segunda-feira, 28 de dezembro de 2020

MotoGP - Freios - O monopólio da Brembo

 

Pinça de freio da MotoGP

O livro que regulamenta o Campeonato Mundial da Federação Internacional de Motociclismo (FIM) especifica no parágrafo de 2.4.1 – MotoGP Class Technical Regulations – que motos participantes na classe MotoGP devem ser exclusivamente protótipos. Os candidatos a participação de GPs que não são membros do Motorcycles Sports Manufacturers’ Association (MSMA) necessitam de uma aprovação especial da Comissão de Grandes Prêmios. Por definição, protótipo é um produto de uma fase de testes e/ou planejamento de um projeto, conceito alinhado com o objetivo da competição servir como um laboratório para tecnologias que possam ser portadas no futuro para as linhas de produção.

 

A MotoGP utiliza compulsoriamente um único fornecedor de pneus (Michelin) e eletrônicos padronizados (Magneti Marelli), que implica em suspensão e freios como principais áreas abertas para a concorrência livre em termos de fornecimento de componentes por não fabricantes dos protótipos. O monopólio voluntário das suspensões da indústria sueca Ohlins terminou quando a austríaca KTM fez a sua estreia no grid no início de 2017, utilizando uma suspensão interna WP, produzida por uma empresa do grupo.

 

Embora a austríaca KTM seja fiel às suas convicções, design da moldura em aço tubular (outros concorrentes usam alumínio) e suspensão WP, os sistemas de freios são da italiana Brembo, fornecedora de todos os protótipos que alinham no grid. Desde que a Gresini abandonou os freios Nissin (produzidos no Japão) a MotoGP tem um monopólio não oficial de fornecimento de sistemas de freios. Todos os GPs da principal categoria desde 1995, incluindo todos os 329 GPs desde a adoção dos motores 4 tempos em 2002, foram vencidos com por equipamentos utilizando freios Brembo.

A indústria italiana Brembo produz, para cada circuito onde é realizada uma etapa do mundial de MotoGP, um resumo dos principais parâmetros de frenagem do traçado. Estes dados são compilados a partir do know-how adquirido ao longo de anos de experiência. A “identidade” do circuito contém especificações gerais e dados técnicos de cada ponto de frenagem, materializado na forma de um diagrama claro e intuitivo onde mostra a velocidade no início e fim da frenagem, tempo e distância necessários para desacelerar o equipamento, força máxima que deve ser aplicada na alavanca do freio e força de frenagem em cada curva. Cada circuito tem as próprias características. O circuito de Brno na República Checa, por exemplo, é um dos mais exigentes. Entre o km 2 e o km 5 o traçado tem aclives e declives que variam entre 376 metros acima do nível do mar até 450 metros, uma cota de 74 metros. É um desafio extra para os pilotos porque é completamente diferente reduzir a velocidade em trechos planos e inclinados.

 

O piloto pode escolher entre utilizar discos de 320 mm ou 340 mm de diâmetro, ambos são oferecidos em 2 modelos, High mass ou Standard (low mass), os modelos 320 mm High Mass tem uma banda de frenagem 80% maior. Para cada formato de disco existem duas composições de carbono, que se distinguem pela fricção inicial e resistência a altas temperaturas. Ao todo existem 8 variações de disco para o freio dianteiro, com exceção de Motegi onde a versão de 340 mm é obrigatória.

 

Vinales pula da moto na Áustria

Estado da moto de Vinales depois do acidente

 

Uma das ocorrências mais assustadoras da temporada de 2020 relacionada com os freios foi protagonizada por Maverick Vinales, piloto da a equipe oficial da Yamaha, na segunda prova realizada na Áustria. Baseados no histórico da primeira prova no mesmo circuito, o piloto e sua tripulação resolveram não seguir as recomendações do fabricante para utilizar as pinças modelo 2020 e equiparam a M1 com pinças modelo 2019. Durante a prova, em uma reta onde os protótipos desenvolvem a velocidade máxima, o sistema de freios sobreaqueceu e entrou em colapso.  O piloto sem poder desacelerar decidiu pular do equipamento para não colidir com as proteções da pista. O tempo que Vinales levou entre identificar a falha dos freios e a decisão de pular da moto foi frações de segundos. O treinamento, controle e sangue frio do piloto evitaram um acidente de proporções incalculáveis.

