segunda-feira, 29 de junho de 2020

MotoGP – Wet race







O GP da Fórmula 1 no circuito do Estoril em 1985 foi disputado abaixo de mau tempo. Desde aquela ocasião as casas de apostas de Londres passaram a adotar como regra “devolver” as apostas em Ayrton Senna quando a previsão do tempo indicava chuva para o horário da prova. Devolver significava pagar £1,01 por cada libra apostada, era o reconhecimento formal da capacidade do piloto em controlar o equipamento na chuva. Onze anos depois, em 1996,
Damon Hill e Jacques Villeneuve dominavam a F1 com os Williams Renault, os melhores carros das pistas. Os F310 da Ferrari, apelidados de “banheirão”, em condições normais não eram páreo para os FW18 da equipe britânica. Então aconteceu o GP da Espanha, sétima corrida da temporada, com a pista em péssimas condições. O clima chuvoso nivelou os carros e o talento de Michael Schumacher fez a diferença. Em pistas molhadas vale a capacidade dos pilotos.



Os exemplos citados foram portados da F1, porém podem ser aplicados se nenhuma chance de erro na MotoGP. O clima hostil separa os verdadeiros pilotos dos bons condutores.



Para quem costuma imaginar que uma etapa da MotoGP (inclui Moto2 & Moto3) implica em pouco mais de algumas horas confortavelmente sentados em frente a uma TV, não imagina o trabalho insano que é preparar um par de protótipos para um fim de semana. As condições em que acontece um evento nunca são iguais.



Mesmo quando o circuito hospeda um GP em anos seguidos, as condições da pista nunca se repetem, como pode ser observado na temporada passada no Circuito da Américas em Austin, onde o asfalto deteriorou, ou no desastre em Silverstone em 2018.



Todos os aspectos da pista e dos equipamentos são analisados, permitindo que os mecânicos configurem as motos de acordo com as condições do piso e preferências de cada piloto. O clima, mesmo com todo o avanço científico na análise das previsões, ainda pode reservar surpresas inesperadas.






Se existe a previsão de chuva para o fim de semana as equipes configuram dois equipamentos, um para piso molhado e um para piso seco. Planejar detalhes como a alocação de pneus é o mais fácil. Porém, mesmo que os fatores climáticos indiquem com razoável certeza como o tempo deve se comportar, a imprevisibilidade sempre existe. Em Phillip Island, por exemplo, pela proximidade do oceano o clima muda de forma imprevisível em pouco mais de 15 minutos. Esta inconstância também existe em Silverstone e em outros circuitos do calendário. Em caso de mau tempo repentino, as equipes têm competência para ajustar uma moto para o seco ou molhado em menos de 5 minutos.



O roteiro para reconfigurar o equipamento inclui trocar pneus, freios, amortecedores, molas, reequilibrar a moto, adequar o software eletrônico e uma pequena alteração na carenagem na parte inferior, removendo receptores que servem o para evitar derramamento de óleo em caso de falha técnica, para não acumular água.



Embora as mudanças óbvias enderecem pneus e freios, as outras que não comentadas com frequência são igualmente importantes. A suspensão e o amortecedor na frente são trocados. A troca da parte traseira é mais complexa, requer muito mais trabalho e só é possível no curto espaço de tempo se a equipe já tiver um sistema traseiro todo configurado e pronto para ser instalado. Isto só acontece com os equipamentos das equipes oficiais de fábrica (orçamentos mais robustos). O protótipo exige um reequilíbrio, um processo delicado que é realizado por um profissional qualificado, essencial para um bom desempenho na pista. Um especialista em eletrônica atualiza os parâmetros da ECU e IMU (o núcleo do software é padronizado).



Suspensão dianteira



Até recentemente, chuva indicava o retorno para os discos de freios de aço inoxidável, porque a eficiência dos freios de fibra de carbono requer uma janela de temperatura muito estreita. Esta limitação foi removida graças aos avanços tecnológicos realizados pela Brembo, fornecedora de todos os fabricantes.  Os pilotos podem optar manter os discos de carbono, mas as pastilhas devem ser trocadas por peças mais eficientes de acordo com as condições do tempo. Caso a equipe decida reverter para os discos de aço, requer uma mudança completa do sistema, incluindo as pinças e drenagem do sistema hidráulico.





Os pneus para piso molhado têm o mesmo processo de fabricação dos pneus slick (para pista seca). Uma seleção de compostos é desenvolvida pela Michelin considerando as condições para melhor desempenho em pistas secas ou molhadas, podem ser simétricos ou assimétricos dependendo do layout do circuito. As opções para piso molhado normalmente são variações de pneus macios. Os compostos para tempo úmido normalmente têm ranhuras porque, embora a superfície de contato com a pista seja mínima (menor que um cartão de crédito), pode ocorrer o fenômeno de aquaplanagem.

Muitas outras coisas podem acontecer quando autorizada uma largada com chuva. Atrasos, a corrida pode ser interrompida, reiniciada ou até ser encurtada. Ouve até um caso, GP da Inglaterra de 2018, que foi cancelado por absoluta impraticabilidade da pista. Quando isto acontece todos perdem, pilotos que não podem competir, equipes que investiram em transporte e infraestrutura, patrocinadores que não obtém retorno publicitário e equipes de TV que reservaram canais internacionais.



Quando uma prova é declarada pelo diretor como pista molhada (Wet Race), usualmente permite a troca de equipamento porque o desgaste dos componentes tende a ser é mais acentuado. O público e os pilotos são informados por bandeiras brancas nos postos dos comissários de pista. Os pilotos são então autorizados para entrar nos boxes e trocar de equipamento, o mesmo acontece caso tenham iniciado a corrida no molhado e a pista secar ou vice versa. Este procedimento é chamado de Flag-to-Flag.






A condição de pista molhada é indicada claramente pela direção da prova por uma placa classificando a prova de “Wet Race”. Neste caso todos iniciam com configuração para pista molhada.



Diversas provas já foram decididas na troca de equipamentos. O GP de Brno em 2017 foi declarado como Wet Race e todos os pilotos começaram com pneus de chuva. A pista secou rapidamente e os pilotos começaram a entrar no pit para trocar de moto. A Honda havia preparado para Márquez um protótipo para molhado e um segundo para tempo seco, a Ducati teve de se manter seus pilotos na pista enquanto o box readequava a sua segunda moto. Márquez venceu a prova.



