terça-feira, 8 de setembro de 2020

MotoGP - Déjà Vu

 

Miguel Oliveira – A primeira vitória do Português

 

Déjà vu é um galicismo que descreve a reação psicológica da ideia de que já esteve em determinada situação, o evento que está sendo vivenciando já aconteceu antes. O termo é uma expressão da língua francesa que significa: "Já visto”.

 

O início desta temporada atípica é um déjà vu do campeonato mundial de 2017. Contextualizando, 2 anos antes em 2015, a equipe oficial da Yamaha conseguiu seu último mundial com uma disputa feroz entre os pilotos oficiais da fábrica nipônica. Jorge Lorenzo, que conquistou o campeonato, foi acusado por Valentino Rossi de ter formado um complô com Marc Márquez para evitar o seu 9º título. Este fato deteriorou a harmonia nos boxes da equipe e gerou um clima belicoso nos boxes em 2016 e, no final da temporada, o espanhol de Mallorca mudou para a Ducati. Agindo com rapidez direção da Yamaha contratou o então piloto líder da Suzuki, Maverick Vinales, para compor com Rossi a representação oficial de fábrica no binômio 2917/2018. Vinales, que já havia obtido sua primeira vitória em 2016 com a Suzuki, conseguiu um início de temporada perfeito na Yamaha, dominou os testes pré-temporada e venceu com autoridade as duas primeiras etapas (Catar e Rio Hondo). Os mais afoitos previram o fim da superioridade da Honda na MotoGP, um novo campeão pilotando uma Yamaha havia surgido. O resto da temporada contou outra história. No final das 18 provas Marc Márquez da Honda venceu o campeonato e só foi desafiado pela Ducati de Andrea Dovizioso. Maverick Vinales ficou com a terceira colocação a 68 pontos do líder. Detalhe, 2017 foi a temporada que marcou a última vitória (Assen) de Valentino Rossi na categoria.

 

Este ano a história se repete. O francês Fabio Quartararo dominou sem oponentes as primeiras etapas do mundial deste ano (ambas as corridas em Jerez). Depois de duas vitórias convincentes e com o acidente que tirou Marc Márquez da competição, a via parecia aberta para coroar um novo campeão, com uma Yamaha em uma equipe satélite. Até a pouca idade do francês foi lembrada para citar uma possível reedição do fenômeno Márquez. O próprio Quartararo em conversas informais dizia que estava tomando cuidados redobrados porque o seu maior adversário este ano seria a Covid-19.

 

As provas em circuitos não tão favoráveis à extraordinária velocidade de curva da Yamaha contam uma história diferente. O primeiro acidente de percurso para o piloto da Petronas aconteceu em Brno (República Checa), onde sua moto fracassou e ele obteve apenas a 7ª colocação, enquanto seu colega de equipe chegou em 2º lugar. A maionese desandou em Red Bull Ring, onde seu desempenho caiu para 8º no primeiro GP e 13º na segunda prova. A reação de Quartararo foi o padrão destas ocasiões, culpou o equipamento. A liderança folgada que se desenhava nas duas provas iniciais foi drasticamente reduzida, agora apenas 4 pontos o separam das Ducati de Dovizioso e Miller.

 

A boa notícia para os pilotos que ambicionam o título deste ano é que Marc Márquez deve perder as 2 ou 3 próximas provas, resultado de sua insistência em voltar a competir sem ter a fratura consolidada. As más notícias são mais numerosas, a KTM está em uma crescente evolução, não só com os pilotos da equipe oficial, um da satélite Tech3, Miguel Oliveira, conseguiu uma vitória na última etapa. Pol Espargaro tem apresentado um ritmo consistente de prova e obter bons resultados é só uma questão de detalhes, lembrando que foi envolvido em dois incidentes em Brno e na primeira prova da Áustria. A Suzuki, embora sem contar com Alex Rins em plena forma, disputou em condições de igualdade com os motores V4 em Red Bull Ring, Joan Mir pilotou um equipamento com condições de desafiar os líderes na segunda prova e foi prejudicado com a paralização da prova pela bandeira vermelha. A Ducati já venceu nesta temporada e as satélites Pramac (Miller)  e Avintia (Zarco) são assíduos na disputas pelas  primeiras colocações.

