Adaptado de um original de Gary Watkins publicado na MotorSport de abril 2021
Gerard Ducarouge foi o gestor que a Equipe Lotus precisava para voltar à frente.
Gérard Ducarouge, que morreu aos 73 anos, não foi realmente o designer dos modelos dos Fórmula 1 Ligier JS11 ao Lotus 99T como é frequentemente creditado. Em vez disso, ele foi a força motriz por trás de Ligier e Lotus, bem como da Alfa Romeo por um curto período, um homem que liderou as equipes com energia e carisma, na oficina e nas pistas.
O piloto Bruno Giacomelli, que correu sob o comando do francês na Alfa Romeo entre 1981 e 1982 afirma: “nunca o vi em uma prancheta de desenho. ” Entretanto lembra-se dele sugerindo novas ideias no processo de design e impondo um novo dinamismo na equipe. O francês provavelmente teria o título de diretor técnico se estivesse trabalhando na F-1 nos dias atuais, porém assumiu um papel muito maior em uma época onde as equipes eram menos estruturadas. Guy Ligier, que o empregou de 1975 a 1981, provavelmente resume melhor quando diz: “Gérard estava em toda parte, fazendo tudo. ”
Certamente foi o caso na Lotus, a equipe que Ducarouge indiscutivelmente salvou quando entrou no início do verão de 1983. O fundador da equipe, Colin Chapman, havia morrido seis meses antes, mas perdeu o foco na F-1 pelo menos alguns anos antes. Ducarouge, recrutado pelo gerente da equipe Peter Warr, entrou e reorientou a organização assumindo o papel que Chapman havia protagonizado quando a Lotus estava em seu auge.
“Gérard basicamente assumiu exatamente o que Colin fez em seus melhores dias”, diz o designer de longa data da Lotus Martin Ogilvie. “É por isso que a Equipe Lotus se tornou bem-sucedida novamente”. Tony Rudd estava no comando na época e, por melhor que fossem suas intenções, não teria condições de transformar uma equipe de F-1. Precisávamos de alguém para nos mostrar o caminho. Gérard entrou e reorientou os esforços, com sucesso.
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Ducarouge não tinha um diploma de engenharia quando se juntou ao departamento de corridas da Matra, uma indústria da aviação, em meados da década de 1960. Permaneceu com o fabricante francês durante 10 anos. Trabalhou em seus programas de monopostos e foi promovido para a F-1, estava cedido à equipe de corridas de carros esportivos e conquistou um hat-trick nas 24 Horas de Le Mans, vitórias em 1972, 1973 e 1974.
Henri Pescarolo, que pilotava na época os protótipos MS670 de 3 litros, lembra de um “grande líder”. “Gérard era responsável pela construção dos carros, do projeto até as provas nas pistas”, diz ele. “Era um excelente engenheiro, fantástico em trabalhar com a mecânica na pista. Gérard foi uma parte importante de nossos sucessos com o 670. ”
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Ducarouge mudou-se para a Ligier quando o departamento de corridas da Matra encerrou suas atividades e entregou um suprimento de seus motores V12 para a nova equipe de F1. “Era o gestor principal”, segundo o antigo funcionário da Ligier Claude Galopin.
“Gérard entendeu totalmente o automobilismo”, diz Galopin. “Ele podia olhar para um carro e dizer o funcionava ou não. Seu trabalho era dirigir a equipe, mas também tinha muitas ideias que entravam nos carros. ”
Galopin ressalta que o time francês teve poucos sucessos depois que Ducarouge foi demitido pelo dono da equipe Guy Ligier em meados de 1981: “Os únicos momentos reais em que a equipe teve bons resultados foi quando Gérard estava trabalhando lá”.
Ducarouge foi rapidamente recrutado pela Alfa Romeo, e imediatamente fez a diferença. O Departamento de competição da empresa (Autodelta SpA) estava migrando do modelo 179C com que Giacomelli havia conquistado a pole para o Grande Prêmio leste dos EUA da temporada anterior em Watkins Glen para o 179D, um carro construído em torno de um novo chassi com distribuição de peso revisada, mantendo a aerodinâmica de seu antecessor. Ducarouge colocou o foco no carro mais novo.
“Depois que Gérard entrou, fizemos muitas modificações no 179D e tivemos um excelente segundo semestre na temporada, muito melhor do que nossos resultados mostraram”, diz Giacomelli, que conta que poderia ter vencido a final da temporada de 1981 no circuito montado no estacionamento do hotel Caesars Palace . “Rodei na pista no início da prova e perdi muito tempo. Em algum momento podia ver a Williams de Alan Jones, que estava liderando, nos meus retrovisores. No final, eu estava apenas 20 segundos atrás em terceiro. Essa foi uma das minhas melhores corridas. ” Nesta prova Nelson Piquet conquistou seu primeiro título mundial.