Pode acontecer que uma prova declarada para pista seca e, depois de iniciada, começar a chover. Neste caso a direção de prova mostra a bandeira branca permitindo que os boxes reabram para a troca de motos.



Uma prova pode ser retardada se houver uma indicação clara de mudança rápida do tempo. Neste caso os pilotos permanecem nos boxes para os ajustes necessários, a formação do grid e a volta de apresentação são mantidas. Caso um equipamento não consiga ser preparado a tempo, o condutor deve permanecer no box e largar do pit lane depois que o último competidor passar.



O Regulamento Geral da competição cobre qualquer omissão com a seguinte cláusula:

"As condições climáticas e sua gravidade nunca podem ser previstas com precisão de modo a cobrir todas as possíveis ocorrências. A Direção de Corrida pode reagir a situações específicas emitindo instruções diferentes. Todas as instruções serão exibidas nos monitores de cronometragem e as equipes serão informadas pela equipe do IRTA"





O texto dessa regra permite que a direção da corrida tome qualquer decisão necessária para garantir a segurança dos pilotos e espectadores. Foi o que aconteceu em Rio Hondo, 2018. Todos os pilotos voltaram aos boxes depois da volta de apresentação, com exceção de Jack Miller, que ficou isolado no grid. Como era impossível garantir a segurança de 22 pilotos largando do pit lane, a direção da prova optou por um tipo de distanciamento social, Miller largou com uma vantagem de 50m.



Se durante uma prova o tempo tornar impraticável a sua continuidade, uma bandeira vermelha pode ser acionada. Os competidores devem voltar aos boxes e, se as condições melhorarem, um procedimento de largada rápida (sem volta de aquecimento) pode ser realizado. Pode acontecer algum imprevisto que provoque a entrada do safety car, a MotoGP utiliza dois veículos, um para atender a ocorrência e um segundo para manter os pilotos em uma velocidade segura. Há também a possibilidade de a corrida ser encurtada para apenas dois terços de seu comprimento original. Quando a bandeira vermelha é acionada e a prova não puder ser reiniciada, se mais de três quartos da corrida tiverem sido disputados a contagem de pontos é integral.



Em raras circunstâncias, o evento é cancelado. Aconteceu na etapa da Inglaterra 2018, chegou a ser aventada a possibilidade de postergar o evento pata a segunda feira, mas não foi possível.

domingo, 28 de junho de 2020

IOMTT & MotoGP - Quais as diferenças?




MotoGP & Isle of Man



O Isle of Man TT começou a ser disputado em 1907, 42 anos antes do Mundial de Motociclismo ser criado. Setenta anos depois a MotoGP é a principal categoria de corridas de motos e ostenta a característica de evento esportivo (de duas rodas) maior cobertura de TV do mundo. Os avanços tecnológicos, expansão e capilaridade da Internet, e o desenvolvimento de novas técnicas de comunicação proporcionaram muitas opções alternativas, outros eventos de motovelocidade estão alcançando novos os patamares de popularidade. Os que mais se beneficiaram das novas facilidades para acompanhar as disputas foram o mundial de Superbikes e o Troféu Turístico Ilha de Man, conhecido pelo acrônimo de IOMTT ou resumidamente TT.



A Superbike é fundamentalmente uma transposição de equipamentos das linhas de montagem para as pistas. O regulamento exige que as máquinas participantes sejam modelos que estejam ao alcance do público consumidor, com um número mínimo de unidades comercializadas. Poucas alterações são permitidas, entretanto quando uma fábrica decide participar da competição, a moto é transformada utilizando recursos do estado da arte da tecnologia.



As modificações preservam o projeto original e visam agregar às motos características necessárias para melhorar segurança e desempenho. O sistema de exaustão, por exemplo, é modificado para utilizar melhor o fluxo interno de ar, filtros e catalizadores são removidos porque limitam o desempenho e motos de competição não são obrigadas a aderir aos regulamentos de controle de emissões das entidades de proteção ambiental.  Os motores das Superbikes mais potentes operam próximos dos 220 hp, uma melhora sensível quando comparado com os 160 hp das motos produzidas para o mercado.



A Ilha de Man é formalmente uma dependência da Coroa Britânica situada no mar da Irlanda e tem autonomia administrativa e parlamento (o mais antigo do mundo) próprio. Com 572 km2 e topologia razoavelmente plana, seu ponto mais elevado é o monte Snaefell, localizado ao norte, com 621 m de altura. A população local é de pouco mais de 80 mil habitantes, a ilha não é um país soberano, não participa da Comunidade Britânica e antes do Brexit não tinha representação própria na União Europeia. Uma de suas características únicas é que não existe, na legislação local, limite para velocidade nos 1.107 km de rodovias públicas, que são totalmente pavimentadas e muito bem conservadas.



Uma viagem para a Ilha para assistir a prova é uma experiência de vida única para quem aprecia aventura e velocidade em duas rodas. Os relatos dos que já viveram esta experiência são incríveis e incluem depoimentos apaixonados de que seus autores nunca vivenciaram nada semelhante. A verdade é que existe uma hype (promoção extrema de uma ideia) que a reputação de evento esportivo mais perigoso do mundo é merecida.



A MotoGP costuma ter 18 ou 19 etapas por ano em circuitos distribuídos nos quatro cantos do planeta. Além da ampla cobertura na TV, a oportunidade de assistir ao vivo não é de todo descartada, aqui no Brasil, por exemplo, existe alguma facilidade em acompanhar “in loco” a etapa de Rio Hondo na Argentina.



Autódromo de Rio Hondo - Argentina



O IOMTT é realizado apenas uma vez por ano entre maio e junho em um dos lugares mais isolados e acidentados do Reino Unido. O acesso à ilha é realizado exclusivamente por balsa ou via aérea. A Ilha de Man está localizada entre a Grã-Bretanha e a Irlanda, a legislação local facilita a aplicação de capital estrangeiro com alíquotas de tributação muito baixas ou nulas, o imposto corporativo é de 0% para quase todos os tipos de negócios. Existem muitas empresas registradas no local, que é considerado como um refúgio fiscal, são as chamadas “offshore” que, juntamente com o turismo, são os principais pilares da economia. Uma curiosidade sobre o local é que os integrantes da banda Bee Gees, os irmãos Maurice, Robin e Barry Gibb, nasceram na Ilha e migraram para a Austrália em 1958.



