sábado, 1 de agosto de 2020

MotoGP – Temporada indefinida

 Phrýne foi o modelo da estátua de Afrodite

 

Phrýne era uma cortesã na Grécia antiga, no século IV a.C. Entrou para a história por seu julgamento por Impiedade (desprezo pela religião oficial) que, na época, era punido por pena capital.

Seu nome verdadeiro era Mnesarete, mas devido à sua pele amarelada era chamada de Phrýne (Sapo - um apelido frequentemente dado às cortesãs). Existem várias histórias sobre Phrýne, incluindo a que em um festival dedicado a Poseidon ela teria soltado os cabelos e entrado nua no mar, fato que inspirou a estátua de Afrodite (Deusa da beleza), a primeira de uma mulher nua da Grécia antiga.

Durante o julgamento, na eminência de um veredito desfavorável seu advogado a despiu em frente aos magistrados e argumentou que suas formas perfeitas eram uma graça divina, seria um sacrilégio contrariar o desejo de Deus de compartilhar com os humanos tamanha beleza. A religiosidade e superstição dos juízes resultaram na sua absolvição.

A lição que as equipes da MotoGP aprenderam em relação a história da cortesã grega é que, se não puder vencer uma prova por ter melhor conjunto equipamento/piloto, explorar as fraquezas dos adversários pode ajudar a alcançar seus próprios objetivos.

Existe um conceito simplista que atribui aos equipamentos cujo motor tem os cilindros dispostos em linha maior velocidade em curvas, seu habitat preferido são pistas onde não existem retas muito longas no traçado. Em contrapartida equipamentos com propulsores com os cilindros em V conseguem desenvolver maior potência e aproveitam melhor grandes retas.

Embora os resultados das primeiras duas provas, especialmente o pódio triplo da Yamaha (cilindros em linha) no segundo GP de Jerez, em uma pista que privilegia os equipamentos que tem na velocidade em curvas a sua melhor característica, a análise dos tempos por volta parece contrariar o senso comum. Na primeira prova o desempenho da Honda (cilindros em V) de Marc Márquez enquanto esteve na pista foi superior a todos os concorrentes. No GP de Andaluzia, o segundo realizado no mesmo circuito, a Ducati de Peco Bagnaia (cilindros em V) esteve várias voltas com tempos que fatalmente o conduziriam ao pódio, até o seu motor falhar.

 Vinales, Bagnaia e Miller no GP da Andaluzia

 

Óbvio, chegar ao fim de uma prova é o requisito essencial para a vitória e pódio, sob esta ótica as Yamaha estiveram melhor. Fábio Quartararo venceu as duas provas com autoridade. Maverick Vinales, mesmo com uma condução errática, obteve por mérito a segunda colocação nos dois GPs. O calor do ambiente e da pista cobrou seu tributo e gerou preocupação quanto a resiliência dos motores, a Yamaha perdeu 3, dois na primeira prova (Vinales nos treinos e Rossi na corrida) e outro enquanto Franco Morbidelli protagonizava uma recuperação no segundo GP.

A sequência dos próximos GPs está programada para pistas onde a velocidade em curva das Yamaha não deve fazer diferença, Brno, Red Bull Ring, Misano, Barcelona, Le Mans, Aragon e Valência. Na República Checa em 2019, circuito de Brno, o pódio foi formado por Márquez, Dovizioso e Miller, uma Honda e duas Ducati, três motores em V, Alex Rins foi o quarto com o primeiro com cilindros em linha, com um atraso de 5 segundos em relação ao vencedor. No ano anterior a configuração dos motores foi a mesma com as colocações de Dovizioso, Lorenzo e Márquez, Rossi foi o quarto 2 segundos atrás.

Em Osterreich no circuito Red Bull Ring a Yamaha de Quartararo foi a terceira colocada em 2019, porém a mais de 6 segundos de Dovizioso e Márquez, que protagonizaram um final eletrizante. No ano anterior Lorenzo, Márquez e Dovizioso ocuparam as três primeiras colocações, a primeira Yamaha foi pilotada por Rossi e chegou 6ª a longínquos 14 segundos do líder. 