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Ducarouge permaneceu com a Alfa Romeo, que terceirizou sua operação na F-1 para a Euroracing de Paolo Pavanello em 1982, até ser demitido sem cerimônia depois que Andrea de Cesaris perdeu seu primeiro tempo de qualificação no GP da França de 1982 (o carro foi considerado abaixo do peso mínimo, esqueceram de encher o extintor de incêndio). Foi o melhor que poderia ter acontecido com ele, abriu a oportunidade de juntar-se a Lotus, onde passou os melhores anos de sua carreira.
A equipe britânica estava desenvolvendo o seu primeiro carro com o motor Renault, o 93T, exigido por Chapman antes de sua morte. Ducarouge estimulou o desenvolvimento de um novo carro. “Gérard olhou para o 93T e decidiu que era muito grande, nunca ganharia corridas”, lembra Ogilvie. “Então ele olhou para o velho 87/88 e decidiu que poderíamos fazer algo com o mesmo chassi. Desenhou algumas linhas básicas de corpo durante o primeiro fim de semana e nos deu as diretrizes para um novo projeto. ”
Também trouxe pessoas necessárias para completar o novo desenvolvimento em cinco semanas e manter o cronograma do 94T, que ficou pronto para o Grande Prêmio da Inglaterra.
“Nossos fabricantes de estamparia usavam modelos de madeira maciça e betume Isopon P38 para preencher falhas e imperfeições nas superfícies, um processo muito lento para Gérard, então ele trouxe um sujeito da França que fez isso em gesso”, diz Ogilvie. “Ele produziu algumas carenagens frontais do bico utilizando moldes de gesso ainda úmidos. ”
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Menos de seis semanas após a chegada de Ducarouge, dois 94Ts com motor Renault estavam no grid em Silverstone. Elio de Angelis se classificou em quarto e Nigel Mansell terminou a prova nesta posição, embora tenha largado em 18º no grid, depois que toda a fiação do seu carro foi trocada durante a noite. Elio de Angelis desligou inadvertidamente sua ignição na segunda volta, não há como saber que resultado poderia ter alcançado.
Ducarouge supervisionou o capítulo final de ouro na história da Equipe Lotus com Ayrton Senna. Inspirou a equipe da mesma forma que Chapman havia feito antes dele, com uma diferença. “Chapman exigia lealdade”, diz Ogilvie, “mas Ducarouge conquistava lealdade. ” Colin dizia: “Acho que devemos fazer isso”, enquanto Gérard dizia: “Eu sei que devemos fazer isso”. Ele tinha estado na Matra, uma empresa aeroespacial, e tinha feito uma porção de ensaios empíricos. Trouxe algumas ideias sobre geometria de suspensão, camber e caster. Não tenho certeza se ele as entendeu completamente, mas colocou em prática e funcionou. ”
A atmosfera sob Ducarouge também era muito diferente da que Chapman promoveu. Não havia discussões acaloradas ou ataques de raiva. “Gérard era um cara muito legal”, continua Ogilvie. “Todas as manhãs circulava pela fábrica dizendo bom dia e cumprimentando a todos, independentemente da hierarquia ou função. Estava sempre calmo e eu acho que nunca ouvi ele levantar a voz. “
Ducarouge deixou a Lotus em 1989 e foi trabalhar para a equipe Larrousse F1. Ele teve um curto período de volta na Ligier e também na Matra, onde trabalhou na logística de equipamentos e pessoal envolvidos com a F1.
Nunca esteve no comando de uma equipe vencedora de um título na Fórmula 1, o mais próximo foi com Senna em 1986, ano em que o brasileiro conquistou oito poles com o Lotus-Renault 98T. Também esteve próximo depois que a Ligier dominou as duas primeiras etapas da temporada de 1979 em Buenos Aires e Interlagos com Jacques Laffite e o novo motor Cosworth JS11. O desafio pelo título rapidamente saiu dos trilhos e há um folclore que as chances da equipe desapareceram junto com o pacote de cigarros – Gitanes presumivelmente – no qual a configuração do carro havia sido rabiscada.
Contam que o túnel de Venturi responsável pelo efeito solo no JS11 estava deformando o assoalho por conta das forças brutais do downforce geradas pelo carro. Galopin ri da história que provavelmente foi uma invenção da imprensa britânica. Só há uma descrição para isso, ele diz: “Puro lixo”.
Fluxo de ar em um carro asa
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