Os discos de freios evoluíram desde que a Brembo estreou na MotoGP no início dos anos 70. Iniciando com os discos de alumínio utilizados na década dos anos 80 para reduzir o peso, até os discos flutuantes que possuem uma parte de alumínio que é fixado na roda e a pista de travagem exterior fixada na parte central. Este arranjo singular permite um movimento mínimo lateral e axial, que proporciona a total adaptação do disco às pastilhas de fricção, absorvendo as tolerâncias. Como resultado a travagem é mais segura e o desgaste das pastilhas é homogêneo. As primeiras versões eram híbridas de alumínio e ferro fundido, que evoluíram para discos de alumínio e rotor de aço inoxidável. No início dos anos 90 houve o desenvolvimento de discos flutuantes de carbono, utilizados inicialmente na classe principal (500cc e posteriormente na MotoGP).

 

Evolução dos discos de freios na MotoGP

 

Discos de carbono permitem uma redução considerável do peso de massas não suspensas, diminuem o efeito giroscópio tonando o equipamento mais amigável e tem um poder de frenagem muito maior que os correspondentes em aço, porém a janela de temperatura para obter a máxima eficiência é muito estreita. Uma das habilidades que distinguem os bons pilotos é saber utilizar a volta de apresentação e as primeiras curvas para aquecer os freios até a temperatura ideal. Em caso de excesso de umidade, o usual é utilizar discos de aço, embora capas protetoras mais eficientes permitam usar componentes de carbono na chuva. A temperatura ambiente também influencia os sistemas de freios, mesmo em clima (seco) frio os discos de carbono (com capa protetora ou não) continuam a ser a opção mais adequada. O gerenciamento adequado da temperatura dos freios é um diferencial dos bons pilotos da MotoGP

 

Características dos freios na MotoGP

 

Em 2014, por solicitação dos fabricantes, o Regulamento da MotoGP foi alterado para contemplar discos de freios maiores para compensar a maior velocidade alcançada pelos protótipos. Até então as regras permitiam para as rodas dianteiras dois diâmetros de disco de freio, 320 mm utilizado em quase todas as pistas e 340 mm, obrigatório para Motegi e opcional para Barcelona e Sepang. A alteração das regras permite que os 340 mm possam ser utilizados em todos os circuitos onde o 320 mm é permitido, mantendo a obrigatoriedade de 340 mm para Motegi.

Tipos de discos de freios na MotoGP

 

As características principais das pastilhas de freio de carbono utilizadas na MotoGP são alto coeficiente de atrito e eficiência constante mesmo submetidas a altas temperaturas, desde que entre os limites da janela de uso. Este comportamento resulta em frenagens eficientes e uniformes durante toda uma competição, conservando a integridade do componente. Se exceder a temperatura máxima, o coeficiente de atrito do carbono pode alterar e perder a eficiência causando excesso de desgaste das pastilhas e discos.

 

Pastilhas de freios na MotoGP

 

A primeira patente de cilindro mestre foi registrada pela Brembo em 1985, o projeto foi desenvolvido para suprir limitações de espaço nos protótipos. Em motos de competição são necessárias soluções compactas para reduzir dimensões gerais e melhorar a ergonomia do piloto, agregando conforto e eficácia no comando da alavanca de acionamento. Esse arranjo estrutural, entre outros benefícios, também permitiu a concepção do cilindro mestre de freio com o objetivo de otimizar as interações hidráulicas e mecânicas, a fim de melhorar o desempenho do produto. Em 1986 o cilindro mestre de freio radial equipou a Yamaha YZR OW 81 do americano Freddie Lawson, que venceu o campeonato da classe 500. O piloto apreciou a linearidade da resposta. A evolução da ideia desenvolveu novas vedações e melhorou o dispositivo de ajuste da alavanca no guidão.                                                                                                                     

