quinta-feira, 18 de julho de 2019

MotoGP – Embustes, mentiras e estatísticas





Mark Twain foi um escritor, humorista e palestrante norte-americano que viveu entre 1835 e 1910, autor de literatura infanto-juvenil e críticas incisivas contra o racismo que era tolerado na época. A ele é atribuída a frase “existem três tipos de mentiras, o embuste normal, a mentira acintosa e as estatísticas”. Neste último item podem ser classificadas as manchetes que noticiam o ocaso da carreira de Valentino Rossi. No início da atual temporada o desempenho do decano dos pilotos apresentou bons resultados, sempre classificado entre os top 5, depois vieram as provas de Mugello, Barcelona e Assen, que resultaram em desistências. Três retiradas em provas seguidas não aconteciam com ele desde 2011, seu primeiro ano na Ducati (2011), a pior temporada nos 20 anos que participa da principal categoria. Foi o suficiente para comparar com os melhores anos de Rossi e concluir que sua carreira estava se encaminhando inexoravelmente para o final. Para os que comentam que a idade (40 anos) inviabiliza a performance em alto nível cabe lembrar que John McGuinness, com 47, ainda compete e obtém vitórias em provas oficiais de Road Racing.



Valentino tem uma longa história na MotoGP e já passou por momentos piores que o atual. Seus dois anos na Ducati, 2011 e 2012, foram sofríveis e ele conseguiu apenas três pódios, este ano faltando 9 etapas ele já tem dois segundos lugares. É certo que sua última vitória foi em Assen, em 2017, mas em 2018 foi o terceiro no mundial, ficando atrás apenas de Márquez e Dovizioso.



A MotoGP está em constante evolução. Na época das 500cc, que Giacomo Agostini empilhava recordes e passava temporadas inteiras vencendo em todas as suas participações em GPs, sua moto era muito superior à dos concorrentes e a diferença para o segundo colocado não raro chegavam a casa dos minutos. Os tempos são outros, na atual temporada a maior diferença entre os dois primeiros foi de 9,81 segundos, uma eternidade, na prova de Rio Hondo. Nas nove etapas já realizadas em três oportunidades a diferença foi menor de 1 segundo, em duas menores que 2 segundos e em outras três entre 2 e 5 segundos. Só no GP da Argentina foi mais de 5 segundos. Nesta temporada cinco pilotos diferentes pilotando equipamentos de quatro fabricantes já galgaram o degrau mais alto do pódio, dois (Rins e Petrucci) pela primeira vez. Dos componentes do grid neste ano Marc Márquez é o único ponto fora da curva. Neste ambiente altamente competitivo ainda brilha a estrela de Valentino Rossi.



O cantor e compositor sertanejo Sérgio Reis imortalizou em versos uma assertiva que pode ser aplicada ao piloto da Yamaha #46: “Não interessa se ele é coroa, panela velha é que faz comida boa”.



O intervalo para as férias de verão (na Europa) previsto no calendario da MotoGP é um terreno fértil para a exploração de assuntos que durante a competição dificilmente mereceriam a atenção da imprensa.  Recentemente Paolo Ciabatti, diretor esportivo da Ducati, comentou para a mídia italiana que, sem Marc Márquez, a equipe Honda estaria disputando provas no bloco intermediário. Foi uma declaração voltada para o público interno, justificando que os italianos desenvolvem equipamentos para serem vitoriosos com qualquer piloto, enquanto a equipe nipônica trabalha exclusivamente para o seu campeão.  Em resposta, Alberto Puig que tem um posto equivalente na Repsol Honda, citou que a sua equipe tem um longo histórico de pilotos que venceram diversos mundiais, enquanto a concorrente italiana tem um único, Casey Stoner em 2007. Ciabatti coleciona declarações infelizes, na temporada passada inviabilizou precocemente a permanência de Jorge Lorenzo na Ducati para esta temporada, contrariando o desejo do diretor da equipe Gigi Dall’Igna.



O italiano tem razão em parte. Desde que foi promovido para a vaga aberta por Casey Stoner na categoria principal em 2013 Márquez venceu 49 GPs, os pilotos que mais se aproximaram desta marca no mesmo período foram Jorge Lorenzo com 24 vitórias e Valentino Rossi com 10. Nos campeonatos paralelos patrocinados pela MotoGP a superioridade da Repsol-Honda é mais expressiva, no mundial de construtores venceu em cinco oportunidades, 2013, 2014, 2016, 2017 e 2018. Na disputa entre equipes obteve os títulos de 2013, 1014, 2017 e 2018. Marc Márquez venceu o mundial de pilotos em 2013, 2014, 2016, 2017 e 2018. Durante este período houveram 117 GPs e uma Honda cruzou a linha de chegada em primeiro lugar em 62 oportunidades, 49 com Márquez, 9 com Dani Pedrosa, 3 com Cal Crutchlow e uma com Jack Miller.



A Ducati assumiu o posto de protagonista no mundial de motociclismo favorecida pela obrigatoriedade do uso da eletrônica padronizada a partir de 2016, que eliminou uma vantagem expressiva que a Honda e a Yamaha tinham com o software proprietário. Houve quem dissesse na ocasião que a eletrônica retrocedeu em mais de uma década e nivelou a disputa por baixo. A Ducati de Dovizioso levou a decisão do título de pilotos até a última etapa de 2017, embora com chances mínimas. A inconstância e infelicidade dos pilotos da equipe oficial permitiu que em 2018 a temporada fosse decidida em favor de Márquez faltando 3 etapas para o encerramento. Ainda assim, mesmo contando com 3 desistências, Andrea Dovizioso conseguiu a segunda colocação com uma margem de 47 pontos sobre Valentino Rossi, o terceiro classificado.



Durante os dois últimos anos a Desmosedici foi considerada por muitos a melhor moto que participa do mundial, entretanto no final das temporadas o vencedor foi sempre um equipamento Honda.



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