sábado, 3 de abril de 2021

MotoGP - Temporada 2021 – Aprilia, Holeshot & Chattering

 

Temporada 2021 – Aprilia, Holeshot & Chattering


A Aprilia tem sido o patinho feio da MotoGP. Sua participação não é um esquema tradicional de equipe de fábrica, é representada pela gestão compartilhada com uma equipe independente, a Gresini Racing, e desde o início da sua participação efetiva do RS-GP no mundial em 2015 tem sido sempre a pior classificada no campeonato de construtores. 

Aprilia é uma empresa italiana produtora de motocicletas subsidiária do Grupo Piaggio, um complexo industrial italiano que produz uma série de veículos de duas rodas e veículos comerciais compactos sob 7 marcas: Piaggio, Vespa, Gilera, Aprilia, Moto Guzzi, Derbi e Scarabeo.


 
Grupo Piaggio – Controlador da Aprilia


No final de 2019 a Aprilia comunicou ao seu parceiro que havia decidido ter uma representação própria a partir de 2022, e que possivelmente teria uma associação com uma independente. A Gresini Racing seria uma escolha óbvia, embora a equipe estivesse atenta ao mercado com possibilidades de abrir negociações com outro fabricante (Suzuki).

Os planos da Aprilia sofreram dois contratempos. A empresa investiu em um equipamento radicalmente novo para 2020, porém foi abalada pelo caso de dopping de Andrea Iannone que impediu a continuidade da cooperação do piloto com o desenvolvimento do protótipo e pela ocorrência da Covid. A empresa foi muito prejudicada pela pandemia, sua equipe técnica estava confiante que o novo motor V4 de 90 graus poderia ser trabalhado protegido pelos regulamentos de concessão, escritos para permitir que fabricantes em dificuldades terem alguma chance de competir com as equipes tradicionais.

Com o agravamento da pandemia a nível mundial a MotoGP incluiu alguns regulamentos de redução de custos de emergência, que proibiram todas as equipes de atualizar seu aero e impediu as fábricas de concessões de atualizar seus motores. A Aprilia foi obrigada a competir toda a temporada de 2020 com um propulsor que rodou pela primeira vez nos testes em fevereiro, poucas semanas antes da primeira corrida. A temporada para o fabricante também iniciou com uma carenagem com muito pouco downforce, desenvolvida para a pista que devia hospedar a prova inicial da temporada (Losail) e inadequada para a maioria dos circuitos. Com a proibição das atualizações não houve como adequar o equipamento e a moto competiu toda a temporada com deficiência de downforce.


Aprilia de Aleix Espargaró lidera a Honda de Pol Espargaró


Durante os testes abreviados de pré-temporada este ano, apenas 5 dias em Losail, a RS-GP se saiu bem melhor. O motor V4 de graus tem várias vantagens, um equilíbrio primário perfeito, mais forte e mais ajustável. Permite uma maior variedade de configurações de disparo desequilibrada (big bang) que ajuda os engenheiros a modular o torque que os pilotos podem aproveitar, um motor que melhor entrega torque e mais potência.

O fator de desempenho que convenceu a Aprilia a apostar no V4 90 graus não foi a saída de curvas, foi a velocidade de entrada em curvas. A configuração 90 graus oferece o layout de escape mais simples que permite usar válvulas de escape para melhorar a frenagem do motor da moto.

A Ducati e Suzuki também possuem válvulas de escape ajustáveis, a Yamaha desenvolveu um sistema chamado Exhaust Ultimate Power Valve (EXUP) que consiste no acionamento por software de um motor hidráulico que abre e fecha as válvulas, para obter desempenho superior em baixa e média rotação, e permite a entrega de potência mais linear. As válvulas de escape variam a pressão traseira no escapamento para criar um efeito na frenagem do motor. Honda, KTM não possuem válvulas de escape.

O RS-GP de 2021 é muito diferente da moto 2020, o peso é reduzido em parte devido a um braço oscilante de fibra de carbono, O equipamento está abaixo do limite mínimo, que permite aos engenheiros ajustar o lastro de forma a obter um maior equilíbrio geral e experimentar diferentes aparelhos e dispositivos. A confiabilidade do motor ainda é uma incógnita porque o motor não tem quilometragem. 

