terça-feira, 13 de outubro de 2020

MotoGP – Desencontros nas comunicações

 

Michael Collins foi, provavelmente, o primeiro ser humano a sentir a solidão absoluta. Piloto do módulo de comando da Apollo 11, durante os 48 minutos em cada órbita quando passava pelo lado escuro da lua seu rádio silenciava, ele ficava sem possibilidade de contato com qualquer pessoa na Terra. Se neste intervalo acontecesse qualquer imprevisto com ele ou com a nave nunca, ninguém, ficaria sabendo. Michael participou da missão histórica que realizou o primeiro pouso lunar, mas por ter ficado em órbita, seu feito nunca recebeu o mesmo reconhecimento que Neil Armstrong, o primeiro homem a pisar na lua, e Edwin “Buzz” Aldrin, piloto do módulo lunar. O hilário é que, quando perguntaram para Michael qual era a sua maior preocupação enquanto estava isolado, ele foi pragmático: “Era inevitável lembrar que esta nave foi construída com componentes fornecidos por empresas que ganharam licitações, ou seja, cotaram o menor preço”.

 

Fazendo uma comparação grosseira, quando apagam as luzes que autorizam a largada de uma prova da MotoGP, o piloto de um protótipo também é um solitário. Nos próximos aproximadamente 40 minutos tudo depende exclusivamente de decisões dele e do comportamento da máquina. Pode receber orientações como, por exemplo, mudar mapas de configurações, ver placas expostas no muro do pit lane ou enviadas para o dashboard do equipamento, porém não pode trocar ideias com o pessoal de apoio. Esta é uma característica que difere a MotoGP de outros esportes motorizados.


Dashboard

 

A história da MotoGP é pródiga em histórias onde a ausência ou falha de comunicações resultou em erros ou acertos de pilotos.

 

 O Grande Prêmio da Austrália de 2013 foi realizado em Phillip Island. A pista havia sido recapeada e o novo piso apresentava uma abrasividade muito grande. A Bridgestone, fornecedora exclusiva de pneus, anunciou que a segurança de seus componentes não poderia ser garantida por mais de 10 voltas. A prova originalmente programada para 27 foi encurtada para 20 voltas com troca de moto (e pneus) obrigatória, nenhum piloto foi autorizado a usar o mesmo conjunto por mais de 10 voltas. Marc Márquez foi desclassificado porque estava em uma disputa árdua com Jorge Lorenzo pela liderança na pista e na contagem de pontos pelo campeonato, seu box não sinalizou que sua entrada era obrigatória. A piada na época foi que para trabalhar na Repsol-Honda era condição fundamental saber contar até 10. 


Márquez desclassificado em Phillip Island (2013)

 

Em 2016 o clima fez a toda a diferença no GP de Sachsenring. A prova foi declarada “wet race”. Márquez largou da pole, porém por ter feito a opção por pneus errados, acabou fazendo um passeio na brita,e foi para as últimas colocações. A chuva parou e começou a formar um trilho seco na pista. Marc antecipou a troca de motos e a equipe montou pneus slick. Foi uma temeridade em uma pista muito úmida que deu certo, em pouco tempo ele estava rodando tempos 5 seg mais rápido que os líderes.


Equipe de Valentino Rossi desapontada por ele não entrar no pit

 

As equipes Yamaha e Ducati sinalizaram por diversas voltas para seus pilotos, orientando para trocar para um equipamento com pneus intermediários. Os pilotos continuaram na pista e Márquez, que chegou a estar com um atraso de quase 40 seg em relação aos líderes, diminuía a diferença rapidamente. Quando finalmente todo o bloco que disputava as primeiras colocações atendeu às solicitações já era tarde, o MM93 passou a liderar e venceu a prova. O fato dos pilotos não terem sido informados dos tempos que a Honda conseguia fazer com pneus novos foi determinante para a utilização e regulamentação dos dashboards.

 

Em 2017 Héctor Barberá foi penalizado com uma bandeira preta (desclassificação) por não estar atento às mensagens no dashboard. O piloto recebeu uma punição de um “passthrough” por ter cometido uma imprudência na prova, os comissários enviaram uma mensagem para o piloto e para a equipe comunicando a penalização. O piloto não percebeu e a equipe não sinalizou com placas no muro do pit lane. Como a punição não foi cumprida em 3 voltas, a direção de prova cumpriu o regulamento e apresentou a bandeira preta para o piloto.


Black flag para Héctor Barberá

 

Johann Zarco apresentou bons resultados na temporada de 2017, no comando de uma Yamaha que havia sido utilizada por Jorge Lorenzo na temporada anterior. Na prova de encerramento da temporada, Valência, o campeonato ainda não estava decidido, porém só uma catástrofe tiraria o título de Marc Márquez. Zarco, que classificou sua moto na segunda posição para a largada, estava ciente da estratégia utilizada por do MM93 nas últimas provas, acompanhar os líderes e tentar vencer nas últimas voltas. Para pilotar sem pressões, orientou sua equipe que, se estivesse na liderança, não queria ser avisado da colocação de Márquez. O francês assumiu a liderança da prova na volta 6, e a manteve até a última volta (29), quando identificou que estava sendo seguido muito de perto por uma Honda laranja. Com a certeza que não resistiria a um ataque do campeão do mundo e com os pneus muito gastos, não ofereceu muita resistência. Foi ultrapassado na última volta por ... Dani Pedrosa. Márquez chegou em 3º, quase 10 seg atrás.


Zarco & Pedrosa em Valência 2017

 

Na mesma prova (Valência 2017), para ter alguma chance do título da temporada, Dovizioso devia vencer e esperar que Márquez não se classificasse entre os 10 primeiros. Desde a largada sua Ducati ficou por 24 voltas atrás do companheiro de equipe Jorge Lorenzo. Na prova anterior, o GP da Malásia, o piloto espanhol recebeu em seu dashboard a mensagem “Mapping 8” enquanto liderava e permitiu (ele diz que errou) a ultrapassagem de seu colega, que com a vitória manteve uma remota possibilidade de vencer o mundial. Durante a prova de Valência o box da Ducati enviou muitas vezes a mesma mensagem, orientou acintosamente por placas no muro do pit lane, para que o MM99 permitisse a ultrapassagem pelo AD04. Ambos caíram na volta 25 sem que o espanhol cumprisse a ordem. Há quem diga que este dia determinou o fim de Lorenzo na Ducati, que ainda venceria no ano seguinte 3 provas (Mugello, Catalunha e Áustria) com a moto italiana.


