terça-feira, 28 de novembro de 2017

MotoGP - Mudanças na HRC





A definição de Xadrez é ambígua, alguns entendem que é um esporte, há correntes que consideram uma arte e muitos definem como uma ciência.  De uma maneira ampla, o Xadrez é um jogo de tabuleiro de natureza recreativa ou competitiva para dois jogadores. Muito se tem escrito sobre o Xadrez, e alguns apregoam maravilhas no desenvolvimento da capacidade de raciocínio dos enxadristas, embora os mais céticos defendam que a prática do Xadrez desenvolve exclusivamente a capacidade de jogar Xadrez. Uma das características do jogo/arte/ciência é manter as regras inalteradas por séculos. Em alguns esportes, especialmente os que são acompanhados por multidões de entusiastas como a MotoGP, atualizações e mudanças são atributos contidos em seu código genético.

A HRC está mudando, de novo.

No final do ano de 2016 Shuhei Nakamoto, vice-presidente executivo da HRC, aposentou-se após 34 anos de serviços. Nakamoto saiu no final de uma temporada onde a equipe oficial da Honda coroou um de seus pilotos como tricampeão na MotoGP e reconquistou o título de construtores que havia perdido para a Yamaha em 2015. Os últimos dias de Nakamoto san não foram tranquilos, a Honda foi acusada de ser o responsável pelo banimento das “winglets”, apêndices aerodinâmicos para melhorar o desempenho nas pistas, em tese pela sua incapacidade de superar a o “know-how” da Ducati nesta área. O então gestor da HRC nunca aceitou esta versão e insiste que as “winglets” foram banidas por teimosia pura da Ducati, que não aceitou nenhuma das sugestões apresentadas pelos demais fabricantes para reduzir os riscos em um possível acidente.

Um ano depois, durante a comemoração de mais um duplo mundial de piloto e construtores, Livio Suppo, o gestor que assumiu muitas das funções de Nakamoto san, também anunciou a sua saída da equipe Repsol-Honda. Foi um movimento inesperado, Suppo tinha contrato por mais um ano e antecipou a sua retirada alegando motivos pessoais. O administrador justificou que a MotoGP é muito cansativa e que está aberto a novos desafios, desde que sem rotinas tão estressantes. A atual situação da HRC está sob controle, pilotos e patrocinadores já estão com contratos fechados para 2018, sair agora permite que a nova administração possa organizar e planejar o futuro da equipe. Suppo integrou a Ducati entre 1999 e 2009, conquistando neste período o único mundial vencido pela equipe italiana (Casey Stoner em 2007). Seu currículo também inclui cinco títulos na HRC, quatro com Márquez e um com Casey Stoner.

Livre das limitações impostas por sua antiga função, Livio Suppo não se furtou a opinar sobre diversos assuntos relacionados com a última temporada. Elogiou sobremaneira a evolução da KTM em seu primeiro ano na categoria, esclarecendo que nunca conversou sobre uma possível mudança com o fabricante austríaco.

Sobre Marc Márquez esclareceu que toda a demora para assinar este ano foi por negociações centradas em questões técnicas, por isto acredita que ele fica na equipe no binômio 2019/2020. O atual tetracampeão não elege o lado financeiro como fator principal em um contrato. A maior evidência é que Márquez tem uma propriedade em Andorra, local escolhido por vários desportistas por sua beleza natural e excelentes condições de treino ao ar livre, mas presta contas ao fisco espanhol, caso único entre os ídolos de esportes do país. Óbvio, dinheiro é uma das maneiras que uma fábrica mostra seu reconhecimento para um piloto, mas não é a única, no caso de Márquez pesam ainda fatores técnicos e familiares, seu irmão Alex pilota uma Honda da Marc VDS na Moto2

Segundo Suppo o salto de qualidade de Andrea Dovizioso em 2017 deve ser creditado em parte ao estímulo causado pela contratação de Lorenzo. A valorização da equipe com a chegada do multicampeão proporcionou maiores investimentos da fábrica de Borgo Panigale e forneceu as condições essenciais para o desempenho do veterano piloto italiano em 2017. Dovizioso aproveitou O piloto italiano aproveitou toda a sua experiência com o equipamento e seu trânsito com a equipe de apoio para obter os bons resultados.

Suppo também comentou sobre dois assuntos recorrentes em relação a Repsol-Honda, a manutenção de Dani Pedrosa na equipe e o GP de Valência em 2015. Ele considera Pedrosa no comando de um equipamento da MotoGP, com o físico que possui, algo muito próximo de um milagre. Independentemente deste fato, o diminuto espanhol é um dos melhores pilotos nas pistas e único piloto a conquistar pelo menos uma vitória por temporada nos últimos 16 anos. Sobre Valência em 2015, a HRC ainda comandada por Nakamoto san permitiu que seus dois pilotos decidissem sobre como proceder na pista. A estratégia de Márquez de poupar equipamento para as últimas voltas foi atrapalhada pela vontade de Pedrosa vencer, permitindo a vitória de Lorenzo. A equipe havia fornecido a telemetria da prova anterior em Sepang e a FIM decidiu não divulgar, o que é compreensível porque existem coisas que estão sujeitas a interpretações. A Federação entendeu que ambas as posições (Rossi & Marquez) eram igualmente defensáveis preferiu não jogar gasolina no fogo.

A relação de Lorenzo com a Ducati é antiga, em 2009 a equipe que Suppo fazia parte trabalhou para que ele migrasse para a equipe italiana. O resultado não foi legal, além de não convencer o maiorquino a abandonar a Yamaha, ainda desagradou Stoner que acertou a sua transferência para a Honda. Lorenzo é um piloto excepcional no comando de uma moto, mas péssimo em comunicação. Nos bastidores da MotoGP existe um consenso que é uma tarefa inglória gostar de Lorenzo, o seu comportamento não facilita e em momentos difíceis quando abre a boca, quase sempre está enganado. O grande problema é que a transferência de Lorenzo para a Ducati foi caracterizada para a equipe como a chegada de um salvador da pátria. Gigi Dall'Igna prometeu investir pesado para conquistar um título, a equipe está cumprindo sua parte, o equipamento já é um dos melhores das pistas e só no final da temporada Lorenzo começou a justificar o seu custo. Se em 2018 Dovizioso continuar com resultados melhores, a situação do espanhol vai ficar desconfortável. Seu valor de mercado deve cair muito.