Um upgrade significativo é a estrutura do banco traseiro, que desempenha um papel importante na harmonia da moto. No ano passado, em algumas pistas, o equipamento sofreu com “chattering”, talvez pela aderência extra fornecida pelo último componente traseiro desenvolvido pela Michelin.


Soma de frequências de vibrações


Chattering é o termo té cnico que descreve um comportamento do protótipo que prejudica o trabalho dos pilotos em condições de competição. O esqueleto de uma moto é o chassi, a estrutura que mantém unidos os vários componentes do equipamento. O seu comportamento e o equilíbrio correto entre rigidez e flexibilidade determinam a competitividade do conjunto. Problemas de concepção do chassi podem resultar em um dos problemas mecânicos que mais prejudicam os pilotos. Quando diversos componentes vibram em frequências muito próximas, e sempre que uma máquina está rodando na pista seus elementos vibram em maior ou menor grau, estas vibrações podem entrar em ressonância e inviabilizar a condução da moto. 

Um dos inconvenientes do chattering consiste na multiplicidade de fatores que podem originar o problema. Um projeto de equipamento não compatível com o chassi, uma configuração malfeita, umas infinidades de outras pequenas causas são suficientes para que os pilotos sintam esta vibração incômoda. A primeira dificuldade é localizar e neutralizar a principal origem, o componente com vibração excessiva, antes de tentar encontrar uma solução. É mais provável encontrar esta situação quando existe muita aderência, quanto maior for o contato de um pneu com a pista, maiores são as sensações que o piloto recebe. Se houver um desconforto ao condutor causado por vibrações, é improvável que consiga extrair do equipamento o seu melhor desempenho.

Apesar do novo design aerodinâmico, a Aprilia ainda pode sofrer com problemas em algumas pistas. A carenagem 2021 é muito melhor do que a versão 2020, porém a Aprilia tem apenas um pacote aero para a moto 2021, enquanto as outras fábricas podem alternar entre seus pacotes de 2020 e 2021. O foco da P&D na Aprilia 2021 será o motor (especialmente a potência máxima), câmbio, eletrônica e chassi. A fábrica italiana foi quem lançou na MotoGP as válvulas pneumáticas (influência da Cosworth da Fórmula 1).

 

Peco Bagnaia aciona o dispositivo holeshot no fim da volta de apresentação


No jargão do motociclismo esportivo “holeshot” é um termo utilizado para identificar o competidor que lidera na primeira curva depois da largada. Por extensão, “dispositivo holeshot” é um equipamento utilizado exclusivamente na largada para proporcionar uma vantagem que permita ao protótipo chegar na frente no primeiro contorno. Em um esporte onde seis fabricantes produzem protótipos, conduzidos pelos melhores pilotos do mundo, que percorrem voltas separados por milésimos de segundos, contornar a primeira curva na liderança pode significar uma vantagem no resultado final de uma corrida.

O recurso de “dispositivos holeshot” não é propriamente uma inovação técnica, foi utilizado à mais de uma década atrás pela Honda na Superbike britânica (BSB). O princípio foi comprimir o garfo da suspensão dianteira para reduzir o “wheelie”, tendência de a moto empinar quando é aplicada potência na roda motriz. Trabalhar o curso dos garfos de suspensão é um recurso comum no motociclismo esportivo, enquanto na motocross pilotos ou mecânicos tinham que executar esta regulagem à mão com a moto parada, o sistema utilizado pela Honda na BSB era pneumático, ativado por controle eletrônico com o equipamento em movimento.

As regras de Mundial de MotoGP que endereçam suspensão e amortecedores são específicas: “Não são permitidos controles elétrico/eletrônicos para alterar regulagens da suspensão e amortecedores. Adequações só podem ser feitas manualmente por mecânicos ou por dispositivos mecânico/hidráulicos”. 

