quarta-feira, 30 de maio de 2018

MotoGP – Padronização da IMU



Man-in-the middle


Dorna Sports é uma empresa de mídia, marketing e gestão, que administra com exclusividade os direitos comerciais e de transmissões de TV do FIM Road Racing World Championship Grand Prix (MotoGP) desde 1991. Nunca foi segredo que os principais objetivos da empresa nos últimos anos são orientados para aumentar a competitividade em todas as provas, estimular a participação de um número maior de fabricantes, pilotos e equipes para proporcionar um melhor espetáculo para os (tele) espectadores. Maior audiência significa maior exposição e atrai mais patrocínios. Um dos procedimentos adotados para equalizar o desempenho dos equipamentos foi a padronização de itens que possam representar uma escalada de custos prejudicando equipes com recursos escassos.

O regulamento da MotoGP em 2014 incluiu o uso obrigatório da ECU (Unidade de Controle Eletrônico) com a especificação da Magneti Marelli, entretanto permitiu que as fábricas continuassem a desenvolver o seu próprio software, que resultou em vantagens significativas para as que dispunham de maior orçamento para aplicar nesta área. O passo seguinte foi a padronização do software, incluída como coercitiva em 2016. Esta medida impediu que os fabricantes utilizassem especialistas em criar códigos para desenvolver meios elegantes e eficientes de administrar o comportamento da moto, através do controle de tração, gerenciamento do freio-motor e controle de potência. Óbvio, quando uma linha de desenvolvimento é bloqueada, os esforços dos engenheiros se concentram em buscar novas alternativas, que possam resultar em algum tipo de vantagem sobre os concorrentes.

No ano passado já circulavam rumores que a IMU (Unidade de Medidas Inerciais) era uma fragilidade que permitia contornar limitações impostas pelo software padrão e aumentar o desempenho dos protótipos na pista. O Autoracing publicou um texto sobre o assunto em 24 de julho de 2017, “MotoGP – Hecha la ley, hecha la trampa”. A IMU é um conjunto de giroscópios, sensores e um processador programável.  Sua atribuição inicial é indicar os ângulos de inclinação da moto nos sentidos lateral e longitudinal. Para executar esta função a unidade combina as leituras de vários sensores, realiza a integração dos dados, calcula os ângulos de inclinação e os entrega para a ECU. O processo de integração pode permitir que os dados sejam modificados para obter vantagens indevidas e gerou a suspeita que a inteligência da IMU está sendo utilizada como um processador secundário, com capacidade de capturar informações de outros sensores e modificar as entradas da ECU para alterar o comportamento da moto. Na atual regulamentação da MotoGP a IMU é classificada como um “sensor livre”', significando que fábricas estão liberadas para escolher qual desejam usar.

O pacote eletrônico da MotoGP é uma estrutura tipo barramento, ou seja, todos os sensores distribuídos no equipamento, incluindo a IMU, transmitem as informações coletadas para a ECU utilizando um canal compartilhado. Esta arquitetura permite que, além de informar suas próprias medidas, a IMU pode ser programada para capturar leituras de outros sensores e recalcular as suas próprias, de modo a fornecer para a ECU números mais alinhados com as características particulares da moto. Isto talvez explique o crescimento do valor de mercado dos engenheiros da Magneti Marelli que trabalharam no desenvolvimento do software da ECU padronizada.

Eventualmente o procedimento pode ser mais complexo e entrar em uma seara sombria. Existem suspeitas do uso de uma técnica desenvolvida por hackers para comunicações via internet chamada “Man-in-the-Middle” (homem no meio, uma referência a um intruso malicioso que intercepta e altera informações). Como a ECU consulta as amostragens dos sensores seguindo uma disciplina de “Polling” (sondagem cíclica de todas as unidades), a IMU pode interceptar a comunicação e alterar o valor fornecido para um mais adequado para o equipamento.

Isto está prestes a acabar.

Em 2016 a Dorna, como compensação pela imposição da ECU padronizada, aceitou congelar as especificações das motos por cinco anos, para garantir o retorno dos investimentos realizados pelos fabricantes. Uma regra fixa estabeleceu que nenhuma alteração pode ser realizada, com a exceção de características de segurança, como foi o caso do banimento das “winglets” (asas) para a temporada de 2017. A Dorna decidiu limitar as especificações de hardware e software da IMU para a temporada de 2019. O diretor de tecnologia da MotoGP Corrado Cecchinelli, durante reuniões conduzidas no GP da França, explicou as razões: “A principal como de costume é a segurança. Não há como garantir o funcionamento correto da ECU se houver a possibilidade de as informações coletadas pelos sensores serem fraudadas ou conterem alterações abusivas. Uma informação errada para a ECU pode causar acidentes. A IMU é um sensor importante que, por sua natureza, exige a inclusão de um chip e alguma lógica. Não há como impedir algum tipo de processamento, então deve ser permitido tudo o que puder ser controlado. A segunda razão são os custos, como é um sensor livre a falta de uma especificação única obriga a todos desenvolverem soluções proprietárias.

A decisão de estabelecer uma especificação padronizada do hardware e software da IMU é mais uma medida da Dorna em busca do equilíbrio na MotoGP.

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