  

Cilindro mestre e alavanca

 

As pinças de freio (cálipers) Brembo de alta performance combinam estabilidade com os níveis de desempenho exigidos pelos protótipos da MotoGP. Cada modelo tem tecnologia de manufatura exclusiva, são extremamente rígidas sob estresse e garantem frenagens precisas e consistentes.
Existem 3 modelos de pinça dianteira e 1 de pinça traseira, todas dimensionadas para suportar os esforços mais extremos.



Pinças (Cálipers) na MotoGP

sexta-feira, 25 de dezembro de 2020

MotoGP – Ducati sem Dovizioso em 2021

 

T tripulação da Ducati

 

Uma frase que costuma ser atribuída a Ayrton Senna: “Segundo é o primeiro que perde”, Andrea Dovizioso vai entrar na história da MotoGP como, talvez, o maior dos perdedores. Para os fanáticos torcedores italianos das motos vermelhas, foi a esperança não concretizada de voltar aos tempos vitoriosos de Casey Stoner. Seus críticos mais exaltados dirão que ele repetiu sempre o mesmo discurso: “Temos os mesmos problemas de sempre” & “A moto não gira”.  Enquanto esteve na Ducati, Dovizioso repetiu estas frases como se fosse um mantra e, assim como o personagem bíblico São João Batista, ele foi a voz que clamou no deserto.

 

Andrea Dovizioso & Marc Márquez

 

Desde que se tornou o maior rival de Marc Márquez, o piloto italiano participou do desenvolvimento de uma moto vencedora não apenas em pistas adequadas para as suas características. A Desmosedici é a moto mais veloz das pistas, contudo tem que corrigir o seu comportamento dinâmico, ou seja, superar sua dificuldade na retomada de velocidade, sair mais inteira das curvas para poder despejar potência.

 

Dovizioso insiste que nenhuma das atualizações conseguiu melhorar este comportamento. Talvez reduzir um pouco, mas em circuitos como Phillip Island, Sachsenring ou Jerez, a Ducati continua com dificuldades. Nas palavras de Andrea, ela simplesmente não é competitiva. Ele foi incapaz de enfrentar Márquez e sua Honda, que estabeleceram o padrão de referência.

 

Longe da imprensa, Andrea reclamava que Dall'Igna e os engenheiros de desenvolvimento faziam ouvidos de mercador, aplicavam recursos em melhorias nas áreas onde o protótipo já era competitivo: o motor e a aerodinâmica.

 

Andrea argumentou sobre as deficiências da GP19 com o CEO da Ducati Corse, Claudio Domenicali, em uma longa reunião após o GP da Espanha em Jerez em 2019. O resultado havia sido ruim, Dovizioso terminou em 5º. A réplica de Gigi Dall’Igna foi um comentário pós-corrida em Le Mans, onde Dovizioso e Petrucci terminaram em 2º e 3º. Afirmou que a Ducati tinha amplas condições de vitória, deixando subentendido que os pilotos não estavam aproveitando ao máximo os recursos da moto. A vitória de Petrucci em Mugello, duas semanas depois reforçou o argumento de Dall'Igna, todos os pilotos que correram com a equipe oficial desde sua chegada à Ducati venceram com suas motos. Pilotos com estilos diferentes como Iannone, Dovizioso, Lorenzo ou Petrucci conseguiram ganhar GPs, o que sugere que não é um veículo tão complicado.

