segunda-feira, 13 de julho de 2020

MotoGP – Finalmente


A Colher da Ducati



Em todas as temporadas a MotoGP ajusta o regulamento geral da competição para evitar que a descoberta de brechas nas regras prejudique o espetáculo. Em uma das provas de 2019 o sensor que fiscaliza a largada antecipada flagrou um mínimo movimento na LCR Honda de Cal Crutchlow. A verificação posterior identificou que foi um gesto involuntário, apenas para manter a moto equilibrada, entretanto os comissários de prova aplicaram no piloto uma penalização de “drive through”, que comprometeu totalmente o seu desempenho na prova. Para a próxima temporada a penalidade foi modificada para duas voltas longas, que devem resultar em um acréscimo entre 3 e 5 segundos no tempo da prova, mais compatível com a vantagem que eventualmente possa ser obtida por um competidor que antecipe em algum tempo a largada.



Houve um tumulto no início da temporada passada em função de uma interpretação criativa da Ducati em relação a colocação de um dispositivo aerodinâmico fixado no braço oscilatório do protótipo GP19. A fábrica de Borgo Panigale (Bolonha) justificou que não tinha função aerodinâmica, era apenas um dispositivo de arrefecimento do pneu traseiro.  Houve um protesto subscrito por todas as equipes, à exceção da Yamaha que havia utilizado um recurso semelhante para retirar água da frente do pneu em condições de excesso de chuva. Inexplicavelmente o tribunal da FIA julgou que as explicações dos engenheiros da Ducati foram convincentes e que os regulamentos eram omissos. A reação mais radical foi da Honda, que apresentou exatamente a mesma geringonça com a justificativa que era uma peça para “enrijecer” o braço oscilatório, com o objetivo claro de ridicularizar o corpo técnico da Dorna. Causou um profundo mal-estar.



Esta ocorrência justificou uma alteração na regulamentação sobre aerodinâmica dos protótipos. O novo regulamento estabelece regras para toda a carenagem, não mais sobre partes individuais. Agora a carenagem inclui todo o corpo do equipamento, os pilotos só poderão homologar uma mudança em toda a temporada.





Alguns pilotos utilizavam partes de metal em seus controles deslizantes, em tese a finalidade era aumentar a resistência, mas um efeito colateral chamou a atenção dos fiscais. Ao deslizar no asfalto os dispositivos produziam faíscas e poderiam induzir os pilotos atrás a suspeitarem de algum tipo de problema ou simplesmente ficarem distraídos. Todas as proteções deslizantes junto ao macacão do piloto nesta e nas próximas temporadas devem obrigatoriamente ser de plástico ou outro material que não produza faíscas no atrito com o asfalto.





Há uma nova sinalização para os pilotos. Uma bandeira preta com um círculo laranja, para informar que há uma falha técnica no veículo (vazamento de óleo ou produção de fumaça) que possa causar risco a si próprio ou a outros concorrentes. Ao receber esta sinalização o piloto deve imediatamente retornar aos boxes ou conduzir a moto com segurança para fora da pista. Os pilotos que deixarem a pista sob esta bandeira exigem liberação por um comissário técnico antes de voltarem para a competição.



Os protótipos da MotoGP são construídos artesanalmente e não tem permissão para trafegar nas ruas. Para atender as absurdas demandas de resistência e velocidade, em sua construção são utilizados materiais incrivelmente mais resistentes e leves que os componentes das motocicletas normais, óbvio, consideravelmente mais caros.



Componentes de titânio, magnésio e peças moldadas em fibra de carbono contribuem para cada protótipo ter um valor que pode ascender a cifra de 2 milhões de dólares, com o agravante que não ter como distribuir o custo individual de cada peça pela produção em massa. O valor supracitado não inclui custos com pesquisa e desenvolvimento, que podem ser diluídos se o resultado puder ser portado para as linhas de produção de unidades comerciais. Apenas como exemplo, a produção dos garfos frontais pode alcançar a cifra de US$ 100.000 a unidade, ou seja, um orçamento robusto pode ser consumido rapidamente se um piloto for propenso a acidentes.



