Largada
do GP de Misano 2020
Para caracterizar um campeonato como mundial a abrangência geográfica é tão fundamental quanto a diversidade dos concorrentes. Protagonista em 2020, o Corona Vírus criou um contexto totalmente diferente para a temporada, alterando as estruturas da MotoGP desde as limitações geográficas impostas por barreiras sanitárias até a restrição de espectadores nos circuitos. O circo itinerante, que leva o espetáculo aos quatro cantos do mundo, este ano está restrito às fronteiras da Europa. Os 16 países que hospedaram GPs em 2019 foram limitados a 6 este ano, metade (7) das provas na Espanha. GPs icônicos como TT Assen e Mugello não constam da programação. Um circuito que não recebia provas da MotoGP, o Autódromo Internacional do Algarve (Portimão) deve fechar a temporada.
Valentino
Rossi em Misano 2020
O intervalo entre Jerez e a tripla jornada de Brno e Spielberg foi um
ponto de inflexão para o desempenho das Yamaha, que marcaram o início da
temporada como favoritas ao título. Duas provas com a vitória de Quartararo, 50
pontos conquistados em 50 disputados, o piloto de fábrica Maverick Vinales
obteve dois segundos lugares e Valentino Rossi contribuiu para a primeiro pódio
exclusivo da Yamaha desde 2014.
Entretanto bons resultados não implicam necessariamente em felicidade
geral, a fábrica perdeu três motores no curto espaço de dois fins de semana,
uma falha que pode indicar um problema de controle de qualidade e as válvulas
foram eleitas como vilãs da história. Como os motores estão lacrados para a
temporada, a Yamaha ensaiou um pedido para substituir as válvulas por motivos
de segurança, porém recuou, como havia o risco de serem introduzidos
melhoramentos durante o processo, outros fabricantes exigiram a fiscalização
“in loco” por seus engenheiros. Para evitar expor soluções tecnológicas para a
concorrência, a fábrica resolveu conviver com o problema minimizando os riscos
reduzindo a rotação em, não é informação oficial, 500 RPM. Em outras palavras,
reduzir a potência de propulsores que já não estão entre os melhores.
Queda de Quartararo – Misano 2020
Abstraindo a dupla queda de Quartararo na última prova, a Yamaha ficou
com a vitória (Morbidelli), 4º (Rossi) e 6º (Vinales). As Suzuki de Mir (3º) e
Rins (5º) comprovam que Misano privilegia motores com cilindros em linha, a
exceção que confirma a regra foi a Ducati V4 de Peco Bagnaia, 2º colocado. No
mesmo circuito em 2019 Márquez venceu, quatro Yamaha ficaram com as colocações
seguintes (na ordem, Quartararo, Vinales, Rossi & Morbidelli). Estes
resultados podem servir de estímulo para a prova do próximo sinal de semana,
embora na presente temporada todas as bolas de cristal estão apresentando
defeitos
Ducati
de Peco Bagnaia
Um dos competidores que pode ameaçar as Yamaha é a Ducati, o circuito de Misano é uma das suas pistas de teste oficiais. Duas Ducati estiveram no pódio (Petrucci & Dovizioso) em 2017, Dovizioso venceu em 2018 e no ano passado as Yamaha compartilharam o pódio com Márquez. O piloto italiano lidera o mundial e ainda não está confortável com a construção do pneu o pneu traseiro desde ano. Seu maior problema é a entrada de curvas, crucial em Misano, com uma série de pontos onde os pilotos acionam os freios com a moto inclinada. Dovizioso está seis pontos na frente de Quartararo, a corrida seguinte é em Barcelona, onde as Ducati podem usar sua maior potência, depois Le Mans, onde esteve no pódio em 2019. Ele pode encaminhar uma base sólida para o terço final do campeonato.
O benefício que a KTM tinha de haver realizado testes na pista antes da
prova de domingo passado não foi representativo. As duas máquinas da equipe
oficial (Pol Espargaro e Brad Binder) e as da independente Tech3 (Miguel
Oliveira e Iker Lecuona) não conseguiram bons resultados. A qualificação que a
mídia estava fazendo que a KRTM RC16 era a melhor moto do grid está em sob
suspeita. Não há dúvidas que tanto Pol como Brad e Miguel ainda podem vencer
nesta temporada, a questão é se tem folego para ameaçar os líderes atuais.
Suzuki de Joan Mir
Uma grata surpresa tem sido a Suzuki GSX-RR, parece ter alguns pontos
fortes sérios sem nenhuma fraqueza óbvia: é ágil, veloz nas curvas como se
espera de uma moto com cilindros em linha. Tem agilidade incomparável, uma capacidade
surpreendente em curvas e ainda assim não perde muito em velocidade final
comparada com as Ducati e Honda. Acelera, freia, gira e desenvolve bem em linha
reta. Joan Mir e Alex Rins tem, ambos, 2 desistências em 6 provas, ambos com
desempenho equivalente, embora Mir tenha 20 pontos a mais na contagem geral.
Talvez a fábrica pudesse aparecer mais se tivesse uma equipe satélite e tem
todos os motivos para esperar resultados fortes nas próximas corridas. Joan Mir
esteve no pódio na última prova, o equipamento Suzuki evoluiu muito desde 2019.
O bom desempenho em Misano pode se repetir em Barcelona, a moto responde com o
equilíbrio nos itens de velocidade de curva e aceleração.
A equipe mais bem-sucedida de toda a MotoGP está atravessando um período
difícil, pagando um preço alto por ser apostado suas fichas em um exército de
um homem só. A RC213V é um equipamento excelente quando pilotado por Marc
Márquez, forte nas mãos de Cal Crutchlow e complicado para qualquer outro
piloto. Os resultados obtidos pela constituição atual da equipe oficial, Alex
Márquez & Stefan Bradley são indignos de uma representação Honda. Marc e
Cal afastados por problemas médicos deixaram toda a responsabilidade nas mãos
de Takaaki Nakagami, que pilota um equipamento 2019, como resultado a Honda é a
quinta colocada no campeonato de fabricantes, na frente apenas da Aprilia.
Aprilia de Aleix Espargaro
A RS-GP de 2020 é um equipamento melhor que a versão 2019, infelizmente para Aleix Espargaro, não é o suficiente para que ele seja verdadeiramente competitivo. A moto ainda não tem potência e precisa evoluir muito, como o motor deste ano não vai ser mudado para 2021, não tem como prever um futuro melhor para a equipe.
A evolução dos motores de 2 para 4 tempos foi caracterizada por mais que
uma alteração técnica, houve uma mudança estrutural nas equipes. Seguindo o
exemplo da Fórmula 1 onde a genialidade dos que o Comendador Ferrari chamava de
garagistas, que desenvolviam o carro como um todo, a MotoGP substituiu o
talento dos engenheiros-chefe por um conjunto de especialistas, cada qual
responsável por sua área de excelência. O desempenho final do equipamento
depende de decisões coletivas que envolvem o engenheiro de suspenção,
administrador de telemetria, gestor do controle de software, especialista de
motores e encarregado de estratégias, além dos técnicos dos fornecedores de
freios e pneus, além obviamente do piloto. Não existe mais a figura do chefe de
equipe plenipotenciário, a harmonia de esforços é que determina a
competitividade do protótipo. O processo de um indivíduo cedendo lugar a um
conjunto de especialistas foi necessário na medida que regulamentos e motos
ficaram cada vez mais complexos. Infelizmente o grupo de pessoas
imprescindíveis está sendo reduzido em um mundial onde relações públicas e
promoção de marcas parecem mais importantes que pilotos e motocicletas.
Duas observações:
Stefan Bradl testou um capacete equipado com rádio em Misano. Esta
inovação atenta contra um dos pilares da MotoGP, uma competição entre pilotos e
equipamentos sem interferências externas. Todos lembram da pressão que a Ducati
fez sobre Jorge Lorenzo na prova final de 2018 quando queriam que ele cedesse a
posição para seu colega de equipe (Suggested Mapping: Mapping 8). A MotoGP corre
o risco de que, como na Fórmula 1, vitórias sejam definidas por contratos entre
executivos em escritórios. Hoje as comunicações e orientações entre pilotos e
pessoal de retaguarda são unidirecionais, via painéis no muro do Pitlane ou
curtas mensagens no dashboard. Com o equilíbrio sútil de uma moto em alta
velocidade, qualquer desatenção do piloto pode causar acidentes.
O capacete de Franco Morbidelli era o mais próximo que o Brasil chegou
da MotoGP desde que Alex Barros saiu da categoria. As cores da bandeira
brasileira dividiam espaço com a bandeira italiana. Em sua primeira vitória na
classe principal Morbidelli fez no capacete uma homenagem a seu mentor,
Valentino Rossi. O Brasil, mesmo indiretamente, perdeu a oportunidade de estar
no degrau mais alto do pódio.
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