Lorenzo e Dovizioso – Valência 2017

 

Por vezes uma orientação errada ou mal compreendida resulta na perda de uma vitória. A pista forma um trilho mais emborrachado na linha ideal, onde as motos passam com maior frequência e encontram maior grip, freiam melhor. No GP da Styria, segunda prova no Red Bull Ring este ano, Pol Espargaro liderava com a KTM, perseguido de perto por Jack Miller e Miguel Oliveira. Bastava continuar no mesmo ritmo e a vitória viria. Ao abrir a última volta o piloto recebeu dos boxes a comunicação que a sua vantagem sobre Miller era 0 seg, quando na verdade eram 6 décimos. Na possibilidade de sofrer uma ultrapassagem iminente, Pol optou por um traçado de segurança, não permitindo que o australiano da Pramac ocupasse o lado interno da pista nas aproximações de curvas. Agindo desta maneira saiu da trilha emborrachada. Freou em uma parte com piso mais escorregadio, sendo obrigado a abrir demais a última curva, manobra que induziu Miller ao erro, ambos foram ultrapassados pela KTM da independente Tech3. Foi a primeira vitória da equipe em 20 anos de participação no mundial e a primeira do piloto português.

 

Box sinaliza ultrapassagem iminente



Pol Espargaro adota pilotagem defensiva

domingo, 11 de outubro de 2020

MotoGP - Síndrome de Abstinência

 

Tradução livre de um artigo de Mat Oxley


Já se passaram meses desde que Marc Márquez, o maior piloto de sua geração – talvez o maior de todos os tempos- está afastado das pistas. Muitas pessoas já estão com sintomas de síndrome de abstinência.

 

Márquez sempre faz tudo no estilo Schwantz

 

Tem sido estranho não ler reportagens sobre Marc Márquez nos últimos meses. Desde meados de 2012, quando assinou seu primeiro contrato na MotoGP, ele roubou a maioria das manchetes, assim como fizeram Mick Doohan e Valentino Rossi antes dele.

 

A MotoGP passou por um longo período sem atrativos antes de Márquez aparecer. Os anos dos motores 800cc foram caracterizados por corridas entediantes. Os pilotos que se sobressaiam na época, Dani Pedrosa, Jorge Lorenzo e Casey Stoner não tinham desempenhos eletrizantes, eram pouco mais que corretos, talvez as rixas com Valentino Rossi tenham notabilizado o australiano um pouco mais.

 

As performances de Marc Márquez começaram a deslumbrar o público enquanto disputava o título mundial de Moto2 de 2012. Óbvio, como todo o novato ele alternou sequências inconsequentes com pura magia. Foi considerado muitas vezes um piloto irresponsável, mas sua performance quase sempre contribuiu para fazer o espetáculo.

 

Até agora, o piloto de 27 anos venceu 82 GPs (todas as classes), número inferior apenas a Angel Nieto (90), Valentino Rossi (115) e Giacomo Agostini (122), mas foram os momentos mágicos que protagonizou que permanecem na história. Ele controlou situações que teriam resultado em quedas para qualquer piloto incontáveis vezes.

 

A prova de Moto2 em 2013 em Motegi é exemplar. Apesar de ter a segunda posição no grid, Marc não conseguiu engatar a primeira marcha quando as luzes de largada apagaram – teve muita sorte por não ser atropelado – e foi ultrapassado por 26 concorrentes. Recuperou 3 posições na Curva 1, na saída acelerou o máximo possível e ultrapassou mais 9 pilotos, todos andando o mais rápido que ousavam com os pneus ainda fora da temperatura ideal. Entre eles havia uma árdua disputa de posições entre Andrea Iannone e Alex De Angelis, Márquez passou por eles como se estivessem parados.

 

Nos 100 metros que separam até a Curva 2 ele acelerou o máximo que sua máquina permitiu, no contorno deixa o pneu traseiro deslizar e, quase sem controle, deixou mais um para trás. Na curva seguinte ultrapassou mais 4 rivais, o que totaliza em 17 ultrapassagens nas 3 primeiras curvas da primeira volta. Márquez venceu a prova com 4 décimos de vantagem sobre Pol Espargaro, seu futuro companheiro na equipe Repsol-Honda em 2021. A mídia teve dificuldades em escolher os termos mais adequados para descrever a magnitude da sua atuação, a palavra mais utilizada foi “hipnotizante”.


Márquez na tentativa fracassada de voltar em Jerez no final de julho

 

A habilidade de Márquez de controlar uma moto é o diferencial que o torna único. Quando chegou à MotoGP, em 2013, inventou uma nova maneira de pilotar, que muitos ainda estão tentando imitar. Marc exerce um controle absurdo ao deslizar o pneu dianteiro, quando a maioria dos pilotos desliza a traseira. Ele consegue controlar a moto nestas condições porque tem doses sobrenaturais de talento, tempos de reação incríveis, combinados com força física, audácia e bravura.

Todos compreendem que entrar em uma curva deslizando a dianteira sem perder o controle é complicado, especialmente quando o pneu está frio. Há poucas condições piores de pilotar um protótipo com o pneu dianteiro frio – basta perguntar aos 38 pilotos de Moto2 e MotoGP que se acidentaram com a baixa temperatura de Barcelona (2020) em curvas para à esquerda, porque o lado de seus pneus dianteiros não estava quente o suficiente. (O total de acidentes de Moto2/MotoGP durante todo o fim de semana foi de 42)!

 

Com o pneu dianteiro frio é quase impossível acelerar muito e manter o controle. Paradoxalmente a única maneira de manter a temperatura adequada do componente é acelerando forte, os pilotos têm que fazer uma escolha delicada.

 

É como andar no fio de uma navalha, e Márquez utiliza toda a sua habilidade nestas condições. É por isso que ele é tão bom em condições duvidosas e úmidas, quando a linha entre glória e a brita é mais tênue. A quantidade de recursos de Márquez no comando de uma moto é espantosa, quando ele está na pista não há como prever o que pode acontecer no momento seguinte. De uma certa maneira, lembra muito a Kevin Schwantz.

