quinta-feira, 23 de maio de 2019

MotoGP 2019 - GP de Le Mans & Efeito Borboleta





Efeito borboleta é um termo que indica a dependência que um sistema complexo às condições iniciais. Segundo a teoria, o simples bater de asas de uma borboleta na floresta amazônica poderia influenciar um curso natural de eventos em cadeia e resultar em um furacão nas Bermudas. Os protótipos da MotoGP são sistemas complexos e tem comportamento semelhante, corrigir um problema de um componente pode criar dificuldades em áreas onde o desempenho era satisfatório.


As características de um equipamento para vencer uma etapa do mundial de motovelocidade estão centradas na eficiência da frenagem na aproximação das curvas, velocidade durante a realização do contorno, retomada da aceleração na saída e velocidade nos trechos retos. 


Em 2019 a Honda corrigiu um ponto fraco da RC213V na temporada passada, a moto de 2018 se comportava extremamente bem nas frenagens e pecava na aceleração e velocidade máxima. No modelo deste ano a fábrica trabalhou em todo o equipamento, melhorou a refrigeração ampliando as entradas de ar e encomendou um novo sistema de escapamento. Esse procedimento exigiu uma redistribuição de peso e alterou o equilíbrio da moto, houve em consequência um aumento de potência e ganhos na velocidade final, entretanto para os pilotos mudou a sensação de estabilidade, especialmente no travamento da frente. A moto já não entra em um contorno grudada no chão, o comportamento na aproximação de curvas ainda é muito bom, mas não tanto como no ano passado.


Em Le Mans Marc Márquez demonstrou na prática como se comporta o modelo 2019. Maior velocidade em curva, menor eficiência em frenagens, acelera mais rápido e tem maior velocidade final. Sua tática durante acorrida também mudou, no ano passado acompanhava os líderes e deixava para atacar nas últimas voltas confiando na maior deterioração dos pneus dos concorrentes. Este ano ele tenta abrir desde o início sempre que possível e utiliza a aceleração e a potência da nova Honda para passar por fora nas curvas e ao longo de retas.


O resultado pode ser comprovado pela escolha dos pneus, no ano passado Márquez utilizava os compostos Hard capazes de suportar as frenagens fortes para conseguir nas curvas os milissegundos necessários para obter vitórias. Este ano a RC213V utiliza de pneus macios na dianteira para transferir mais sensibilidade para o piloto, que não resistiriam por toda uma prova se submetidos a frenagens violentas. O pneu macio deforma mais fácil, aumenta a área de contado com o asfalto e tem maior tolerância a erros.


No circuito de Le Mans Jack Miller, que já pilotou uma Honda no passado, seguiu Márquez com uma Ducati por algumas voltas e observou o comportamento do espanhol. “A frenagem dele não me impressionou, senti que podia tentar ultrapassar na maioria das minhas zonas de travagens. A Honda vai muito bem na retomada de velocidade e em linha reta, o que contraria tudo o que se sabia até este ano. Frear tão bem quanto uma Honda é inédito. Uma Ducati perder para uma Honda na aceleração é ainda mais estranho”.


A pergunta que se impõe é porque os outros pilotos da HRC não obtêm nas pistas os mesmos resultados que Márquez. Jorge Lorenzo está em processo de lento aprendizado com o equipamento e equipe, Takaaki Nakagami ainda utiliza uma especificação B (2018) e Cal Crutchlow enfrenta dificuldades em assimilar o novo comportamento da roda dianteira. Uma das principais características de Marc Márquez é a rapidez com que se adapta a uma nova conjuntura e ele está utilizando uma técnica diferente da que já rendeu cinco mundiais, os milissegundos que ele perde na frenagem para entrar em uma curva, recupera no contorno e na retomada de velocidade, o pneu macio permite uma inclinação um pouco mais agressiva do equipamento.


A prova de Le Mans evidenciou a mudança de postura do #93. Márquez, assim como fez em Jerez, assumiu a liderança no início acelerou apenas o suficiente para não ser ultrapassado, do meio da prova em diante procurou uma distância segura dos seus concorrentes. 