Livio Suppo nunca trabalhou com Valentino Rossi, e isto não o impede de admirar o ídolo italiano embora, como tantos outros, acredite que tem ele muito pouco a contribuir nos dias atuais. Já havia saído da Ducati quando Rossi foi contratado, e é um dos artífices da estranha equipe de três pilotos que a Honda inscreveu em 2011 (Stoner, Pedrosa e Dovizioso), solução encontrada para acomodar Casey Stoner, que conquistou o título da temporada.

A fila anda. Quando os protótipos da MotoGP alinharem para a primeira prova de 2018 muitas caras novas estarão presentes no grid e nos bastidores. Livio Suppo não estará nos boxes da Repsol-Honda, entretanto muitas de suas ideias e metodologias vão estar presentes. A ausência do italiano conciliador de sorriso fácil e cabelos raspados será sentida.  

segunda-feira, 20 de novembro de 2017

Acidente Fatal na Motovelocidade em Macau (Vídeo)


Daniel Hegarty


Um acidente causou o óbito do piloto britânico Daniel Hegarty e encerrou precocemente o GP de Macau, edição de 2017.
Na sétima das doze voltas previstas para a prova realizada nas ruas da região administrativa especial da República da China, onde um dos idiomas oficiais é o português, o piloto da equipe TopGun Racing perdeu o controle da moto e atingiu violentamente os guard-rails que limitam a pista.
A força do impacto deixou Hegarty deitado imóvel na pista e sua moto foi totalmente destruída. O piloto foi socorrido imediatamente e chegou já sem vida ao hospital.
O GP de Macau é evitado por pilotos que participam do mundial da FIM por ser disputado em circuito de rua e não contemplar áreas de escape.
A corrida foi encerrada, com um pódio totalmente britânico.
As 18:30 hs deste sábado, horário local, o Comitê Organizador do Grande Prêmio de Macau confirmou a fatalidade emitindo a seguinte nota oficial:
“É com profundo pesar que o Comitê do Grande Prêmio informa que o piloto britânico não resistiu aos seus ferimentos e faleceu durante o transporte de ambulância para o Hospital Conde de São Januário”.

Video: https://www.youtube.com/watch?v=gZs9cWFON08

Carlos Alberto

sexta-feira, 17 de novembro de 2017

MotoGP - Coadjuvantes

Valência 2017


A MotoGP tem uma longa história, é injusto creditar exclusivamente a um ator, ocorrência ou ao que aconteceu na última prova a conquista de um campeonato. Se existia alguma desconfiança sobre o qual melhor piloto em atividade, e utilizo o condicional porque paixão e razão dificilmente andam juntos, tem uma grande chance de 2017 ter eliminado qualquer dúvida. Os 6 mundiais vencidos em 8 disputados ou os 4 títulos conquistados em 5 temporadas na classe principal falam por si, entretanto nesta última edição Marc Márquez encontrou novas formas de vencer, com um inventário variado de estratégias, técnicas e ousadia. Sua capacidade de recuperar o controle de sua moto em episódios antes considerados acidentes inevitáveis é demonstração de talento puro. Márquez é um piloto que definitivamente anda mais que a máquina e a sua única desculpa para contrariar as leis de Newton que regem o movimento dos corpos no universo é nunca ter estudado física. Para definir Marc Márquez pode ser aplicada uma frase de Maurício Gugelmin descrevendo sua admiração por Ayrton Senna: “Se for convidado para disputar uma prova de moto-niveladoras, todos já têm uma noção de quem é favorito”. O piloto da Honda é o mais jovem a conseguir 4 títulos na classe principal e desde sua estreia em 2013, ano de seu primeiro triunfo, acumula pelo menos 5 vitórias por temporada. Em 2017, com um equipamento complicado no início do ano conseguiu apenas uma vitória nas 8 primeiras provas, nas últimas 10 venceu 5 vezes. Conquistou o campeonato pela consistência, marcou pontos onde a vitória era impossível, seu pior resultado valido foi um 6º em Mugello. Conseguiu ainda 2 quartos lugares, 3 não classificações (quedas na Argentina e França, motor na Inglaterra) e esteve no pódio em todas outras provas.

A festa da Repsol-Honda em Valência incluiu mais componentes que os títulos de Márquez, fabricantes e equipes, poucos no circuito perceberam a importância da vitória de Dani Pedrosa. O colega de equipe de Márquez é uma figura diferenciada nos mundiais de motovelocidade. Com sua compleição física diminuta, 1,60 m de altura e 51 Kg de peso, o espanhol de 32 anos estreou na então 125cc em 2001 e desde 2006 pilota um dos equipamentos da equipe Honda. Em Valência conseguiu a sua 31ª vitória na classe principal, o mesmo número de Eddie Lawson, e igualou o total de 54 vitórias de Mick Doohan em todas as classes (detalhe: Doohan conseguiu todas as suas vitórias na 500cc). O australiano Mick Doohan é o único remanescente da época de ouro da motovelocidade que acompanha os números de Valentino Rossi, Jorge Lorenzo, Marc Márquez e Dani Pedrosa, o chamado quarteto fantástico. Ícones da história do motociclismo esportivo como Wayne Rainey, Kevin Schwantz e Eddie Lawson já foram ultrapassados.

