A
temporada a ser iniciada em 20 de março sugere uma disputa acirrada entre
Yamaha, Honda, Ducati, Suzuki e Aprilia, embora desde o Grande Prêmio da
Austrália em 2010 somente os pilotos das duas primeiras subiram ao ponto mais
alto do pódio.
O
campeonato mundial deste ano contempla componentes inéditos e indefinições
resultantes do novo regulamento, mas tudo indica que deve haver uma competição
à parte entre o estilo ortodoxo e consistente de Jorge Lorenzo, Valentino Rossi
e outros pilotos para contornar uma curva e a condução agressiva de Marc
Márquez e Dani Pedrosa, que reduzem o tempo de frenagem e aceleram mais rápido
nas saídas. Os pilotos da Yamaha
trabalham seus pneus em todo o contorno e o modo Honda é centrar o apoio nas
bordas por um período mais curto (Dani Pedrosa mencionou em entrevista recente
que gostaria que fosse um tempo um pouco maior!). Em algumas provas de 2015
ficou evidente que Márquez adotava a estratégia de um ataque mais intenso nas
últimas voltas, confiando no desgaste dos líderes, funcionou em algumas provas,
em outras como a decisão em Valência não deu certo.
Existem
muitas outras variáveis. A Michelin assume o lugar da Bridgestone como
fornecedora de pneus, com especificações próprias. Todas as equipes reconhecem
que em 2016 haverá uma disputa paralela para desenvolver chassis e estilo de
pilotagem adequados para os novos pneus. A última experiência neste sentido foi
realizada em 2008 com os Bridgestone, onde primeiro sinal visível foi o
reposicionamento das rodas, que foram levadas até os limites de ajustes para
deslocar o peso do motor para a parte traseira. No circuito de Laguna Seca em 2008,
Valentino Rossi era obrigado a frear mais de 10 metros antes do ponto ideal de
frenagem com os Michelin para entrar na chicane Corkscrew. Nada parecia
funcionar. Os engenheiros da Yamaha e Bridgestone não conseguiram uma
explicação razoável e intuitivamente levantaram a suspensão da moto, os 10
metros desapareceram. O centro de gravidade mais alto transferiu o peso para a
frente durante a frenagem, aumentando o grip e aquecendo mais o pneu. Foi um
indicativo para Bridgestone e pilotos trabalharem mais explorando o aquecimento
dos pneus.
Os
pilotos de testes da Michelin elogiam a "super-aderência" dos pneus
traseiros, mas têm reservas sobre os dianteiros, que atualmente balizam os
limites de entrada e saída de curvas. Nos testes de Valência os menos afetados
pelas mudanças foram os pilotos da Classe Open em 2015, acostumados com os
compostos mais macios da Bridgestone, Maverick Viñales fechou com o segundo
tempo e Aleix Spargaro com o quarto, ambos com Suzuki.
Os
motores são outro ponto a considerar. Pilotos precisam de torque, mas para
obter mais os limites de rotação do motor devem ser sacrificados. Em 2015 ficou
evidente, os pilotos da Honda quase sempre largavam nas primeiras filas e nunca
chegavam na frente na primeira curva devido ao mau desempenho em baixas
rotações. É necessário um equilíbrio entre velocidade, potência e
dirigibilidade. A dificuldade em controlar a potência foi a principal causa das
6 quedas de Márquez em 2015. Esta característica também distingue os
construtores, a Yamaha não tem o equipamento com velocidade final mais alta,
porém a curva de potência é melhor distribuída. Todos os recursos têm sido
utilizados para conciliar a resposta do motor com a dirigibilidade e a
principal ferramenta utilizada tem sido a banda de potência virtual,
implementado através do sistema de acelerador “by-wire” controlado pela
eletrônica. A potência e a curva de torque entregues pelo motor apresentam
picos e depressões acentuadas, algo impossível de ser controlado somente pela
sensibilidade com que o piloto atua sobre o acelerador. A banda de potência
virtual compensa a falta e os picos de torque controlando a abertura do
acelerador, a grosso modo, o mesmo comportamento das asas de um caça F/A-18,
abrindo para planar e fechando para obter maior velocidade. O piloto não
percebe picos e depressões e recebe uma curva de torque aplainada. Há limites
para a agressividade do motor ser controlada, a Honda pode ter cometido um erro
estratégico em ao exceder este parâmetro em 2015.