A história do GP de Le Mans começou a ser contada na tomada de tempos para a formação do grid de largada. O clima foi protagonista e causou transtornos para Valentino Rossi, que foi obrigado a disputar o Q1. A pole no Q2 foi decidida logo no início, Marc Márquez fez o melhor tempo na sua primeira volta rápida e, ao tentar encontrar os limites da moto, caiu na seguinte. Ao contrário do que seria esperado, ele recuperou a moto e permaneceu na pista com o mesmo equipamento enquanto os outros pilotos tentavam ser mais rápidos, Márquez permaneceu todo o período de definição da pole rodando com a moto acidentada. 


Marc Márquez conquistou a sua 55ª pole em 113 disputas na sua 7ª temporada na classe principal.  Para efeitos de comparação, Valentino Rossi tem o mesmo número de poles em 328 etapas (20 temporadas) somando 500cc & MotoGP. O recordista neste indicador é Mick Doohan, com 58 poles em 137 participações (11  temporadas) na 500cc, lembrando que o atual formato de classificação para a largada só começou a ser utilizado em 1974.


A Bíblia é uma coleção de textos religiosos de valor sagrado para o cristianismo, foi a primeira grande obra impressa na Europa Ocidental a partir de tipos móveis de metal, marco inicial da imprensa escrita. Nos rascunhos da Bíblia já não havia referências relacionadas com problemas de corrente de relação em motos de competição. Paradoxalmente nos últimos tempos incidentes com correntes passaram a ser noticiados com frequência, aconteceu com Lorenzo, Márquez e nos treinos da França com a Yamaha de Rossi. Este fato inusitado pode ser atribuído à nova febre que assola os fabricantes de protótipos de competição, a flexibilidade dos chassis.


O chassi e braço oscilatório de um protótipo de competição não formam um conjunto rígido de metal, são componente com alguma flexibilidade, capazes de prover condições para um piloto inclinar o máximo possível no vértice de uma curva e entrar no traçado ideal mais rápido. A maneabilidade da estrutura ajuda as rodas a ficarem alinhadas com a trajetória ideal. O segredo deste processo é que na retomada de velocidade a estrutura deve apresentar uma rigidez que permita canalizar toda a potência gerada pelo motor para a roda traseira, permitindo ao piloto obter o máximo de velocidade.

O GP da França apresentou várias ocorrências singulares, Joan Mir (Suzuki) e Karel Abraham (Avintia) conseguiram cair na volta de apresentação em eventos separados. Provavelmente Mir, que largou depois do pitlane, assustou-se com a queda da Avintia.  Abraham recebeu uma bandeira preta porque só conseguiu sair depois do líder completar a primeira volta, além de trapalhão mostrou que sua equipe não conhece o regulamento da competição. Na volta 02 já estavam na frente os seis primeiros (Márquez, Dovizioso, Petrucci, Miller, Rossi & Pol Espargaro), não houve alteração posterior no grupo, só a colocação entre eles. A falta de sorte de Maverick Vinales continua, foi literalmente atropelado por Pecco Bagnaia. 


Iannone, Zarco e Lorenzo continuam sendo as maiores decepções – estranhamente Lorenzo e não a HRC parece mais incomodado. O #99 foi contratado para “domar” a RC213V e não para obter resultados imediatos.


Fatos marcantes na prova foram a 300ª vitória da Honda na categoria principal (500cc & MotoGP) de um total de 881 provas disputadas no mundial de motovelocidade, e a festa na KTM pelo sexto lugar de Espargaro a 6 segundos do líder. Fábio Quartararo recuperou posições depois de sair da pista e confessou no fim da prova que queria resultado, por isso rodou em “Modo ataque” (usado só na largada) o tempo todo e correu o risco de estressar o motor.


O efeito borboleta também pode ser identificado na MotoGP, mudanças sutis na flexibilidade do chassi podem causar problemas na corrente de relação.

terça-feira, 7 de maio de 2019

MotoGP 2019 - Jerez de la Frontera

Márquez, Morbidelli & Quartararo  no Circuito Angel Nieto


Surgiu na Inglaterra nos anos 80 uma série de livros orientados para o público infanto-juvenil que em pouco tempo fez sucesso no mundo inteiro. O conteúdo das publicações eram ilustrações que ocupavam duas páginas, com grafismos retratando multidões em atividades normais; circulando em praças públicas ou assistindo práticas esportivas. Em algum lugar estava Wally, o personagem central da série, identificado por óculos, uma camiseta com listras brancas e vermelhas e um gorro com as mesmas cores. O título das obras, que são comercializadas até os dias atuais, é “Onde está Wally” e o objetivo é localizar a personagem entre as diversas pessoas da ilustração.Ao encerrar a 4ª etapa da temporada de 2019 da MotoGP em Jerez houve, entre os diversos jornalistas que cobriam o evento, um comentário recorrente: “Onde estão Jorge Lorenzo e Johann Zarco”, as duas contratações mais comentadas no ano passado.