 

A relação entre Dall'Igna e Dovizioso certamente passou por momentos tensos. Dovizioso, com razão, reclama que é sistematicamente ignorado. Afinal, foi ele quem colocou a Ducati em uma posição para aspirar o título mundial da MotoGP, venceu 11 corridas entre 2016 & 2018. Com a saída de Lorenzo se tornou a principal referência da Ducati na MotoGP e, portanto, o Departamento de Corridas deveria considerar seus feedbacks. Dall'Igna não escuta.

 

O chefe do Departamento de Corridas da Ducati, em vez disso, dá prioridade ao que acredita. Sua experiência, combinada com a enorme quantidade de dados que gerencia, lhe dá uma visão que parece ser muito diferente da dos pilotos. Não é segredo que Gigi tem uma paixão por motores, o segmento de indústria na qual ele brilhou com mais intensidade durante sua carreira profissional.


Soluções aerodinâmicas da Desmosedici


A segunda área onde não para de trabalhar é a aerodinâmica, um campo onde foi um pioneiro absoluto nos últimos anos. A Ducati continuamente introduz inovações técnicas e soluções que forçam seus rivais a trabalhar 24 horas por dia para se atualizar. Primeiro foram as winglets (asas), depois a ”colher” montada no braço oscilante, a semi carenagem da roda dianteira e, a partir de Mugello 2019 na máquina de Michele Pirro, a mesma proteção na roda traseira.

 

Dovizioso sempre foi cético sobre as últimas “invenções”. Sempre que foi perguntado quais são as vantagens das novas peças ele respondia “zero”. Gostaria que menos peças de fibra de carbono (que quase não têm efeito no desempenho da moto) e uma moto que proporcione mais facilidade nas curvas.

 

A Ducati aprendeu com a desastrosa passagem de Valentino Rossi (2011 & 2012) que não devia basear toda a linha de desenvolvimento em um só piloto, que pode facilmente trocar de equipe. Os engenheiros são muito renitentes em permitir que um único indivíduo defina a linha de evolução de seus equipamentos.

 

Casey Stoner como piloto de testes da Ducati

 

Andrea Dovizioso não é o primeiro piloto a afirmar que Gigi Dall'Igna desconsidera opiniões dos condutores. As palavras de Casey Stoner ao abandonar o contrato de piloto de testes da Ducati seguem na mesma linha: “Não há razão para eu continuar, ninguém leva a sério minhas sugestões e feedbacks”. Tudo indica que deve haver alguma verdade no que é dito sobre o Diretor da Ducati Corse.

 

Dall’Igna à parte, o verdadeiro problema, talvez, não é o que tem disponível porque quando você está lutando com um “alienígena”, nunca é suficiente. “Se não houvesse o Marquez, eu era bicampeão mundial.  O problema é que Marc está na disputa, então meu equipamento tem que ser muito melhor”, disse Dovizioso após Le Mans 2019. Ele sabe que quando a competição é exasperada como na MotoGP, cada detalhe conta.  “Se o objetivo é o título, precisamos encontrar algo. Estamos perto de Márquez, mas não é suficiente: atualmente a Ducati não tem cartas na manga para desafiar a Honda".

A experiência de Dovizioso com a Ducati é indiscutível, mesmo que não concorde com seu piloto, Dall'Igna deveria ter considerado a sua opinião. Se tivesse dado certo teria sido maravilhoso. Como não aconteceu, o alívio que Andrea diz sentir ao sair do box da equipe faz sentido.

 

Não está em pauta se a Desmosedici de Dall'Igna é uma moto vencedora, todos os pilotos que correram com a equipe oficial desde que Gigi assumiu o Departamento de Corridas venceram pelo menos um GP. Iannone venceu o GP da Áustria em 2016, Dovizioso venceu 15 vezes, Lorenzo venceu em Mugello, Catalunha e Áustria em 2018 e Petrucci nas temporadas de 2019 e 2020. Todos são pilotos com diferentes estilos de condução. As Ducati venceram em no Catar, Brno, Valência, Mugello, Barcelona, Áustria, Motegi, Misano, Sepang e Silverstone, a moto provou ser competitiva em 13 dos 19 circuitos do mundial, então não tem lógica a afirmação que só é eficaz em determinadas pistas.

