Efeito borboleta é
um termo que indica a dependência que um sistema complexo às condições
iniciais. Segundo a teoria, o simples bater de asas de uma borboleta na
floresta amazônica poderia influenciar um curso natural de eventos em cadeia e
resultar em um furacão nas Bermudas. Os protótipos da MotoGP são sistemas
complexos e tem comportamento semelhante, corrigir um problema de um componente
pode criar dificuldades em áreas onde o desempenho era satisfatório.
As características
de um equipamento para vencer uma etapa do mundial de motovelocidade estão
centradas na eficiência da frenagem na aproximação das curvas, velocidade
durante a realização do contorno, retomada da aceleração na saída e velocidade
nos trechos retos.
Em 2019 a Honda
corrigiu um ponto fraco da RC213V na temporada passada, a moto de 2018 se
comportava extremamente bem nas frenagens e pecava na aceleração e velocidade
máxima. No modelo deste ano a fábrica trabalhou em todo o equipamento, melhorou
a refrigeração ampliando as entradas de ar e encomendou um novo sistema de
escapamento. Esse procedimento exigiu uma redistribuição de peso e alterou o
equilíbrio da moto, houve em consequência um aumento de potência e ganhos na
velocidade final, entretanto para os pilotos mudou a sensação de estabilidade,
especialmente no travamento da frente. A moto já não entra em um contorno
grudada no chão, o comportamento na aproximação de curvas ainda é muito bom,
mas não tanto como no ano passado.
Em Le Mans Marc
Márquez demonstrou na prática como se comporta o modelo 2019. Maior velocidade
em curva, menor eficiência em frenagens, acelera mais rápido e tem maior
velocidade final. Sua tática durante acorrida também mudou, no ano passado
acompanhava os líderes e deixava para atacar nas últimas voltas confiando na
maior deterioração dos pneus dos concorrentes. Este ano ele tenta abrir desde o
início sempre que possível e utiliza a aceleração e a potência da nova Honda
para passar por fora nas curvas e ao longo de retas.
O resultado pode
ser comprovado pela escolha dos pneus, no ano passado Márquez utilizava os
compostos Hard capazes de suportar as frenagens fortes para conseguir nas
curvas os milissegundos necessários para obter vitórias. Este ano a RC213V
utiliza de pneus macios na dianteira para transferir mais sensibilidade para o
piloto, que não resistiriam por toda uma prova se submetidos a frenagens
violentas. O pneu macio deforma mais fácil, aumenta a área de contado com o asfalto
e tem maior tolerância a erros.
No circuito de Le
Mans Jack Miller, que já pilotou uma Honda no passado, seguiu Márquez com uma
Ducati por algumas voltas e observou o comportamento do espanhol. “A frenagem
dele não me impressionou, senti que podia tentar ultrapassar na maioria das
minhas zonas de travagens. A Honda vai muito bem na retomada de velocidade e em
linha reta, o que contraria tudo o que se sabia até este ano. Frear tão bem
quanto uma Honda é inédito. Uma Ducati perder para uma Honda na aceleração é
ainda mais estranho”.
A pergunta que se
impõe é porque os outros pilotos da HRC não obtêm nas pistas os mesmos
resultados que Márquez. Jorge Lorenzo está em processo de lento aprendizado com
o equipamento e equipe, Takaaki Nakagami ainda utiliza uma especificação B
(2018) e Cal Crutchlow enfrenta dificuldades em assimilar o novo comportamento
da roda dianteira. Uma das principais características de Marc Márquez é a
rapidez com que se adapta a uma nova conjuntura e ele está utilizando uma
técnica diferente da que já rendeu cinco mundiais, os milissegundos que ele
perde na frenagem para entrar em uma curva, recupera no contorno e na retomada
de velocidade, o pneu macio permite uma inclinação um pouco mais agressiva do
equipamento.
A prova de Le Mans
evidenciou a mudança de postura do #93. Márquez, assim como fez em Jerez,
assumiu a liderança no início acelerou apenas o suficiente para não ser
ultrapassado, do meio da prova em diante procurou uma distância segura dos seus
concorrentes.