 

Há diversos momentos memoráveis da atuação de Márquez. Há aquele momento absurdo quando ele desliza afrente e a traseira para ajudar a virar a sua Honda, Cal Crutchlow diz que consegue no máximo uma ou duas vezes por prova realizar o que ele define como “queda controlada”, Márquez faz isso em praticamente todas as curvas da corrida. Há ainda aqueles momentos mágicos que colegas, espectadores e telespectadores ficam se perguntando, como ele conseguiu fazer isso?

 

Márquez tem várias histórias incríveis, como a pole na COTA em 2015, estava na 4ª colocação quando sua moto parou na pista, faltando 3 minutos para encerrar a classificação. Ele estacionou a moto contra o muro do pit lane, correu até o seu box e montou na RC213V sobressalente. Abriu a sua última volta faltando poucos segundos para encerrar a qualificação, fez um tempo fantástico e conseguiu a pole.

 

Márquez mantém uma equipe unida ao seu redor

 

Houve ainda o GP de Brno em 2019 quando ele conseguiu a pole por uma eternidade de 2,5 seg sobre o 2º colocado na chuva, com uma particularidade: usando slicks! Seus rivais reagiram com incredulidade: “Não entendo como a pista estava seca exclusivamente para Marc, não para o resto de nós", desabafou Danilo Petrucci da equipe oficial da Ducati, interpretando o sentimento da maior parte do grid.

 

Talvez a performance mais marcante tenha sido em Sachsenring 2016, porque destaca sua capacidade de fazer coisas com um pneu dianteiro frio, que ninguém mais consegue.

 

A corrida começou em uma pista fria e encharcada, Márquez não estava à vontade e lutou para se manter com os líderes. Com um terço da prova ele saiu da pista em alta velocidade e fez um passeio na brita, conseguiu manter o controle e voltou muito atrasado. Estava em 9º e não conseguia progredir, então tentou fazer algo diferente. Com a pista ainda fria e úmida, entrou nos boxes e trocou pela segunda moto, equipada com pneus slicks.

 

Pol Espargaro o seguiu até os boxes – sem dúvida confiando na capacidade de seu compatriota de tomar a decisão certa na hora certa – e o trocou seu equipamento para um com a mesma configuração de Marc. O que Espargaro faz em seguida só serve para ilustrar a magia de Márquez, ele caiu na primeira curva à esquerda. A pista estava muito traiçoeira.

 

Márquez continuou a andar no fio da navalha, forçando o pneu dianteiro o suficiente para gerar calor, mas não para perder o controle e sair da pista. Voltou em 14º, 38 seg atrás do líder Andrea Dovizioso, mas nas voltas seguintes Márquez foi o piloto mais rápido da prova, utilizando as poucas partes sem água da pista, mesmo que a trilha formada não tivesse mais de um metro de largura em certos lugares. Houve voltas em que o espanhol rodou mais de 5 seg mais rápido que os líderes.

 

Quando depois de muitas voltas outros pilotos param para trocar de moto, muitas equipadas com pneus intermediários, Marc assumiu liderança ultrapassando Jack Miller – ainda com pneus de chuva – e cruzou a linha de chegada dez segundos à frente do segundo colocado Cal Crutchlow.

 

Essa vitória resume Márquez melhor do que qualquer uma de suas outras 55 vitórias na MotoGP. (Uma média de oito por temporada na era mais competitiva do motociclismo).

 

Com pneus slick em Sachsenring -  Márquez comemora vitória em 2016

 

Claro, na abertura de temporada em Jerez, em julho, ele ultrapassou o limite e pagou o preço. Alguns argumentam que a lesão no braço, por causa do estilo exagerado de pilotagem, era inevitável.

 

Na medida em que motociclismo é um esporte de risco, acidentes não devem ser novidade para Marc Márquez, mas o fato é que ele quase nunca lidera o ranking de quedas. Apenas em uma temporada nesta década ele foi o piloto com o maior número de acidentes. A história da MotoGP não vincula acidentes com vitórias, como ilustra o caso entre Kevin Schwantz e Wayne Rainey – Schwantz caiu duas vezes mais vezes, mas foi Rainey que acabou em uma cadeira de rodas.

 

Nenhum jornalista sério se arrisca a prognosticar quando Márquez voltará s pistas. Ele tentou na segunda prova de Jerez e não conseguiu. Talvez tenha sido muito otimista, mas é assim a natureza dos pilotos.

 

Corredores voltam precocemente de lesão e saem impunes são aclamados como super-heróis. Se tentam voltar muito cedo e não conseguem, são rotulados de inconsequentes.

 

Quando Mick Doohan voltou muito cedo de sua lesão na perna ninguém o qualificou como imprudente. Quando ele fraturou a tíbia e a fíbula realizando um treinamento intenso, ninguém o chamou de irresponsável. E quando ele bateu e quebrou a clavícula porque a perna ainda estava muito fraca para comandar uma motocicleta, ninguém escreveu que ele era maluco. Em vez disso, todos reconheceram que estavam diante de um piloto preparado para ir muito além do os simples mortais para alcançar um objetivo.

 

Poucos campeões mundiais conseguem o título sem levar seus esforços a limites extremos, Marc Márquez é um deles. Certo ou errado, é isso que os diferencia dos outros concorrentes.

MotoGP - Eu tenho um sonho!


Há mais de meio século, falando para uma multidão de mais de 250 mil pessoas reunidas no Lincoln Memorial em Washington, o ativista pelos direitos civis Martin Luther King Jr. pronunciou um discurso épico que ficou mundialmente conhecido por sua frase inicial: “I have a dream! (Eu tenho um sonho)”. Citado inicialmente no contexto de promover a integração racial, este jargão foi portado para o cotidiano das pessoas para expressar um desejo intenso, uma meta a ser alcançada.


Gestão do Mundial de MotoGP

 

Uma análise de decisões recentes da Dorna Sports, uma empresa de gestão esportiva, marketing e mídia, que tem o monopólio comercial da MotoGP, indica que seus diretores e executivos têm um sonho. Recapitulando, o mundial de motociclismo tem a gestão compartilhada por quatro entidades: FIM (Federation Internationale de Motocyclisme) que promove o campeonato; Dorna que controla os direitos comerciais, leia-se o dinheiro envolvido; a associação dos fabricantes MSMA (Motorcycle Sports Manufacturer’s Association); e a IRTA (International Road Racing Teams Association) que representa os interesses de equipes, principais fornecedores e patrocinadores.