As conquistas de Dani Pedrosa nunca foram suficientemente reconhecidas, ele é o único piloto que venceu sucessivas disputas diretas na pista com gênios como Valentino Rossi, Marc Márquez, Jorge Lorenzo e Casey Stoner. Alguns mais críticos sempre indicam que ele só obteve títulos nas categorias menores (2003 na 125cc, 2004 e 2005 na 250cc), porém uma rápida consulta na relação de campeões desde 2006 indica apenas 5 nomes, Hayden, Stoner, Rossi, Lorenzo e Márquez, é um clube muito restrito.

A temporada terminou e provavelmente seus detalhes se percam nos registros do tempo. Sobre 2017 a história deve mencionar brevemente os “Saves” miraculosos de Márquez, as ordens de equipes e talvez a luta hercúlea de Andrea Dovizioso para procrastinar a decisão para a última prova do ano em Valência. A vitória de Dani Pedrosa vai ser só mais um dado estatístico.

O ano de 2017 também ficou marcado por tentativas de solapar um dos princípios básicos da MotoGP, a solidão dos pilotos desde que se apagam as luzes da largada até a bandeirada final. O primeiro indício surgiu em Sepang, na penúltima etapa do mundial. A prova era liderada pela Ducati #99 de Jorge Lorenzo, seguida de perto pelo então ainda possível desafiante ao título Andrea Dovizioso com a Ducati #04. Nas últimas voltas surgiu uma mensagem aparentemente normal no painel de Lorenzo: “Suggested Mapping: Mapping 8”, poderia ser apenas uma indicação da equipe para o piloto adequar o comportamento da moto às condições de pneus e combustível para os últimos quilômetros da corrida. A desatenção de Lorenzo em uma das voltas seguintes o obrigou a abrir demais uma curva e ele foi ultrapassado. Dovizioso venceu a prova e ganhou uma sobrevida, um tênue sopro de esperança de vencer o mundial. Para os que acompanharam a corrida pareceu uma mensagem cifrada, para nós tupiniquins reativou lembranças desagradáveis, Felipe Massa, Rubens Barrichello e até Ayrton Senna (Suzuka 1991) já receberam ordens semelhantes, e obedeceram.


Quando em Valência o painel de Lorenzo, que ocupava a 4ª colocação próximo aos líderes e era seguido de perto por Dovizioso recebeu a mesma mensagem, foi quase uma confirmação de que se tratava de uma ordem codificada da equipe. A sinalização, que tem duração limitada, foi enviada diversas vezes a partir da metade da corrida e removeu qualquer dúvida, a Ducati exigia que o espanhol cedesse a posição para o italiano. Lorenzo simplesmente ignorou. A equipe então decidiu abandonar qualquer escrúpulo e sinalizar ostensivamente com uma placa no muro dos boxes, negando a Lorenzo qualquer possibilidade de alegar não ter recebido a orientação.

A recusa de Lorenzo não foi propriamente uma surpresa. Óbvio que ele estava disposto a auxiliar o colega, mas as condições na pista nunca ofereceram a mínima chance para Dovizioso e nestas circunstâncias ele preferiu perseguir sua primeira vitória. Ele sempre soube durante a prova que a Ducati não tinha equipamento para acompanhar as Honda e a Yamaha de Zarco. Assistiu de uma posição privilegiada quando Márquez perdeu a frente e ainda assim permaneceu na pista. Também sempre soube que para manter uma distância mínima do grupo da frente estava assumindo riscos incompatíveis com as condições mínimas de segurança. Ele apostou alto, e pagou sua audácia com uma queda. Lorenzo não ficou surpreso por Dovizioso ter bancado a mesma aposta e saído na mesma volta.

A Ducati foi obrigada a se render aos argumentos do piloto espanhol, seu procedimento na pista sempre foi alinhado com o que era o mais útil para a equipe. Gigi Dall'Igna, a principal autoridade da Ducati nos bastidores da prova perguntou a Lorenzo se tinha recebido as repetidas mensagens, ouviu do espanhol a confirmação de que estava ciente e decidiu ignorar pelas circunstâncias da prova. A análise mais racional no ambiente da Ducati foi realizada pelo diretor Paolo Ciabatti: “Não há como julgar a situação com base em imagens de TV, o piloto é o único que sabe qual o ritmo possível. A empresa paga bons salários para seus profissionais e deve confiar em seu discernimento. A Ducati teria todo o direito de ficar indignada se Márquez não completasse a prova, Lorenzo ficasse em 1º e Dovizioso em 2º. Não foi o caso”.

De certa forma a conduta de Jorge Lorenzo resgatou o ideal esportivo da MotoGP, corridas são decididas pelo desempenho de pilotos e máquinas na pista. A maioria dos locutores e comentaristas que trabalharam no evento, incluindo os que transmitiram para o Brasil, condenaram o comportamento do espanhol. Minha opinião pessoal é que a instituição MotoGP foi preservada. Rossi, Lorenzo, Márquez, Pedrosa, Vinales, Dovizioso e tantos outros vitoriosos se destacam por serem excelentes pilotos, não por terem patrocínios pessoais fartos e/ou bons advogados. Até os dias atuais persiste a dúvida para os adeptos da velocidade se todas as realizações extraordinárias de Michael Schumacher eram devidas exclusivamente ao seu talento nas pistas ou previstas em contratos com seus empregadores. A MotoGP não pode adotar este caminho, abrindo mão da sua essência.

No pós-prova Márquez foi festejado, Dovizioso tratado com gentileza e Lorenzo execrado pela mídia. O italiano foi recebido com uma salva de palmas quando compareceu a um encontro com a imprensa, Jorge Lorenzo por muito pouco não foi agredido. Um repórter mais afoito proferiu uma série de acusações e impropérios, recebeu como retorno uma afirmação cortês: “Como você não fez uma pergunta, não tenho uma resposta adequada”.

