quinta-feira, 22 de abril de 2021

F1 - Gérard Ducarouge: o homem que salvou a Equipe Lotus


Adaptado de um original de Gary Watkins publicado na MotorSport de abril 2021
 

Gerard Ducarouge foi o gestor que a Equipe Lotus precisava para voltar à frente.
 

Gérard Ducarouge, que morreu aos 73 anos, não foi realmente o designer dos modelos dos Fórmula 1 Ligier JS11 ao Lotus 99T como é frequentemente creditado. Em vez disso, ele foi a força motriz por trás de Ligier e Lotus, bem como da Alfa Romeo por um curto período, um homem que liderou as equipes com energia e carisma, na oficina e nas pistas.

O piloto Bruno Giacomelli, que correu sob o comando do francês na Alfa Romeo entre 1981 e 1982 afirma: “nunca o vi em uma prancheta de desenho. ” Entretanto lembra-se dele sugerindo novas ideias no processo de design e impondo um novo dinamismo na equipe. O francês provavelmente teria o título de diretor técnico se estivesse trabalhando na F-1 nos dias atuais, porém assumiu um papel muito maior em uma época onde as equipes eram menos estruturadas. Guy Ligier, que o empregou de 1975 a 1981, provavelmente resume melhor quando diz: “Gérard estava em toda parte, fazendo tudo. ”

Certamente foi o caso na Lotus, a equipe que Ducarouge indiscutivelmente salvou quando entrou no início do verão de 1983. O fundador da equipe, Colin Chapman, havia morrido seis meses antes, mas perdeu o foco na  F-1 pelo menos alguns anos antes. Ducarouge, recrutado pelo gerente da equipe Peter Warr, entrou e reorientou a organização assumindo o papel que Chapman havia protagonizado quando a Lotus estava em seu auge.

“Gérard basicamente assumiu exatamente o que Colin fez em seus melhores dias”, diz o designer de longa data da Lotus Martin Ogilvie. “É por isso que a Equipe Lotus se tornou bem-sucedida novamente”. Tony Rudd estava no comando na época e, por melhor que fossem suas intenções, não teria condições de transformar uma equipe de F-1. Precisávamos de alguém para nos mostrar o caminho. Gérard entrou e reorientou os esforços, com sucesso.


Ducarouge ouve Senna em 85 – o tupiniquim faria sua estreia na Lotus naquele ano
 

Ducarouge não tinha um diploma de engenharia quando se juntou ao departamento de corridas da Matra, uma indústria da aviação, em meados da década de 1960. Permaneceu com o fabricante francês durante 10 anos. Trabalhou em seus programas de monopostos e foi promovido para a F-1, estava cedido à equipe de corridas de carros esportivos e conquistou um hat-trick nas 24 Horas de Le Mans, vitórias em 1972, 1973 e 1974.

Henri Pescarolo, que pilotava na época os protótipos MS670 de 3 litros, lembra de um “grande líder”. “Gérard era responsável pela construção dos carros, do projeto até as provas nas pistas”, diz ele. “Era um excelente engenheiro, fantástico em trabalhar com a mecânica na pista. Gérard foi uma parte importante de nossos sucessos com o 670. ”
 

Vitória no Estoril - Ayrton Senna venceu o GP da Portugal de 1985
 
Ducarouge mudou-se para a Ligier quando o departamento de corridas da Matra encerrou suas atividades e entregou um suprimento de seus motores V12 para a nova equipe de F1. “Era o gestor principal”, segundo o antigo funcionário da Ligier Claude Galopin.

“Gérard entendeu totalmente o automobilismo”, diz Galopin. “Ele podia olhar para um carro e dizer o funcionava ou não. Seu trabalho era dirigir a equipe, mas também tinha muitas ideias que entravam nos carros. ” 

Galopin ressalta que o time francês teve poucos sucessos depois que Ducarouge foi demitido pelo dono da equipe Guy Ligier em meados de 1981: “Os únicos momentos reais em que a equipe teve bons resultados foi quando Gérard estava trabalhando lá”.

Ducarouge foi rapidamente recrutado pela Alfa Romeo, e imediatamente fez a diferença. O Departamento de competição da empresa (Autodelta SpA) estava migrando do modelo 179C com que Giacomelli havia conquistado a pole para o Grande Prêmio leste dos EUA da temporada anterior em Watkins Glen para o 179D, um carro construído em torno de um novo chassi com distribuição de peso revisada, mantendo a aerodinâmica de seu antecessor. Ducarouge colocou o foco no carro mais novo.

“Depois que Gérard entrou, fizemos muitas modificações no 179D e tivemos um excelente segundo semestre na temporada, muito melhor do que nossos resultados mostraram”, diz Giacomelli, que conta que poderia ter vencido a final da temporada de 1981 no circuito montado no estacionamento do hotel Caesars Palace . “Rodei na pista no início da prova e perdi muito tempo. Em algum momento podia ver a Williams de Alan Jones, que estava liderando, nos meus retrovisores. No final, eu estava apenas 20 segundos atrás em terceiro. Essa foi uma das minhas melhores corridas. ”  Nesta prova Nelson Piquet conquistou seu primeiro título mundial.
 

FÓRMULA 1: “Nosso passado promove o nosso futuro” - 70º Aniversário


Ducarouge permaneceu com a Alfa Romeo, que terceirizou sua operação na F-1 para a Euroracing de Paolo Pavanello em 1982, até ser demitido sem cerimônia depois que Andrea de Cesaris perdeu seu primeiro tempo de qualificação no GP da França de 1982 (o carro foi considerado abaixo do peso mínimo, esqueceram de encher o extintor de incêndio). Foi o melhor que poderia ter acontecido com ele, abriu a oportunidade de juntar-se a Lotus, onde passou os melhores anos de sua carreira.