 

Há pouca discussão que a Desmosedici seja uma motocicleta com características especiais, incluindo um “quadro rígido”, porém nenhuma máquina é perfeita. A Honda tem uma frente crítica, o motor Yamaha é tão lento quanto o motor Suzuki, a KTM não tem um ponto forte e aposta no equilíbrio e por aí vai. Moto perfeita não existe, todas têm prós e contras. Jorge Lorenzo teve que reaprender a pilotar um protótipo da MotoGP quando chegou no box da Ducati em 2017. Em diversas ocasiões o espanhol disse que tinha que ir contra seu estilo natural de condução para se adaptar e ter sucesso.

 

Lorenzo & Dovizioso – Valência 2018

 

Há uma crença generalizada que Ducati não sabe gerenciar seus pilotos e são recorrentes conflitos entre colegas de equipe. Houve problemas entre Iannone e Dovizioso, a “novela” da não renovação de Lorenzo, a confusa demissão de Petrucci e decisões dos boxes ignoradas (Mapping 8). Paolo Ciabatti é o diretor de esportes da Ducati, Gigi Dall'Igna dirige o Departamento de Corridas. Junto com Davide Tardozzi administram a gestão dos pilotos. Claudio Domenicali também tem voz nas decisões. O ruído surgiu porque Jorge Lorenzo, o maior investimento na área, levou uma temporada e meia para ser competitivo.  Avaliar o desempenho de um piloto implica em analisar a resposta nas pistas considerando seu custo. Na prova de Le Mans em 2018, face a ausência de resultados, em má hora a Ducati decidiu não renovar com Lorenzo. Parece que foi a senha para ele começar a vencer. A incontinência verbal com muita gente emitindo opiniões desencontradas foi desastrosa para a fábrica, antes de ser comunicado que não estaria na equipe em 2019 Lorenzo assinou com a Honda.

 


Gigi Dall’Igna conversa com Andrea Dovizioso

 

Gigi Dall'Igna encarna David na luta bíblica contra Golias, administra uma empresa do tamanho da Ducati contra as três gigantes nipônicos, Yamaha, Honda e Suzuki. O engenheiro italiano sabe perfeitamente que deve encontrar competitividade de maneiras alternativas: “A prioridade é definitivamente o chassi, porém como o desenvolvimento do quadro e dos motores demanda equipes diferentes, a Ducati trabalha em ambas as frentes. Os pilotos querem uma moto mais amigável e certamente temos que endereçar esta área, quando este objetivo for alcançado é importante ter a velocidade necessária para vencer a corrida. É mais fácil vencer um GP se tiver a moto mais rápida da pista. Quando você tem poder, você pode decidir se o usa ou não. Para controlar a corrida é importante ter mais cavalos do que seus oponentes. Se você não tem os cavalos que precisa, você tem que estar disposto a lutar muito mais para vencer a corrida”.

 

A temporada passada, além de todas as dificuldades decorrentes das incertezas causadas pela pandemia, ainda teve o complicador do novo pneu traseiro da Michelin. Foi uma mudança importante em termos de desempenho e alterou o modo de gerenciar o componente. O novo pneu tem mais aderência e resulta em um equipamento mais nervoso, dificultando a encontrar a configuração certa não só para o quadro, mas também em termos de eletrônica.

 

Cansado de esperar, magoado com o desprezo da Ducati, Dovizioso anunciou publicamente uma decisão muito bem pensada, romper o vínculo com a fábrica, encerrando um relacionamento que pode ser resumido em 15 vitórias e 3 segundos lugares no Campeonato Mundial. Embora haja alguns que duvidem, a decisão foi de Andrea Dovizioso. A Ducati por um tempo considerou um novo contrato com ele, mas Dovi antecipou a mudança com uma declaração: “Obrigado, foi bom enquanto durou, mas não há razão para continuar”. Foi esta instrução que Andrea passou ao seu empresário Simone Battistella, que então comunicou à Ducati. Reuniões subsequentes serviram para concordar sobre como divulgar a notícia.