 

O sonho da Dorna, compartilhado com estas entidades, é operacionalizar um campeonato com 24 participantes distribuídos entre 6 fabricantes, cada qual com 4 pilotos, 2 representando a equipe oficial e 2 em uma independente, competindo em um campeonato com no máximo 22 etapas.  Um regulamento rígido que impeça uma escalada de custos de desenvolvimento, para evitar que empresas com orçamentos abundantes monopolizem a competição como já aconteceu em um passado recente. Desde o fenômeno Case Stoner com a Ducati em 2007, todos os campeonatos foram vencidos por pilotos da Yamaha (2008, 2009, 20010, 2012 & 2015) ou da Honda (2011, 2013, 2015, 2016, 2017, 2018 & 2019).

 

Antes da pandemia, a MotoGP estava buscando maior presença na Ásia, onde o desenvolvimento econômico é acelerado e o mercado de motocicletas ascendente. A Dorna assinou em 2018 um protocolo de intenções com um grupo de empresários para que o Brasil volte a hospedar uma etapa no calendario de 2022, em um circuito a ser construído em Marechal Deodoro no Rio de Janeiro. A empresa também planejava promover uma prova na Finlândia (Circuito de Kymiring), avaliava a viabilidade de um circuito urbano na Indonésia e um possível retorno ao México. O Corona Vírus implodiu este planejamento e arquivou estes projetos por algum tempo

 

Os fabricantes já estão em processo de adequação a esta nova realidade. As antigas relações de fornecedor/cliente que existiam entre as fábricas e satélites migraram para o conceito de parceria. Com grandes inovações tecnológicas severamente limitadas pelo regulamento, cresce a necessidade de pilotos com sensibilidade e quilometragem em testes para coletar dados que, com o auxílio de simuladores digitais, orientem ajustes e adequações dos equipamentos. Ducati, Yamaha e Honda já fornecem aos principais pilotos das equipes satélite pelo menos um protótipo do modelo mais recente. Nesta temporada Cal Crutchlow da LCR utiliza uma RC213V idêntica às disponibilizadas para Alex Márquez e Stefan Bradley, Jack Miller da Pramac tem uma GP-20 igual às de Dovizioso e Petrucci, Fábio Quartararo da SIG Petronas pilota uma YZR-M1 com especificação idêntica à de Rossi e Vinales. A KTM expandiu este conceito e as quatro motos que disputam o mundial, 2 da equipe oficial e 2 da Tech3, são da mesma geração. Mais dados e observações fornecem indicações mais apuradas de como ajustar melhor os protótipos para um GP.

 

Os contratos das equipes que disputam o campeonato atual se encerram em 2021, com uma série de possibilidades a surgirem na constituição do paddock para 2022.

 


Equipes inscritas no Mundial de MotoGP 2020

 

Para cada fábrica adotar também para uma independente teria de haver mais uma equipe no grid, uma vez que só existem 11 inscritas. Suzuki e Aprilia teriam uma equipe satélite e a Ducati perdia uma das duas (Pramac & Avintia) que tem neste momento.

 

O primeiro caso a ser analisado é a situação da Petronas. Segundo a rádio paddock (conversas informais no pit-lane) a equipe não está satisfeita em relação a Yamaha. Não tem duas motos de fábrica como as a Ducati fornece para a Pramac e a KTM disponibiliza para a Tech3. Franco Morbidelli tem uma M1 antiga e, embora já tenha vencido nesta temporada, poderia render mais. Também não ficaram muito satisfeitos com a solução encontrada para manter Rossi atrelado à Yamaha em 2021. Nada a reclamar quanto a presença do “The Doctor”, mas porque a ideia central da equipe é trabalhar com jovens talentos que possam ser catapultados ao estrelato, como foi feito com Quartararo. É uma mudança de paradigma, perder um piloto que pode evoluir em troca de uma lenda, que tem pouco ou quase nada a comprovar. O que pode ser ouvido no paddock é que, como o financiamento aparentemente não é problema para os malaios, a equipe pode migrar para a Suzuki em 2022.

 

A Yamaha ficando sem satélite poderia optar por patrocinar a evolução da VR46, que já disputa Moto2 e Moto3. É uma ideia antiga de Rossi ter a sua própria equipe, até para poder promover os talentos da sua academia de pilotos. Não está descartada a hipótese de que "The Doctor" Rossi possa resolver adiar a sua aposentadoria e correr por sua própria equipe em 2022.

Valentino Rossi em sua própria equipe

 

A Aprilia é a pedra no sapato dos planos. A equipe não tem uma equipe oficial de fábrica, é representada pela Gresini Racing. Se Pramac e Ducati tem um relacionamento perfeito, a Avintia tende a sobrar. Quando Massimo Rivola assumiu a administração da Aprilia na MotoGP, prometeu uma equipe de fábrica própria e faz sentido pensar na Gresini como uma equipe satélite. A Avintia tem contrato até 2021, porém pode faltar fôlego (financeiro) para uma equipe bancada para garantir um assento para Tito Rabat.

 

Renovação em andamento

Existem atualmente cinco equipes de fábrica no grid do Mundial de MotoGP: Ducati, Monster Energy Yamaha, Red Bull KTM, Repsol Honda e a Suzuki Ecstar. Um fato notável é que todas, à exceção da Honda, as outras apostam na nova geração de condutores, todas serão representadas por pilotos que estrearam na categoria máxima a partir de 2015. Ou seja, pilotos calejados estão migrando para as equipes independentes. A aposta das equipes oficiais é contratar talentos promissores que possam manter por muitos anos. O único contratado de representações de fábrica que passou da barreira dos 30 é Pol Espargaro, que deve ser o companheiro de Marc Márquez na Repsol Honda.