A equipe britânica estava desenvolvendo o seu primeiro carro com o motor Renault, o 93T, exigido por Chapman antes de sua morte. Ducarouge estimulou o desenvolvimento de um novo carro. “Gérard olhou para o 93T e decidiu que era muito grande, nunca ganharia corridas”, lembra Ogilvie. “Então ele olhou para o velho 87/88 e decidiu que poderíamos fazer algo com o mesmo chassi.  Desenhou algumas linhas básicas de corpo durante o primeiro fim de semana e nos deu as diretrizes para um novo projeto. ”

Também trouxe pessoas necessárias para completar o novo desenvolvimento em cinco semanas e manter o cronograma do 94T, que ficou pronto para o Grande Prêmio da Inglaterra.

“Nossos fabricantes de estamparia usavam modelos de madeira maciça e betume Isopon P38 para preencher falhas e imperfeições nas superfícies, um processo muito lento para Gérard, então ele trouxe um sujeito da França que fez isso em gesso”, diz Ogilvie. “Ele produziu algumas carenagens frontais do bico utilizando moldes de gesso ainda úmidos. ”
 

Ducarouge e o engenheiro Steve Hallam consultam Senna em 86, no ano o brasileiro conquistou oito poles para a Lotus
 

Menos de seis semanas após a chegada de Ducarouge, dois 94Ts com motor Renault estavam no grid em Silverstone. Elio de Angelis se classificou em quarto e Nigel Mansell terminou a prova nesta posição, embora tenha largado em 18º no grid, depois que toda a fiação do seu carro foi trocada durante a noite. Elio de Angelis desligou inadvertidamente sua ignição na segunda volta, não há como saber que resultado poderia ter alcançado.

Ducarouge supervisionou o capítulo final de ouro na história da Equipe Lotus com Ayrton Senna. Inspirou a equipe da mesma forma que Chapman havia feito antes dele, com uma diferença. “Chapman exigia lealdade”, diz Ogilvie, “mas Ducarouge conquistava lealdade. ”  Colin dizia: “Acho que devemos fazer isso”, enquanto Gérard dizia: “Eu sei que devemos fazer isso”. Ele tinha estado na Matra, uma empresa aeroespacial, e tinha feito uma porção de ensaios empíricos. Trouxe algumas ideias sobre geometria de suspensão, camber e caster. Não tenho certeza se ele as entendeu completamente, mas colocou em prática e funcionou. ”

A atmosfera sob Ducarouge também era muito diferente da que Chapman promoveu. Não havia discussões acaloradas ou ataques de raiva. “Gérard era um cara muito legal”, continua Ogilvie. “Todas as manhãs circulava pela fábrica dizendo bom dia e cumprimentando a todos, independentemente da hierarquia ou função. Estava sempre calmo e eu acho que nunca ouvi ele levantar a voz. “

Ducarouge deixou a Lotus em 1989 e foi trabalhar para a equipe Larrousse F1. Ele teve um curto período de volta na Ligier e também na Matra, onde trabalhou na logística de equipamentos e pessoal envolvidos com a F1.

Nunca esteve no comando de uma equipe vencedora de um título na Fórmula 1, o mais próximo foi com Senna em 1986, ano em que o brasileiro conquistou oito poles com o Lotus-Renault 98T. Também esteve próximo depois que a Ligier dominou as duas primeiras etapas da temporada de 1979 em Buenos Aires e Interlagos com Jacques Laffite e o novo motor Cosworth JS11. O desafio pelo título rapidamente saiu dos trilhos e há um folclore que as chances da equipe desapareceram junto com o pacote de cigarros – Gitanes presumivelmente – no qual a configuração do carro havia sido rabiscada.

Contam que o túnel de Venturi responsável pelo efeito solo no JS11 estava deformando o assoalho por conta das forças brutais do downforce geradas pelo carro. Galopin ri da história que provavelmente foi uma invenção da imprensa britânica. Só há uma descrição para isso, ele diz: “Puro lixo”.
 

Fluxo de ar em um carro asa
 

quarta-feira, 21 de abril de 2021

MotoGP - O ocaso de uma lenda



No último fim de semana (18/04) houve a 3ª etapa do Mundial de MotoGP 2021 no Autódromo Internacional do Algarve, em Portimão. Duas notícias dividiram a atenção da mídia, a 3ª vitória consecutiva da Yamaha, segunda de Fabio Quartararo, e o regresso, depois de um afastamento de 265 dias causado pela fratura do braço direito, de Marc Márquez. A queda de Valentino Rossi na 14ª volta foi uma notícia marginal. Uma nova geração busca afirmação, um vencedor busca manter sua hegemonia e uma lenda sonha com suas glórias do passado.

 
Queda em Portimão
 

A última vitória de Valentino Rossi em uma prova oficial do mundial de MotoGP aconteceu em julho de 2017, com uma Yamaha, em Assen na Holanda. Na época ele já havia perdido o papel de principal desafiante aos títulos sucessivos da Honda de Márquez para a Ducati de Andrea Dovizioso. Os resultados obtidos por Rossi desde 2017 não condizem com a sua história e importância na motovelocidade. Em 2018 obteve a 3ª colocação no mundial, com um déficit de 123 pontos em relação ao campeão. Em 2019 foi o 7º classificado, com expressivos 246 pontos o separando do vencedor do título na temporada e sua pontuação foi menor que as Yamaha de Maverick Vinales (equipe oficial) e Fábio Quartararo (satélite). O ano de 2020 foi um desastre total, amargou a 15ª posição na classificação geral e comandou a pior colocada das quatro YZR-M1 inscritas na competição.
 
Em função da ausência de resultados e da política de renovação da Monster Yamaha, perdeu a sua condição de piloto oficial de fábrica e migrou para a Sepang Petronas, equipe satélite, com a promessa de dispor sempre de um equipamento no estado da arte, com todas as atualizações.
 
Em diversas entrevistas já divulgadas na mídia o italiano tem reiterado que a aposentadoria será considerada a partir do momento em que não se sentir mais competitivo, Rossi não se contenta em apenas participar, quer ser protagonista. Ao que tudo indica, este dia está próximo.