A prova foi caracterizada por números cabalísticos, 300º GP depois da introdução de novas regras e regulamentos que permitiram motores de 4 tempos em 2002, ano em que a competição adotou a marca MotoGP. Coincidiu com a 400ª competição do mundial de motovelocidade em território espanhol (de um total de 3.108 GPs em todas as classes pelos registros oficiais). 


O desenvolvimento da prova transcorreu dentro do esperado. A esmagadora maioria dos espectadores presentes no circuito acreditava em uma vitória de Marc Márquez, como acabou acontecendo. Até a surpreendente colocação das duas Yamaha da equipe satélite Petronas na primeira fila da largada foi assimilada como normal. Os que transitam nos boxes da MotoGP sabem que é possível configurar equipamentos para ter um desempenho excepcional por um período curto, mas que é complicado conservar durante toda uma prova. Havia muita expectativa a respeito do desempenho da Suzuki depois da vitória de Alex Rins no Circuito das Américas, da recuperação de Rossi e do comportamento das Ducati, principalmente depois das exíguas diferenças dos tempos durante todo o final de semana.
   

Talvez como resultado do dispositivo Holeshot, Dovizioso conseguiu a melhor largada, chegou a andar ao lado de Márquez na aproximação da primeira curva, mas ficou sem trajetória e permitiu que a dupla da Petronas se alinhasse atrás do líder, recompondo a primeira fila do grid com as posições invertidas, Márquez em primeiro Morbidelli em segundo Quartararo em terceiro. Vinales fez uma largada surpreende e conquistou a 4ª colocação, deixando a Ducati do até então líder do campeonato em 5º.


Márquez adotou na prova a sua estratégia padrão, tentou abrir uma liderança confortável e foi seguido de perto pelas Yamaha da Petronas virando em tempos quase idênticos. Nas três primeiras voltas o trio na liderança abriu uma pequena distância, Vinales vinha meio segundo atrás, a mesma diferença que o separava Dovizioso e Rins.  Nas voltas seguintes Vinales conseguiu uma aproximação com os líderes enquanto Rins ficou travado atrás da Ducati. Saindo da 13ª posição Valentino Rossi progrediu rapidamente até a 10ª, o progresso, entretanto ficou mais difícil quando se posicionou atrás da Ducati de Jack Miller.


A partir da 10ª volta Márquez começou a se descolar das Yamaha e abriu dois segundos. Aproveitando uma hesitação do colega, Quartararo assumiu a vice-liderança enquanto Morbidelli virou alvo de Rins e Vinales. Dovizioso pareceu ter perdido o gás em 6º e sua ambição se reduziu a ficar na frente do colega Petrucci.


No meio da prova Quartararo sofreu um problema mecânico e abandonou, o desempenho de Morbidelli caiu e as posições definitivas começaram a ser desenhadas, Rins assumiu o 2º posto, Vinales o 3º terceiro seguido das Ducati, Rossi com uma prova consistente chegou até a 6ª posição.

Alguns fatos merecem ser mencionados. Pol Espargaro com a KTM cedeu a 12ª posição para Jorge Lorenzo por um erro estúpido, ao abrir a última volta ele imaginou ter encerrado na prova e desacelerou. No duelo familiar do clã Espargaró, Aleix com uma Aprilia obteve melhor classificação em todas as provas que concluiu, na contagem de pontos para o campeonato Pol leva uma pequena vantagem (3 pontos) por que o irmão mais velho abandonou em Austin.  


As cinco Honda que participaram da prova ficaram na zona de pontuação, o piloto de testes da HRC Stefan Bradl participou como convidado testando um novo chassi. Apesar de Márquez ter vencido, a segunda RC213V melhor colocada ficou em 8º com Cal Crutchlow, seguida de Nakagami e Bradl, Lorenzo foi o 12º.  O top ten foi dividido entre 4 Honda, 3 Yamaha, 2 Ducati e uma Suzuki.