Um evento da MotoGP tem a duração de um fim de semana, sexta-feira para ambientação, sábado para a classificação da ordem de largada e domingo para as provas. O IOMTT se estende por duas semanas, uma de treinos/qualificações seguida de uma semana de classificações/provas, separadas por um domingo em que a pista é liberada para curiosos.



O mundialmente respeitado Guia Oxford, publicado pela Oxford University, descreve o evento da seguinte forma: "O circuito de automobilismo mais antigo ainda em uso é o Snaefell Mountain Course, local onde são realizadas as provas do Troféu Turístico da Ilha de Man. Começando na cidade de Douglas, na costa sudeste, o curso faz uma ampla varredura para oeste e norte para entrar na cidade de Ramsey na costa nordeste e voltar ao ponto de partida. Cada volta tem a extensão de 60,7 km e inclui 256 curvas. Parte do nível do mar para uma altitude de mais de 396 m. Este circuito é o epítome do percurso rodoviário natural, todas as estradas utilizadas são rodovias públicas comuns, fechadas para as corridas e sessões de treinos."



O IOMTT é um evento independente e conta com a participação de diversos competidores de outras modalidades como da Superbike, dos campeonatos britânicos, pilotos da American Motorcycle Association (AMA) ou das provas de Road Racing. Qualquer pessoa que tenha uma licença de piloto de competição expedida por uma entidade britânica, com mais de um ano de validade, pode se inscrever na disputa. Muitos consideram que só o fato de participar de uma prova já vale como um grande triunfo.



Entre 1949 e 1976 a IOMTT foi a etapa britânica da MotoGP. Entretanto devido às características diferenciadas da pista, um boicote foi liderado por Giacomo Agostini em 1972 e ganhou musculatura nos anos seguintes, o evento foi gradualmente esvaziado (como prova válida pelo mundial da MotoGP) até 1976, no ano seguinte a corrida foi retirada do calendário e substituída pelo GP da Inglaterra em Silverstone. O ocaso da Ilha de Man no mundial de MotoGP não foi devido a questões comerciais, foi fundamentalmente em relação à segurança. Nenhuma pista é mais desafiadora que os 60,7 km do circuito, que mescla trechos em estradas montanhosas com enormes retas e sequências de curvas onde os competidores alcançam velocidades de mais de 320 km/h. Inclui trechos urbanos sem nenhuma área de escape, cercados de muros de pedra, espectadores próximos, guias de calçada, postes de energia elétrica, tampas de bueiros e desníveis no asfalto.  Além do mais é impossível garantir o socorro imediato para algum piloto acidentado em um circuito tão longo. A extensão da pista também impossibilita uma cobertura abrangente pela televisão. O IOMTT é uma competição voluntária, não faz parte de nenhum campeonato anual com contagem de pontos como a MotoGP.




IOMTT – Acidente com Guy Martin



O histórico da IOMTT contempla desde o seu início, em 1907, perto de 250 fatalidades durante treinos, qualificação ou corridas. Em 2016 acidentes causaram o óbito de 5 pilotos, porém o recorde sinistro pertence à edição de 1970, com 6 acidentes fatais durante o evento. Estes números incluem pilotos, espectadores e comissários de pista. O alto número de óbitos é devido ao uso de vias públicas entre árvores, calçadas, postes de iluminação, prédios, placas de rua, paredes de tijolos (muitas com mais de 100 anos) e muros de pedra que cercam trechos do percurso.



A MotoGP viu apenas 103 mortes desde sua criação, a frequência destes eventos caiu drasticamente nas últimas décadas, apenas 3 nos últimos dez anos. Uma morte em competição é uma raridade. O mesmo não pode ser dito para o IOMTT, o risco e a letalidade estão no DNA do evento.



O recorde oficial de velocidade na MotoGP registrado por sensores (dados mais específicos são considerados informação reservada pela Brembo, empresa que fornece sistemas de freios para todas as equipes) foi estabelecido em 2018, pela Ducati GP18 de Andrea Dovizioso, que alcançou 356,5 km/h no circuito de Mugello.



A ilha de Man tem particularidades próprias, especialmente grandes retas em declive. Em um ensaio realizado em 2015 um piloto de testes da Kawasaki, James Hillier, estabeleceu o recorde de velocidade pelas estradas da ilha com uma Ninja H2R, alcançou a impressionante marca de 331 km/h. A H2R estava equipada com um motor 998cc, quatro cilindros, dupla injeção de combustível e transmissão de seis marchas. Com a dificuldade de estabelecer qual o trecho dos 60,7 km que possibilita a maior velocidade, na edição de 2018 Peter Hickman, no comando de uma BMW S1000RR, estabeleceu o recorde por volta no TT da Ilha de Man, com uma velocidade média de 217.998 km/h. Para efeitos de comparação, na mesma prova onde Dovizioso marcou o recorde absoluto de velocidade da MotoGP, a melhor volta foi obtida por Valentino Rossi com uma Yamaha M1, média de 177,7 km/h. Óbvio que esta vantagem do IOMTT tem que ser creditada ao layout do circuito, composto de vias de tráfego comum sem alternância de curvas de alta e baixa velocidade como nas pistas onde se realizam provas da MotoGP.





MotoGP em Mugello - Itália



Os mais de 60 km de cada volta não podem ser comparados com os circuitos mais curtos da MotoGP, cuja pista mais longa é a de Sepang, na Malásia, com um comprimento de 5,47 km e cuja volta leva menos de 2 minutos para ser concluída.



A MotoGP contempla provas por volta de 45 minutos, os eventos mais curtos da IOMTT são de 4 voltas no circuito e realizados em pouco mais de uma hora. Os eventos com equipamentos de maior potência são realizados em 6 voltas, perto de 90 minutos, o dobro da MotoGP, em um circuito bem mais desgastante. O IOMTT exige um excelente preparo físico e muita concentração durante um longo período em um ambiente muito inseguro.



Existem diferenças fundamentais entre as duas competições. Na Ilha de Man um corredor pode competir em mais de uma categoria, não é o caso da MotoGP onde os pilotos são contratados para classes específicas como MotoGP, Moto2 e Moto3, e não podem durante um evento migrar livremente entre as categorias. O ápice da carreira de um condutor no mundial da FIM é ascender a uma equipe de fábrica da MotoGP, normalmente o caminho passa pelas categorias de acesso. O número de participantes é muito limitado e em casos muito raros os pilotos que se sobressaem em campeonatos regionais conseguem vaga direta na categoria principal.