 Valentino Rossi no comando de uma YZR-M1  da Sepang Petronas
 

Há alguns anos, como é natural para todos os esportistas de sucesso, Valentino Rossi iniciou a fase de declínio em sua carreira. O que quase ninguém previa era um colapso acentuado no seu desempenho em um prazo relativamente curto. Várias possíveis razões podem ter contribuído: , a ascensão de novos talentos como Quartararo, Joan Mir, Francesco Bagnaia e até seu antigo aluno e amigo particular Franco Morbidelli; as contínuas tentativas dos promotores da MotoGP de aumentar a competitividade do campeonato nivelando os protótipos por limitações nas regras; a nova concepção dos pneus Michelin que introduziu uma nova variável na equação de ajuste da configuração dos equipamentos.
 
A Yamaha pagou caro por sua decisão de optar por entender os segredos do software Magneti Marelli imposto como obrigatório a partir de 2016, utilizando apenas recursos próprios (Do it yourself – DIY), enquanto as outras fabricantes preferiram atalhos contratando engenheiros e técnicos que participaram da concepção da eletrônica padronizada para uso da MotoGP. Para esta temporada o fábrica recrutou pessoal especializado da fornecedora do software padrão e técnicos da Ducati, que trabalham com os produtos Magneti Marelli há décadas. Talvez esta manobra explique a sensível melhora dos equipamentos na pista.
 
Existe um fator externo que pode estar associado aos últimos maus resultados de Rossi, após testar positivo para o Corona Vírus, seu único resultado aceitável foi a colocação na 2ª fila de largada no GP de abertura desta temporada. Um contraste radical com a posição de largada na 2ª prova no Catar onde conseguiu estar à frente apenas do novato Lorenzo Salvatori da Aprilia, na última fila. Rossi só havia largado um GP nas últimas posições devido a penalizações, como em Valência em 2015, por ter provocado a queda de Marc Márquez no episódio que ficou conhecido como “Incidente de Sepang”.  
 

 Rossi & Márquez no Incidente em Sepang (2015)


A comprovação numérica dos maus resultados de Rossi pode ser identificada desde novembro de 2020. Até o GP da França realizado de 9 a 11 de outubro, seu desempenho não era brilhante, em Le Mans ele tinha sido o 8º no primeiro livre, 7º no FP3, 4º no FP4, 10º no classificatório e 12º no treino livre e aquecimento (warm-up). Na corrida, disputada em piso molhado, sofreu uma queda.

Em 15 de outubro de 2020 um exame de rotina diagnosticou contaminação por Corona vírus, Rossi perdeu as duas provas disputadas em Aragon por estar em quarentena e retornou no GP da Europa, disputado em Valência. Desde então seu desempenho é irreconhecível, como mostra o quadro abaixo:
 
 
GPTemporadaGrid de largadaClassificação
Europa 2020 19 NC
Valência 2020 15 12
Portimão 2020 14 12
Losail 1 2021 4 12
Losail 2 2021 21 16
Portimão 2021 17 NC
 

O experiente piloto que em 22 temporadas na principal classe do motociclismo esportivo (26 incluindo as classes de acesso), contabiliza 417 GPs com 115 vitórias, acumulou 6317 pontos e 9 campeonatos mundiais (em todas as categorias), nos 3 GPs disputados este ano ficou atrás das duas Yamaha da equipe oficial, embora tenha um equipamento idêntico. Enquanto Quartararo lidera com 61 pontos e Vinales tem 41 na contagem geral, Rossi conseguiu apenas 4, que o classifica na 18ª posição.

A análise das temporadas de 2020 e 2021 registra em 17 GPs apenas um pódio, o 3º lugar no GP da Andaluzia, 2ª etapa da temporada passada. Depois disso seus melhores resultados foram um 4º lugar em Misano e dois 5ºs em Brno e Red Bull Ring.

Todos os números indicam que depois de contrair a Covid 19 Valentino Rossi não se encontrou mais nas pistas. Ninguém discute o talento e a coragem de um atleta de 42 anos, que disputa espaço com gerações bem mais jovens, porém a biografia do decano das pistas está sendo manchada por esta sucessão de maus resultados, e é complicado dividir a culpa com um equipamento que venceu todas as provas desta temporada.
 

segunda-feira, 12 de abril de 2021

MotoGP - Retorno do rei: Marc Márquez está de volta









Original de Mat Oxley
Publicado em 12/04/2021 na
revista Motosportmagazine
 

Marc Márquez volta à ação em Portugal neste fim de semana. É candidato ao título de 2021? Os números sugerem que sim, mesmo que marque 40% menos pontos do que fez em 2019.

 
Marc Márquez e o chefe de equipe Santi Hernandez em Barcelona

 

Nos últimos nove meses, a MotoGP tem sido como o ringue de boxe sem Muhammad Ali, o campo de futebol sem Pelé e o grid de Fórmula 1 sem Ayrton Senna.

Praticamente todos os anos, os recordes de volta da MotoGP são quebrados, mas não na temporada passada, porque o homem mais rápido do grid não estava por perto para acelerar fundo no desconhecido.

Agora finalmente Marc Márquez está de volta, depois de três operações e muitos momentos em que pareceu que sua carreira estava encerrada.

Durante os 34 anos que trabalhei na MotoGP, há muito tempo percebi que é inútil usar minhas ideias para julgar o que os pilotos profissionais podem alcançar diante das adversidades, porque não sei o que acontece dentro de suas cabeças quando eles se machucam.

Quando corri “trocentos” anos atrás passei a não gostar da dor. Quando me machucava, permitia que minha mente se concentrasse no que tinha feito de errado e de alguma forma esperava voltar no tempo, para evitar aquele milissegundo de um erro e continuar andando em volta das pistas de corrida, em vez de me contorcer em casa.

Meu desejo de correr novamente desaparecia a cada fratura ou concussão. É realmente o que quero? Não é só a dor física, é a mentira no hospital por semanas, o tédio, a falta dos amigos e da namorada, então mais semanas mancando de muletas, sentindo inveja de todos desfrutando de seus braços e pernas. Seus bastardos sortudos!