Andrea Dovizioso e seu empresário Simoni Battistella

 

O AD04 nos últimos tempos sofreu todo tipo de afronta da Ducati. Ao invés de perder a paciência e fazer como, por exemplo, Danilo Petrucci que jurou amor eterno a um concorrente (KTM) ainda recebendo salário dos italianos, Andrea foi profissional. O comportamento da Ducati foi acintoso, antes de iniciar negociações com Dovizioso a Ducati perseguiu todos os pilotos livres, fazendo ofertas, contratando Jack Miller e Peco Bagnaia, procrastinando negociar com o piloto que obteve os melhores resultados com o Desmosedici em GPs nos últimos anos.

 

Surgiu até uma versão de falta de acordo financeiro, em realidade a Ducati não fez nenhuma oferta concreta a Dovizioso. Ridícula foi a desculpa que estavam esperando pelas provas na Áustria (Andrea venceu uma), para quem tem mais de dois neurônios entendeu que a fábrica já havia decidido, porém queria evitar demitir um vencedor, como aconteceu com Lorenzo.

 

Assim termina uma história que começou em 2013, quando Dovizioso se juntou à Ducati como substituto de Valentino Rossi. Ele diz que teve muita sorte porque era impossível ter uma estadia pior que a do Doutor. A entrada de Gigi Dall’Igna agregou método de trabalho e no início houve uma harmonia total.

 

A contratação de Lorenzo para o biênio 2017/2018 entornou o caldo. Em 2017 Andrea disputou o título mundial até a última prova, dividindo o box com Jorge Lorenzo com um contrato de 25 milhões de Euros por 2 anos, enquanto seu rendimento era de 1,5 milhão por ano. Enquanto Dovi vencia, Lorenzo ficava nas posições intermediárias. Se não fosse o piloto italiano, a temporada da Ducati teria sido um desastre, mas Dall'Igna nunca mostrou gratidão por Andrea ter evitado o fracasso total da equipe na temporada.

 

Áustria 2020 – A última vitória de Andrea Dovizioso

 

Em 2019, na Áustria, Dovizioso teve que engolir um sapo de bom tamanho quando descobriu que a Ducati estava fazendo todo o possível para trazer Lorenzo de volta às suas fileiras negociando com a vaga de Jack Miller na equipe Pramac, para depois de tentar colocá-lo na equipe de fábrica.


A Ducati tem inscritos para 2021 6 equipamentos, Jack Miller/Francesco Bagnaia na equipe oficial, Johann Zarco/Jorge Martin no Pramac, e Luca Marini/Enea Bastianini na Esponsorama (Avintia). De todos eles só Jack Miller venceu um GP (em 2016 no GP de Assen TT com uma Honda da equipe independente Marc VDS Racing), 3 são novatos egressos da Moto2. Mesmo que Márquez não volte, as chances de vencer o mundial são complicadas.

MotoGP - A equipe Satélite da Suzuki

 

Joan Mir, Davide Brivio & Alex Rins

 

A intenção dos organizadores do mundial de motociclismo não é novidade, foi mencionada aqui no Stilohouse este ano (Eu tenho um sonho! - StiloHouse) e voltou a ser comentada com mais ênfase nos planos para a temporada 2022. O sonho compartilhado entre as entidades que administram o evento anual, Federation Internationale de Motocyclisme (FIM), Dorna que controla os direitos comerciais, construtores representados pela Motorcycle Sports Manufacturer’s Association) (MSMA) e entidade que defende os interesses das equipes, fornecedores e patrocinadores International Road Racing Teams Association (IRTA) é operacionalizar um campeonato com 24 participantes, distribuídos entre 6 fabricantes, cada qual com 4 pilotos, 2 representando a equipe oficial e 2 uma independente, competindo em um calendário de no máximo 22 GPs.

