O livro que regulamenta o Campeonato Mundial da Federação Internacional de Motociclismo (FIM) especifica no parágrafo de 2.4.1 – MotoGP Class Technical Regulations – que motos participantes na classe MotoGP devem ser exclusivamente protótipos. Os candidatos a participação de GPs que não são membros do Motorcycles Sports Manufacturers’ Association (MSMA) necessitam de uma aprovação especial da Comissão de Grandes Prêmios. Por definição, protótipo é um produto de uma fase de testes e/ou planejamento de um projeto, conceito alinhado com o objetivo da competição servir como um laboratório para tecnologias que possam ser portadas no futuro para as linhas de produção.
A MotoGP utiliza
compulsoriamente um único fornecedor de pneus (Michelin) e eletrônicos
padronizados (Magneti Marelli), que implica em suspensão e freios como
principais áreas abertas para a concorrência livre em termos de fornecimento de
componentes por não fabricantes dos protótipos. O monopólio voluntário das
suspensões da indústria sueca Ohlins terminou quando a austríaca KTM fez a sua
estreia no grid no início de 2017, utilizando uma suspensão interna WP,
produzida por uma empresa do grupo.
Embora a austríaca KTM
seja fiel às suas convicções, design da moldura em aço tubular (outros concorrentes usam alumínio) e suspensão WP,
os sistemas de freios são da italiana Brembo, fornecedora de todos os
protótipos que alinham no grid. Desde que a Gresini abandonou os freios Nissin
(produzidos no Japão) a MotoGP tem um monopólio não oficial de fornecimento de
sistemas de freios. Todos os GPs da principal categoria desde 1995, incluindo
todos os 329 GPs desde a adoção dos motores 4 tempos em 2002, foram vencidos
com por equipamentos utilizando freios Brembo.
A indústria italiana Brembo produz, para cada
circuito onde é realizada uma etapa do mundial de MotoGP, um resumo dos
principais parâmetros de frenagem do traçado. Estes dados são compilados a
partir do know-how adquirido ao longo de anos de experiência. A “identidade” do
circuito contém especificações gerais e dados técnicos de cada ponto de
frenagem, materializado na forma de um diagrama claro e intuitivo onde mostra a
velocidade no início e fim da frenagem, tempo e distância necessários para
desacelerar o equipamento, força máxima que deve ser aplicada na alavanca do
freio e força de frenagem em cada curva. Cada circuito tem as próprias características.
O circuito de Brno na República Checa, por exemplo, é um dos mais exigentes. Entre
o km 2 e o km 5 o traçado tem aclives e declives que variam entre 376 metros
acima do nível do mar até 450 metros, uma cota de 74 metros. É um desafio extra
para os pilotos porque é completamente diferente reduzir a velocidade em trechos
planos e inclinados.
O piloto pode escolher entre utilizar discos
de 320 mm ou 340 mm de diâmetro, ambos são oferecidos em 2 modelos, High mass
ou Standard (low mass), os modelos 320 mm High Mass tem uma banda de frenagem
80% maior. Para cada formato de disco existem duas composições de carbono, que
se distinguem pela fricção inicial e resistência a altas temperaturas. Ao todo
existem 8 variações de disco para o freio dianteiro, com exceção de Motegi onde
a versão de 340 mm é obrigatória.
Vinales
pula da moto na Áustria
Estado da moto de Vinales depois do acidente
Uma das ocorrências mais assustadoras da
temporada de 2020 relacionada com os freios foi protagonizada por Maverick
Vinales, piloto da a equipe oficial da Yamaha, na segunda prova realizada na
Áustria. Baseados no histórico da primeira prova no mesmo circuito, o piloto e
sua tripulação resolveram não seguir as recomendações do fabricante para utilizar
as pinças modelo 2020 e equiparam a M1 com pinças modelo 2019. Durante a prova,
em uma reta onde os protótipos desenvolvem a velocidade máxima, o sistema de
freios sobreaqueceu e entrou em colapso.
O piloto sem poder desacelerar decidiu pular do equipamento para não
colidir com as proteções da pista. O tempo que Vinales levou entre identificar a
falha dos freios e a decisão de pular da moto foi frações de segundos. O
treinamento, controle e sangue frio do piloto evitaram um acidente de
proporções incalculáveis.