Pilotos não são assim. Eles consideraram que as fraturas, a dor, o sofrimento e os dias e semanas em hospitais são totalmente inevitáveis na sua profissão. Então, quando se machucam, por mais que grave que seja, não é grande coisa. Sabem que vai acontecer, então não lamentam tentando voltar no tempo. Nunca olham para trás; só olham para a frente.

Quando os pilotos transformam sua bravura em um grande resultado, são saudados como heróis. Quando os heroísmos dão errado, são chamados de insensatos, impetuosos, imprudentes. A linha entre que separa as duas atitudes é tão fina quanto um osso escafoide.

Márquez já foi chamado de heroico e imprudente. Qual será desta vez?

Nove meses é muito tempo sem correr de moto, mas ele já passou por esta experiência. Em algum lugar pior, na verdade. No final de 2011 (Moto2), Márquez teve uma grande queda em Sepang – não por sua culpa – e bateu no chão com tanta força que viu tudo dobrado por meses. Não foi só uma dose ruim de concussão, o impacto foi tão pesado que esticou os músculos do olho direito.

 
Márquez assiste a conquista do mundial de Moto2 por Stefan Bradl em 2011
 

O nervo trochlear havia sido danificado, causando sérios problemas de visão. O olho não melhorou com o passar do tempo e os peritos médicos não tinham certeza se o faria. Por fim, Márquez foi submetido a uma cirurgia ocular, com um anestésico local. Mesmo assim, não era certo que ele seria capaz de começar os testes de pré-temporada em fevereiro.

Lesões como essa  podem mudar a vida e assustam a maioria dos pilotos,  algo que pode inviabilizar a sua carreira. Felizmente, a operação foi um sucesso e Márquez não olhou para trás. Só para a frente.

Nas oito temporadas desde então, ele ganhou sete campeonatos mundiais (1 Moto2 e 6 Motogp) e teve muitos acidentes – mais de 130 só nos finais de semana de corrida.

É por isso que alguns dizem que era inevitável que Márquez sofresse um acidente sério, porém as corridas não funcionam assim. Kevin Schwantz caiu muitas, muitas vezes mais do que o arquirrival Wayne Rainey, mas foi Rainey quem acabou em uma cadeira de rodas.

Quando perde o controle da moto, o piloto depende da sorte. Alguns tentam se proteger quando atravessam a armadilha de cascalho, mas há uma coisa que nunca podem controlar: a órbita de sua moto voadora.

 
Márquez é atingido por sua moto em Jerez 2020
 

Em Jerez, em julho passado, o infortúnio de Márquez foi ser atingido pelo pneu dianteiro de seu RC213V quando ele bateu nos estágios finais da abertura da temporada. (Ironia suprema: ser derrubado pelo mesmo componente que o tornou tão imbatível.) Caso contrário, ele não teria se afastado e provavelmente conquistado o sétimo título da MotoGP em oito anos.

O úmero não é um osso comum para quebrar em corridas de motocicletas – geralmente é o braço, pulso e mão inferiores que levam o peso de um acidente.

O quatro vezes campeão mundial de Superbike, Carl Fogarty encerrou sua carreira em Phillip Island em 1999, quando fraturou o topo do úmero esquerdo. A lesão foi tratada com um implante de metal, mas não resolveu. Carl tentou pilotar alguns meses depois e imediatamente entendeu que o jogo estava acabando.

"Eu era 1% do cara que eu tinha sido", disse na época. "Eu não conseguia nem descer atrás da bolha, mudar de direção ou pendurar a moto nas curvas. Confirmou tudo o que o especialista havia dito – o braço não seria mais capaz de levar as constantes batidas."

O braço de Márquez está em melhor forma que o de Fogarty, então ele pode ganhar um sétimo campeonato de MotoGP este ano?

Não gosto de fazer previsões – corrida de motos é um esporte muito estranho para adivinhações – mas é certamente possível. Claro, há dúvidas – o local da fratura pode resistir a 40 minutos de trepidação na pilotagem plana em uma moto de competição.

Portimão deve responder a essa pergunta. Não existe uma pista fácil em uma motociclista, mas a Curva 1 do circuito português – onde os pilotos mergulham em uma descida íngreme no final da reta de largada/chegada de 217 mph/350km/h – provavelmente cria as maiores forças-G que qualquer piloto de moto experimentará (sem sofrer algum acidenter).

Cada vez que Márquez frear na Curva Um ele alcançará pelo menos 1,7 G, o que significa carregar algo como 120kg através de seus braços e pulsos. Ele já sabe disso porque testou lá no mês passado, embora com uma Honda RC213V-S de estrada, sem freios de carbono.

Márquez apostou no braço no ano passado, perdeu e aprendeu que ele é apenas humano. E se ele verificar os números, vai ver que não precisa começar a vencer imediatamente para ganhar o campeonato de 2021.
 

O ondulado Circuito Internacional do Algarve - Portimão
 

Márquez conquistou o título da MotoGP 2019 com 420 pontos. Esta foi a melhor campanha da primeira classe da história das corridas de grandes prêmios: 12 vitórias e seis segundos lugares em 19 corridas, em um momento em que as motos nunca estiveram mais próximas e os pneus nunca foram mais complicados.

Se extrapolarmos a pontuação de Joan Mir em 2020 em uma temporada de 19 corridas como o campeonato de Márquez em 2019, ele teria marcado 232 pontos, 188 a menos.

A pontuação de Mir na conquista do título foi baixa, mas não foi muito diferente dos pontos que Andrea Dovizioso acumulou para terminar em segundo lugar para Márquez nos campeonatos de 2017, 2018 e 2019.

Tudo isso resulta em que Márquez tem uma margem para considerar. Obviamente, 2021 não é 2019, mas nada mudou muito desde que ele ganhou sua última coroa, porque ninguém quebrou nenhum recorde de volta, apesar das corridas consecutivas em várias pistas. E mesmo que ele marque 40% menos pontos do que em 2019, ele ainda ganharia o campeonato, assumindo que seus rivais permanecessem aproximadamente no mesmo nível que estavam no ano passado, o que parece provável.