O que teria acontecido se Lorenzo tinha deixado Dovizioso passar? O italiano provavelmente cairia mais cedo se tentasse buscar os líderes, a moto #04 foi mais lenta que a #99 em suas últimas voltas na pista. Assim como Lorenzo, não teria como tentar uma maior aproximação com quem estava na ponta. Se o espanhol agiu certo ou errado é irrelevante para os resultados do campeonato, as explicações que apresentou são plausíveis. Talvez, e entrar no ramo de suposições é complicado, o sentimento da Ducati pudesse ser suavizado se uma de suas motos vencesse a prova, mesmo com Márquez terminando antes da 11ª colocação.

Se a insistência obstinada da Ducati em obrigar Lorenzo a ceder posição foi um legítimo gol contra, e a tentativa de justificar alegando ter sido só uma sugestão ofende a inteligência dos adeptos da MotoGP. A fábrica italiana devia ter percebido que seu desempenho ao longo da temporada foi mais que elogiável. Levar um piloto até a última etapa com condições de vencer o mundial, atropelando fabricantes japoneses e austríacos, já é uma grande proeza. Andrea Dovizioso e a Ducati definitivamente não podem mais serem rotulados como coadjuvantes, são protagonistas.

terça-feira, 14 de novembro de 2017

MotoGP & F1 - Desabafo!

Amanda Lopes de Araujo


Aprendi aqui no Autoracing que esportes são uma extensão da vida e os esportes a motor, especialmente o automobilismo e a motovelocidade, representam o domínio da tecnologia e do homem sobre a máquina. As referências a Hamilton, Vettel, Massa, Márquez e Dovizioso na mídia superam o número de citações para Ferrari, Mercedes ou Honda. Pessoas tem preferência.
Acompanhando o site também percebo que os redatores/colaboradores procuram sempre inserir as notícias/opiniões no contexto da nossa realidade. Uma das últimas publicações utilizou o ambiente de decisão na MotoGP do último domingo para citar fatos históricos – revolução de 1930 – e mencionar a tendência dos brasileiros – que o autor chama de tupiniquins – em interpretar de forma divertida qualquer ocorrência.
Sir Winston Churchill, ao fazer uma homenagem aos pilotos da RAF (Real Air Force) por seu desempenho heroico na Grande Guerra gerou uma frase antológica: “Nunca tantos deveram tanto a tão poucos”. Em tempo, não era uma referência as administradoras – tão poucos – e usuários de cartões de crédito – tantos – na atual conjuntura do país.
Com a licença do ex primeiro ministro britânico, quero modificar a frase para justificar este meu desabafo: No Brasil atual, nunca tão poucos envergonharam tanto toda uma população. O mal que os marginais, pessoas inescrupulosas, excrescências da sociedade causaram na autoestima brasileira ao praticarem assaltos contra equipes de profissionais estrangeiros que vieram trabalhar para o GP Brasil de Fórmula 1 é incomensurável. Estas notícias circularam em todo o planeta com uma velocidade maior que Lewis Hamilton com pneus ultra macios em Interlagos. O estrago foi tamanho que nem toda a habilidade de Marc Márquez em controlar desastres consegue evitar.
Nos últimos anos o Brasil tem sido mais eficiente em propagar seus maus feitos que toda a repercussão das loucuras que acontecem no Oriente Médio. Um delegado federal sedento por seus minutos de fama resolveu, baseado em investigações pífias, destruir o conceito do país como produtor de proteína animal causando um prejuízo ainda não calculado. Um Procurador Geral entendeu que seu futuro pessoal é mais importante que o do país e decidiu derrubar o presidente confiando irrestritamente em alguém que criou um império baseado em propinas e benesses de corruptos. A maior empresa de comunicação do país defendendo seu próprio monopólio assumiu como compromisso de honra acabar com as instituições democráticas do país e o Ministério público criou uma religião própria, para ser respeitado como uma divindade basta passar em um concurso público para procurador federal.
Quando uma das poucas coisas boas que nos restou foi o esporte motorizado, na mesma semana em que voltamos a ter um piloto no mundial de motovelocidade – Eric Granado – e que perdemos um representante na F1 – Felipe Massa – um grupo de bandidos decide acabar também com isso. Os testes da Pirelli & McLaren já foram cancelados. Com tantos países e circuitos se candidatando para hospedar um GP, este tipo de atitude colabora para que o GP Brasil de F1 tenha o mesmo destino da MotoGP no país, notícias do exterior ou livros de história.

Amanda

segunda-feira, 13 de novembro de 2017

MotoGP - Rescaldo de Valência


Circuito Ricardo Tormo - Valência

Pelos registros históricos da revolução de 1930, a cidade de Itararé localizada na divisa entre os estados de São Paulo e Paraná foi tomada pelas tropas de Getúlio Vargas sem que um só tiro tenha sido disparado. O desempenho heroico em um evento fictício, uma batalha que não houve, foi apropriado pelo escritor e humorista Apparício Torelly para outorgar a si próprio um título de nobreza, o Barão de Itararé. Uma frase atribuída a este autor pode ser aplicada ao capítulo final da temporada de 2017 da MotoGP, “Quando menos se espera, nada acontece”.
A equipe Ducati e o piloto Andrea Dovizioso ansiavam por uma série de eventos improváveis para ter alguma chance de alcançar o título. Embora não seja sábio apostar contra a lei das probabilidades, a mídia especializada promoveu a etapa utilizando frases de efeito e não raro os locutores e comentaristas utilizaram jargões como “Nunca diga nunca” ou “Tudo pode acontecer”. Em relação à espera de um evento milagroso, o Barão de Itararé também escreveu: “Se a montanha não vai a Maomé, o mais sensato é Maomé desistir da temporada na serra”.
Muito já foi comentado sobre a última etapa da MotoGP 2017, entretanto uns poucos itens merecem ser mencionados:

A pista
O Circuito Ricardo Tormo, que tradicionalmente hospeda a prova final das temporadas de MotoGP está localizado próximo a Valência, principal cidade da comunidade autônoma de Cheste, na Espanha. O traçado tem 4 variantes possíveis e é qualificado pelos critérios da FIA como categoria 2, pode acomodar todos os tipos de eventos motorizados à exceção de provas da Fórmula 1. A configuração utilizada pela MotoGP tem 4 km de extensão, sentido anti-horário e contém 14 curvas, 9 para a esquerda e 5 para a direita. O seu projeto de arquitetura privilegiado permite acomodar 120.000 espectadores, todos com ampla visão da pista. Para os competidores uma das principais características do traçado é o longo trecho entre as curvas 13 e 4, no qual a moto fica apoiada sobre o centro e borda esquerda do pneu. A curva 4 à direita, que exige o apoio no lado frio dos Michelin, conhecidos por operar com uma janela estreita de temperatura, é um dos pontos críticos do circuito.