A Ducati confirma a sua aposta nos jovens que tem apoiado nos últimos anos, Francesco Bagnaia e Jack Miller que devem tentar conseguir mais que os vice-campeonatos alcançados pelo veterano Andrea Dovizioso. A Yamaha conta com Maverick Vinales, que está na equipe a 4 temporadas e recebe Fabio Quartararo, que a equipe aposta poder reprisar seu desempenho na independente Petronas. Toda a experiência de Valentino Rossi, de 41 anos, é transferida para a representação malaia.

Com u m trabalho consistente de formação de (Red Bull MotoGP Rookies Cup), a Red Bull KTM coloca todas as suas fichas em jovens talentos e deve ter uma das duplas mais inexperientes em 2021, Brad Binder a Miguel Oliveira. Os dois desenvolveram suas carreiras dentro do espírito de lealdade e confiança na marca austríaca, ambos já venceram na MotoGP.

 

A aposta em pilotos que podem fazer carreira na equipe é extensiva à Suzuki Ecstar, Álex Rins e Joan Mir chegaram ao MotoGP com o construtor nipônico e devem ser mantidos em 2021, na esperança de reviver os tempos áureos de Barry Sheene (1976-1977), Kevin Shwantz (1993) e Kenny Roberts Jr. (2000).

 

Na Repsol Honda, Marc Márquez apesar da pouca idade estreou na equipe em 2013 não é uma aposta, Pol Espargaro com sua idade não pode ser considerado um investimento no futuro, sua contratação se deve mais a uma garantia imediata de consistência e bons resultados. A presente temporada, com os infortúnios de Márquez e Crutchlow, pode ser considerada um fracasso total. A equipe aposta na independente LCR na formação de Alex Márquez e Takaaki Nakagami para o futuro.

 

A Aprilia é um caso à parte. A fábrica não tem atualmente uma representação oficial e é representada nas pistas por uma equipe independente, a Gresini Racing. A fábrica foi prejudicada nesta temporada com a perda de Andrea Iannone, penalizado por doping, e já informou que pretende ter uma equipe oficial em 2022 e deve contratar um piloto para ajudar Aleix Espargaro a desenvolver o equipamento em 2021 e preparar a transição para a estrutura oficial em 2022.

 

Apostar nos jovens pilotos tem vantagens e inconvenientes. Por um lado, os contratos são mais em conta e podem trazer algo de novo, seja em termos de técnicas de pilotagem, desenvolvimento de equipamentos ou de imagem. Há os riscos associados, estando em uma fase precoce de suas carreiras, não há como prever sucesso futuro ou discernimento no desenvolvimento de um protótipo, que pode enveredar por caminhos errados. Pilotos mais calejados como Andrea Dovizioso, Cal Crutchlow ou Valentino Rossi podem se comunicar melhor com os engenheiros, trazendo sugestões além de sentimentos.

 

MotoGP - Aerodinâmica



Em tese, as competições da MotoGP deveriam funcionar como laboratórios de pesquisas para inovações, que possam migrar para produtos comerciais disponíveis em revendas. Na prática o mundial de motociclismo adquiriu vida própria, a cobertura global da TV e o capital corporativo transformaram o GPs de motos em espetáculos para promover marcas de fabricantes. A importância da MotoGP como agente de marketing cresceu e o mundial transformou-se em uma vitrine onde os fabricantes divulgam a excelência de sua engenharia e a qualidade de seus produtos. Vencer um campeonato de pilotos, marcas ou equipes é uma comprovação inequívoca de superioridade sobre a concorrência e serve para promover as vendas de um fabricante.

Em março de 1954 o presidente da Honda, até então um fabricante modesto de motocicletas, emitiu uma declaração pública anunciando a disposição da sua empresa em disputar o Troféu Turismo Ilha de Man (Isle of Man TT). Soichiro Honda acreditava que vencer uma prova do maior evento de desporto motorizado do seu tempo permitiria, não só a Honda promover sua marca internacionalmente, como contribuir para o desenvolvimento tecnológico do Japão.

Décadas depois duas empresas japonesas, disputavam a hegemonia da MotoGP, com fartos investimentos em software embarcado para facilitar a tarefa dos pilotos. Entre 2011 e 2015 só representantes da Yamaha e Honda ocuparam o degrau mais alto do pódio. Cientes de que esta polarização implica em uma escalada de custos que favorece aos que dispõem de orçamentos abundantes, limita a competitividade e desencoraja outros concorrentes, a organização do mundial decidiu padronizar em 2016 a unidade de controle eletrônico (hardware & software) e iniciou via regulamentações, um processo de equalização de recursos. Atualmente todos os pilotos inscritos no mundial dispõem de equipamentos muito semelhantes.

Na medida em que soluções exóticas ou criativas foram desencorajadas, sobrou aos fabricantes investir na aerodinâmica como forma de buscar de alguns milésimos de segundos por volta que pudessem fazer a diferença, uma das poucas áreas em que os desenvolvimentos ainda que não estão totalmente engessados. A aerodinâmica tem sido o maior ponto de discussão tecnológica da MotoGP, até porque é mais fácil detectar uma carenagem modificada em um concorrente que identificar um mapa de controle de tração reescrito. As fábricas já entenderam que não existe uma relação direta entre investimentos e obtenção de vantagens competitivas. Com poucas exceções o gasto em estudos aerodinâmicos pode ser considerada um desperdício de recursos, que se aplica exclusivamente nas pistas de corrida e não tem relevância para o mercado de motocicletas rodoviárias.




Modelo do fluxo de ar criado por computador

 

A ideia de carenagens aerodinâmicas é aumentar o downforce para reduzir a tendência do protótipo em descolar a roda dianteira da pista (“wheelie”) durante a aceleração e auxiliar e minimizar a resistência do ar em altas velocidade ou enquanto contorna curvas. 

A importância do aspecto anti-wheelie aumentou significativamente quando os organizadores padronizaram o software de controle, a versão desenvolvida pelo fornecedor do padrão adotado foi considerada muito simplista. A eletrônica era incapaz de manter a dianteira em contato com a pista sem reduzir drasticamente o torque, leia-se capacidade de aceleração, de modo que os fabricantes buscaram o auxílio de carenagens para fazer o trabalho.