Se o úmero direito dele se mantiver firme, acredito que tem todas as chances de ganhar o título. Esta é a opinião da maioria das pessoas que frequentam o meio.

"Com Marc, tudo está em outro planeta", diz o gerente da equipe Repsol Honda, Alberto Puig. "Quando ele coloca o capacete e sai para a pista você sabe que algo vai acontecer, algo especial."

No entanto, Jack Miller, da Ducati, acredita que Márquez achará a vida difícil.

"Há uma grande diferença entre andar de bicicleta e pilotar no fio da navalha por 20 [voltas] com outros 22 caras ao seu redor", diz o australiano.

O que Márquez pode fazer neste fim de semana? Há três coisas a considerar em responder a esta pergunta.
(1) Márquez testou em Portimão no mês passado, então ele conhece a pista. (2) Em novembro passado, o piloto de testes da HRC Stefan Bradl levou o RC213V de Márquez para o sétimo no GP de Portugal, 15 segundos atrás do vencedor, seu melhor resultado do ano. (3) Bradl diz que não ficaria surpreso se Márquez terminasse no pódio neste domingo.
 

Moto #93 de Marc Márquez

MotoGP - Sinal verde

 


Médicos dão sinal verde para Marc Márquez voltar a disputar a MotoGP; “Com o resultado dos últimos exames, a avaliação atual é que o paciente está em condições de competir".

 

Marc Márquez is back
 

Após os seus últimos exames, os médicos finalmente avaliaram que o oito vezes campeão mundial Marc Márquez está novamente apto a competir.
 
A declaração oficial da Repsol Honda não menciona explicitamente o GP do próximo fim de semana em Portimão, porém em suas redes sociais Marquez deixou claro que estará a caminho para a 3ª prova da temporada no Autódromo Internacional do Algarve, terceira rodada do mundial 2021: “Foram 9 meses difíceis com diversos momentos de incertezas, finalmente poderei desfrutar da minha paixão novamente! Até o próximo fim de semana em Portimão! ”
 
Depois de testar uma moto de produção RC213V-S duas vezes no mês passado, Marquez estava imaginando um retorno na abertura da temporada no Catar. No entanto, os médicos concluíram que sua problemática fratura no braço direito ainda não estava em condições  de suportar sem riscos os esforços necessarios para um GP..
 
A junta médica que executou o procedimento e acompanhou a recuperação de sua 3ª cirurgia finalmente acionou a luz verde e, desde que seja aprovado na verificação obrigatória pelos médicos da MotoGP na quinta-feira, Márquez pode completar suas primeiras voltas em uma RC213V em Portimão (onde já rodou em testes com uma moto comercial).
 
O comunicado emitido pela  Repsol Honda informa: “Na revisão realizada em Marc Márquez pela equipe médica do Hospital Ruber Internacional, quatro meses após a cirurgia liderada pelos médicos Samuel Antuña e Ignacio Roger de Oña, e composta pelos doutores De Miguel, Ibarzabal e García Villanueva, para a correção de uma pseudoartrose infectada do úmero direito, foi encontrada uma condição clínica satisfatória, com evidentes progressos no processo de consolidação óssea.
 
Na situação atual, considera-se que o paciente pode voltar à competição, assumindo o risco razoável implícito em sua atividade esportiva. ”
 

Equipe Repsol Honda
 

Ao ficar ausente das provas no Catar, Márquez já poderia estar 50 pontos atrás do líder pela corrida pelo título mundial se, como no ano passado em Jerez, o mesmo piloto tivesse vencido as duas corridas iniciais.
 
Entretanto o atual líder do campeonato é Johann Zarco, de uma equipe independente da Ducati, com 40 pontos, enquanto os vencedores da Yamaha no Catar, Maverick Vinales e Fabio Quartararo, estiveram ausentes do pódio na outra corrida e, portanto, só conseguiram acumular 36 pontos. Pior ainda é a situação do atual campeão mundial, Joan Mir da Suzuki, que inicia a temporada europeia com apenas 22 pontos de um total possível 50.
 
Combinando estas pontuações baixas dos concorrentes nesta que parece ser uma temporada muito equilibrada, Márquez está longe de ficar fora da disputa pelo título, lembrando que faltam ainda 17 etapas e que se alguma prova for cancelada, será substituída por um circuito de reserva ou por rodadas duplas onde estiver programado um GP.
 
A pergunta de um milhão de dólares é quanto tempo Marc leva para voltar à sua forma antiga, depois de tanto tempo fora de uma moto de competição. Resta também saber como está o desenvolvimento atual da moto, a fábrica está sem vitórias desde a sua lesão em Jerez, e seu irmão mais novo Alex conquistou os 2 únicos pódios (Le Mans e Aragon) da temporada passada.
 
A equipe Honda tem um histórico favorável na recuperação de pilotos sinistrados, Mick Doohan sofreu um acidente sério em 1992 e passou toda a temporada de 1993 competindo com dificuldades, sem sensibilidade na perna. No ano seguinte iniciou uma série contínua de vitórias nos mundiais que resultou em 5 títulos consecutivos. Mick Doohan sempre será lembrado por ter criado o acionamento do freio traseiro com o polegar esquerdo, sua perna estava debilitada demais para operar com o péNa época a Honda permitiu que o piloto participasse das competições sem as suas melhores condições físicas, o que não acontece com Márquez.
 
O protótipo da Honda que apresentou melhor resultado no Catar foi o do seu novo companheiro de equipe, Pol Espargaro, que conquistou o 8º e 13º lugares. Em relação ao novo contratado pela Repsol Honda, as diferenças de tempo para o vencedor foram bem melhores que os resultados indicam, 5.990 segundos de Maverick Vinales na corrida 1 e 6,063 segundos para a outra Yamaha (Fabio Quartararo) de fábrica na corrida 2.  O tempo de corrida de Espargaro melhorou em 4,593s durante a segunda prova, apesar de dois erros na Curva 1. Antes do 2º erro, o piloto estava a apenas 2,6 segundos do líder.
 