 

Regulamento 2020 da MotoGP


A Suzuki pode ter conquistado o título de 2020 sem o benefício de uma equipe satélite, porém parece mais uma questão de "quando", não "se" a fábrica pretende expandir sua atuação na MotoGP. A presença da Suzuki no mundial está limitada a uma equipe oficial de fábrica desde o início da era dos quatro tempos em 2002.

 

Apoiar uma equipe de satélite requer o comprometimento de recursos extras, porém a contrapartida de fornecer aos engenheiros o acesso a muito mais dados de pista é atraente. São benefícios adquiridos tanto no curto prazo, ajudando na configuração em um fim de semana de corrida, quanto a longo prazo, ao decidir sobre o desenvolvimento futuro e os testes de novas peças. Para a Suzuki ter uma equipe independente é uma situação complexa porque sempre trabalharam com apenas dois equipamentos, não tem como saber os benefícios exatos de uma equipe de satélite.

 

A fábrica tem uma equipe de testes experiente, os pilotos Sylvain Guintoli, Takuya Tsuda e Naochimi Uramoto são excelentes e fornecem muitos feedbacks úteis. Foi suficiente para conquistar o título de 2020, embora o campeão Joan Mir tenha acumulado 171 pontos dos 350 possíveis, um desempenho medíocre quando comparado com os 420 pontos de um máximo de 475 obtidos por Márquez na temporada 2019. O acréscimo de dados coletados por pilotos de satélites durante a competição é importante para manter e melhorar a competitividade dos protótipos no futuro.

 

Existem poucas dúvidas que o melhor pacote da temporada 2020 foi a GSX-RR da Suzuki, que conquistou o campeonato com Mir e a 3ª colocação com Rins, por consequência é uma parceria cobiçada pelas equipes independentes em busca de uma colaboração futura.

 

A principal candidata nesta fase parece ser Gresini Racing, que recentemente confirmou que não vai continuar como equipe de fábrica da Aprilia e voltará ao status independente em 2022. A escolha do maquinário ainda não foi anunciada, mas Gresini já reservou uma de suas vagas de 2022 para o piloto da Moto2, Fabio Di Giannantonio.

 

Fabio Di Giannantonio – Speed Up Moto2


A Aprilia está programada para administrar a sua equipe de fábrica em 2022 e, embora seja possível que Gresini possa continuar com a Aprilia como uma equipe de satélite, Fausto Gresini descreve o futuro de sua equipe como um “projeto ambicioso, cujos detalhes devem ser revelados aos poucos”, um discurso que não parece se encaixar com uma transição de fábrica para status de satélite da Aprilia.

 

 A postura de Di Giannantonio também não respalda esta ideia, o jovem italiano já indicou que gostaria de pilotar pela Ducati, como seu ídolo Troy Bayliss, e um contrato diretamente com a Ducati Corse em vez de uma equipe independente seria o caminho normal. A imprensa noticiou que Di Giannantonio foi visto em negociações com Suzuki antes de fechar contrato com a Gresini. Como Mir e Rins tem contrato até o fim de 2023, a equipe de fábrica está definida em 2022 e surgiu um ruído de uma possível ligação futura entre Gresini e Suzuki. A imprensa especializada em motovelocidade noticiou que Di Giannantonio foi um dos pilotos da Moto2 (Marco Bezzecchi e Joe Roberts também foram citados) que recusaram a vaga de Andrea Iannone na Aprilia para a próxima temporada. Não precisa mais de 2 neurônios para entender que seria mais lógico Di Giannantonio pilotar para a equipe oficial da Aprilia em 2021 que esperar uma RS-GP de uma equipe satélite (Gresini) em 2022.

 

O italiano de 22 anos completou duas temporadas na Moto2 até agora, com Speed Up, conquistando quatro pódios. Para efeitos de comparação, Mir fez apenas uma temporada na Moto2 (quatro pódios, nenhuma vitória) antes de se juntar à Suzuki na MotoGP aos 21 anos.