O contato entre o pneu dianteiro e o piso é importante porque a tarefa de conduzir a moto é facilitada quando ambos os pneus têm aderência com a pista. Os equipamentos da MotoGP têm tanto torque que, mesmo quando desenvolve 320 km/h, a roda dianteira mal toca o asfalto. Se o piloto for obrigado a reduzir rapidamente a velocidade utilizando o freio dianteiro pode causar acidentes. Em defesa da aerodinâmica alguns argumentam que o downforce extra criado pela carroceria é também um fator vital de segurança.

A aerodinâmica é uma área de desenvolvimento onde é difícil projetar e ainda mais difícil testar a eficácia dos projetos. Algumas motos da MotoGP têm muito aero, algumas têm muito pouco e outras não têm nenhum, ou seja, é grande a incerteza sobre os resultados.


Carenagem da Desmosedici que disputou a MotoGP

 

A aerodinâmica pode ter enormes implicações de custos, que incluem simulações computacionais da Dinâmica de Fluidos (CFD) e análises em túneis de vento. A MotoGP está no início desse processo, então ainda é impossível prognosticar como essa linha de desenvolvimento pode contribuir para o esporte. A Ducati é líder nesta área na MotoGP, mas os engenheiros envolvidos no processo não têm ideia de qual o melhor resultado que podem obter. Ensaios em túneis de vento, caríssimos, determinam para uma carga do vento a resposta dinâmica da moto. Os resultados são utilizados para o dimensionamento estrutural do protótipo para resistir a pressões, tensões, cargas e deformações nos pneus. Como limitação só avaliam o efeito do aero com o equipamento na vertical e em linha reta. O comportamento muda radicalmente quando a moto está inclinada em uma curva ou quando o piloto está movendo seu corpo, que obviamente modifica a aerodinâmica do equipamento como um todo.

Em termos aerodinâmicos, inclinações são complicadas porque quando o equipamento está com um ângulo de 60 graus uma parte da carenagem está muito próxima da pista. A técnica utilizada pelo piloto e o modo como joga com seu peso para mudar o centro de gravidade são fatores que influenciam o comportamento da máquina. A ciência ainda não está desenvolvida para calcular com exatidão qual a contribuição do downforce nestas situações, se é que tem alguma. É o típico caso em que a única métrica dos engenheiros são os sentimentos transmitidos pelos dos pilotos.


Túnel de vento da Volkswagen em Wolfsburg, Alemanha

quinta-feira, 1 de outubro de 2020

MotoGP - Rossi na Petronas: poderia ser uma promoção?

 

Texto adaptado de um original de Mat Oxley

 

Em tese, a mudança de Valentino Rossi da equipe de fábrica da Yamaha para a independente é um rebaixamento, mas tem suas vantagens.

O staff de Valentino Rossi, que será desfeito em 2021

 

A maior notícia do fim de semana do GP da Catalunha não foi uma novidade. Depois de 21 anos como piloto de fábrica da Aprilia, Honda, Yamaha & Ducati, o sete vezes Campeão do Mundo da Valentino Rossi finalmente vai ser rebaixado para uma equipe independente em 2021.

Tinha que acontecer. O tempo passa para todos, a carreira de um piloto bem-sucedido como Rossi só poderia terminar de duas maneiras, aposentadoria ou rebaixamento para uma equipe independente, por que as equipes oficiais de fábrica precisam de contratos com pilotos rápidos e com futuro pela frente.

Todas as carreiras profissionais, inclusive as de pilotos da MotoGP são como montanhas. Uma subida até o topo, tentar se manter em cima o máximo possível e descendo, com o corpo vencido pelo esforço ou recebendo os aplausos da multidão a cada passo para baixo.

A montanha de Rossi tem sido mais um platô, ele tem estado em um patamar elevado ao longo de duas décadas ou mais, porém  ele tem que começar sua descida para se juntar aos que vivem em um nível mais baixo.

Os pilotos de fábrica começam cada com a rotina de coletar dados e adequar o equipamento. Motos antigas têm a vantagem de ter, pelo menos, uma temporada completa de melhorias já implementadas.

A grande questão é se uma mudança para a Petronas Yamaha SRT pode ser considerada um rebaixamento. Em tese sim. O contrato de Valentino permanece com a Yamaha, então ele é um piloto de fábrica, mas ele foi colocado em uma equipe independente, a exemplo do que são os contratos da Ducati/Pramac de Jack Miller e o da HRC/LRC de Cal Crutchlow. Rossi vai iniciar a temporada de 2021 com uma YZR-M1 de fábrica completa, mas todas as inovações e atualizações que forem desenvolvidas irão prioritariamente para as motos de Maverick Vinales e Fabio Quartararo. Não é necessariamente uma coisa ruim. Pode inclusive ser uma vantagem.

A lógica simples é que uma oferta regular de desenvolvimentos de hardware e software da fábrica ajuda aos pilotos melhorar constantemente seu desempenho. Nem sempre é assim. Na segunda década do século XXI não existe mais a bala de prata, a possibilidade de uma alteração que traga uma melhoria instantânea que tenha resultados palpáveis no desempenho dos equipamentos.  As motos são muito próximas do estado da arte, cada novo componente deve ser analisado em detalhe pela coleta constante de dados. Se uma peça oferece uma vantagem infinitesimal em uma área, pode muito bem prejudicar em outra. Tudo isso toma tempo, trabalho e pode resultar, se não for bem administrado, em uma potencial confusão.

Não é coincidência que a Yamaha não se encontrou desde a implementação da eletrônica padronizada e a troca do fornecedor de pneus (Michelin) em 2016.

A YZR-M1 user-friendly (amigável) precisa de pneus mais macios para realizar curvas em traçados suaves e arqueados, mas no início de 2016 a Michelin introduziu um pneu traseiro com uma construção mais rígida como medida de segurança, depois que Scott Redding teve um componente desintegrado na Argentina, e um ano depois a empresa francesa introduziu um pneu dianteiro mais reforçado. Houve protestos de alguns pilotos, que preferiam pneus dianteiros mais amigáveis com uma carcaça mais macia.

Carcaça do pneu de Scott Redding em Rio Hondo

 

Desde então, até o início da temporada 2020, a M1 não consegue usar seus pontos fortes e tem sido prejudicada por seus pontos fracos. Entre 2016 e 2019 a Yamaha utilizou diversos chassis diferentes, sempre em busca de maior aderência. Rossi e Vinales não conseguiam encontrar um quadro adequado, em um ano terminaram a temporada mudando para o chassi do ano anterior na última corrida, mais perdidos que cachorro que caiu do caminhão de mudança”.

