Momento Márquez - Curva 3 em Le Mans |
Existe
um fator que prejudica todas as competições, a previsibilidade. Este ano o
Mundial de MotoGP está correndo o risco de repetir as temporadas de 2007 (Casey
Stoner), 2012 (Jorge Lorenzo) e 2014 (Marc Márquez), onde a grande
superioridade de um piloto minou o interesse do público pela disputa do título.
O
recente GP da França terminou com mais uma vitória inconteste de Marc Márquez,
a terceira consecutiva em 5 etapas. Na abertura da temporada no Catar, uma
pista tradicionalmente madrasta para os protótipos da Honda, a disputa entre o
espanhol e Andréa Dovizioso foi literalmente até os últimos metros, com uma
espetacular vitória do italiano. Em Rio Hondo valeu a sabedoria popular que
todos têm um dia ruim, o campeão do mundo estava fora da casinha. Afrontou o
regulamento na largada, foi extremamente agressivo na pista e recebeu três
penalizações, possivelmente um recorde, a última um acréscimo de tempo
calculado na medida exata para que não marcasse nenhum ponto. Depois desta
prova Márquez foi alvo de pesadas críticas, algumas pertinentes, outras muito
exageradas. Valentino Rossi, por exemplo, disse que Márquez estava acabando com
o esporte e que temia pela própria vida ao compartilhar a pista com ele. Andrea
Iannone, pasmem, um campeão de trapalhadas que se auto intitula de The
Maniac, sentenciou que ele era um perigo para os outros pilotos.
Nas
três provas seguintes o vencedor pôde ser apontado antes de cumprir a metade do
percurso. Nesta última, na França, Danilo Petrucci, seu perseguidor mais
próximo, confessou que sofreu um tipo de tortura psicológica, Márquez permitia
uma aproximação e, quando ele acariciava a possibilidade de vitória, a Honda
abria a distância entre eles. Houve até um “Momento Márquez”, uma quase queda
aconteceu na curva três, onde o espanhol já havia caído durante os treinos, o
piloto perdeu a frente e corrigiu a inclinação excessiva do equipamento
apoiando o cotovelo na pista.
Explicações
simplistas como o estágio atual da RC213V ser muito superior ao dos
competidores não resistem a uma análise mais detalhada. A Honda participa do
mundial com seis equipamentos, todos tem o mesmo motor e três, as duas motos da
equipe oficial e a LCR de Cal Crutchlow, estão equipadas com o mesmo nível de
desenvolvimento. Até a quinta etapa Márquez acumulou 95 pontos no mundial,
todos os outros cinco pilotos (Crutchlow, Pedrosa, Morbidelli, Nakagami e
Luthi) juntos somam 101, ou seja, fica explícita a contribuição do talento do
piloto.
Em
Le Mans Márquez foi o único no grid de largada a utilizar um composto hard no
pneu traseiro. A característica deste composto é demorar algumas voltas para
atingir a temperatura ideal, o que justifica os riscos maiores que os normais
assumidos por Dovizioso e Zarco no início da prova, uma tentativa de abrir o
máximo possível para tentar administrar no final. Ambos pecaram pelo excesso e
caíram nas voltas iniciais.
O
GP da França não se restringiu a mais uma vitória do campeão do mundo. A sua
dilatada liderança na pontuação do mundial é distorcida por diversas
ocorrências inesperadas acumuladas por seus concorrentes, como o triplo
acidente em Jerez e as quedas de Dovizioso e Zarco. Atrás do líder a disputa na
classificação geral é acirrada, apenas 13 pontos separam Vinales em segundo de
Dovizioso em nono, com Zarco, Rossi, Petrucci, Jack Miller, Andrea Iannone e
Cal Crutchlow entre eles.
