Durante o GP da França o oito vezes campeão do mundo reiterou as considerações feitas em Jerez sobre a evolução técnica dos equipamentos, que por vezes não é acompanhada de evolução dos circuitos. A corrida de Mugello, por exemplo, foi caracterizada por uma indefinição na reta final sobre quem teria sido o 2º colocada, quem cruzou a linha de chegada foi Miguel Oliveira, que foi penalizado por não respeitar os limites da pista. Joan Mir que seria favorecido incorreu na mesma infração e retornou à sua 3ª colocação original. A faixa de circulação na pista é limitada por questões de segurança, porém exige uma atenção redobrada dos pilotos e fiscais e não tem uma solução simples. O piloto tende a usar toda a pista disponível, Uma área de escape que é adequada para a MotoGP, por exemplo, pode não ser a mais segura para outros tipos de competições como a Fórmula 1.
Primeira versão do holeshot apresentada pela Ducati em 2019
Na Espanha (Jerez) Márquez considerou exagerada a evolução técnica, principalmente pelo uso indiscriminado de dispositivos de largada, os chamados “holeshots”. e sugeriu uma reunião de pilotos. Sua argumentação é que os dispositivos de largada mascaram as vantagens obtidas na classificatória de formação do grid de largada No jargão do motociclismo esportivo “holeshot” é um termo utilizado para identificar o competidor que lidera na primeira curva depois da largada. Por extensão, “dispositivo holeshot” é um equipamento utilizado para adequar a suspensão na largada e provavelmente em retas longas para proporcionar uma vantagem que permita ao protótipo chegar mais rápido no contorno. Em um esporte onde seis fabricantes distintos produzem protótipos de competição conduzidos pelos melhores pilotos do mundo e percorrem voltas separados por milésimos de segundos, contornar a uma curva na liderança pode significar vantagem no resultado final de uma corrida. Não raro pilotos da 3ª ou até 4ª fila se apresentam para a disputa da 1ª curva na largada. Sem dúvida é um fator de risco. Um número grande de equipamentos com pneus e freios ainda sem a temperatura ideal disputam a liderança impulsionados por um desempenho artificial.
Pneus assimétricos também complicam. O novo composto dianteiro da Michelin apresenta diferenças de grip entre o lado macio e o duro, que implica em atenção especial do piloto quando entra em um “S”.
Quando o circo se reuniu em Le Mans, Marc percebeu que estava sozinho na cruzada contra a extrema escalada de desempenho. Houve divergências de opinião e poucos pilotos se alinharam com o espanhol. A maioria expressou simpatia por “Quanto mais potência e recursos para obter melhor resultado, melhor”. Há também os que acreditam que uma engenharia superior pode equalizar técnicas de condução diferentes e houve até os entenderam que o espanhol estava tentando mascarar a atual inferioridade da Honda. Os pilotos, no entanto, são apenas uma das três partes envolvidas: as outras são os engenheiros, depois os fabricantes, e o Dorna, gestora da série chamada MotoGP.
O que os pilotos pensam já está endereçado múltiplas entrevistas e com toda a probabilidade a opinião dos engenheiros é contrária à de Márquez. A administração da MotoGP limita-se a cumprir as regras. Existem regulamentos técnicos aceitos por todos os fabricantes no início do mundial e que só podem ser alterados se houver unanimidade. Se os pilotos têm algo a opinar, as sugestões devem ser encaminhadas pelos fabricantes, que também são responsáveis por questões de segurança junto com a Motorcycle Sports Manufacturers Association (MSMA).
A pergunta, no entanto, surge espontaneamente: a alegação de Marquez não está ligada a um fator de segurança? O oito vezes campeão mundial e aqueles que apoiam sua tese não estão avisando que algumas soluções técnicas tornaram as motos mais exigentes a ponto de causar, por exemplo, problemas generalizados de síndrome compartimental (Arm Pump).
A posição da Dorna é clara, as regras em vigor permanecem até que haja um consenso entre fabricantes. Há um acordo em vigor sobre regulamentos técnicos, que tem um prazo de vigência, e as regras só podem mudar antes desse prazo se todos concordarem. Aconteceu, por exemplo, com winglets (asas) e outras situações: o acordo foi alcançado por unanimidade e a regra alterada.
Lendo entre as linhas, fica claro que a gestora da MotoGP não quer que os pilotos assumam o controle do campeonato. Claro, eles são uma parte fundamental, já que são os protagonistas do espetáculo, e como tal são tratados, mas não podem invadir as competências dos outros, pelo menos em nível público. Neste detalhe a sugestão de Márquez causou um desconforto na Dorna.
Independentemente da forma em que a ideia foi expressa, é verdade que o aumento do desempenho da MotoGP tem consequências óbvias, as motocicletas exigem mais dos pilotos e, de acordo com alguns deles, também são menos seguros. Não há como negar.
Sequência da queda de Quartararo na 1ª curva de Silverstone em 2019 (foi atropelado pela moto de Dovizioso)
Entre as possíveis soluções, a adequação do traçado dos circuitos eliminando gargalos nas primeiras curvas é a solução mais extrema e menos viável no curto prazo. Pistas com baixos padrões de segurança poderiam ser removidas do calendário, como já aconteceu como Ilha de Man, Interlagos e Spa-Francorchamps, mas em alguns casos existem contratos com validade de muitos anos já assinados para sediar GPs no futuro e esta também é uma opção impraticável.
Estabelecer um limite técnico é uma possibilidade?
Limitar a evolução técnica é um processo complicado. Seria uma maneira de excluir fabricantes, especialmente os com orçamentos mais baixos, cuja única chance de competir com os gigantes japoneses está relacionada a criatividade na exploração de detalhes técnicos.
Limitar velocidades máximas não tem uma lógica defensável em um ambiente competitivo. O perigo não está nas retas, mas está relacionado com as velocidades na curva. Talvez a solução mais simples possa ser limitar a quantidade de gasolina disponível – 22 litros para a corrida – ou aumentar a distância da prova. Seriam soluções sem esforço que nos permitiriam não desistir das tecnologias desenvolvidas, e forçariam os engenheiros a limitar o desempenho do motor para chegar à linha de chegada.
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