Enquanto isso, as equipes independentes, Tech3 e posteriormente a Petronas, ficaram alheias a esta confusão, continuaram correndo com o que tinham. Suas motos permaneceram praticamente inalteradas, pois a política de fábrica é desenvolver a moto para a equipe oficial e deixar para a independente um kit com a especificação mais antiga.  Melhor ainda, as motos de um ano dadas transferidas então para a Tech3, e atualmente a Petronas (com exceção de Quartararo este ano) foram sofrendo alterações com dados coletados durante uma temporada. Estão menos propensas a surpresas, enquanto isso os pilotos da fábrica começam do zero a cada temporada, amostrando e processando informações a cada corrida.

Ocasionalmente, os pilotos independentes reclamam que querem um kit mais atualizado, foi o caso de Quartararo na segunda metade da temporada passada, mas na maioria das vezes voltam para o seu original. É o segredo para o sucesso de equipes independentes.


Rossi e os pilotos da Petronas Quartararo e Morbidelli em Misano

 

Para os pilotos corridas as motos são 99% sobre sentimentos, quanto mais voltas sem mudar a configuração, maior é o aprendizado da moto e mais fácil é prever o seu comportamento. O condutor sabe o que fazer para não perder o controle quando, por exemplo, o pneu dianteiro desliza. Quando o chassi é novo ou as configurações significativamente diferentes não existe esta capacidade de prever o comportamento do protótipo, então qualquer reação da moto é uma surpresa para o condutor.

A vantagem de pilotar um equipamento já consolidado é comprovada pela história, os resultados obtidos por Quartararo, Morbidelli, Zarco, Crutchlow, Dovizioso e Bradley Smith em equipes independentes. Com certeza é mais fácil encontrar um centésimo na técnica de pilotar que em melhoria no hardware. É verdade que Rossi terá motos de 2021 no próximo ano, mas ele não terá engenheiros oferecendo novos recursos e peças o tempo todo, o que podem ou não funcionar.

Há outros pontos positivos na mudança de Rossi da equipe de fábrica para a equipe independente.

O comportamento d Rossi é de um hippie, como seu pai. Ele pode voar em jatos particulares velejar no Mediterrâneo em barcos chamativos, mas ele é apenas um hippie com algumas centenas de milhões de Euros no banco. Portanto, ele provavelmente se sentirá mais leve em uma equipe de menor, com menos camadas de gestão e menos deveres corporativos. Além disso, ele lembrou no fim de semana que conquistou seu primeiro título da classe principal, o campeonato mundial de 500cc com a Honda de uma equipe independente em 2001, trabalhando em paralelo,   não na estrutura corporativa da HRC.

Existe uma outra grande questão: A Petronas está pronta para Rossi? A equipe se saiu muito bem durante suas duas primeiras temporadas, em grande parte graças às habilidades de Quartararo, que a equipe aceitou contratar graças à enorme pressão do importador francês Yamaha, não por sua própria convicção.

O status de Rossi como o astro do paddock, adorado pelos fãs em todas as corridas, forçará Petronas a trabalhar de uma nova maneira, se a equipe não quiser ser sitiada por bem-intencionados admiradores durante todo o fim de semana, que podem ser uma distração para seus funcionários.

Uma curiosidade final é como Rossi se comportar sem sua tripulação técnica e a claque de seus assessores pessoais. A Yamaha não aceitou continuar pagando salario a seus amigos, que também foram rejeitados pela Petronas. Seu grupo de mecânicos também foi desfeito. Ao longo de sua carreira de primeira classe, o italiano manteve principalmente as mesmas pessoas ao seu redor porque é assim que ele gosta de trabalhar. Ele chama sua equipe de sua família, mas no final desta temporada ele vai dizer adeus a dois de seus membros mais fiéis, que estão com ele a décadas.


Alunos da Academia VR46

 

O australiano Alex Briggs trabalhou com Mick Doohan em seus cinco títulos de 500cc e faz parte da equipe de Rossi a partir do final de 1999, ao lado do companheiro australiano e chefe de equipe Jeremy Burgess.

O neozelandês Brent Stephens estava com a equipe Yamaha de fábrica quando Rossi mudou para a marca em 2004. “Lutei muito para toda a minha equipe mudar para a Petronas, mas às vezes é impossível”, disse Rossi no Barcelona. “Neste momento da minha carreira é normal e não tenho mais o poder de exigir tudo o que quero. Infelizmente não foi possível ter Alex e Brent. É triste, mas assim é a vida”.

Não está claro por que Petronas não quer Briggs e Stephens. Aparentemente, o problema não é financeiro, o que seria então? Talvez a administração da Petronas SRT queira afirmar a sua autoridade sobre a situação e garantir que Rossi saiba quem está no comando. Resta a questão se a equipe vai encontrar dois mecânicos que podem trabalhar muito bem com Rossi e lidar com a pressão em torno do maior nome que o este esporte já conheceu.

No próximo ano, Rossi também perderá seu outro mecânico de longa data, Bernard Ansiau, que ficará na equipe de fábrica. Ansiau tem um currículo de fazer inveja: três títulos mundiais de 500cc com Wayne Rainey, cinco com Mick Doohan e sete coroas de 500 e MotoGP com Rossi.

 

MotoGP - Falha de projeto?

Citicorp Center – Nova York

Um erro de projeto resultou em vulnerável a construção do Citicorp Center, uma edificação de 59 andares em Nova York. Um vento mais forte poderia ter derrubado o edifício. A falha não foi notada até que uma estudante da Universidade de Princeton levantou questões um ano após sua inauguração em 1977. Uma estudante de engenharia civil, Diane Hartley, consultou os engenheiros e arquitetos responsáveis pela obra para tentar encontrar um erro em seus cálculos em um trabalho acadêmico sobre a construção. A Srta. Hartley presumiu que seus resultados estavam errados, não estavam. A configuração única do edifício apoiado em quatro palafitas tornava seus cantos vulneráveis à carga do vento. Os reparos necessários foram realizados durante a noite para evitar o pânico, o segredo foi mantido por décadas.