 
Jorge Martin

 
Analisando as atuais condições da disputa pelo mundial, Johann Zarco da Pramac, satélite da Ducati, lidera a classificação da MotoGP com 40 pontos, seguido por Quartararo e Vinales com 36, Francesco Bagnaia (Pramac) com 26 e Alex Rins (Suzuki) com 23. Seu companheiro de equipe, o atual campeão Joan Mir conseguiu apenas 22 pontos, enquanto o piloto líder da Ducati, Jack Miller tem 14 e outro favorito na pré-temporada, o vice-campeão da Petronas Yamaha em 2020 Franco Morbidelli, conseguiu 4. Existem ainda disputas internas na Yamaha (Vinales vs Quartararo) e na Suzuki (Mir vs Rins) sobre quem deve liderar a equipe. Os pilotos oficiais da Ducati, Miller e Binder, sequer conseguem acompanhar Johann Zarco e Jorge Martin (Novato) da satélite Pramac.
 
Na temporada passada, de um total de 14 provas, o campeão mundial Joan Mir não pontuou em 3 (Jerez, República Tcheca e Portimão), pouco mais e 20% das etapas disputadas. Projetando este resultado para as 19 provas previstas para esta temporada, implica que pode haver um campeão que não pontue em até 4 provas.
 
Por incrível que pareça, a fábrica que possui o melhor histórico na história do mundial de motociclismo esportivo, a Honda,  é a 6ª classificada no campeonato de construtores, atrás da Yamaha, Ducati, Suzuki, KTM e Aprilia.
 
Depois de Portimão, a próxima corrida programada será o Grande Prêmio da Espanha no início de maio, no circuito que presenciou a incrível recuperação de Márquez da 17ª para a 3ª colocação antes de sofrer o acidente que causou o seu afastamento de 2020 e incliuiu as 2 provas inaugurais de 2021. Jerez também foi onde houve mais um acidente com Mick Doohan em 1999, que acabou resultando em sua aposentadoria das pistas.
 
Em 2020 depois de uma cirurgia para ajudar a consolidação do seu membro fraturado na prova de abertura, Márquez tentou um retorno antecipado no fim de semana seguinte sem condições, se retirou após a qualificação e precisou de uma segunda operação quando a placa quebrou devido ao acúmulo de estresse alguns dias depois.
 
Como a consolidação da fratura não evoluia, uma terceira operação foi realizada em dezembro no Hospital Internacional Ruber em Madrid, por uma outra equipe médica, quando foi identificada uma infecção no osso (pseudoartrose) que estava retardando o processo de consolidação e adotado um outro procedimento, com a administração de antibióticos e enxerto ósseo vascularizado, cujos resultados acabam de ser aprovados.

sábado, 3 de abril de 2021

MotoGP - Temporada 2021 – Aprilia, Holeshot & Chattering

 

Temporada 2021 – Aprilia, Holeshot & Chattering


A Aprilia tem sido o patinho feio da MotoGP. Sua participação não é um esquema tradicional de equipe de fábrica, é representada pela gestão compartilhada com uma equipe independente, a Gresini Racing, e desde o início da sua participação efetiva do RS-GP no mundial em 2015 tem sido sempre a pior classificada no campeonato de construtores. 

Aprilia é uma empresa italiana produtora de motocicletas subsidiária do Grupo Piaggio, um complexo industrial italiano que produz uma série de veículos de duas rodas e veículos comerciais compactos sob 7 marcas: Piaggio, Vespa, Gilera, Aprilia, Moto Guzzi, Derbi e Scarabeo.


 
Grupo Piaggio – Controlador da Aprilia


No final de 2019 a Aprilia comunicou ao seu parceiro que havia decidido ter uma representação própria a partir de 2022, e que possivelmente teria uma associação com uma independente. A Gresini Racing seria uma escolha óbvia, embora a equipe estivesse atenta ao mercado com possibilidades de abrir negociações com outro fabricante (Suzuki).

Os planos da Aprilia sofreram dois contratempos. A empresa investiu em um equipamento radicalmente novo para 2020, porém foi abalada pelo caso de dopping de Andrea Iannone que impediu a continuidade da cooperação do piloto com o desenvolvimento do protótipo e pela ocorrência da Covid. A empresa foi muito prejudicada pela pandemia, sua equipe técnica estava confiante que o novo motor V4 de 90 graus poderia ser trabalhado protegido pelos regulamentos de concessão, escritos para permitir que fabricantes em dificuldades terem alguma chance de competir com as equipes tradicionais.

Com o agravamento da pandemia a nível mundial a MotoGP incluiu alguns regulamentos de redução de custos de emergência, que proibiram todas as equipes de atualizar seu aero e impediu as fábricas de concessões de atualizar seus motores. A Aprilia foi obrigada a competir toda a temporada de 2020 com um propulsor que rodou pela primeira vez nos testes em fevereiro, poucas semanas antes da primeira corrida. A temporada para o fabricante também iniciou com uma carenagem com muito pouco downforce, desenvolvida para a pista que devia hospedar a prova inicial da temporada (Losail) e inadequada para a maioria dos circuitos. Com a proibição das atualizações não houve como adequar o equipamento e a moto competiu toda a temporada com deficiência de downforce.


Aprilia de Aleix Espargaró lidera a Honda de Pol Espargaró


Durante os testes abreviados de pré-temporada este ano, apenas 5 dias em Losail, a RS-GP se saiu bem melhor. O motor V4 de graus tem várias vantagens, um equilíbrio primário perfeito, mais forte e mais ajustável. Permite uma maior variedade de configurações de disparo desequilibrada (big bang) que ajuda os engenheiros a modular o torque que os pilotos podem aproveitar, um motor que melhor entrega torque e mais potência.

O fator de desempenho que convenceu a Aprilia a apostar no V4 90 graus não foi a saída de curvas, foi a velocidade de entrada em curvas. A configuração 90 graus oferece o layout de escape mais simples que permite usar válvulas de escape para melhorar a frenagem do motor da moto.

