quinta-feira, 23 de setembro de 2021

MotoGP - Fator competitividade


Todos que cultivam o hábito de acompanhar regularmente os esportes motorizados a algum tempo são praticamente unânimes em eleger a melhor primeira volta da história a protagonizada por Ayrton Senna em 1993 no único GP realizado no circuito de Donington Park. Disputada em clima úmido, quando a largada foi autorizada os carros se transformaram em uma névoa de spray.

Senna (McLaren) largou em 4º e buscava uma melhor colocação quando foi bloqueado por Michael Schumacher (Benetton) e perdeu a posição para Karl Wendlinger (Sauber). 


 Largada do GP Europa de 1993 em Donington Park


Antes de um quarto da primeira volta ser concluída Senna passou pela Benetton de Schumacher, superou o jovem alemão da Sauber e assumiu a 3ª posição, com meio circuito percorrido ultrapassou Damon Hill (Williams)e no grampo já no 3º setor deixou Alain Prost (Williams) para trás, assumindo a liderança antes de completar a 1ª volta. As duas Williams-Renault eram muito superiores a todos os carros do grid, a McLaren de Senna era impulsionada por um motor Ford depois de perder o Honda da temporada anterior. As condições da pista mascararam as diferenças de desempenho dos carros. A capacidade dos pilotos, em especial de Ayrton Senna, em competir em condições desfavoráveis fez a diferença. 

As entidades que administram a MotoGP, Federation Internationale de Motocyclisme (FIM), DORNA Sports (DORNA), International Road Racing Teams Association (IRTA) e Motorcycle Sports Manufacturers Association (MSMA) foram muito felizes (e competentes) ao criar uma regulamentação que privilegiou a competitividade, de modo que a obtenção de milésimos de segundo está centrada em detalhes. Os resultados estão sendo comprovados, até agora nesta temporada 8 pilotos e 5 fabricantes diferentes já venceram competições. As diferenças dos tempos que separam os pilotos na classificação e nas voltas durante as provas são mínimas. As temporadas em que havia a hegemonia de uma (MV Agusta) ou duas equipes (Honda e Yamaha) são coisas do passado. Entre 2011 e 2015 foram disputados 89 GPs, todas as vitórias foram conquistadas exclusivamente por equipamentos produzidos pelos fabricantes nipônicos Honda e Yamaha.

Embora todos tenham as mesmas especificações técnicas, conjuntos de pneus semelhantes e auxílio eletrônico padronizado, os protótipos são diferentes entre si. O projeto desenvolvido para cada equipamento contempla ênfase em características que o fabricante considera importantes para obter melhor desempenho, velocidade em retas e contornos, eficiência nas frenagens e rapidez na retomada de aceleração. Em uma análise extremamente simplista, equipamentos com cilindros em linha (Yamaha e Suzuki) são mais lentos e com manejo mais fácil, enquanto os 4 cilindros em V (Honda, KTM, Aprilia e Ducati) são mais rápidos, porém bem mais difíceis de controlar.

 
 
Circuitos Anti-horário de Sachsenring e Aragon


Os motores V4 desenvolvem maior potência porque tem um virabrequim mais curto, rígido, com menor vibração e menores perdas de energia, enquanto os com cilindros em linha são mais amigáveis nas curvas graças ao seu virabrequim mais longo. Os pilotos de equipados com cilindros em linha tem alguma vantagem em treinos classificatórios porque podem realizar voltas super-rápidas com pista livre. Quando encaixotados entre V4s com maior velocidade final, a coisa complica. Utilizar o vácuo de um equipamento ajuda a acelerar mais rápido, a falta de resistência do ar faz com que a moto desacelere mais lentamente, porém controlar uma moto ao aplicar os freios em um turbilhão é um pesadelo. 

Em situações de corrida, a velocidade superior em retas dos V4 não é o único problema para os quatro-em-linha. As máquinas V4 não gostam tanto de curvas, então seus pilotos usam linhas mais agudas em forma de V, freando até o ápice, girando agressivamente a moto no meio da curva e acelerando para a saída. Os quatro-em-linha estão no seu melhor ambiente nas curvas, então os pilotos usam trajetórias em forma de U, percorrendo um arco para conseguir o máximo de velocidade possível.

A linha V do piloto de um V4 exige que ele freie mais agressivamente, por isso é mais fácil conduzir um quatro- em-linha. Uma vez que um V4 está na frente, o quatro-em-linha não pode usar sua velocidade de curva superior. A mesma coisa acontece nas saídas de curvas, o piloto do quatro-em-linha perdeu a velocidade e sai mais lento na retomada de aceleração.

Basicamente, os quatro-em-linha podem ser mais rápidos que os V4s na maioria dos circuitos se tiverem ampla liberdade para manobrar nas trocas de direção, a pista só para eles, como acontece nas classificações. Fabio Quartararo consegue suas vitórias da única maneira que realmente parece funcionar para os quatro-em-linha, sair na frente o mais rápido possível e não deixar os V4 se aproximarem o suficiente para interferir na velocidade em curva.

A personalidade de um equipamento depende também da orientação utilizada pelos engenheiros durante o projeto. A RC213V, por exemplo, foi concebida na era dos pneus Bridgestone e explora as características do pneu dianteiro, que era o forte da fábrica japonesa. Na prática implica que é uma moto diferente das V4 tradicionais e exige um modo de condução específico. Pilotos experientes e talentosos como Jorge Lorenzo e Pol Espargaro custaram ou custam a se adaptar, o protótipo Honda tem um comportamento diverso de todos os concorrentes. Marc Márquez se destaca graças ao controle absurdo que tem do pneu dianteiro. O RC213V é conhecido por não ter aderência traseira, e a sua retomada de aceleração perde para as Ducati, KTM e Aprilia. 

 
 Observem a orientação das rodas da moto #93 no épico GP vencido por Márquez no GP da Tailândia em 2018


Fábio Quartararo – Liderança inconteste na Yamaha


No somatório geral, embora os 6 fabricantes adotem abordagens distintas, o resultado é equilibrado e cresce a importância dos pilotos. As colocações no mundial (até a etapa de Misano/2021) mostram que equipamentos semelhantes obtém tem resultados distintos. Dos 397 pontos conquistados por protótipos Yamaha, 234 foram obtidos por Fábio Quartararo. Um cenário semelhante, porém, não tão significativo, pode ser encontrado nas máquinas desenvolvidas pela Honda. Marc Márquez, que não está em sua condição física ideal e sequer foi inscrito nas duas primeiras etapas, tem 92 dos 276 pontos acumulados por máquinas da marca japonesa. O #93 também foi o único piloto Honda que esteve presente no pódio das provas realizadas nesta temporada. A infelicidade de Marc Márquez iniciou quando fraturou o braço direito em uma queda na primeira etapa da temporada de 2020 em Jerez. Um misto de precipitação, diagnósticos equivocados e erros médicos resultou em seu afastamento por toda a temporada, seu braço direito ainda não se recuperou totalmente.

 
Marc Márquez utiliza intensamente os cotovelos


O piloto, cuja técnica de condução utiliza muito o cotovelo, sempre teve predileção por circuitos com sentido anti-horário, com maior número curvas à esquerda, como os traçados de Sachsenring e Aragon. Márquez venceu na Alemanha foi o 2º em Motorland. A próxima prova está programada para o Circuito das Américas em Austin, que é disputado no sentido anti-horário, onde o espanhol coleciona vitórias.

 

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