Nos 7 circuitos que restam, motores em V venceram todos os GPs disputados em 2018 e 2019. Em Misano no ano passado Quartararo obteve a segunda colocação, em uma prova vencida por Marc Márquez.

O escritor Mark Twain falecido em 1910, viveu em uma época em que as comunicações intercontinentais eram complicadas. Em certa ocasião, declarou em Londres que as notícias que estavam sendo divulgadas nos EUA sobre sua morte eram exageradas. O mesmo acontece com as pessoas que julgam que o mundial desta temporada já acabou. Quem julga que o campeonato já está decidido em favor do jovem francês demonstra que (1) não conhece a história e (2) não assimilou o que é a MotoGP. Em 1992 nas primeiras 7 provas de uma temporada de 13 GPs, (número igual a previsão inicial para este ano), o australiano Mick Doohan conseguiu 5 vitórias e 2 segundos lugares, abriu 65 pontos de vantagem sobre o então bicampeão Wayne Rainey. No final da temporada Rainey e sua Yamaha conquistaram o terceiro título consecutivo. Como diria o agora aposentado narrador oficial da MotoGP Nick Harris, “Never say never in MotoGP - Nunca diga nunca na MotoGP”.

Esta temporada está sendo diferente. As provas que normalmente são distribuídas ao redor do mundo e programadas para acontecerem em clima neutro (ameno), este ano estão concentradas na Europa em pleno verão, o calor ambiente e a temperatura da pista foram um grande problema em Jerez. É improvável que as próximas provas sejam realizadas em condições semelhantes e que Quartararo tenha as mesmas facilidades para vencer.

As entidades que disciplinam a MotoGP estão realizando um esforço contínuo via regulamentações para equalizar as condições de disputa. Em 2019 o resultado da prova de Jerez indicou a vitória de Marc Márquez com uma vantagem de 1,65 segundos sobre o segundo colocado Alex Rins. Este ano as duas vitórias de Fábio Quartararo sobre Maverick Vinales excederam 4,5 segundos, porém durante as voltas finais da competição o representante da Yamaha independente chegou a abrir mais de 7 segundos sobre o equipamento da equipe oficial. Considerando que nesta pista os protótipos percorrem mais de 64 metros por segundo, equivale a dizer que o francês chegou a andar 450 metros na frente do espanhol.

 

Impossível prever o resultado da temporada de MotoGP


A atual pandemia pode transformar esta temporada em um exercício de futurologia. A administração da MotoGP realizou intensas negociações com governos e autoridades sanitárias para viabilizar 13 etapas, 7 na Espanha, 2 na Áustria, 2 na Itália,1 na França e 1 na República Checa. Promete até 10 de agosto um calendario definitivo com provavelmente 14 GPs, incluindo um a ser realizado em Portugal, os circuitos possíveis são o Autódromo Internacional de Algarve (em Portimão) ou o Autódromo do Estoril.  Todas os GPs serão realizados na Europa, uma concentração geográfica que não acontecia desde 1986. Todo este esforço pode ser frustrado se houver um agravamento generalizado do contágio pelo vírus. Fronteiras entre países podem ser fechadas ou autoridades sanitárias locais proibir a realização de eventos. É uma situação bizarra, equipes e pilotos sequer tem certeza do total de provas na temporada.

 

Autódromo Internacional de Algarve – Portimão - Portugal

Os gestores da motovelocidade estão atuando de forma rígida e inflexível na fiscalização dos protocolos da Covid. As temporadas da MotoGP / WSB estão andando sobre o fio da navalha, se alguma autoridade administrativa ou sanitária da região dos circuitos julgar que o paddock não é um lugar seguro, toda a competição está ameaçada.

A imprensa espanhola noticiou em 31/07 que a equipe 2R Racing foi banida do restante da temporada do SuperSport 300, parte do seu staff violou as regras de segurança e circulou pelo paddock de Jerez sem o uso das máscaras obrigatórias. Cinco pilotos foram sumariamente afastados da competição e não há a possibilidade de recurso.



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