Os discos de freios evoluíram desde que a Brembo
estreou na MotoGP no início dos anos 70. Iniciando com os discos de alumínio utilizados
na década dos anos 80 para reduzir o peso, até os discos flutuantes que possuem
uma parte de alumínio que é fixado na roda e a pista de travagem exterior fixada
na parte central. Este arranjo singular permite um movimento mínimo lateral e
axial, que proporciona a total adaptação do disco às pastilhas de fricção, absorvendo
as tolerâncias. Como resultado a travagem é mais segura e o desgaste das
pastilhas é homogêneo. As primeiras versões eram híbridas de alumínio e ferro
fundido, que evoluíram para discos de alumínio e rotor de aço inoxidável. No
início dos anos 90 houve o desenvolvimento de discos flutuantes de carbono, utilizados
inicialmente na classe principal (500cc e posteriormente na MotoGP).
Evolução
dos discos de freios na MotoGP
Discos
de carbono permitem uma redução considerável do peso de massas não suspensas,
diminuem o efeito giroscópio tonando o equipamento mais amigável e tem um poder
de frenagem muito maior que os correspondentes em aço, porém a janela de
temperatura para obter a máxima eficiência é muito estreita. Uma das
habilidades que distinguem os bons pilotos é saber utilizar a volta de
apresentação e as primeiras curvas para aquecer os freios até a temperatura
ideal. Em caso de excesso de umidade, o usual é utilizar discos de aço, embora
capas protetoras mais eficientes permitam usar componentes de carbono na chuva.
A temperatura ambiente também influencia os sistemas de freios, mesmo em clima
(seco) frio os discos de carbono (com capa protetora ou não) continuam a ser a
opção mais adequada. O gerenciamento adequado da temperatura dos freios é um
diferencial dos bons pilotos da MotoGP
Características
dos freios na MotoGP
Em 2014, por solicitação dos fabricantes, o
Regulamento da MotoGP foi alterado para contemplar discos de freios maiores para
compensar a maior velocidade alcançada pelos protótipos. Até então as regras
permitiam para as rodas dianteiras dois diâmetros de disco de freio, 320 mm
utilizado em quase todas as pistas e 340 mm, obrigatório para Motegi e opcional
para Barcelona e Sepang. A alteração das regras permite que os 340 mm possam
ser utilizados em todos os circuitos onde o 320 mm é permitido, mantendo a
obrigatoriedade de 340 mm para Motegi.
As características principais das pastilhas de freio
de carbono utilizadas na MotoGP são alto coeficiente de atrito e eficiência
constante mesmo submetidas a altas temperaturas, desde que entre os limites da janela
de uso. Este comportamento resulta em frenagens eficientes e uniformes durante
toda uma competição, conservando a integridade do componente. Se exceder a
temperatura máxima, o coeficiente de atrito do carbono pode alterar e perder a
eficiência causando excesso de desgaste das pastilhas e discos.
Pastilhas
de freios na MotoGP
A primeira patente de cilindro mestre foi registrada pela Brembo em 1985, o projeto foi desenvolvido para suprir limitações de espaço nos protótipos. Em motos de competição são necessárias soluções compactas para reduzir dimensões gerais e melhorar a ergonomia do piloto, agregando conforto e eficácia no comando da alavanca de acionamento. Esse arranjo estrutural, entre outros benefícios, também permitiu a concepção do cilindro mestre de freio com o objetivo de otimizar as interações hidráulicas e mecânicas, a fim de melhorar o desempenho do produto. Em 1986 o cilindro mestre de freio radial equipou a Yamaha YZR OW 81 do americano Freddie Lawson, que venceu o campeonato da classe 500. O piloto apreciou a linearidade da resposta. A evolução da ideia desenvolveu novas vedações e melhorou o dispositivo de ajuste da alavanca no guidão.
Cilindro
mestre e alavanca
As
pinças de freio (cálipers) Brembo de alta performance combinam estabilidade com
os níveis de desempenho exigidos pelos protótipos da MotoGP. Cada modelo tem
tecnologia de manufatura exclusiva, são extremamente rígidas sob estresse e
garantem frenagens precisas e consistentes.
Existem 3 modelos de pinça dianteira e 1 de
pinça traseira, todas dimensionadas para suportar os esforços mais extremos.
Pinças (Cálipers) na
MotoGP