 

Outro benefício de ter uma equipe de satélite é que um fabricante tem um lugar para colocar suas estrelas em ascensão (caso de Di Giannantonio) como preparação de uma promoção para a equipe de fábrica.


Sete Gibernau com uma Honda RC211V da Gresini Racing em 2003

 

A Gresini Racing tem histórico na principal classe do mundial de motociclismo, em 2003 seu piloto Sete Gibernau classificou em 2º lugar com uma Honda, entanto não é a única possibilidade de satélite para a Suzuki. A equipe Sepang, com suporte financeiro da Petronas, atualmente tem uma parceria exitosa com a Yamaha, venceu 6 GPs em 2020 e seu piloto Franco Morbidelli foi o segundo no mundial. Em 2018 quando avaliava a possibilidade de inscrever uma equipe na MotoGP houve negociações com a Suzuki, que ofereceu motos idênticas às da equipe oficial. Por arranjos comerciais houve uma decisão em favor da Yamaha, que ofereceu um conjunto de máquinas Factory-Spec (Quartararo) e um conjunto de A-Spec (Morbidelli). As conversas entre Sepang-Suzuki também implicam em que se a Suzuki estava pronta e disposta a apoiar uma equipe de satélite para 2019, portanto a ausência de mais GSX-RRs no grid é encontrar um parceiro adequado e não falta de recursos da fábrica. Como o contrato de Valentino Rossi com a Yamaha, que cedeu o piloto para a Sepang termina no final de 2021, não seria de todo descartado que os malaios e a Suzuki possam conversar sobre 2022.

 

O próprio Rossi é um dos muitos pilotos mais entusiasmados sobre o desempenho da Suzuki nesta temporada. Em 2021 seu irmão mais novo, Luca Marini, será apoiado pela na Avintia Ducati, decisão que pode ser entendida como um ensaio da presença de uma equipe própria de Valentino Rossi na MotoGP. A questão é, se isto ocorrer, que máquinas pretendem usar. 


Davide Brivio – “Capo di tutti capi” da Suzuki

 

A ligação de Rossi com o atual gerente da equipe Suzuki, Davide Brivio, é antiga. Brivio desempenhou um papel importante para convencer Rossi a fazer a mudança de Honda para a Yamaha no final de 2003, e atuou como administrador da equipe do Doctor em seus últimos anos de sucesso com a M1.

 

Ambos deixaram a Yamaha no final de 2010, Brivio continuou a assessorar o VR46 até assumir a oferta da Suzuki ano retorno da fábrica à MotoGP em 2015. Rossi não é econômico ao elogiar Davide, em suas palavras “A Suzuki trabalha muito bem. Brivio faz um trabalho fantástico, porque é capaz de equilibrar o que  é realizado no Japão com um trabalho muito forte na Itália. Especialmente em convencer os japoneses a trabalhar em conjunto com os europeus e italianos, que resulta em uma equipe muito forte.”

 

Alguns acreditam que a conexão entre Rossi & Brivio poderia abrir caminho para a VR46 (equipe) possa utilizar Suzukis em 2022. A vem de longa data, embora nos últimos anos o veterano campeão tenha sido muito ácido em suas críticas nas últimas temporadas. Certamente ser substituído por Quartararo e exportado para a Sepang Petronas não era o final de carreira que tinha planejado.

 

A criação de uma equipe VR46 para a MotoGP com M1s seria o lógico, porém é improvável que esteja nos planos dos nipônicos competir com 6 motos no grid. Outo movimento significativo foi a Monster Energy, uma das principais patrocinadoras da Yamaha, Rossi e VR46, anunciar que também estampar sua marca na Suzuki a partir da próxima temporada.




Ou seja, a Suzuki com várias opções competitivas de Satélite para 2022 e o a única certeza que existe é que a Gresini contratou Di Giannantonio para 2022 em outubro.