A
RC211V foi um protótipo desenvolvido pela Honda com motor 4 tempos, lançado em
2001 para substituir a legendária NSR500 2 tempos. A mudança da MotoGP para
motores de 4 tempos aconteceu quando os grandes fabricantes foram pressionados
a encerrar a produção industrial dos motores de 2 tempos pela emissão excessiva
de poluentes. Não havia lógica para os fabricantes continuarem investindo no
desenvolvimento destes motores se a tecnologia não puder ser portada para as
motos comerciais. A mudança de 2 para 4 tempos exigiu uma nova curva de
aprendizado, que resultou, cinco anos depois, na MotoGP V4 (800cc) RC212V,
conservando a ideia básica da centralização das massas com o objetivo de
melhorar o comportamento dos protótipos ao longo das corridas.
Importante
para o balanceamento e bom desempenho é a localização do centro de gravidade do
equipamento e uma das opções é utilizar o espaço atrás do assento do piloto
para transportar controles eletrônicos, câmera embarcada, amortecedores de
massa e outros componentes. Deslocar peso para a parte de trás da moto ajuda a
amortecer a ressonância criada por sistemas rotativos como o contato do pneu
traseiro com a pista, um dos grandes obstáculos para manter o controle do
equipamento em voltas rápidas. Um efeito chamado “chatter” é resultado de uma
vibração de alta velocidade identificada entre os pneus e a pista, criada pela
incompatibilidade harmônica entre várias partes da moto. “Chatter” excessivo é
quase um sinônimo de queda.
A
justificativa científica para amortecer a vibração deslocando massa para a
traseira do equipamento é simples: o momento da inércia aumenta em relação ao
quadrado da distância, então adicionar peso que longe do centro de massa da
motocicleta é uma ótima maneira de combater o “chatter”.
Os protótipos de corrida são
incrivelmente sensíveis ao efeito “chatter”. Em 2012, quando a Bridgestone,
então a fornecedora exclusiva de pneus, mudou no meio da temporada a
consistência do componente dianteiro para um composto mais macio, a RC212V da
Honda sofreu muito com os fenômenos causados pela ressonância, com sérios
problemas de dirigibilidade para Casey Stoner e Dani Pedrosa em algumas
corridas. Na época os engenheiros da HRC ficaram perplexos com a extensão das
vibrações reportadas pelos pilotos, principalmente porque a telemetria indicava
que se manifestavam de forma diferente nas curvas para a direita e para a
esquerda. Como os desenhos dos autódromos não são simétricos e o conjunto de
forças que atua sobre a moto varia em cada curva, os engenheiros custaram a
identificar que a causa era o centro de massa levemente deslocado para um dos
lados, uma anormalidade quase imperceptível, mas que causava um resultado
devastador. Embora a diferença fosse mínima, a vibração era ampliada pela
ressonância gerada pelo movimento rotativo da roda motriz e os outros
componentes (virabrequim) do protótipo. O conceito de ressonância na mecânica dos
movimentos define o fenômeno que um sistema cíclico, em algumas frequências
específicas, provoca a oscilação de outros sistemas com amplitude maior. Nessas
condições até mesmo forças periódicas pequenas podem produzir vibrações de
grande amplitude, uma vez que o sistema armazena energia vibracional.
Embalar
uma moto de corrida compactando componentes revestidos por soluções
aerodinâmicas nunca é fácil, mas fica cada vez mais desafiador na MotoGP à
medida que as fábricas buscam ganhos cada vez menores em desempenho. Por fim, é
importante lembrar que os fabricantes não buscam só maior aceleração em linha
reta pelas razões mais óbvias, além de maior equilíbrio durante as frenagens e
facilitar a retomada depois das curvas, o aumento da velocidade máxima diminui
o estresse no pneu dianteiro, o piloto não precisa deixar a frear a moto muito
perto do contorno para compensar tempo perdido. A Honda está particularmente
interessada em reduzir o calor em seus pneus dianteiros para que os irmãos
Márquez, Cal Crutchlow e Takaaki Nakagami possam completar os GPs utilizando
compostos mais macios.
A
pandemia do Corona Vírus está gerando um clima de incertezas, não só em relação
as datas dos GPs, mas principalmente porque os fabricantes perderam as
referências dos testes conjuntos. Algumas equipes e pilotos, e o exemplo mais
significativo é do atual campeão do mundo e da Honda, ganharam mais prazo para
consolidar a condição física e recuperar o atraso no desenvolvimento de seus
protótipos. A especificação dos motores ainda não está lacrada, ou seja, as
equipes ainda estão trabalhando em seu desenvolvimento e as observações
comparativas coletadas nos últimos testes podem não ser mais válidas.
A
parte financeira também foi seriamente afetada, e de modo desigual. Os seis fabricantes
que disputam a categoria máxima são em parte subsidiados pela MotoGP. O mesmo
ocorre com as equipes das categorias menores (Moto3 e Moto2), embora em valores
muito mais baixos. A ausência de GPs interrompeu o fluxo de caixa da entidade
organizadora e os orçamentos têm que ser cuidadosamente reavaliados. Existem
diversos pontos contratuais pendentes de análise, os prejuízos causados pela
pandemia atingiram os também os patrocinadores e a maioria dos contratos está
vinculada ao número de GPs, que nesta temporada ainda não está definido.
Os
campeonatos de esportes motorizados ficam inviabilizados se houver GPs sem
público. Ao contrário de outras modalidades onde os ginásios ou arenas costumam
ser propriedade das equipes ou clubes, autódromos são mantidos por instituições
autônomas que arcam com os custos de manutenção e pagam valores significativos
pela oportunidade de hospedar algum evento. Uma corrida sem assistentes mantém
as despesas e priva as entidades de administração de receitas, não só na venda
de ingressos, também do aluguel de espaços para comercialização de alimentação
e produtos relacionados, sem citar que marcar uma prova sem espectadores acaba
com a indústria do turismo na região. O recente cancelamento do tradicional TT
Isle of Man privou a dependência britânica de uma fonte importante de recursos
(fluxo de turistas) para equilibrar seu orçamento anual.
Nas
disputas pessoais ou entre equipes praticadas em quadras ou locais fechados os
atletas podem ser incentivados por aplausos ou influenciados por vaias dos
espectadores. O motociclismo é um esporte onde desde a autorização da largada o
piloto fica solitário, isolado do que acontece fora de seu cockpit. Ovações ou
apupos tem pouco significado durante a prova, portanto a presença ou ausência
de público não é um fator relevante para o resultado de uma competição.
Carlos
Alberto
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