Historicamente
existem diversos circuitos cujas características privilegiam o projeto das
Honda: Barcelona, Sachsenring, Brno, Aragon, Phillip Island e Valência, que
justificam o temor dos concorrentes do espanhol. Marc lidera o campeonato por
36 pontos, vantagem inferior à que obteve no início da temporada de 2014 quando
venceu as cinco primeiras provas e livrou 42 pontos. As perspectivas dos
aspirantes ao título não são animadoras como resumiu Valentino Rossi:
"Marc já tem uma boa vantagem, mas o que preocupa a todos é a sua
velocidade na pista. Ele tem sido sempre o mais rápido, este ano vai ser
complicado evitar mais um título dele”.
Depois
da prova encerrada em Le Mans algumas entrevistas dos pilotos foram muito
expressivas. Com uma franqueza que foge à habitual Danilo Petrucci afirmou que
a Ducati estava analisando a contratação dele ou de Jack Miller, para talvez
ocupar o assento de Lorenzo, olhando para os custos. Explicou que o salário de
ambos é bem menor do que o do espanhol.
Jorge
Lorenzo, que tem se caracterizado como o melhor largador desta temporada,
justificou a sua queda de rendimento durante as provas pelo cansaço. Sua
técnica de condução e a ergometria da moto não combinam, ele não consegue
utilizar as pernas para apoiar o corpo durante as frenagens, todo o esforço é
transferido para os braços. Esta exigência de energia muscular cobra seu custo
depois de um terço da prova.
Cal
Crutchlow sofreu um acidente sério na tomada de tempo e as consequências o
obrigaram a passar uma noite no hospital. Seus ferimentos foram mais graves
porque ele havia sofrido um acidente na FP4 e não trocou de macacão para o Q1.
A queda anterior acionou o airbag, que não tinha carga para inflar e proteger o
piloto na segunda queda. A presença do britânico no grid espantou a todos
e sua explicação foi extremamente simples: “É o meu trabalho”.
Embora
o desempenho da Yamaha tenha sido bom, inclusive com o pódio de Valentino,
Maverick Vinales era um piloto infeliz. “Não sei porque meu rendimento não foi
igual ao dele, acho que trabalharam melhor no box ao lado”. Qual o recado que o
espanhol queria passar e para quem não ficou claro. Não é de hoje que existem
boatos sobre o seu descontentamento com seu chefe de equipe, muito conservador
para o seu gosto. Vinales está afirmando para a Yamaha com todas as letras que
que não está satisfeito com o curso dos acontecimentos. O último GP que ele
venceu faz um ano, foi na França em 2017.
Para
os mais observadores as comemorações depois da bandeirada final foram
significativas. No parque fechado ficou claro que, embora ambos felizes com
seus respectivos resultados, Márquez e Rossi não se bicam. Ambos foram efusivos
ao confraternizar com Petrucci, mas mesmo compartilhando um espaço exíguo não
se aproximaram. O sentimento de desconforto entre eles ficou evidente na
solenidade do champanhe, um para cada lado. Juntos e sorridentes, só nas fotos
oficiais do pódio. Talvez uma entrevista de Lívio Suppo na semana anterior
tenha contribuído para acirrar os ânimos. O antigo gestor da Honda Racing
afirmou que em 2015 o próprio Rossi arquivou seu sonho de ser de fato e de
direito o maior piloto de todos os tempos, ao criar uma polêmica desnecessária
antes da prova de Sepang. Na corrida anterior Márquez havia evitado cinco
pontos a mais para Lorenzo ao o ultrapassar nos últimos metros em Phillip
Island, e foi acusado por Rossi de comandar um complô junto com o conterrâneo
para evitar o que seria o seu décimo campeonato. O resultado da pantomina todos
conhecem, o incidente em Sepang, a penalização para Valência e a perda do
campeonato. Em contraste, Gigi Dall’Igna, embora sem um piloto de fábrica no
pódio, estava exultante com a performance de Petrucci, da Pramac, com uma moto
idêntica às utilizadas por Dovizioso e Lorenzo. Ele considerou uma conquista da
Ducati.
Distanciamento no Parque Fechado |
Distanciamento do Pódio |
Nenhum comentário:
Postar um comentário