O recorde que não é recorde
Os bancos de dados da MotoGP indicam a pole conseguida por Márquez em Valência como a 73ª de sua carreira, um recorde absoluto na história da competição. Há controvérsias. A FIM reconhece 3.042 GPs disputados, incluindo todas as classes (50cc, 80cc, 125cc, 250cc, 350cc, Moto3, Moto2 & MotoGP), entretanto só há registros de poles em provas realizadas a partir de 1974. Antes deste ano não haviam procedimentos regulamentados para definir a ordem de partida ou distribuição no grid, critérios como sequência de inscrição e até idade dos condutores chegaram a ser utilizados. Não tem muita lógica o fato de que o maior recordista da MotoGP, Giacomo Agostini, com 122 vitórias tenha registrado apenas 9 poles.

Ordens da Equipe
Andrea Dovizioso e a Ducati insistem que não estão incomodados por Jorge Lorenzo ignorar as seguidas sugestões de permitir que o companheiro de equipe, até então candidato ao título do ano, o ultrapassasse. É altamente improvável que houvesse alguma alteração no resultado, porém no pós-corrida a mídia italiana massacrou o piloto espanhol.  Durante o transcorrer da prova a Ducati enviou diversas mensagens para o painel de controle de Lorenzo sugerindo o “Mapeamento 8”, um código para trocar de posição com o companheiro na pista. Após vários pedidos não atendidos, foi apresentada uma placa no muro dos boxes com “Dovizioso -1” e uma seta amarela para baixo. Nada adiantou.
Lorenzo informou que recebeu as mensagens, porém tinha um desempenho melhor que Dovizioso e estava tentando rebocá-lo até as Honda e a Yamaha que lideravam. O espanhol insistiu que teria facilitado a vitória do colega caso Márquez tivesse algum percalço, como quase aconteceu na volta 23 quando o piloto conseguiu salvar um quase acidente com o cotovelo, saindo da pista e caindo da terceira para a quinta colocação. Logo depois Lorenzo e Dovizioso caíram.
Apesar do aparente '”o que este cara está fazendo” flagrado pelas câmeras de TV durante a corrida, o diretor esportivo da Ducati, Paolo Ciabatti, disse que as mensagens de modo algum eram uma ordem da equipe. O próprio Dovizioso esclareceu que a estratégia de Lorenzo era a melhor a ser aplicada, e o seguir na pista contribuiu para andar mais descontraído. "Era a melhor maneira de ambos chegarem aos líderes, infelizmente excederam o limite de possibilidades do equipamento. Dovi e Lorenzo estavam conformados no box, sem clima de animosidade. Temos que dar crédito para pilotos profissionais que sabem o que estão fazendo” – complementou o diretor da equipe.
Se o clima no box da Ducati era de comemoração pelo bom desempenho na temporada, a mídia italiana reagiu indignada. Alguns profissionais da imprensa, que imaginam que o universo do esporte gira em torno de Valentino Rossi, publicaram com estardalhaço a versão que Lorenzo havia retribuído a Márquez o campeonato de 2015.

Campeão de quedas
No mundial deste ano Marc Márquez registrou, em eventos oficiais (FP1, FP2, FP3, FP4, Q1, Q2, Warm Up & Provas) relacionados com as 18 etapas, um total de 27 quedas. Este número excessivo permite supor que haja algum tipo de método nestas ocorrências. Durante o Q2 da prova de Valência, Márquez marcou um tempo excelente em sua primeira incursão na pista. Após trocar pneus, o piloto conversou com Santi Hernandez, seu chefe de equipe e foi informado que o pneu traseiro alcançou a janela de temperatura operacional (ideal) mais rápido que o dianteiro. O engenheiro informou não poder ajudar sobre quantas voltas eram necessárias para ter os dois pneus na melhor condição. Márquez voltou à pista disposto a descobrir, caiu na segunda volta. Por sorte seu tempo inicial foi suficiente para garantir a pole.

Importância de Pedrosa
Livio Supo, o principal executivo da HRC, em uma entrevista para a BT Sports depois da prova enalteceu a permanência de Dani Pedrosa na equipe. Além de um excelente entendimento com Márquez e Crutchlow, Pedrosa é um recurso extremamente útil para os engenheiros de desenvolvimento. O mais longevo piloto em uma mesma equipe, a Repsol-Honda desde 2006, Dani Pedrosa em todos estes anos contabilizou pelo menos uma vitória por temporada. Sua compleição física reduzida o prejudica em condições adversas de clima e, embora seu estilo seja diferente de Márquez, é um piloto competente e confiável, como comprova a vitória de Valência.

O risco Zarco
Em uma prova onde um acidente poderia pôr tudo a perder, Marc Márquez confessou sua preocupação por dividir a primeira fila com Iannone e Zarco, dois pilotos “sanguíneos”, sedentos por vitórias. A estratégia do campeão do mundo foi traçada com antecedência, largaria pelo centro da pista permitindo caminho livre para Pedrosa, que estava imediatamente atrás. A ideia era abrir o máximo possível e correr risco zero com o tráfego. Quando percebeu a aproximação da Yamaha de Zarco, permitiu a ultrapassagem para não complicar.  Andar comboiando o piloto francês revelou-se uma má estratégia, além de ser mais rápido Márquez começou a perder a concentração e cometer erros estúpidos, então esperou uma ocasião adequada e o ultrapassou. Zarco brigou pela posição, foi agressivo e temendo pela proximidade entre as motos, o piloto da Honda cometeu um erro grave na curva 1. Foi um "momento difícil", a insistência de Johann Zarco o forçou a um erro que quase o colocou fora da corrida final do mundial.