 

Oliveira, Miller & Espargaro na última curva – Styria 2020

 

Depois de 5 etapas neste estranho campeonato, uma constatação é evidente, a dinâmica da MotoGP está diferente. Quando Marc Márquez está no grid, as chances de pódio dos outros pilotos reduzem em 1 terço. No ano passado a campeão esteve presente no pódio 17 vezes em 18 GPs e abriu uma diferença de mais de 150 pontos sobre o segundo colocado, lembrando que todos os que acompanham a MotoGP são unânimes em dizer que a sua Honda não era a melhor moto do grid. O histórico do piloto espanhol justifica a fama de ser um ponto fora da curva. A sabedoria popular ensina que que quando o gato não está presente os ratos tomam conta. As disputas nesta temporada estão muito equilibradas, metade do grid tem legítimas aspirações de vitória Quatro vencedores em cinco provas mostram que é grande a disputa.  O último pódio na Áustria, com duas KTM e uma Ducati, foi a primeira vez em 47 ano em que não tinha um representante de uma fábrica japonesa (o GP da Suécia em 1973 foi de duas MV Agusta italianas e uma  Konig alemã).

 

Em 1999 quando Mick Doohan sofreu o acidente, por coincidência em Jerez, que encerrou sua carreira um fenômeno semelhante aconteceu. Houve seis vencedores diferentes em 16 GPs. Sem a presença de Doohan, o pódio mais próximo de todos os tempos aconteceu na Austrália em 1999, apenas 0,124 segundos separaram o vencedor do 3º colocado. Em 2020 já houve 4 vencedores em 5 provas, resultado que comprova que os pilotos de pelo menos 5 fabricantes diferentes (a Aprilia ainda não está no nível das outras) tem condições de vencer.

 

Um outro indicativo que os equipamentos estão andando mais próximos é o número de toques, acidentes e incidentes que aconteceram na MotoGP nos últimos três fins de semana (Brno Red Bull Ring). A tendência é que esta situação seja mantida até a última semana de novembro.


Bandeiras vermelhas decidiram a prova

 

As bandeiras vermelhas foram decisivas nas duas etapas de Red Bull Ring. Na primeira prova deu fôlego para Andrea Dovizioso que estava apagado e de certa forma estava prejudicou Pol Espargaro, que estava em ritmo excelente abrindo na liderança. Neste último fim de semana possibilitou a correção de um erro de escolha de Miguel Oliveira, que largou com o pneu dianteiro médio e nas primeiras voltas sentiu que não era adequado. Durante a bandeira vermelha trocou para o composto hard que melhorou em muito o desempenho da sua KTM. O desfecho da prova também foi influenciado por um erro de sinalização dos boxes, que induziu Pol Espargaro a uma alteração no modo de conduzir a moto. O box sinalizou na última volta que ele estava +0 na frente de Miller. O cronometro na verdade indicava que havia alguma distância entre eles. Baseado na informação recebida o piloto adotou uma linha defensiva, utilizando um percurso diferente do que estava fazendo e freando onde havia menos borracha na pista. Pela frenagem não ser tão eficiente acabou abrindo demais uma curva e foi ultrapassado. Conseguiu recuperar a liderança, mas voltou a abrir demais na última curva, desta vez induzindo Jack Miller a cometer o mesmo erro e ambos entregaram a vitória para Miguel Oliveira.

 

Maverick Vinales – Nervos de aço

 

Lupcínio Rodrigues, cantor e compositor brasileiro conhecido por ter inventado a dor de cotovelo, descreveu em uma das suas composições o tipo ideal de piloto para a MotoGP: “Pessoas com nervos de aço”. O acidente que causou a bandeira vermelha na última etapa aconteceu com o piloto da Yamaha Maverick Vinales. O Red Bull Ring pode ser definido como 3 km de arrancada com um miolo, as retas do autódromo permitem velocidades de mais de 300 km/h. Quando se aproximou do final da reta mais veloz, o piloto descobriu que estava totalmente sem freios e um choque frontal com a proteção de ar que antecede a defensa metálica era inevitável. Vinales não hesitou, apesar da velocidade, (segundo a telemetria a 230 km/h)  pulou da moto em movimento e deslizou pelo asfalto e brita, enquanto sua Yamaha se chocava violentamente com a proteção.  O equipamento ficou destruído, o piloto íntegro. A Brembo, fornecedora da Yamaha havia recomendado que todos os protótipos deveriam usar o novo sistema de freios desenvolvido para 2020, com pinças maiores e melhor desempenho. A moto de Vinales era a única da fábrica que não estava utilizando este novo mecanismo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário