quinta-feira, 3 de dezembro de 2020

MotoGP – Evolução das equipes satélites

 

A última etapa da temporada 2020 da MotoGP em Portimão apresentou, pela primeira vez desde 2004, um pódio formado exclusivamente por pilotos de equipes independentes, as chamadas satélites

 

Pódio de pilotos de equipes independentes em Portimão

 

Foi um detalhe que quase passou despercebido nesta temporada atípica,  a última etapa do Campeonato Mundial de MotoGP de 2020 gerou uma estatística interessante, o pódio ( Miguel OliveiraJack Miller & Franco Morbidelli) foi o primeiro top 3 composto por equipes satélites desde 2004. Talvez o fato mais surpreendente é que não tenha acontecido antes.

Os números da MotoGP em 2020, 14 provas, 9 vencedores diferentes e 15 pilotos no pódio mostram que a categoria está diferente. As razões são múltiplas, um regulamento que privilegia a competitividade, a readequação das características das classes de acesso Moto3 e Moto2 que preparam melhor os pilotos e, principalmente, a mudança do papel exercido pelas equipes independentes. Até pouco tempo as satélites compravam ou alugavam (a relação exata com cada fabricante dependia do tipo de contrato) equipamentos de temporadas anteriores, nos dias atuais representam um recurso a mais utilizado pelas fábricas para coletar dados e testar modificações para desenvolver seus protótipos.   

Petronas SRT Yamaha e Red Bull KTM Tech3 conseguiram suas primeiras vitórias em 2020, a Tech3 conseguiu este feito pela primeira vez após quase duas décadas na disputa. Pramac e LCR estiveram perto do topo nesta temporada, assim como já havia acontecido em anos anteriores.

As satélites com chances de vitória melhoram o espetáculo”, disse Franco Morbidelli, que terminou como segundo colocado na classificação geral, a Yamaha melhor classificada embora utilizasse um equipamento especificação B (chassi 2019) na equipe Petronas SRT Yamaha.

Na MotoGP os pilotos de fábrica têm acesso preferencial aos novos desenvolvimentos e os de equipes independentes estão constantemente tentando mostrar seu potencial para os administradores das fábricas. Estes procedimentos ajudam o aumento do nível de pilotos,  treinam melhor, são mais focados e estão mais atentos aos detalhes porque a competitividade do campeonato é maior.

A Honda Racing Corporation (HRC) que administra a equipe oficial da Honda já divulgou sua decisão de manter a mesma especificação em suas quatro motos inscritas para 2021. Os seus resultados este ano foram muito prejudicados com as lesões de seus principais pilotos, Marc Márquez se acidentou na prova de abertura do mundial e perdeu toda a temporada, Cal Crutchlow passou praticamente o ano recuperando-se de lesões, a defesa da fábrica foi concentrada em um novato (Alex Márquez) e no piloto da equipe satélite LCR, Takaaki Nakagami. A Aprilia informou que deve rodar com quatro equipamentos iguais a partir de 2022 e a Suzuki está avaliando a possibilidade de patrocinar uma equipe independente.

O conceito de equipe satélite deve continuar a existir na acepção mais pura do termo, ou seja, uma segunda equipe com administração autônoma, porém a tendência atual é quatro motos idênticas nas duas equipes. Não era assim, até um passado recente ao terminar uma temporada em Valência os fabricantes repassavam as motos até então utilizadas pelos pilotos oficiais para as independentes e começavam os testes com os protótipos desenvolvidos para a temporada seguinte. As fábricas utilizavam os recursos das equipes satélites para testar pilotos ou fazer caixa com condutores que dispunham de patrocinadores poderosos ($), sempre com máquinas de 1 ou até 2 anos de idade.