Praticamente todos os fabricantes utilizam dispositivos holeshot, que podem atuar nos garfos dianteiros ou na suspenção traseira. A eficiência deste recurso é inquestionável, na largada da prova inicial desta temporada as motos Ducati conseguiram utilizar toda a potência de seus motores e ocuparam as 4 primeiras posições na primeira curva, destaque para o novato Jorge Martin que largou da 14ª posição do grid e contornou a primeira curva em 4º. 

Maverick Vinales venceu o GP do Catar em 2017, em seu primeiro ano de contrato com a Yamaha, em 2018 & 2019 a Ducati de Andrea Dovizioso superou a Honda de Marc Márquez. O traçado da pista de Losail contempla uma reta extensa, apropriada para a potência dos motores V4 da Ducati, e um trecho sinuoso onde os motores com cilindros em linha (Yamaha e Suzuki) podem exercer sua velocidade em curvas.

 
Quatro Ducatis (Bagnaia, Miller, Zarco & Martin) disparam na frente na largada, ignorando as Yamaha


Em 2021 a largada foi espetacular, as Ducati utilizaram com competência os dispositivos holeshot, o pole Francesco Bagnaia, seu colega de eq uipe Jack Miller e Johann Zarco, equipados com Desmosedici GP21, seguidas pelo surpreendente Jorge Martin com uma GP20 ignoraram as Yamaha que estavam na primeira fila. Um dos favoritos da prova, Franco Morbidelli, partiu da 7ª posição caiu para 20º. 

O trio Yamaha de Vinales, Fabio Quartararo e Valentino Rossi da SRT se reagruparam na volta inicial, com Quartararo ocupando a 5ª posição. Logo ficou evidente que o ritmo de Jorge Martin estava atrasando os demais e ele foi ultrapassado consecutivamente por Quartararo na Curva 6 e Vinales na curva 10 da terceira volta.

Enquanto Bagnaia estabelecia uma pequena vantagem sobre Zarco, Quartararo ultrapassou Miller na volta 6, o australiano perdeu a posição para Vinales duas voltas mais tarde. Duas voltas depois Maverick Vinales superou seu companheiro de equipe assumindo o terceiro lugar.

Vinales ultrapassou Zarco e os caprichos do clima o ajudaram a manter a posição na longa reta, o forte vento contrário impediu a Ducati de utilizar a sua maior potência. O piloto espanhol conquistou a liderança ultrapassando Bagnaia na volta 15, em uma manobra onde as motos ficaram muito perto de se tocarem. Quando conseguiu a pista limpa à sua frente, Vinales conseguiu abrir uma pequena vantagem enquanto as Ducati começaram a apresentar problemas de aderência pelo consumo dos pneus. 

Maverick Vinales não foi ameaçado na última volta para conseguir sua nona vitória na MotoGP e assumir uma liderança antecipada no campeonato.

Mir, o atual campeão do mundo e piloto da Suzuki, saiu da 10ª colocação no grid e galgou para pegar o segundo de Zarco na Curva 15 na última volta. Para sua infelicidade cometeu talvez o seu único erro ao abrir demais a última curva e ser ultrapassado pelas Ducati a poucos metros da bandeira quadriculada. 

A prova de Losail apresentou alguns resultados não esperados como o fracasso da equipe Sepang Petronas. Valentino Rossi (12º) sofreu um “apagão” de grip durante a prova e seu companheiro Franco Morbidelli (18º) não conseguiu desarmar o holeshot (na Yamaha é só na traseira e controlado por um pistão hidráulico) e ficou inviável no trecho sinuoso. 


 Franco Morbidelli foi prejudicado pelo mau funcionamento do holeshot


As  Honda da equipe de fábrica classificaram-se na zona de pontuação (Pol em 8º e Bradl em 11º), resultados não totalmente satisfatórios, porém melhores que as KTM oficiais (Miguel em 13º e Brad em 14º).

O desastre total ficou por conta de Danilo Petrucci, queda na volta inicial e com a dupla da LCR Nakagami e Alex Márquez que também não concluíram a prova

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