e 2015 as equipes
oficiais da Honda e Yamaha venceram todas as provas disputadas na MotoGP. Havia
pouco espaço para a improvisação, para adaptar-se às circunstâncias, para o
elemento de surpresa. O caminho da Bridgestone, previsível e preciso, ou o modo
Michelin que exige a capacidade de rápida adaptação às condições de contorno
definem o que esperar de uma competição. Em termos de espetáculo, as corridas
da era Michelin são mais divertidas.
No desarme do circo
em Barcelona o chefe da Honda Livio Suppo comentou que estamos vivendo tempos
interessantes, fabricantes diferentes apresentando desempenhos surpreendentes.
O pêndulo oscila entre uma e outra equipe, motos antigas com performance
superior que as mais modernas, uma equipe específica ou uma determinada fábrica
sobressai quando obtém o máximo desempenho com os pneus. Na próxima corrida é
um circuito diferente, um piloto diferente, uma moto diferente, uma equipe
diferente. A crítica de Suppo, como responsável por uma das equipes que mais
investe na MotoGP, é que esta insegurança prejudica a obtenção de recursos para
as próximas temporadas. Regras claras e condições iguais para todos é não só
aceitável, como desejável. Complicado é trabalhar na base da adivinhação.
Carlos Alberto
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