A ilha de Man é uma competição voluntária, não depende de vaga em equipes, como diz o verso inesquecível de Geraldo Vandré, “Quem sabe faz a hora, não espera acontecer”.



A rigor, MotoGP e IOMTT tem em comum a velocidade sobre duas rodas. A MotoGP é uma competição clássica, onde todos disputam juntos e quando encerra todos sabem quem é o vencedor. A IOMTT é contra o relógio, os pilotos largam com intervalos de tempo para impedir que hajam tumultos nas primeiras curvas. O tempo de prova de cada piloto é contabilizado e, no final do evento, quem conseguir a melhor marca é declarado vencedor.



Em termos de esporte motorizado, ainda há uma indefinição sobre qual o evento digno de ostentar a qualificação de maior espetáculo da terra. Considerando que os candidatos devem contemplar tradição, cobertura jornalística e integração com a comunidade, o Troféu Turístico Ilha de Man disputa este título com as 500 Milhas de Indianápolis e as 24 Horas de Le Mans.



Retas, trechos em cidades e Side Cars



Revisão: Renata Veríssimo

F1 – Como será o amanhã


O “cogumelo” de turbulência gerado em uma disputa



Um fato intrigante da F1 é quando um piloto persegue um competidor com velocidade visivelmente maior, entretanto quando se aproxima do concorrente tem uma dificuldade muito grande para conseguir uma ultrapassagem. Acontece porque o carro da frente cria uma espécie de cogumelo de turbulência prejudicando o “downforce” do veículo de trás, ou seja, tem a tração reduzida.



O efeito que aparece quando os monopostos andam muito juntos é resultado do ar quente e turbulento que se forma por conta do carro à frente. Os pneus criam uma enorme bagunça aerodinâmica, geram uma esteira desagradável de ar caótico de baixa energia e, se atuar sobre o próprio carro, perde a capacidade de gerar “downforce". Então, como explica James Allison, técnico da Mercedes, desde 2009 estão desenvolvendo técnicas para se livrarem do fluxo de ar criado por volumes em movimento e jogá-lo o mais longe possível. Os principais elementos que auxiliam neste processo são a asa dianteira, os dutos de freio dianteiros e as “bargeboards”, peças de carroçaria que cumprem exclusivamente funções aerodinâmicas. Este fluxo de ar tem que ser deslocado para algum lugar, como ele é direcionado para longe do próprio monoposto, acaba sobrando para o carro de trás e dificulta as ultrapassagens.



Quando o ar flui sobre um dispositivo aerodinâmico em movimento, perde energia e desacelera. Esse fluxo de baixa velocidade leva à turbulência e, quando em seu caminho ela passa por baixo do carro e é aquecido, cria um pandemônio que o carro de trás tem que administrar.



Em uma reta, o efeito pode resultar em uma parte da esteira fluindo ao redor do carro em perseguição, como o carro da frente efetivamente está investindo potência para vencer a resistência do ar, o de trás encontra menor resistência, menos arrasto, aumenta a velocidade e pode capitalizar este impulso adicional com uma ultrapassagem, também conhecida no jargão da F1 como “reboque”.


Turbulência em linha reta



Os problemas vêm nas curvas, onde esse “ar sujo” não está alinhado com o veículo de trás, desestabilizando o seu desempenho aerodinâmico e tornando quase impossível realizar uma manobra com segurança para ultrapassar. Uma regra prática, que não tem como ser comprovada porque varia de acordo com o ângulo entre os dois veículos, indica que quando o carro que segue está a um comprimento do carro da frente, perde aproximadamente metade de seu “downforce" (leia-se tração).



Para endereçar o problema de ultrapassagem e melhorar o cenário da F1 no futuro, o detentor dos direitos comerciais, Liberty Media, reuniu um grupo de engenheiros liderado por Pat Symonds e Ross Brawn. Este grupo realizou diversos estudos aerodinâmicos, utilizando a Dinâmica de Fluidos computacionais (CFD), bem como a análise de diferentes conceitos para 2021. Os modelos CAD eram regularmente enviados às equipes, nove das quais contribuíram para a pesquisa sugerindo soluções e enviando simulações em seus computadores. A F1 com base em seus próprios resultados e nas contribuições dos fabricantes, aconselhou a FIA sobre como escrever os regulamentos. Este trabalho resultou na promulgação das regras em outubro de 2019, desde então o papel do grupo criado para determinar as regulamentações aerodinâmicas é tentar encontrar omissões ou falhas para evitar interpretações criativas.



O objetivo para as regulamentações aerodinâmicas de 2021 é não apenas reduzir o volume do ar turbulento sobre o próprio carro, mas ejetá-lo para cima, para não prejudicar o veículo de trás, desta forma, os carros devem ser capazes de acompanhar uns aos outros de perto e possibilitar ultrapassagem em curvas.



A pesquisa aerodinâmica realizada na F1 se concentrou fundamentalmente na redução da turbulência para melhorar o desempenho dos carros de trás, mas buscou também simplificar o design dos carros, reduzindo sensibilidades em algumas áreas, levando a diferenciais de desempenho mais baixos, Como resultado, espera que a diferença entre os carros mais rápidos e mais lentos seja menor para 2021.

Para atender a estes objetivos, a F1 introduziu uma série de mudanças, incluindo:

·      Asa dianteira mais simples – com o objetivo de criar vórtices mais fracos para restringir a capacidade das equipes de controlar a turbulência gerada pelas rodas dianteiras;

·      Ausência de “bargeboards”, peças de carroçaria que cumprem exclusivamente funções aerodinâmicas;

·      Um assoalho desenhado para permitir o efeito-solo, com um difusor longo começando na frente dos sidedpods (estruturas aerodinâmicas externas de cada lado do carro para coletar a entrada de ar para a refrigeração de componentes mecânicos) e que se estende até a parte de trás do carro;

·      Alguns componentes serão restritos (ainda não padronizados) em áreas de grande sensibilidade para evitar equipes de obter muita vantagem;

·      Pneus e rodas de 18 polegadas;

·      Suspensão dianteira e traseira reprojetadas para permitir rodas de 18 polegadas.





O “novo” Fórmula1





O resultado esperado é que o carro de trás tenha, ao ficar próximo, pelo menos 86% do “downforce” do carro da frente. Com o tempo, e com os melhoramentos próprios das equipes, este número pode ficar até maior A simulações por computador mostram que os carros não terão muitas dificuldades em andar juntos, o que significa que o perseguidor terá melhor condições de atacar quem estiver na frente em trechos sinuosos.