 A mesma coisa pode ter acontecido com a Honda RC213V de 2020, um erro de projeto é possívelmente a razão dos maus resultados obtidos pelos protótipos nos GPs. Não há outra explicação plausível. Na primeira prova da temporada Marc Márquez, um dos pilotos mais talentosos em atividade, perdeu o controle da moto por duas vezes, algo improvável em alguém reconhecido por sua capacidade de adaptação ao equipamento e recuperação do controle em situações onde a queda é considerada inevitável. Como era a primeira prova da temporada, a pandemia havia prejudicado a preparação dos pilotos e a fornecedora Michelin trocou as características do pneu traseiro, as circunstâncias do acidente foram relevadas.

Algo estranho já havia acontecido nos testes que antecederam o primeiro GP em Jerez, Cal Crutchlow, um condutor experimentado que já venceu três provas (2016 & 2018) com protótipos da Honda, também perdeu o controle e fraturou a mão. Alegar que a equipe não tem pilotos adequados e que é a primeira temporada de Alex Márquez na classe principal é um contrassenso, Alex superou Brad Binder no mundial da Moto2 de 2019 e o sul-africano já venceu esta temporada. O irmão de Marc é um piloto de qualidade inquestionável, tem dois títulos mundiais (Moto3 em 2014 & Moto2 em 2019) e acumula 12 vitórias, 38 pódios e 15 poles em 143 participações em todas as classes da MotoGP. O piloto que assumiu a vaga de Marc Márquez enquanto o atual campeão se recupera da fratura do braço, Stefan Bradl, é o recurso de testes da equipe e provavelmente a pessoa que tenha mais familiaridade com equipamento. Bradl tem no histórico 1 mundial da Moto2, 7 vitórias, 19 pódios e 8 poles em 188 participações, contando todas as categorias.



Stefan Bradley na RC213V 2020

 

Outro indicativo que o modelo 2020 tem algum problema de origem é o fato de que o piloto da independente LCR, que disputa com um modelo RC231V antigo, o equipamento que Marc Márquez utilizou em 2019, obtém sistematicamente melhores resultados que os representantes da equipe oficial. Takaaki Nakagami tem um currículo muito inferior a Alex e Stefan, nunca venceu um mundial e tem 2 vitórias, 14 pódios e 5 poles, todos os resultados obtidos na Moto2. O japonês disputa o mundial desde 2007 (125cc) e foi promovido para a principal categoria em 2018, até os dias atuais a sua melhor colocação nos mundiais aconteceu em 2017, 7º classificado na Moto2.

A ausência de Marc tem sido a principal desculpa para mascarar o insucesso da Honda nesta temporada. Os registros de 7 etapas seguidas sem estar presente uma única vez no pódio e a ocorrência cada vez mais provável de um ano inteiro sem estar entre os três primeiros dos GPs não é consistente com a história da marca japonesa, agravado pelo desempenho recente da Yamaha e Suzuki, suas concorrentes diretas no mercado nipônico.

Barcelona 2020 - Primeiro pódio na temporada para Alex Rins

 

Condensar toda a temporada em poucos meses trouxe alguns problemas para a fornecedora de pneus. Com o GP da Catalunha agendado para uma época diferente do habitual (em junho) e programado para o final de setembro, a Michelin foi forçada a utilizar dados meteorológicos históricos para a área de Barcelona, para fazer a seleção adequada de compostos para os pneus. Dados anteriores sugeriam uma temperatura ambiente média de 27° C, semelhante ao esperado para junho, porém o fim de semana foi muito mais frio e com mais vento que o previsto, com uma temperatura ambiente de apenas 17° C e temperatura da pista de 20° C. Somente para efeitos de comparação, na corrida de Andaluzia em Jerez de julho a temperatura de pista foi de 59° C.

Como resultado prático, para correr na superfície fria e escorregadia da pista da Catalunha, todos os 22 pilotos selecionaram para a corrida o pneu traseiro macio. 17 pilotos também optaram pela frente macia, enquanto os outros cinco escolheram o médio. Ninguém optou pelo composto Hard.

Apesar do componente macio na frente, muitos pilotos tiveram problemas de aquecimento no lado esquerdo do composto, que é menos utilizado, não atingia a temperatura ideal. Quatro pilotos caíram após perderem a frente, a maioria, entretanto, conseguiu se adaptar e o tempo de vitória de Fabio Quartararo foi apenas dois segundos mais lento que Marc Márquez em 2019. A melhor volta do francês foi mais rápida que Márquez no ano passado.

A Michelin observou os dados históricos e escolheu uma gama de compostos adequada para um clima mais quente. Infelizmente as temperaturas foram muito menores que o esperado e dificultou aos pilotos obter o calor adequado para utilizar a maior aderência da pista.

O próximo Grande Prêmio da França, circuito de Le Mans, também está previsto para ser frio, a data tradicional do evento é maio, o que significa que a seleção de pneus da Michelin deve ser adequada a essas condições

 




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Johann Zarco tirou Dovizioso da prova na Catalunha

 

Com 8 etapas concluídas e faltando 6 provas, o campeonato começa a apresentar candidatos ao título. Até o meio da temporada, quatro pilotos estavam separados por apenas 4 pontos. Andrea Dovizioso que liderava a contagem antes de Barcelona foi atropelado por Johann Zarco e ficou estacionado, Fábio Quartararo obteve a sua 3ª vitória e retomou a liderança, Maverick Vinales viu sua pole na prova transformar-se em uma decepcionante 9ª colocação e Joan Mir com uma surpreendente Suzuki conquistou uma 2ª colocação que, apesar de não pontuar em duas provas (abertura em Jerez e na República Checa), em todas as outras conquistou pontos expressivos e apenas 8 o separam do líder.Fábio Quartararo conquistou a 3ª vitória na temporada

Terceira vitória de Fabio Quartararo em 2020


O GP da Catalunha apresentou um inédito duplo pódio da Suzuki (Mir e Rins) e comprovou as suspeitas que o novo componente traseiro da Michelin desequilibrou a disputa em favor dos motores com cilindros em linha (Yamaha e Suzuki). As motos V4 ainda não descobriram como obter mais rendimento com o maior grip do novo composto. A enorme reta do circuito de Barcelona não foi suficiente para a maior velocidade final dos V4 impor sua superioridade.