Motivação política

Durante muitos anos Ayrton Senna resgatou a autoestima dos tupiniquins desfilando com uma bandeira do Brasil em comemoração às suas vitórias. Marc Márquez é natural de Cervera, mas tem residência oficial (e fiscal) em Andorra, um pequeno país localizado entre França e Espanha, que faz fronteira com a Catalunha. O piloto costumava fazer a volta triunfal com uma bandeira espanhola. As rígidas restrições da Dorna proíbem manifestações políticas e, por ser um separatista convicto, Márquez agora desfila com uma bandeira vermelha, com o número 93.

Salvamentos
O controle que Marc Márquez exerce sobre a sua máquina é absurdo, diversas ocasiões em situações extremas foram recuperadas. Nesta temporada ele saiu da pista e invadiu a gravilha em Sachsenring, conseguiu retornar e vencer a prova. Em Valência errou na curva 1, evitou a queda na pista com o joelho e cotovelo, controlou o equipamento na brita e voltou para pista perdendo apenas duas colocações. Em condições muito semelhantes, Dovizioso caiu e abandonou a prova. Um comentário do locutor da BT Sports britânica que narrou a corrida é definitivo, ele mostrou dúvidas em relação a Lorenzo e foi muito positivo dizendo que se Dovizioso tivesse a habilidade de Márquez teria concluído a prova.

terça-feira, 7 de novembro de 2017

MotoGP - Decisão em 3D



As esperanças italianas no mundial de MotoGP giram em torno de 3 D, a moto Ducati, o piloto Dovizioso e o gestor da equipe Dall’Igna. As dificuldades, e são muitas, estão confinadas geograficamente na Espanha, terra do também postulante Marc Márquez e onde está localizado o circuito que vai hospedar a última prova da temporada, em Valência. A Ducati, desde foi revitalizada com o aporte de capital gerencial e financeiro do Grupo Audi, hoje representa a excelência italiana em duas rodas e  pode emplacar o novo campeão do mundo.
A incursão da Ducati no mundo da motovelocidade iniciou em 1985 quando a empresa foi comprada pelo Grupo Cagiva. O espírito entusiasta dos dois herdeiros do proprietário Giovanni Castiglioni (o nome do grupo é o acrônimo de Castiglioni, Giovani e Varese, sua cidade natal) foi responsável pela inserção da fábrica de Borgo Panigale nas competições de motos. A Ducati equipou mitos da Superbike como Troy Bayliss e Carl Fogarty, chegou na MotoGP em 2003 com Loris Capirossi e alcançou o ápice na temporada de 2007 com a vitória do lendário Casey Stoner. 
Gigi Dall'Igna é um projetista que foi apresentado às provas de velocidade em duas rodas na Aprilia em 1992. Cedo despontou como um raro talento, associando conhecimento técnico com uma sólida disciplina de trabalho. Dall’Igna aprendeu com motos 125cc/250cc e comandou os boxes que conquistaram dois títulos mundiais da Superbike com Max Biaggi. No final de 2013 aceitou o convite da fábrica de Bolonha e assumiu como diretor de esportes da divisão Ducati Course Racing. A Desmosedici GP15, evolução das GP 14.1, GP 14.2 e GP 14.3, foi a primeira moto desenvolvida sob sua responsabilidade. No final de 2016 Dall’Igna comandou um lance ousado com a mega contratação do multicampeão Jorge Lorenzo. 
Os tempos de glória da carreira de Andrea Dovizioso pareciam estar limitados aos primeiros anos de sua carreira, quando conquistou o mundial de 125cc em 2004 e nos dois anos seguintes foi vice na classe 250cc. O italiano chegou na MotoGP em 2008 pilotando uma moto Honda. Em 2009 foi contratado como piloto oficial da fábrica em parceria com Dani Pedrosa, neste ano conseguiu sua primeira vitória no GP da Inglaterra, disputado abaixo de chuva em Donington Park. Em 2011 a Honda disputou a temporada com três pilotos, mantendo a dupla Pedrosa/Dovizioso e contratando o australiano Casey Stoner, que conquistou o título. Dovizioso mudou para a Tech3 com equipamento Yamaha em 2012, depois que a Honda reverteu a decisão anterior e concentrou as atenções em Stoner & Pedrosa. Em 2013 Dovizioso substituiu Valentino Rossi na Ducati, este ano está completando a quinta  temporada com a equipe. Nas temporadas de 2015 e 2016 a Desmosedici era reconhecida como uma moto muito eficiente em trechos retos e extremamente complicada em curvas, os pilotos completavam as provas completamente exaustos. A evolução da GP 17 endereçou esta característica e o equipamento atual é um dos melhores das pistas. 
Andrea Dovizioso já praticava exercícios físicos massivos para adquirir musculatura suficiente para controlar a potência das Ducati, este ano ele também utilizou recursos profissionais para se preparar psicologicamente, melhorando as suas habilidades de concentração para administrar GPs estressantes. Os resultados apareceram. 
No próximo domingo, em Valência, a Desmosedici GP 17 de Andrea Dovizioso vai alinhar no grid de largada com a responsabilidade de representar as esperanças de conseguir  um título puro sangue, campeão e moto italianos. Não é uma tarefa fácil. Marc Márquez tem uma quilométrica vantagem de 21 pontos e só não será campeão se Dovizioso vencer e ele não conseguir 5 ou mais pontos. Parece uma tarefa quase impossível, mas uma situação semelhante ocorreu em 2006 quando uma queda de Valentino Rossi resultou em um título improvável para Nicky Hayden. 
As chances de Dovizioso estão baseadas em uma frase de Juan Manuel Fangio que já tem mais de sessenta anos: “Carreras son carreras”.



segunda-feira, 6 de novembro de 2017

MotoGP - Gerações



Valentino Rossi & Marc Márquez – Assen 2015


A vida tem uma sequência lógica.