Haverá um efeito colateral nas retas. As simulações indicam que a turbulência terá a forma de uma lágrima, implica que carro que segue não terá uma redução de arrasto significativa, o turbilhão não será mais tão eficaz. Por outro lado, se o chamado "cogumelo" está sendo ejetado mais alto, então ainda pode haver uma zona de baixa pressão atrás do carro da frente, por isso que o sistema de redução de arrasto (Drag Reduction System –DRS) permanece para 2021 para compensar a menor eficiência do “reboque”,





UP





É muito improvável que haja modificações expressivas na UP que está em uso. A Fórmula1 sempre foi protagonista em tecnologias de conservação de energia, as unidades de potência são híbridas, um motor de combustão tradicional de 6 cilindros em V (V6), de 1,6 litros com turbocompressor, utiliza os gases do escapamento para comprimir mais ar do ambiente na câmara de combustão, resultando em mais eficiência. A UP (Unidade de Potência) dos F1 também utiliza dois sistemas de recuperação de energia, o MGU-K (Motor Generator Unit – Kinetic), evolução do KERS (Kinetic Energy Recovery System) utilizado há alguns anos, com a finalidade de armazenar e reaproveitar a energia cinética dos freios para gerar maior mais potência. O MGU-H (Motor Generator Unit – Heat) recupera o calor gerado pelo turbo que é transformando em energia elétrica para contribuir com o conjunto.   Alterações nas Unidades de potência tem um custo muito alto para resultados quase inexpressíveis. Talvez adição de maior teor de combustíveis renováveis, mas, não é pode ser considerado um grande salto tecnológico. O Brasil já faz isto desde o início do Proálcool em 1975.



Motor Honda





A unidade de potência para 2021 será praticamente a que está nas pistas este ano, talvez com poucas mudanças nos materiais visando redução de custos, que em última análise, vão causar um ligeiro aumento de peso.



É verdade que o grupo da Liberty começou com planos mais ambiciosos, mas considerando que existe um bilhão de carros movidos a combustível fóssil no planeta e que a situação não vai mudar nos próximos dois anos, a contribuição da F1 seria ínfima.

O combustível para 2021 incluirá o dobro da quantidade de conteúdo renovável, aumenta para 20% e a partir de 2022 há um "roteiro ambicioso" que visa aumentar esse conteúdo renovável para o futuro. A FIA espera passar para algo que se aproxime de um combustível do tipo E20, então muito à frente de onde a indústria rodoviária mundial (exceto no Brasil, que já usa E25).





Suspensão, Rodas e Pneus F1 2021

A mudança para rodas e pneus de 18 polegadas, que foi anunciada no início deste ano, deve ter um enorme impacto nos carros. Não só permite um disco de freio maior, como a suspensão terá que ser completamente redesenhada.



Com um pneu de 18 polegadas existe menos volume de ar, pode haver variações de pressão que modificam o grip. O pneu é muito mais reativo, mais previsível e as equipes precisarão redesenhar a suspensão porque a parede lateral do pneu é muito menor do que agora. Também aumenta o diâmetro externo, então influencia mais a aerodinâmica. A interação entre o freio e a borda é muito importante, não só para a troca de calor, mas também para os fluxos de ar circulam nesta área.



Com as rodas padronizadas, as equipes terão menos oportunidades de explorar o aquecimento do aro para ajudar a gerenciar a temperatura dos pneus.



O tamanho da nova roda requer uma nova suspensão, porém os regulamentos simplificaram o projeto ao máximo. A suspensão hidráulica está proibida. Os sistemas de suspensão dos carros de Fórmula 1, que ajustados às frequências naturais de oscilação dos pneus reduzem (inerters) a carga mecânica na suspensão, também estão banidos. Estes componentes não têm relevância real para a indústria automotiva e utilizam sistemas ultracomplicados. A parte interna da suspensão traseira, molas e amortecedores e componentes cinemáticos também estarão dentro do volume da roda.











F1 2021 Peso e Velocidade

Os regulamentos da F1 2021 especificam que o peso mínimo do carro aumentará de 743Kg para 768Kg. A principal contribuição são as rodas e pneus maiores de 18 polegadas, a unidade de potência, as peças padrão, bem como alguns recursos adicionais de segurança.





Rodas e pneus padronizados em 2021



O pneu provavelmente será ligeiramente mais pesado, pois a maioria do peso de um pneu está dentro da banda de rodagem. A borda de cada pneu poderia ser cerca de 2kg mais pesada, resultando em um adicional de 8kg.

O aumento de peso, juntamente com o novo pacote aerodinâmico e outras mudanças, farão com que os carros de F1 2021 em torno de 3,0 a 3,5 segundos mais lentos de acordo com as previsões atuais. Olhando de outro modo, voltamos às velocidades de 2016, em 2017 houve um grande desenvolvimento de algumas equipes em aerodinâmica com aumento no “downforce”, aconteceu que não houve mais disputas.





Limite orçamentário da F1 2021

A sustentabilidade das equipes e o campeonato como um todo tem sido outro principal objetivo para a F1 em 2021 e levou a regulamentos financeiros drásticos. A maior mudança é o limite orçamentário de US$ 175 milhões (£140 milhões) por temporada. Embora existam várias exclusões dessa soma, o efeito líquido é que as equipes serão restritas a aproximadamente 550 funcionários, que é aproximadamente do tamanho da McLaren, Williams e Renault. Isso pode significar que Mercedes e Ferrari terão que reduzir o pessoal em 40%.







Padronização da F1 2021



Para ajudar as equipes a reduzir seus custos, os componentes agora podem ser classificados em cinco categorias:

·      Componentes de equipe listados (LTC) – componentes exclusivos produzidos por cada equipe;

·      Componentes de Fornecimento Padrão (SSC) – único fornecedor escolhido por meio de processo licitatório. Caso atual de rodas e discos de freio;

·      Componentes de design determinado (PDC) – o projeto é da FIA e as equipes podem produzir;

·      Componentes Transferíveis (TRC) – componentes que podem ser portados de uma equipe para outra como, por exemplo, a transmissão;

·      Componentes de Código Aberto (OSC) – um conjunto de componentes onde as equipes enviam seus projetos para um servidor e uma equipe rival pode fazer um componente com base neste design.

São mudanças significativas, porém é importante que a F1 não perca as suas características próprias. A F1 sempre foi reconhecida como top de tecnologia e é importante que continue sendo. A categoria obrigatoriamente tem que manter o seu DNA.

