sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

MotoGP – Como tudo começou (3)


 No início dos anos 70, Yamaha, Honda e Suzuki somavam vitórias e títulos nas categorias de 125cc e 250cc, em 1975 marcou o primeiro ano em que uma equipe japonesa conseguiu chegar ao título da principal categoria com Giacomo Agostini vencendo seu último título. A temporada de 1975 marcou o início do domínio das máquinas produzidas na terra do sol nascente, que perdura até os dias atuais com uma única exceção, o título obtido por Casey Stoner em 2007 com uma Ducati. Os meados da década de 70 também marcaram o protagonismo de pilotos que utilizavam o Inglês como língua nativa.

 

Em 1976 a Suzuki conquistou o título com o britânico Barry Sheene e as motos nipônicas conseguiram as 10 primeiras colocações do ano, vencendo 8 das 10 provas, as exceções foram a Yamaha na Ilha de Man e a MV Agusta, escolhida por Agostini exclusivamente para disputar o GP da Alemanha, no antigo traçado de 22 km do circuito de Nurburgring.

 

Sheene repetiu o feito no ano seguinte (1977), porém a hegemonia da Suzuki foi ameaçada pelo crescimento do desempenho das Yamaha. A temporada foi marcada por diversos acidentes fatais, como o GP da Áustria de 350cc disputado em Salzburgring que causou o óbito do suíço Hans Stadelmann e ferimentos graves em Johnny Cecotto, Patrick Fernandez, Dieter Braun e Franco Uncini. O acidente causou um boicote de pilotos da 500cc e o GP foi realizado por um número reduzido (6) de competidores. Houve incidentes também no GP da Iuguslavia no circuito de Opatija quando os organizadores falharam em tomar medidas para melhorar a segurança do circuito, cujo traçado por estradas e incluía paredes de rocha sólida e quedas íngremes mal protegidas. Ulrich Graff bateu contra uma parede de pedra ao ter um pneu furado, sofreu ferimentos graves e mais tarde foi decretado se. O circuito de Opatija foi banido do calendário.

 

Barry Sheene foi um ídolo britânico que transitava com igual desenvoltura entre o noticiário social e esportivo no Reino Unido. Em 1975 sobreviveu a um acidente espetacular em uma prova promocional fora do calendário oficial, a Daytona 200, que resultou em fraturas na coxa esquerda, braço direito, clavícula e duas costelas. Na mesma temporada com uma RG500 conquistou sua primeira vitória no TT holandês. Em 1976 venceu 5 GPs de 500cc e conquistou seu primeiro mundial, e repetiu a dose em 1977 com 6 vitórias.


Barry Sheene – o primeiro superstar do motociclismo Britânico


A importância de Barry Sheene para a motovelocidade britânica transcende às pistas, além de um excelente piloto era um showman e uma fonte praticamente inesgotável de manchetes para os agentes da mídia. Em uma temporada não disputou as últimas provas porque não teria nada a ganhar, estava com o título assegurado. Em uma oportunidade para promover uma marca de cigarros abriu um furo no capacete para poder fumar antes da largada. No início de sua última temporada de grandes prêmios, após 3 anos de resultados pífios, Sheene montou na sua RG500 em um palco de TV durante um programa ao vivo em horário nobre na British Broadcasting Corporation (BBC). Esse tipo de exposição não tem preço para os patrocinadores.


 

Barry Sheene com uma Yamaha em 1980

 

A divulgação na mídia da temporada de 1978 cresceu muito, impulsionada pela popularidade do então campeão Barry Sheene e pela presença do extraordinário piloto norte-americano Kenny Roberts. Um dos quatro pilotos da história a vencer o Grand Slam da AMA (American Motorcycle Association), Roberts havia participado com uma equipe de pilotos americanos do Transatlantic Match de 1974, competindo contra uma equipe britânica. O consenso da época era que pilotos americanos, formados em pistas de terra, não eram adversários para os britânicos, especializados em corridas no asfalto. Roberts destruiu esta crença ao vencer três das seis provas e terminou em segundo lugar nas três restantes. No evento Roberts contribuiu com 93 pontos para sua equipe, cinco a mais que Barry Sheene, o melhor piloto britânico. Kenny Roberts com uma Yamaha foi o campeão da temporada, com 10 pontos mais que a Suzuki de Sheene. A batalha de Sheene com Kenny Rogers no GP da Inglaterra de 1979 é citada como uma das melhores dos campeonatos promovidos pela FIM.

Após a temporada de 1979, Sheene abandonou Suzuki, acreditando que ele estava recebendo equipamento inferior em comparação com o de seu companheiro de equipe. A vitória de Sheene no Grande Prêmio da Suécia de 1981 foi a última vitória de um piloto britânico na categoria principal até a vitória de Cal Crutchlow no GP da República Tcheca de 2016.