Na medida que os anos passam, ela vai nos tirando coisas, destreza, agilidade, acuidade visual, velocidade de raciocínio. Os cabelos escasseiam e perdem a cor, escadas ficam mais íngremes e com mais degraus, caminhos ficam mais longos. Entretanto o roteirista de nossa existência incluiu algumas compensações, experiência, sabedoria e o privilégio de acompanhar “in loco” a evolução das novas gerações.

Quem cresceu convivendo com o apogeu de Valentino Rossi, que reinventou o motociclismo esportivo, observa agora a escalada de Marc Márquez, o mais provável candidato a ser a referência para os próximos anos. Nesta conjuntura é oportuno analisar comparativamente o início da carreira destes dois pilotos que já fazem parte da história da MotoGP.

Valentino Rossi estreou no mundial em 1996 com 17 anos, disputando a classe 125cc com uma Aprilia. Obteve uma vitória em seu primeiro ano e com o mesmo equipamento foi campeão no ano seguinte, vencendo 11 das 15 etapas.  Márquez foi mais precoce, disputou seu primeiro campeonato da FIM em 2008 aos 15 anos com uma KTM, também na classe 125cc. Passou seus dois primeiros anos em branco, porém pilotando uma Derbi em 2010 venceu 10 das 17 etapas e conquistou seu primeiro título.

Rossi evoluiu em 1998, ainda conduzindo uma Aprilia, para a classe 250cc. Em dois anos disputou 30 provas, venceu 14 e conseguiu seu segundo mundial em 1999. A passagem de Márquez pela Moto2, a 250cc repaginada, também foi meteórica, entre 2011 e 2012 participou de 32 provas e venceu 16. Assim como Valentino, Marc também foi campeão em sua segunda temporada.

Valentino Rossi migrou para a classe principal do mundial da FIM, na época a 500cc, pilotando uma Honda em 2000. Conquistou duas vitórias no ano e foi campeão em 2001, o último antes da reformulação do mundial que passou a se chamar MotoGP. O piloto italiano conquistou o tricampeonato com a Honda (2001, 2002 e 2003) e enfileirou os dois títulos (2004 e 2005) conduzindo uma Yamaha. Nos 4 primeiros anos na classe de elite (2000 a2003) Rossi disputou 64 GPs e venceu 33 vezes. A carreira de Marc Márquez na MotoGP consegue ser igualmente impressionante, venceu o primeiro mundial que disputou em 2013 e no período de 4 anos foi campeão 3 vezes, disputando 72 provas e vencendo 29.  Os números de Márquez são mais impressionantes porque, excetuando 2014 quando dispôs da melhor máquina do grid, nos outros anos brigou com um equipamento problemático. 

Rossi está em seu 22º mundial e em todos estes anos apenas em 2011 e 2012, quando correu pela Ducati, não conseguiu pelo menos uma vitória. Seu recorde pessoal por temporada foram 11 primeiros lugares em 1997, 2001, 2002 e 2005.  Marc Márquez fez uma temporada de estreia medíocre e teve participações inexpressivas em 2008 e 2009, desde então esteve no lugar mais alto do pódio em pelo menos 5 vezes por temporada. Em 2014 obteve seu melhor resultado,13 vitórias nas 18 etapas do ano, um recorde absoluto.

A exuberância de resultados não é, por si só, um indicativo de genialidade. Para um piloto correto dispondo de um equipamento muito superior aos demais a vitória é consequência, não mérito pessoal. Nos últimos anos foi criada a expressão “Modo Lorenzo” para descrever vitórias em provas onde o piloto com uma moto com desempenho superior às demais larga na frente e mantém a liderança até a bandeira quadriculada. A principal característica de um piloto diferenciado é conseguir vitórias em situações adversas.

Bons resultados e técnicas de condução não são as únicas características necessárias para individualizar uma carreira extraordinária. A história da motovelocidade está repleta de pilotos vencedores que não conseguiram se impor como exemplos a serem seguidos. Em 2012 durante a conferência de imprensa da 4ª etapa da temporada o australiano Casey Stoner, bicampeão da MotoGP anunciou a sua aposentadoria aos 27 anos de idade, no auge de sua carreira, com a melhor moto do grid e faturando milhões. Várias hipóteses foram citadas para justificar esta atitude, o nascimento de sua primeira filha, um possível efeito do óbito de Marco Simoncelli no ano anterior e o desprezo pela mídia em geral.  A evolução da Moto GP passou a exigir que os pilotos sejam mais acessíveis e politicamente corretos, contemplam um número excessivo de participações externas para promover a competição e os patrocinadores, coisa que o australiano abominava. Stoner era um monstro na pista, porém nunca teve o carisma de Valentino Rossi.

O abandono de Stoner obrigou a Honda a promover precocemente um piloto que impressionava nas classes de acesso. Dois anos antes, em outubro de 2010, a prova do Estoril da classe 125 foi disputada em um clima hostil para a motovelocidade. Marc Márquez, 17 anos, já havia conquistado 9 vitórias e alinhou para a largada na penúltima prova do campeonato. Na sua frente um único piloto, Nico Terol, também candidato ao título, a diferença entre ambos eram escassos 12 pontos. Depois da largada as posições foram mantidas por 6 voltas, até a prova ser interrompida por absoluta impraticabilidade das condições da pista. No retorno para o grid da nova largada, Márquez caiu e danificou a carenagem da sua Derbi #93. A equipe trabalhou alucinada para permitir a sua volta, infelizmente não a tempo de alinhar na sua posição, 2ª, ele foi obrigado a largar em 16º no fim do grid. Nas 9 voltas restantes, com uma pilotagem extremamente agressiva, Márquez ultrapassou todos os concorrentes e venceu a prova por uma diferença de 0,150 segundos.

Valentino Rossi é o piloto mais longevo em atividade, e mantém alto nível de competitividade. A característica mais marcante do italiano é a sua adaptabilidade às mudanças de equipamentos e técnicas de condução. Em sua longa e vitoriosa carreira ele competiu com motos de 2 e 4 tempos, 125cc, 250cc, 500cc, 990cc, 800cc e finalmente 1000cc, e foi vencedor em todas, com ressalva dos 2 anos da Ducati. Sua história contempla múltiplos exemplos de performances de exceção e protagonizou no GP Dutch TT, em 2015 no circuito de Assen, uma das mais brilhantes vitórias de sua carreira. Foi prova excitante onde o ídolo italiano largou da pole e participou de uma disputa hercúlea com Marc Márquez. Os dois trocaram várias vezes de posições e Rossi chegou liderando nas curvas finais, o espanhol tentou uma ultrapassagem “in extremis” na entrada da última chicane os dois fizeram contato. A Yamaha de Valentino foi forçada a ir para o cascalho, o piloto conseguiu recuperar o controle e voltou para a pista a tempo de vencer, foi a sua sétima vez no circuito, um recorde.

Valentino Rossi e Marc Márquez são representantes de gerações distintas. Antes de disputarem colocações nas pistas, Márquez foi um fã declarado de Valentino e colecionador de miniaturas de suas motos. A admiração continuou até ser abalada em Sepang em 2015, desde então os dois optaram por um tipo de relacionamento protocolar.

quarta-feira, 1 de novembro de 2017

MotoGP – Falta combinar com os russos


Márquez & Dovizioso
Copa do Mundo da Suécia em 1958, antes do jogo com a Rússia o técnico Vicente Feola combinou uma estratégia infalível com os jogadores. A defesa adversária era encorpada e lenta, Garrincha devia reter a bola pelo lado do gramado para tirar a dupla de zagueiros da área e recuar para Didi lançar os atacantes no espaço aberto. Com trinta minutos de jogo o folclórico jogador chegou na beira do gramado e ponderou para o técnico: "Seu" Feola, "tô" fazendo tudo direitinho, mas os homens não saem de lá. Tem certeza que eles sabem o que foi combinado? Feola não tinha.
Faltou combinar com os russos. 
Nicky Hayden declarou antes da decisão de 2006 que suas únicas esperanças eram (1) ele estar em um dia muito bom e (2) Valentino Rossi, o pentacampeão e líder do campeonato com 8 pontos de vantagem, estar em um dia muito ruim. Valentino caiu durante a prova, conseguiu voltar para a pista e chegou em 13º lugar, Hayden com os 16 pontos de seu 3º foi o último norte-americano a conquistar o título de campeão do mundo.
A queda de Rossi não havia sido combinada.
Em 2013 o então campeão do mundo, Jorge Lorenzo chegou na prova final em Valência 13 pontos atrás de Marc Márquez, um novato imberbe em sua primeira temporada na categoria. Lorenzo pensou em uma estratégia criativa, tomar a ponta e reduzir a velocidade para agrupar o maior número de corredores. Imaginou que o garoto de 20 anos poderia ficar impaciente e envolver-se em algum incidente. Não funcionou. Márquez ficou a prova inteira comboiando Dani Pedrosa, que pressionou Lorenzo. O antigo campeão venceu a prova, a terceira colocação garantiu a Márquez seu primeiro mundial.
Lorenzo não combinou com Márquez que ele devia ficar impaciente.
A temporada de 2015 foi a última a ser decidida na prova final em Valência e a mais controversa de todas. Valentino Rossi entrou na pista com 7 pontos de vantagem sobre Jorge Lorenzo, porém penalizado para largar do fim do grid em função dos incidentes ocorridos entre ele e Márquez na prova anterior em Sepang. Rossi fez uma corrida excepcional, conseguiu galgar posições até a 4ª colocação, infelizmente para ele Lorenzo venceu a prova e o campeonato.
Quando se envolveu com Márquez na Malásia, Rossi não combinou com os fiscais para não ser penalizado.
A temporada de 2017 vai ser concluída em Valência, as possibilidades de vencer o campeonato estão restritas a Marc Márquez, da Honda e Andrea Dovizioso da Ducati. O italiano de 31 anos estreou nos mundiais de motovelocidade em 2001 na classe 125cc e tem em seu currículo 16 vitórias e um mundial conquistado em 2004 (classe 125cc). Dovizioso já participou de 274 GPs e entra na pista com uma desvantagem de 21 pontos em relação ao atual campeão do mundo. Marc Márquez, 24, já fez história na motovelocidade em sua curta carreira. Participou de 166 GPs, venceu 61, com 72 poles é o recordista desde que o atual sistema de classificação foi adotado em 1974. Márquez foi campeão mundial da MotoGP em sua em sua primeira participação na categoria, 2013, e acumula cinco títulos mundiais (125cc em 2010, Moto2 em 2012 e MotoGP em 2013, 2014 e 2016).
A mesma matemática que possibilita ao italiano sonhar com o título complica as suas possibilidades. Para ser campeão ele necessita vencer a prova em um circuito cujas características são mais favoráveis às motos Honda, e esperar que Márquez não consiga uma classificação entre os 10 primeiros. Se, nas condições normais de temperatura e pressão, uma vitória da Ducati em Valência é possível, alguma coisa muito estranha deve acontecer para a Honda não estar entre os "top ten". Nas 17 etapas realizadas nesta temporada, entre seções de testes, qualificação e provas, Márquez já caiu 27 vezes, porém duas das três provas que não completou foram devidas a problemas técnicos. Sua pior colocação na pista este ano foi um 6º lugar no GP da Itália.

Desta vez sugerir a Lorenzo uma mudança extemporânea de mapeamento pode não ser suficiente, precisa combinar com os russos.