 

Lucio Cechinello, administrador da LCR, pede calma para Cal Crutchlow em Phillip Island (2016)

 

No meio da segunda década deste século a engenharia da Honda tinha um grande problema, seus 2 pilotos (Marc Márquez & Dani Pedrosa) eram ótimos, mas nunca conheceram outra máquina além das fornecidas pelo fabricante, não tendo termos de comparação com os concorrentes. Assim a Honda decidiu fornecer para Cal Crutchlow, piloto da LCR e que já tinha experiência com Yamaha (Tech3 de 2011 a 2013) e Ducati (oficial em 2014) um protótipo atualizado e incluir o piloto em seu programa de testes. A iniciativa teve êxito e em 2016 Cal conseguiu as primeiras vitórias para a LCR na MotoGP ao vencer as etapas da República Tcheca e Austrália. As vitórias de Crutchlow mostraram a vantagem de ter mais motos na pista coletando dados e pilotos com experiências diferentes fazendo sugestões.

A estratégia foi rapidamente replicada e logo todos os fabricantes tinham pelo menos uma máquina com especificação atualizada em suas equipes satélite. A KTM ousou mais e em 2019 prometeu máquinas idênticas para as equipes oficial e independente Tech3. A Ducati seguiu o exemplo em 2020 com Miller e Pecco Bagnaia na Pramac Racing com GP20. A Yamaha forneceu para Petronas um modelo 2020 da M1 para Fabio Quartararo, enquanto a moto de Franco Morbidelli é efetivamente um híbrido do chassi de 2019 com algumas inovações desenvolvidas para 2020.

Embora os problemas com o desenvolvimento e fornecimento de peças significassem que a promessa de máquinas idênticas da KTM à Tech 3, principal razão para a equipe encerrar a relação de duas décadas com a Yamaha em 2019, não era totalmente aplicável até 2020, a 2ª vitória de Oliveira na temporada nas 3 obtidas pela KTM é uma indicação que a abordagem de motos iguais pode causar algum impacto.

Jack Miller inaugurou a nova era recente de pilotos de satélites vencendo corridas com seu sucesso no Assen TT de 2016, embora com um modelo Honda de um ano anterior. Miller passou 6 temporadas em equipes independentes antes de ser promovido para a equipe Ducati Corse em 2021, o australiano acredita que a mudança no relacionamento oficial/satélite trouxe um enorme benefício para as equipes e público em geral.

Inicialmente foi a Honda fornecendo um equipamento atualizado para Cal, depois foi a Ducati promovendo em 2017 uma disputa entre Danilo Petrucci e Scott Redding na Pramac Racing para ver quem receberia uma moto atualizada na fábrica. A última prova da temporada 2020 terminou com 3 pilotos de equipes não-fábrica no pódio, dois deles com equipamentos atualizados (Miguel Oliveira e Jack Miller) e um e (Franco Morbidelli) com um equipamento híbrido. É impressionante como a competitividade da MotoGP cresceu com o maior apoio para as equipes satélites.

 

                         Miguel Oliveira confraterniza com Franco Morbidelli em Portimão 


O futuro das equipes independentes depende das motivações dos fabricantes, se como extensões próximas benéficas aos seus esforços de desenvolvimento ou seu sucesso como um possívvel vendo a equipe, da qual é o principal patrocinador e empresta a marca (Monster Energy Yamaha) sendo constantemente superada pela Petronas SRT.

 

Primeiro título mundial de Rossi obtido por uma equipe satélite


A verdade é que não há uma definição clara do que é especificação A ou B. Depois de 19 anos da conquista do primeiro mundial de 500cc por Valentino Rossi pilotando para a independente Nastro Azzurro Honda, a temporada de 2021 tem amplas possibilidades de coroar um piloto de uma satélite como campeão.

Para as equipes que tentam definir suas equipes de fábrica e satélite no novo ciclo de contratos a partir de 2022 é mais provável que adicione em vez de tirar, incluindo uma terceira moto para a Aprilia com duas na equipe de fábrica e uma da satélite Aprilia Racing Team Gresini.

A partir de 2022, podemos ver a Yamaha e a Honda com envolvimento ainda maior com suas associadas independentes, inclusive vistas como um local para pilotos em ascensão.

Não se pode esquecer que o Campeonato Mundial de MotoGP de 2020 foi conquistado pela Suzuki, uma equipe que aparentemente se beneficiou de focar em apenas acertar duas motos. talvez esse seja o caminho a seguir...

 

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