 

Kenny Roberts - Yamaha YZR500 na pista de Imatra (1979)

 

Apesar de sua baixa estatura, 1,55m, Kenny Roberts contribuiu com o esporte de velocidade em motos por mais de três décadas. Depois do bicampeonato de Sheene em 1976/1977, Roberts venceu 3 mundiais consecutivos de 500cc, de 1978 a 1980. Foi posteriormente um chefe de equipe muito bem-sucedido e é pai de Kenny Roberts Junior, que foi campeão mundial em 2000. Roberts surgiu para o motociclismo esportivo nos EUA, vencendo campeonatos nacionais em pistas de terra e estradas na década de 70. Fez uma aparição pontual em 1974 no GP de Assen, pilotando uma Yamaha e obteve um 3º lugar. Foi contratado pela equipe para disputar a temporada de 1978 e o primeiro norte americano a conquistar o título já no seu ano de sua primeira participação. Seus duelos espetaculares com Barry Sheene e Freddie Spencer marcaram o seu segundo título em 1979 e repetiu o feito em 1980. A sua última temporada foi 1983 quando perdeu o campeonato para Freddie Spencer por apenas dois pontos, apesar de ter vencido seis das 12 corridas do ano.

Kenny Roberts montou sua própria equipe, que conseguiu com a Yamaha os títulos simultâneos de 500cc e 250cc em 1990 com os pilotos Wayne Rainey e John Kocinski, respectivamente. Rainey ganhou três títulos consecutivos na primeira classe sob a administração de Roberts, repetindo as conquistas de seu chefe de equipe pouco mais de uma década antes.


Wayne Rainey - 1993

 

Em1980 a Honda introduziu a exótica NR500 de quatro tempos, que não marcou nenhum ponto, em 81 e 82 a Suzuki retomou a primazia com os pilotos italianos (Marco Lucchinelli e Franco Uncini). Na temporada de 82 a Yamaha introduziu um novo motor V4 para Kenny Roberts e a Honda abandonou a NR500 quatro tempos participou com a NSR500, motor V3 dois tempos, com a condução de Freddie Spencer.

Os 7 anos seguintes registraram a disputa feroz entre Freddie Spencer da Honda, vencedor em 83 e 85, e Eddie Lawson da Yamaha em 84,86, 88 e 89, este último ano com uma Honda. Wayne Rainey conquistou o seu tricampeonato nos anos 90, 91 e 92. O ano de 92 marcou a despedida das pistas de Eddie Lawson, que conseguiu no GP de Hungaroring a única vitória da Cagiva na categoria de 500cc.

 

Adendo:

Durante a maior parte dos anos 60 a Honda dominou as provas de motovelocidade quando, em 1967, surpreendeu o mundo anunciando que iria se retirar das competições porque não havia mais nada a ganhar, mais nada a provar. Durante mais de uma década os adversários estiveram livres do opressivo poderio tecnológico da Honda.  

 

NR500 – O maior fracasso da Honda

 

A ausência da Honda terminou em 1979 quando, para a felicidade dos aficionados, a fábrica decidiu voltar ao Mundial. A fábrica sempre optou por sua própria linha de desenvolvimento e optou por uma mudança radical: em vez de fabricar uma motocicleta de 500cc com motor 2 tempos, tecnologia dominante à época, optou pelo motor 4 tempos como os de seus motores vencedores do passado. A decisão implicou em enorme desafio, o regulamento técnico da época não previa nenhuma compensação para equilibrar o rendimento entre motores, uma desigualdade flagrante, tendo em vista que os de ciclo 2 tempos, em paridade de cilindrada, eram cerca de 50% mais potentes que os motores de 4 tempos. Como regulamento do Mundial de Motovelocidade estabelecia um limite para a categoria máxima 500cc tanto para motores 2T e 4T, a escolha da Honda foi temerária, era praticamente impossível alcançar a potência das máquinas 2T com cilindrada igual. 

Um modo de conseguir seria um motor turbinado, entretanto o regulamento não permitia a sobre alimentação. Outra hipótese era aumentar o número de cilindros, a fábrica tinha a tecnologia utilizada em máquinas 125cc com 5 cilindros (modelos RC148 e 149) e com 250cc com 6 cilindros em linha, porém, o regulamento limita o número de cilindros a quatro. A solução técnica foi a utilização de pistões ovais, respeitando o limite regulamentar – 4 cilindros e 500 cc – a maior área dos pistões ovais permitiria fazer o motor ter características de potência de um motor de 8 cilindros.

A complexidade dos motores contrastava com a simplicidade dos 500cc 2T. A previsão teórica de igualar a potência de máquinas 2T através do aumento de rotações (15 mil RPM era o limite da NR500) não foi confirmada, o V4 de pistões ovais era pesado demais e quebrava com facilidade. Os engenheiros e técnicos da Honda trabalharam intensamente adquirindo conhecimento técnico em áreas diversas como metalurgia, lubrificação, refrigeração e eletrônica. Tudo para economizar peso, ganhar confiabilidade e, claro, desenvolver potência. Não funcionou. Em 1981 a Honda finalmente conseguiu uma vitória, depois de três temporadas de sucessivas quebras s NR500 venceu uma prova de resistência, os 500 km de Suzuka, onde o motor conseguiu desenvolver 130 CV girando a incríveis 19.500 rpm. Paradoxalmente a 1ª vitória da moto com pistões ovais, com uma reputação de fragilidade, aconteceu em uma corrida de resistência.

 

O revolucionário pistão oval da Honda

 

A NR500 foi substituída pela ágil NS 500 de três cilindros em V, 2T, moto que desde sua primeira temporada se revelou vencedora e conquistou seu primeiro título mundial em 1983 com Freddie Spencer.

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