A
busca por materiais e compostos que proporcionassem maior rigidez ao chassi,
que orientava os desenvolvimentos desde 1993, foi definitivamente interrompida
nos últimos anos. As últimas temporadas da MotoGP mostraram Yamaha e Honda
testando novos componentes ou até braços oscilantes na esperança de conseguir
uma articulação adequada das partes na inclinação máxima (que já chegou a 64
graus da vertical) para absorver a rugosidade dos pavimentos e manter os pneus
trabalhando com capacidade plena. Com uma estrutura mais rígida os pneus saltam
entre as saliências e perdem aderência, o comportamento errático do chassi pode
resultar em vibrações ou até instabilidade total do equipamento. Os fabricantes
já descobriram que a solução de problemas conhecidos pode levar a descobrir ou
criar novos problemas. A Honda obteve um
compromisso aceitável do chassi da RC213V, entretanto Marc Márquez foi uma vez
perguntado sobre qual o comportamento mais incomum do seu equipamento e saiu
com uma resposta desconcertante: “O pneu dianteiro da Bridgestone. Só funciona
bem no limite”.
Todos
os componentes do equipamento reagem aos esforços gerando calor. No grande
prêmio de Montegi, em 2012, a aderência do pneu dianteiro da moto de Ben Spies
permitiu freadas violentas na aproximação das curvas e os discos de freio
desintegraram-se antes do fim da prova submetidos ao calor de mais de 1.000
graus Celsius. As motos atuais utilizam discos de 340 mm de espessura, mais
ventilados, entretanto a perda de eficiência em freadas agressivas devido ao
calor ainda não está totalmente mapeada.
Orçamentos
são anuais, mas variações em regras técnicas estão sujeitas a alterações a
qualquer momento. Isso significa que uma equipe pode reorientar recursos de
desenvolvimento para outras áreas, porque algumas são vedadas. As melhores equipes podem ter até seis
motores por temporada, porém a especificação é congelada a partir da primeira
prova. 2015 mostrou um distanciamento entre equipes de fábrica e satélites, que
talvez cresça na nova temporada. Pesquisas baseadas nas unidades de medidas dos
três eixos da plataforma inercial podem detectar movimentos insuspeitos do
chassi e orientar a descoberta de modos de melhorar a estabilidade, que
permitam entrar em curvas em velocidades mais altas. Isto é ciência a serviço
da dinâmica do movimento e exige investimentos, que são escassos nas equipes
satélite. Chuck Yeager, o primeiro piloto a voar mais rápido que o som (Bell
X-1, 1947) gastou semanas em testes de estabilidade incrementando a velocidade
aos poucos, com os recursos que a MotoGP dispõe atualmente teria resultados
imediatos.
Um
dos pontos ainda controversos do MotoGP é se a eletrônica padrão da Magneti
Marelli vai nivelar as equipes. Os orçamentos são muito díspares e os recursos
vão ser gastos em pontos que podem ser melhorados sem ofender ao regulamento.
Pelo lado comercial, competitividade com custos menores implica em disputa
entre mais equipes (e patrocinadores), para as fábricas o valor das
competições, além da exposição da marca, reside essencialmente nos desafios e
soluções de P&D que possam ser portados para a produção em série. Com
motivações distintas, a regulamentação oscila entre favorecer fabricantes ou as
equipes. Quando o desenvolvimento de motores foi congelado (para a temporada),
o desenvolvimento de chassi flexível aumentou rapidamente. Quando foram fixadas
as especificações do pacote de software, o centro de atenções deslocou-se para
a dinâmica do movimento, permitindo trabalhar os dados dos sensores
padronizados para aumentar o desempenho e estabilidade nas curvas.
O lado
de relações públicas ganhou muita importância devido aos acontecimentos
lamentáveis no final de 2015. As habilidades apresentadas pelos melhores
pilotos nas pistas inconscientemente induzem a esperar excelência também no
comportamento social e depõem contra o esporte nas situações que revelam que se
tratam de pessoas normais, sujeitas a condutas questionáveis, trapaças e
mesquinharias. Reuniões emergenciais no final da temporada passada resultaram
em contratos prolixos com pesadas cláusulas de penalização para o mau
comportamento em 2016.
Como
já foi dito (escrito), apenas as arquirrivais Honda e Yamaha venceram corridas
desde o grande prêmio da Austrália em 2010. A Dorna, proprietária dos direitos
comerciais da MotoGP, aposta que as regras que implicam em redução de custos
devem estimular a concorrência de maior número de equipes e nivelar o
desempenho. Se vai ou não acontecer, os resultados dos testes de pré-temporada
que iniciam em 01 de fevereiro devem servir como amostragem.
Publicado em 01 de fevereiro de 2016 no site www.autoracing.com.br
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