A Ducati e Suzuki também possuem válvulas de escape ajustáveis, a Yamaha desenvolveu um sistema chamado Exhaust Ultimate Power Valve (EXUP) que consiste no acionamento por software de um motor hidráulico que abre e fecha as válvulas, para obter desempenho superior em baixa e média rotação, e permite a entrega de potência mais linear. As válvulas de escape variam a pressão traseira no escapamento para criar um efeito na frenagem do motor. Honda, KTM não possuem válvulas de escape.

O RS-GP de 2021 é muito diferente da moto 2020, o peso é reduzido em parte devido a um braço oscilante de fibra de carbono, O equipamento está abaixo do limite mínimo, que permite aos engenheiros ajustar o lastro de forma a obter um maior equilíbrio geral e experimentar diferentes aparelhos e dispositivos. A confiabilidade do motor ainda é uma incógnita porque o motor não tem quilometragem. 

Um upgrade significativo é a estrutura do banco traseiro, que desempenha um papel importante na harmonia da moto. No ano passado, em algumas pistas, o equipamento sofreu com “chattering”, talvez pela aderência extra fornecida pelo último componente traseiro desenvolvido pela Michelin.


Soma de frequências de vibrações


Chattering é o termo té cnico que descreve um comportamento do protótipo que prejudica o trabalho dos pilotos em condições de competição. O esqueleto de uma moto é o chassi, a estrutura que mantém unidos os vários componentes do equipamento. O seu comportamento e o equilíbrio correto entre rigidez e flexibilidade determinam a competitividade do conjunto. Problemas de concepção do chassi podem resultar em um dos problemas mecânicos que mais prejudicam os pilotos. Quando diversos componentes vibram em frequências muito próximas, e sempre que uma máquina está rodando na pista seus elementos vibram em maior ou menor grau, estas vibrações podem entrar em ressonância e inviabilizar a condução da moto. 

Um dos inconvenientes do chattering consiste na multiplicidade de fatores que podem originar o problema. Um projeto de equipamento não compatível com o chassi, uma configuração malfeita, umas infinidades de outras pequenas causas são suficientes para que os pilotos sintam esta vibração incômoda. A primeira dificuldade é localizar e neutralizar a principal origem, o componente com vibração excessiva, antes de tentar encontrar uma solução. É mais provável encontrar esta situação quando existe muita aderência, quanto maior for o contato de um pneu com a pista, maiores são as sensações que o piloto recebe. Se houver um desconforto ao condutor causado por vibrações, é improvável que consiga extrair do equipamento o seu melhor desempenho.

Apesar do novo design aerodinâmico, a Aprilia ainda pode sofrer com problemas em algumas pistas. A carenagem 2021 é muito melhor do que a versão 2020, porém a Aprilia tem apenas um pacote aero para a moto 2021, enquanto as outras fábricas podem alternar entre seus pacotes de 2020 e 2021. O foco da P&D na Aprilia 2021 será o motor (especialmente a potência máxima), câmbio, eletrônica e chassi. A fábrica italiana foi quem lançou na MotoGP as válvulas pneumáticas (influência da Cosworth da Fórmula 1).

 

Peco Bagnaia aciona o dispositivo holeshot no fim da volta de apresentação


No jargão do motociclismo esportivo “holeshot” é um termo utilizado para identificar o competidor que lidera na primeira curva depois da largada. Por extensão, “dispositivo holeshot” é um equipamento utilizado exclusivamente na largada para proporcionar uma vantagem que permita ao protótipo chegar na frente no primeiro contorno. Em um esporte onde seis fabricantes produzem protótipos, conduzidos pelos melhores pilotos do mundo, que percorrem voltas separados por milésimos de segundos, contornar a primeira curva na liderança pode significar uma vantagem no resultado final de uma corrida.

O recurso de “dispositivos holeshot” não é propriamente uma inovação técnica, foi utilizado à mais de uma década atrás pela Honda na Superbike britânica (BSB). O princípio foi comprimir o garfo da suspensão dianteira para reduzir o “wheelie”, tendência de a moto empinar quando é aplicada potência na roda motriz. Trabalhar o curso dos garfos de suspensão é um recurso comum no motociclismo esportivo, enquanto na motocross pilotos ou mecânicos tinham que executar esta regulagem à mão com a moto parada, o sistema utilizado pela Honda na BSB era pneumático, ativado por controle eletrônico com o equipamento em movimento.

As regras de Mundial de MotoGP que endereçam suspensão e amortecedores são específicas: “Não são permitidos controles elétrico/eletrônicos para alterar regulagens da suspensão e amortecedores. Adequações só podem ser feitas manualmente por mecânicos ou por dispositivos mecânico/hidráulicos”. 

Praticamente todos os fabricantes utilizam dispositivos holeshot, que podem atuar nos garfos dianteiros ou na suspenção traseira. A eficiência deste recurso é inquestionável, na largada da prova inicial desta temporada as motos Ducati conseguiram utilizar toda a potência de seus motores e ocuparam as 4 primeiras posições na primeira curva, destaque para o novato Jorge Martin que largou da 14ª posição do grid e contornou a primeira curva em 4º. 

Maverick Vinales venceu o GP do Catar em 2017, em seu primeiro ano de contrato com a Yamaha, em 2018 & 2019 a Ducati de Andrea Dovizioso superou a Honda de Marc Márquez. O traçado da pista de Losail contempla uma reta extensa, apropriada para a potência dos motores V4 da Ducati, e um trecho sinuoso onde os motores com cilindros em linha (Yamaha e Suzuki) podem exercer sua velocidade em curvas.

 
Quatro Ducatis (Bagnaia, Miller, Zarco & Martin) disparam na frente na largada, ignorando as Yamaha


Em 2021 a largada foi espetacular, as Ducati utilizaram com competência os dispositivos holeshot, o pole Francesco Bagnaia, seu colega de eq uipe Jack Miller e Johann Zarco, equipados com Desmosedici GP21, seguidas pelo surpreendente Jorge Martin com uma GP20 ignoraram as Yamaha que estavam na primeira fila. Um dos favoritos da prova, Franco Morbidelli, partiu da 7ª posição caiu para 20º. 