Segundo alguns dirigentes de equipes muitas pessoas estão interessadas em nossa tecnologia e é por isso que assistem f1.

Embora a licitação para uma transmissão padrão tenha sido descartada por enquanto, a F1 planeja introduzir uma especificação mais restritiva para 2021



O posicionamento da Ferrari sempre foi contra a padronização de componentes. Segundo Matia Binoto, “Como Ferrari, a princípio somos contra padronizações, mas sabemos que precisamos controlar os custos e despesas e, obviamente, há um limite de orçamento, então precisamos encontrar o equilíbrio certo". A padronização só faz sentido se economizar dinheiro e manter o espetáculo, o que ainda não foi provado (em termos, na MotoGP tem dado resultados).



Alguns administradores de equipes apoiam a padronização. Não concordam que o DNA da Fórmula 1 seja apenas desenvolvimento. Todos concordam com algumas assertivas, há que se encontrar uma maneira trabalhar com os custos, pessoas querem ver corridas interessantes, manobras de ultrapassagem. Não se importam com a forma das bordas das rodas ou com os freios. Portanto, se a solução for um maior número possível de peças padronizadas, que seja.

Como o esporte motorizado pode ajudar a combater o COVID-19




Na medida que a pandemia do Corona Vírus continua a assolar o mundo inteiro, o maior problema que os países enfrentam é a inadequação dos seus sistemas de saúde. Apesar de cerca de 80% das pessoas com Covid-19 se recuperarem sem precisar de tratamento hospitalar (informação divulgada pela Organização Mundial de Saúde, que não tem muita credibilidade em função de recomendações desencontradas), uma em cada seis pode desenvolver um caso grave da doença. São nestes casos que o sistema de saúde não está preparado por falta de treinamento e equipamentos para fornecer o tratamento adequado, e resulta em óbitos desnecessários. A contaminação muito rápida criou uma demanda global por equipamentos de proteção individual, kits de testes de Corona Vírus e equipamentos de ventilação, que conduziu à escassez mundial. Na tentativa de combater estas limitações, os governos pediram ajuda a uma ampla gama de indústrias, e muitos atenderam a chamada, incluindo o automobilismo.


Seja um carro de F1 ou um veículo de quilômetro de arrancada, todos os carros de corrida são essencialmente protótipos, compostos por milhares de peças sob medida. Somente quando a necessidade é parafusos, fixadores ou fiação é que existem componentes produzidos em massa e, em alguns casos, até mesmo esses foram especialmente feitos para se adequar a uma aplicação em particular. Então, como essa indústria de prototipagem pode ajudar nesse problema de produção em massa? Resposta: velocidade e otimização.

Umidificadores, componentes essenciais de um ventilador mecânico


A própria natureza das competições fez com que equipes e fornecedores se tornassem especialistas em projetar, construir e testar componentes e carros de corrida em prazos exíguos. As equipes normalmente iniciam o projeto para o próximo ano em junho/julho, e nove meses depois, todas as 14.500 peças que compõem Fórmula 1 estão correndo em volta do Circuito da Catalunha, em Barcelona. É esta resposta rápida que torna o automobilismo uma indústria tão atraente para o Governo trabalhar neste momento de crise.

Além disso, no mundo competitivo das corridas, toda iteração de uma peça em um carro de corrida precisa ser mais leve, mais rígida, mais forte e geral ter melhor desempenho que a anterior. Esse impulso constante de otimização é outro atributo do automobilismo que os governos podem explorar para ajudar a redesenhar as soluções atuais de equipamentos.



Algumas semanas atrás, o governo britânico fez uma chamada para ver quais capacidades e instalações a indústria automobilística tinha que talvez pudessem ajudar a atual escassez de equipamentos hospitalares. Muitas empresas responderam, incluindo os fabricantes da Fórmula 1.



Projeto Pitlane

As sete equipes de F1 sediadas no Reino Unido (Mercedes, Red Bull Racing, McLaren, Renault, Williams, Haas, Racing Point) estão trabalhando em conjunto com a Innovate UK, High Value Manufacturing Catapult team, UCL and University College London Hospital, bem como uma variedade de outras empresas como parte do 'Project Pitlane'. Isso visa combinar os recursos e recursos de todas essas empresas e implantá-las em três fluxos de trabalho:

·         Engenharia reversa dos dispositivos médicos existentes;

·         Apoiar a ampliação da produção de design de ventilador existente como parte do VentorChallengeUK;

·         Projeto rápido e fabricação de protótipos de um novo dispositivo para certificação e produção subsequente.


Projeto de Pesquisa Coordenada (CRP) (várias organizações) fez protótipos de válvulas e componentes de ligação para máscaras respiratórias



O Mercedes HPP (High Pressure Processing) tem trabalhado em conjunto com engenheiros mecânicos da University College London (UCL) e com os médicos da UCL Hospital para desenvolver um auxílio respiratório de pressão positiva contínua das vias aéreas (Continous Positive Airway Presssure - CPAP) que foi aprovado para uso pelo National Health Service (NHS). Em menos de 100 horas, este dispositivo foi projetado para permitir que fosse rapidamente fabricado em milhares de unidades. Atualmente, cem dispositivos foram entregues à UCLH para testes clínicos com o objetivo de lançar esses dispositivos para hospitais em todo o Reino Unido.

Em outros lugares o automobilismo e outras equipes e fornecedores estão fazendo tudo o que podem para ajudar. Empresas de usinagem como a XYZ Machine Tools estão disponibilizando uma grande variedade de suas fábricas, tornos, fábricas de centro e centros de usinagem disponíveis em um empréstimo gratuito para qualquer empresa envolvida na produção de peças para equipamentos médicos de emergência.


Partes que compõem o auxílio respiratório que Mercedes HPP ajudou a desenvolver




Enquanto a CRP está usando sua tecnologia de impressão 3D Sintering de alta velocidade, juntamente com materiais isotrópicos Windform P1 para fabricar protótipos de válvulas de emergência para dispositivos de reanimação e  como componentes de ligação para máscaras respiratórias.

As empresas de simulação também estão ajudando, com muitas oferecendo licenças gratuitas para suas plataformas de software e empresas como a MathWorks lançando modelos gratuitos de pulmões e ventiladores. Estes são apenas alguns exemplos de como a indústria do automobilismo está se unindo para apoiar a luta contra o Corona Vírus e ajudar a salvar vidas.