A história do GP
de Le Mans começou a ser contada na tomada de tempos para a formação do grid de
largada. O clima foi protagonista e causou transtornos para Valentino Rossi,
que foi obrigado a disputar o Q1. A pole no Q2 foi decidida logo no início,
Marc Márquez fez o melhor tempo na sua primeira volta rápida e, ao tentar
encontrar os limites da moto, caiu na seguinte. Ao contrário do que seria
esperado, ele recuperou a moto e permaneceu na pista com o mesmo equipamento
enquanto os outros pilotos tentavam ser mais rápidos, Márquez permaneceu todo o
período de definição da pole rodando com a moto acidentada.
Marc Márquez
conquistou a sua 55ª pole em 113 disputas na sua 7ª temporada na classe
principal. Para efeitos de comparação,
Valentino Rossi tem o mesmo número de poles em 328 etapas (20 temporadas)
somando 500cc & MotoGP. O recordista neste indicador é Mick Doohan, com 58
poles em 137 participações (11
temporadas) na 500cc, lembrando que o atual formato de classificação
para a largada só começou a ser utilizado em 1974.
A Bíblia é uma
coleção de textos religiosos de valor sagrado para o cristianismo, foi a
primeira grande obra impressa na Europa Ocidental a partir de tipos móveis de
metal, marco inicial da imprensa escrita. Nos rascunhos da Bíblia já não havia
referências relacionadas com problemas de corrente de relação em motos de
competição. Paradoxalmente nos últimos tempos incidentes com correntes passaram
a ser noticiados com frequência, aconteceu com Lorenzo, Márquez e nos treinos
da França com a Yamaha de Rossi. Este fato inusitado pode ser atribuído à nova
febre que assola os fabricantes de protótipos de competição, a flexibilidade
dos chassis.
O chassi e braço
oscilatório de um protótipo de competição não formam um conjunto rígido de
metal, são componente com alguma flexibilidade, capazes de prover condições
para um piloto inclinar o máximo possível no vértice de uma curva e entrar no
traçado ideal mais rápido. A maneabilidade da estrutura ajuda as rodas a
ficarem alinhadas com a trajetória ideal. O segredo deste processo é que na
retomada de velocidade a estrutura deve apresentar uma rigidez que permita
canalizar toda a potência gerada pelo motor para a roda traseira, permitindo ao
piloto obter o máximo de velocidade.
O GP da França
apresentou várias ocorrências singulares, Joan Mir (Suzuki) e Karel Abraham
(Avintia) conseguiram cair na volta de apresentação em eventos separados.
Provavelmente Mir, que largou depois do pitlane, assustou-se com a queda da
Avintia. Abraham recebeu uma bandeira
preta porque só conseguiu sair depois do líder completar a primeira volta, além
de trapalhão mostrou que sua equipe não conhece o regulamento da competição. Na
volta 02 já estavam na frente os seis primeiros (Márquez, Dovizioso, Petrucci,
Miller, Rossi & Pol Espargaro), não houve alteração posterior no grupo, só
a colocação entre eles. A falta de sorte de Maverick Vinales continua, foi
literalmente atropelado por Pecco Bagnaia.
Iannone, Zarco e
Lorenzo continuam sendo as maiores decepções – estranhamente Lorenzo e não a
HRC parece mais incomodado. O #99 foi contratado para “domar” a RC213V e não
para obter resultados imediatos.
Fatos marcantes na
prova foram a 300ª vitória da Honda na categoria principal (500cc & MotoGP)
de um total de 881 provas disputadas no mundial de motovelocidade, e a festa na
KTM pelo sexto lugar de Espargaro a 6 segundos do líder. Fábio Quartararo
recuperou posições depois de sair da pista e confessou no fim da prova que
queria resultado, por isso rodou em “Modo ataque” (usado só na largada) o tempo
todo e correu o risco de estressar o motor.
O efeito borboleta
também pode ser identificado na MotoGP, mudanças sutis na flexibilidade do
chassi podem causar problemas na corrente de relação.
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