O trio Yamaha de Vinales, Fabio Quartararo e Valentino Rossi da SRT se reagruparam na volta inicial, com Quartararo ocupando a 5ª posição. Logo ficou evidente que o ritmo de Jorge Martin estava atrasando os demais e ele foi ultrapassado consecutivamente por Quartararo na Curva 6 e Vinales na curva 10 da terceira volta.

Enquanto Bagnaia estabelecia uma pequena vantagem sobre Zarco, Quartararo ultrapassou Miller na volta 6, o australiano perdeu a posição para Vinales duas voltas mais tarde. Duas voltas depois Maverick Vinales superou seu companheiro de equipe assumindo o terceiro lugar.

Vinales ultrapassou Zarco e os caprichos do clima o ajudaram a manter a posição na longa reta, o forte vento contrário impediu a Ducati de utilizar a sua maior potência. O piloto espanhol conquistou a liderança ultrapassando Bagnaia na volta 15, em uma manobra onde as motos ficaram muito perto de se tocarem. Quando conseguiu a pista limpa à sua frente, Vinales conseguiu abrir uma pequena vantagem enquanto as Ducati começaram a apresentar problemas de aderência pelo consumo dos pneus. 

Maverick Vinales não foi ameaçado na última volta para conseguir sua nona vitória na MotoGP e assumir uma liderança antecipada no campeonato.

Mir, o atual campeão do mundo e piloto da Suzuki, saiu da 10ª colocação no grid e galgou para pegar o segundo de Zarco na Curva 15 na última volta. Para sua infelicidade cometeu talvez o seu único erro ao abrir demais a última curva e ser ultrapassado pelas Ducati a poucos metros da bandeira quadriculada. 

A prova de Losail apresentou alguns resultados não esperados como o fracasso da equipe Sepang Petronas. Valentino Rossi (12º) sofreu um “apagão” de grip durante a prova e seu companheiro Franco Morbidelli (18º) não conseguiu desarmar o holeshot (na Yamaha é só na traseira e controlado por um pistão hidráulico) e ficou inviável no trecho sinuoso. 


 Franco Morbidelli foi prejudicado pelo mau funcionamento do holeshot


As  Honda da equipe de fábrica classificaram-se na zona de pontuação (Pol em 8º e Bradl em 11º), resultados não totalmente satisfatórios, porém melhores que as KTM oficiais (Miguel em 13º e Brad em 14º).

O desastre total ficou por conta de Danilo Petrucci, queda na volta inicial e com a dupla da LCR Nakagami e Alex Márquez que também não concluíram a prova

Fórmula 1- Albert Park

Albert Park



Albert Park é um circuito adaptado em ruas abertas ao tráfego em um parque da cidade de Melbourne, capital do estado de Vitória na Austrália. Faz parte do calendário regular da F1desde 1996, quando substituiu o circuito de Adelaide.

Alinhada com os objetivos dos administradores do Mundial de Fórmula 1 em transformar os GPs em espetáculos para os (tele) espectadores, proporcionando maiores disputas e mais ultrapassagens, a administração do Circuito de Albert Park, em Melbourne – Austrália, está realizando mudanças no layout as a pista. As alterações contemplam os requisitos de segurança para garantir a integridade dos pilotos e pessoal envolvido na realização das provas.
 

 Novo layout do traçado de Albert Park
 
 
As alterações mais significativas estão sendo realizadas no traçado das curvas 9 e 10 com a remoção da chicane, que permite uma nova zona de DRS (Sistema de Redução de Arrasto ou Drag Reduction System, em tupiniquim, “abrir a asa”) mais longa, e o consequente aumento da velocidade de entrada nas curvas 11 e 12.
A curva 13 está sendo redesenhada e recebe uma inclinação (camber) para oportunizar a ultrapassagem na zona de frenagem.

Diversas curvas estão em processo de ampliação, sempre com o objetivo de criar condições de ultrapassagem, a Curva 1 terá a largura aumentada em 2,5 metros, a Curva 3 por 4 metros e a Curva 6 será de 7,5 metros de largura. A curva 15 está sendo ampliada em 3,5 metros e sua inclinação, a exemplo da curva 5, será reajustada. Os trabalhos começaram em fevereiro e a conclusão prevista para julho (o GP da Austrália está marcado para novembro.

A administração do circuito projeta a redução de tempos por volta de até 5 segundos e consequente aumento da velocidade média por volta em 15km/h. Outras obras de apoio, como mudanças no pit lane e para acomodação do público já foram finalizadas e o recapeamento total da pista está previsto para a próxima temporada.

O GP da Austrália em 2020 não foi realizado devido à crise sanitária causada pela pandemia da Covid 19. Na prova realizada em 2019, o pole foi o britânico Lewis Hamilton com um Mercedes V6 híbrido e o vencedor foi seu colega de equipe o finlandês Valtteri Bottas. O maior vencedor da prova da Austrália é o alemão Michael Schumacher, que recebeu a bandeira quadriculada em 4 oportunidades. A bandeira brasileira já tremulou no lugar mais alto do pódio em 3 ocasiões, com Ayrton Senna em 1991 e 1993 e com Nelson Piquet em 1990 (GPs foram disputados no circuito de Adelaide).

As alterações em Albert Park já estão adequadas para as mudanças de especificação dos carros de Fórmula 1 em 2022. Embora o objetivo final seja produzir melhores espetáculos e corridas mais emocionantes, as reformas em andamento também endereçam as instalações do entorno para uso da comunidade.

O recorde por voltas de um circuito é o melhor tempo registrado em um GP. Deve ser realizado durante a prova, não nos treinos ou na qualificação. Os tempos obtidos fora de uma disputa oficial são conhecidos por recorde do circuito. O recorde por volta de Albert Park pertence (ainda) a Michael Schumacher, com 226,934 km/h.


Michael Schumacher - Maior número de vitórias e recordista por volta em Albert Park