O regulamento da MotoGP impõe algumas limitações no uso de materiais, é proibido o uso de titânio na construção das seguintes peças; quadro (chassis), excluindo parafusos e elementos de fixação; o braço oscilante, também excluindo parafusos e elementos de fixação e eixos das rodas (neste caso também está proibida a utilização de ligas leves). Também o titânio não pode ser utilizado na construção do guidão, nos tubos internos e externos das suspensões dianteiras e traseiras, no eixo e no tubo do amortecedor. O virabrequim deve obrigatoriamente ser construído por um composto ferroso ou ferro fundido. Ligas de um material diferente são permitidas com o único objetivo de equilibrar a peça. Os pistões, cabeças dos cilindros e blocos de cilindros não podem ser estruturas compostas que utilizem materiais de reforço como carbono ou fibra de aramida.



Os motores utilizados na MotoGP devem ser 4 tempos e 1000cc, maluquices como as que a Honda produziu no passado (distante) como cilindros ovais não são permitidas, os pistões são obrigatoriamente circulares e com limitação de diâmetro. Os motores devem ser lacrados antes do início da temporada e tem um número limitado por piloto.



Motor da RC213V



A construção é artesanal, são montados à mão e provavelmente constituem a peça mais cara do protótipo. Como cada piloto tem apenas 7 motores, é absolutamente necessário equilibrar desempenho com durabilidade, que podem ser prejudicados por eventos como muitos acidentes.



O consumo é crítico, o tanque de cada moto é limitado a 22 litros. Considerando que as provas são em torno de 120 Km, o consumo gira em torno de pouco mais que 5 km/l, fato que pode ser controlado por mapas de software ou pelos botões da handlebar (enriquecer ou diluir a mistura).  Na temporada passada, a ânsia do já campeão em brindar sua equipe com uma vitória em seu próprio circuito (Motegi) causou uma pane seca na volta da vitória, Mark Márquez teve de ser rebocado pela KTM de Hafizh Syahrin.



O recorde de velocidade da MotoGP pertence a Andréa Dovizioso, 356,4 km/h estabelecido no GP da Itália em 2018. O anterior também pertencia à Ducati e foi de 354 km/h obtido por Andrea Ianonne em 2016.



A MotoGP é essencialmente um esporte que exige muita resistência física. Há momentos que a desaceleração da velocidade máxima cai para pouco mais da metade e produz uma força de 1,9g sobre o piloto.  Não é lógico argumentar que a força g é maior sobre um piloto de F1, porque em monopostos o condutor é mantido por cintos de segurança de 5 pontos, na MotoGP o piloto não tema amarras.



Uma comparação feita em uma simulação mostra que o esforço que o condutor está submetido é semelhante a ter um peso de 150 kg nas costas enquanto inclina o protótipo mais de 50 graus para entrar em uma curva, considerando que está apoiado em uma área de contado borracha/pista semelhante a um cartão de crédito.  Talvez isto explique porque lesões no pulso impedem um piloto a participar da prova, ossos quebrados, com um coquetel de analgésicos, são tolerados.





Freio de Fibra de Carbono



Freios na MotoGP são exclusividade da Brembo, uma empresa especializada italiana. Houve um tempo em que era padrão alterar os discos de freios para aço quando a corrida era em pista molhada, porque os compostos de fibra de carbono, mais leves e eficientes, eram muito susceptíveis à temperatura. Esta postura começou a ser alterada em Misano, temporada de 2017, quando Marc Márquez venceu na chuva com os compostos de fibra, um produto mais refinado resultado de pesquisas e desenvolvimento da Brembo. Atualmente é muito raro uma equipe de ponta utilizar freios de aço em qualquer tipo de ocasião.

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