quarta-feira, 10 de abril de 2019

MotoGP – “Hors Concours"


MM #93 no Circuito das Américas


Clóvis Bornay foi um museólogo e carnavalesco brasileiro, criou o Baile de Gala do Carnaval no Theatro Municipal do Rio de Janeiro (1937) e ganhou notoriedade por participar de concursos de fantasias. Nos tempos que antecederam a TV e a internet, os principais meios de divulgação da mídia eram jornais e revistas Bornay foi um mestre em fantasias de carnaval, venceu praticamente todos os concursos que participou. Como a simples menção de sua inscrição desencorajava a participação de outros competidores, acabou sendo declarado “Hors Concours”, um concorrente de honra que se apresentava nos desfiles, porém não era considerado em termos de premiação.


Talvez este seja um caminho para a MotoGP nos EUA, ao promover a competição declarar Marc Márquez como “Hors Concours”, permitindo que outros pilotos tenham a chance de comemorar a vitória. Os registros oficiais da MotoGP indicam que desde 2011 Márquez disputou 11 provas em solo norte-americano, venceu todas. O piloto espanhol acumula vitórias em Indianápolis em 2011 e 2012 pela Moto2, e desde 2013 na MotoGP. Venceu as provas disputadas em Laguna Seca (1), Indianápolis (3) e no Circuito das Américas (6). Um currículo impecável. A menor diferença em uma prova nos EUA foi Indianápolis em 2015, 0,688seg em relação a Jorge Lorenzo (Yamaha), no ano seguinte em Austin conseguiu a maior folga, 6,107seg contra o mesmo adversário. A expectativa para o próximo GP, estimulada pelo resultado da corrida anterior, uma vitória com larga margem em Rio Hondo, é que a história se repita. Um indicativo claro do alcance desta tendência é que as casas de apostas de Londres devolvem o valor para os prognósticos cravados no atual campeão. Esta previsibilidade associada à ausência de pilotos americanos na disputa não contribui para promover o mundial nos EUA.


Não há como fazer um exercício de futurologia confiável, mas uma análise dos números de mundial de motociclismo da FIM em território americano serve como uma referência. Os protótipos Honda sempre apresentaram bons resultados nos EUA, dos 31 GPs disputados, 2 em Daytona, 15 em Laguna Seca, 8 em Indianápolis e 6 em Austin, 15 foram vencidos por equipamentos do fabricante nipônico. Desde que o mundial foi reformulado e assumiu o nome de MotoGP em 2002, máquinas Honda cruzaram a linha de chegada na frente em 18 das 23 provas. No ano passado a sequência poles obtidas por Márquez no circuito foi interrompida, não por ter aparecido um desafiante mais veloz, o campeão foi penalizado por supostamente ter atrapalhado a volta de outro concorrente, caso contrário teria um histórico perfeito de 6 poles e 6 vitórias nas 6 provas disputadas no circuito. Curiosidade, o último piloto a obter uma vitória com equipamento de outro fabricante nos EUA foi Jorge Lorenzo em 2012, na oportunidade a bordo de uma Yamaha. Lorenzo este ano é colega de Márquez na Repsol-Honda. Só três pilotos relacionados no mundial deste ano já venceram nos EUA desde 2002, Valentino Rossi, Jorge Lorenzo e Marc Márquez.


Na MotoGP atual os fabricantes de estão na busca constante de soluções técnicas, algumas exóticas, para melhorar cada vez mais o desempenho de seus equipamentos. Todas as equipes têm especialistas dedicados a esmiuçar os regulamentos em busca de possíveis detalhes que possam ser explorados para obter vantagens durante as provas. Neste cenário um personagem está se notabilizando por sua eficiência e criatividade. Em 2013 Gigi Dall’Igna assumiu o departamento de competições da Ducati com o objetivo explícito de conquistar título para a fábrica italiana. Recebeu uma equipe como a autoestima em baixa por não ter conseguido nos dois anos anteriores (2011 & 2012) fornecer um equipamento para o herói italiano Valentino Rossi vencer uma única corrida. Dall’Igna percebeu que o pessoal era engenhoso e competente, porém carente de organização, orientou seu trabalho estimulando a criatividade e técnicas da administração.


O resultado pode ser percebido no visual externo dos protótipos, nos últimos anos a Ducati inovou nas winglets (asas), criou uma lancheira acoplada na rabeta da moto cuja finalidade é um dos segredos mais bem guardados da categoria, testou o uso de um braço de torque, renasceu o dispositivo holeshot e, no  Catar, protagonizou toda uma celeuma com a sua “colher”, alegadamente para resfriar o pneu traseiro. São soluções práticas, talvez até exóticas, sempre em busca de alguma vantagem para vencer seus concorrentes. O trabalho de Dall’Igna está apresentando resultados, desde o último terço da temporada de 2016, a Ducati está se credenciando como protagonista do mundial de pilotos, superando Yamaha e Suzuki na tarefa de desafiar a supremacia da Honda.


Gigi Dall’Igna sabe que a fábrica japonesa tem uma vantagem extra difícil de ser igualada, o talento do piloto que ocupa o assento da moto #93. A importância de Marc Márquez fica evidente quando se analisa os últimos resultados, em 2018 ele foi campeão tendo conquistado mais de 70% dos pontos possíveis na temporada, a segunda melhor colocação de uma Honda no mundial foi de Cal Crutchlow, que classificou-se em sétimo.


Este é o cerne da beleza da MotoGP. As equipes investem somas consideráveis para fornecer aos pilotos recursos próximos ao estado da arte da tecnologia, os organizadores tentam equalizar as oportunidades com regulamentos rígidos e, depois que as luzes de largada se apagam, o que prevalece é a determinação e o talento dos pilotos.

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