F1 - 1994, o ano que não deveria ter existido








Ayrton Senna acompanhando a cobertura do acidente de Roland Ratzenberger



Frank Williams foi, na concepção de Enzo Ferrari, um garagista, um construtor de monopostos Fórmula 1 que não produzia seus próprios motores. Comandando a equipe Williams tinha hábitos peculiares, por exemplo, as vitórias nos mundiais nunca eram mérito dos pilotos, seus carros eram os principais protagonistas responsáveis pelos sucessos. A Williams não tinha o hábito de renovar com pilotos campeões, foi assim com Nelson Piquet em 1987, Nigel Mansell em 1992 e repetiu com Alain Prost em 1993. Em 1994 a equipe realizou um sonho antigo e contratou Ayrton Senna. A equipe Williams sempre trabalhou com os melhores técnicos e engenheiros mais criativos, faltava o melhor piloto. Seu carro em 1993 era equipado com o auge da tecnologia em competições, tinha implementado o controle de tração, controle de largada, suspensão ativa, freios ABS e câmbio automático. O Williams Renault FW15C era um carro imbatível.



A FIA percebeu que a diferença tecnológica estava destruindo a competitividade e, por extensão, o esporte. Optou por uma decisão radical, proibir todos os auxílios eletrônicos a partir de 1994. A temporada teria o retorno do reabastecimento, uma maneira artificial de provocar mudanças de posições nas corridas.



O FW16 nasceu errado, os engenheiros da Williams não conseguiram desenvolver um projeto equilibrado com um chassi convencional, segundo o próprio Senna o carro era extremamente complicado para guiar. Por outro lado, algumas equipes conseguiram produzir bons carros, como era o caso da Benetton com o modelo B194, que era conduzido por Michael Schumacher.



Na primeira etapa da temporada, o GP Brasil, Senna conseguiu a pole e liderou o primeiro trecho da corrida, mas foi ultrapassado nos boxes pelo piloto da Benetton durante um pit-stop de reabastecimento. Tentando recuperar a ponta exagerou, rodou sozinho e abandonou. O alemão venceu a prova.



A segunda etapa foi realizada no circuito de Aida no Japão, o chamado GP do Pacífico. Ayrton Senna conseguiu a sua segunda pole, mas durou pouco na prova, ao disputar a primeira curva foi tirado da pista por Mika Hakkinen e depois abalroado por Nicola Larini. Schumacher venceu mais uma. A nota positiva da prova foi o primeiro pódio de Rubens Barrichello com uma Jordan


Circuito de Ainda - 1994



Então chegou o fatídico GP de San Marino, disputado no circuito de Ímola na Itália. A terceira etapa foi marcada pelo acidente que vitimou Rubens Barrichello na sexta-feira, pela morte de Roland Ratzenberger no dia seguinte e o acidente que causou o óbito de Ayrton Senna durante a prova no domingo.

 


Rubens Barrichello sofreu o pior acidente de sua carreira ao perder o controle da sua Jordan na chamada Variante Baixa do circuito, o carro decolou após tocar numa zebra, bateu na barreira de pneus e nas telas de proteção antes de capotar O piloto foi prontamente socorrido. 

Rubens Barrichello – Ímola 1994



O austríaco Roland Ratzenberger é lembrado por ter sido o primeiro piloto a sofrer um acidente fatal em um final de semana da Formula 1 desde o GP do Canadá em 1982, quando ocorreu o óbito de Ricardo Paletti. Mais de oito passaram desde que Elio de Angelis sofreu um acidente fatal enquanto participava de uma seção privada de testes da Brabham no circuito de Paul Ricard em 1986. No treino de qualificação em Ímola, Roland Ratzenberger fazia uma volta rápida quando perdeu a asa dianteira do seu Simtek na entrada da curva Villeneuve, o carro descontrolado bateu contra um muro a 314,9 km/h. Sua morte foi anunciada oito minutos após o piloto ter dado entrada no Hospital Maggiore de Bolonha. Como o show não pode parar, após o acidente a Simtek anunciou que não iria se retirar da prova, alegando que Roland gostaria que seu companheiro de equipe David Brabham participasse da corrida.  Em relação a este acidente houve uma grande controvérsia, a discussão se concentrou na determinação da hora e local do óbito de Ratzenberger. Os organizadores da corrida e da FIA alegaram que ele foi levado ainda com vida para Bolonha, enquanto os investigadores garantem que, pelos danos causados, ele teve morte instantânea ou, no máximo, ainda nas dependências do circuito de Ímola. Segundo as leis italianas, se um atleta morrer durante uma ocorrência esportiva, o evento deve ser cancelado e todo o complexo desportivo colocado à disposição dos peritos até o final da investigação, que pode durar meses ou anos. Se isso tivesse acontecido, o acidente do dia posterior que vitimou Ayrton Senna seria evitado.



Syntek de Roland Ratzenberger – Ímola 1994

Antes da terceira corrida do ano, Senna declarou que esta deveria ser sua corrida de início da temporada, pois não havia terminado as anteriores Conquistou mais uma vez a pole, mas estava particularmente preocupado com dois eventos: Um deles, na sexta-feira, durante a sessão de qualificação da tarde o piloto tupiniquim Rubens Barrichello foi vitimado por um grave acidente, sofreu pequenas escoriações e quebrou o nariz, o suficiente para ser impedido de correr no domingo. Senna visitou o colega no hospital do circuito, mas foi obrigado a pular um muro depois de ser impedido pelos médicos. Ficou impressionado e saiu convencido de que as normas de segurança deveriam ser revisadas. O segundo ocorreu no sábado, durante os treinos livres, quando Ratzemberger morreu em um acidente que começou a ser causado na curva Tamburello,  quando a asa dianteira de seu carro se soltou. Senna contrariou as recomendações da FIA e convenceu os oficiais de pista a permitir que visitasse o local do acidente. Esta  ousadia lhe custou mais uma advertência e maior desgaste na sua atribulada relação com a FIA (que até o ano anterior era presidida por Jean-Marie Balestre).



Senna passou parte da manhã de domingo reunido com outros pilotos, determinado a recriar a antiga Comissão de Segurança a fim de melhorar as condições de disputa na F1. A largada do GP foi desastrosa, a Benetton de J.J. Letho apagou o motor, forçando os outros pilotos a fazerem manobras evasivas, Pedro Lamy (Lotus) não conseguiu e bateu forte na traseira do carro parado,  provocou a entrada do safety-car por cinco voltas para liberar a pista. O acidente causou ferimentos sem gravidade em 4 espectadores, que foram atingidos por destroços. Na sexta volta a corrida foi reiniciada, na abertura do sétimo giro Senna estava fazendo os melhores tempos, porém passou reto na curva Tamburello, a mesma que assistiu a batida de Nélson Piquet (Williams) em 1987 e de Gerhard Berger (Ferrari) em 1989. Piquet costumava definir a antiga curva Tamburello (o traçado foi modificado) como uma “reta torta”, que os pilotos costumavam fazer com o pé embaixo. A telemetria informa que depois de perder o controle do carro Senna ainda conseguiu reduzir de 300 km/h para 200 km/h em milésimos de segundo. O socorro foi rápido, mas não havia mais nada a ser feito. Mais tarde foi encontrada no carro de Senna uma bandeira austríaca, o
piloto pretendia, em caso de vitória, homenagear Ratzenberger. 



Ayrton Senna – Ímola 1994


Talvez a palavra mais concisa para descrever o GP de San Marino de 1994 seja “baderna”. Além dos acidentes de Barichello, Ratzenberger e Senna, a batida de Pedro Lamy na largada arremessou dois pneus para as arquibancadas, ferindo espectadores. Michele Alboreto (Minardi) perdeu um pneu na saída dos boxes e atorpelou mecânicos da Ferrari e da Lotus. Logo depois do acidente de Senna as comunicações no circuito entraram em colapso, Érik Comas (Larrousse) não foi informado que a corrida tinha sido paralizada e por detalhe não abalroou o helicóptero que se encontrava pousado no asfalto da pista aguardando para levar Senna ao hospital. A emissora do Jardim Botânico, que tem o monopólio das transmissões de TV para Pindorama, criou mais uma frase emblemática que ficou armazenada no histórico das transmissões da Fórmula 1 para o país. Roberto Cabrini anunciou por telefone em uma edição extraordinária direto do hospital em Bolonha: “Morreu Ayrton Senna da Silva... Uma notícia que a gente nunca gostaria de dar”.

Os resultados do GP de San Marino acenderam um alarme nos organizadores da F1, os carros ficaram muito instáveis sem o auxílio eletrônico, recursos foram adotados para reduzir a velocidade. As equipes foram instruídas que a partir do GP da Espanha teriam limitações nas asas dianteiras e difusores, no GP do Canadá deveriam apresentar reforços nas laterais e suspensões, e na Alemanha teriam que usar asas traseiras menores e uma prancha de madeira na parte inferior e aumentar a distância do chão e reduzir a pressão aerodinâmica. 
A primeira metade de 1994 foi o início de temporada dos sonhos para a Benetton, seis vitórias e um segundo lugar em sete provas. O que parecia ser um passeio no parque em um domingo ensolarado mudou radicalmente no restante do campeonato.

Começou com desconfianças que algumas equipes ainda utilizavam recursos eletrônicos. Nicola Larini comentou em Aida (GP do Pacífico) que a Ferrari não tinha desativado o controle de tração, a FIA investigou, detectou a violação às regras e mandou a equipe remover o componente, não houve punições. No GP em Ímola a FIA requisitou as centrais eletrônicas dos três primeiros colocados, Schumacher (Benetton), Larini (Ferrari) e Hakkinen (McLaren). O componente da Ferrari foi aprovado sem restrições, a McLaren de Hakkinen apresentou um câmbio automático não permitido e a Benetton de Schumacher incluía uma opção oculta de controle de largada. A equipe explicou que era um resquício do software antigo e que não era usado. McLaren e Benetton sofreram apenas punições financeiras. Algum tempo mais tarde (2011) Jos Verstappen (suposto pai do Max, pela tradição judaica maternidade é fato, paternidade é hipótese) afirmou que o carro de Schumacher não era igual ao seu, sem especificar exatamente qual a diferença. 

No GP da Inglaterra o alemão ultrapassou o pole Damon Hill na volta de apresentação, os comissários o penalizaram com um stop-and-go. O box orientou para que o piloto não cumprisse a punição e três voltas mais tarde Schumacher recebeu a bandeira preta (desclassificação). O alemão então cumpriu a pena inicial e voltou para a prova, classificando-se em 2º lugar. O GP foi vencido por Damon Hill, Schumacher chegou a comemorar a 2ª colocação no pódio, porém foi posteriormente desclassificado. A arrogância de Flávio Briatore ao orientar que o piloto não cumprisse a primeira penalização saiu caro, a Benetton foi multada em US$ 500 mil, Schumacher além da desclassificação foi suspenso por duas provas, Espanha e Portugal.


No GP da Alemanha nova polêmica, a Benetton de Jos Verstappen incendiou durante o reabastecimento, a equipe havia retirado os filtros para a gasolina chegar mais rápida ao tanque. Muitos lembraram que no primeiro GP do ano Schumacher ultrapassou Senna justamente por ter feito um reabastecimento bem mais rápido. Todas as equipes utilizavam no reabastecimento os equipamentos de uma única fornecedora, a Intertechnique, que havia enviado uma carta para a Larrousse autorizando a retirada dos filtros. Foi a defesa alegada pela Benetton e também desta vez não houve punições.

Fogo na Benetton de Jos Verstappen – Alemanha 1994

O GP da Bélgica terminou com a vitória do alemão, que foi mais uma vez desclassificado. A vistoria depois da prova indicou que o carro tinha uma distância do chão inferior à permitida. A equipe alegou que o assoalho do carro tinha sido danificado em uma saída de pista, explicação que não foi aceita pelos comissários e a desclassificação mantida.


Todos estes infortúnios de Schumacher conduziram a uma situação inesperada, na última etapa da temporada na Austrália ele chegou com apenas um ponto de diferença sobre o britânico Damon Hill. Liderou a prova até a volta 36 quando escapou da pista. Com um retorno atabalhoado atropelou a Williams de Hill, que estava em segundo, ambos os carros ficaram danificados e tiveram que abandonar, permitindo o primeiro mundial de Michael Schumacher. Honrando a fleugma britânica (espécie de frieza ante as adversidades), Hill recusou acusar o alemão de ter provocado o acidente considerando o ocorrido como normal em competições.

Michael Schumacher joga o carro sobre Damon Hill – Austrália 1994
Nunca antes na história da F1 um piloto conseguiu ser campeão apesar de ser penalizado em 4 provas. Foi um final desanimador para uma temporada que, para muitos, não deveria ter existido.