A KTM está reeditando o que aconteceu com a Ducati no biênio 2017/2018, Johann Zarco tem o salário de 1º piloto e quem entrega resultados é Pol Espargaro, o espanhol chegou sistematicamente na frente do francês. A RC16 tem sido um prato indigesto, muito diferente da docilidade de condução que Zarco estava acostumado com a Yamaha. O piloto está enfrentando muitas dificuldades para controlar o equipamento e, como na vida (na MotoGP também) os males nunca estão desacompanhados, está perdendo a admiração dos franceses para a nova estrela em ascensão, Fábio Quartararo.


Todo o universo da MotoGP tinha a certeza que a tarefa de Jorge Lorenzo na Repsol-Honda era ingrata, seu colega de equipe além de ser considerado por muitos o melhor piloto em atividade, desenvolveu toda a sua carreira ligado à HRC e mantém a mesma equipe de apoio desde que subiu para a classe principal, Jorge é o “new kid on the block”. A demora de Lorenzo a apresentar resultados tem alimentado muitas conversas nos boxes da MotoGP. A seu favor tem o depoimento de Márquez que, mesmo com 2 vitórias em 4 provas, não está confortável com o desempenho da moto, o motor está melhor, porém a dirigibilidade está estranha, o comportamento da frente é complicado. A opinião do atual campeão do mundo sobre as dificuldades do equipamento é corroborada por Cal Crutchlow, que apesar do pódio em Losail tem tido um mau início de temporada.





Nota final:

Um acidente, muito semelhante ao que causou o óbito de Marco Simoncelli na Malásia em 2011 aconteceu no início da Moto2 em Jerez. Remy Gardner, que disputava a terceira posição, sofreu um high side na curva 2 e caiu atravessado na frente de um compacto grupo de competidores. O efeito dominó causou a queda de outros pilotos, incluindo Alex Márquez que deslizou pela pista na frente de todo o pelotão que se aproximava. Por sorte ninguém o atingiu e os prejuízos foram só materiais. A moto de Márquez foi recomposta em tempo recorde, o suficiente para ele participar da nova largada do pit lane.

quinta-feira, 2 de maio de 2019

MotoGP – ECU & Mapeamento eletrônico


Jorge Lorenzo no GP da Malásia em 2017

Sepang, 29 de outubro de 2017, o dia em que a MotoGP assumiu publicamente que não é um esporte imaculado, isento de interferências extra pista. Durante a 17ª etapa da temporada, GP da Malásia, Jorge Lorenzo com uma Ducati oficial liderava seguido pelo companheiro de equipe Andrea Dovizioso, Zarco e Márquez ocupavam respectivamente a 3ª e 4ª posições. Os resultados de pista estavam indicando o campeão da temporada com uma prova de antecedência. Faltando 6 voltas para o final o painel da moto #99 mostrou uma mensagem enviada pelo box: “ Suggested Mapping: Mapping 8”. Duas voltas depois Lorenzo abriu demais uma curva e permitiu a ultrapassagem do colega, a vitória do italiano deu uma sobrevida nas aspirações da Ducati em ter um piloto coroado campeão do mundo, o que não acontece desde 2007 (Casey Stoner).

O que todos já imaginavam, mas nunca tinha sido comprovado, é que existem, também na MotoGP, ordens de equipes influenciando o resultado final das provas. Na prova seguinte em Valência, encerramento da temporada, existiam chances de Dovizioso conseguir o título, (1) devia obrigatoriamente vencer a prova e (2) esperar que Márquez não ficasse entre os dez primeiros. Improvável, mas não impossível. Houve quem lembrasse que em uma situação semelhante Nicky Hayden ganhou o mundial de 2006 competindo contra Valentino Rossi. Durante a prova houve um conjunto de circunstâncias que colocaram, em determinado momento, Zarco, Márquez, Pedrosa, Lorenzo e Dovizioso nas cinco primeiras posições. Faltando 18 voltas para o final o visor da Ducati #99 repetiu a mensagem de Sepang: “Suggested Mapping: Mapping 8”. Desta vez Lorenzo não obedeceu, ele estava tentando o pódio e deixar o colega ultrapassar não seria significativo para o resultado do mundial. O recado foi irritantemente repetido inúmeras vezes, reforçado por painéis apresentados no muro do pit, Lorenzo ignorou todos. Faltando 7 voltas Márquez decidiu tomar a ponta e na primeira curva depois da ultrapassagem perdeu o equilíbrio, recorreu a toda a sua habilidade de lidar com imprevistos para conseguir controlar a moto passando pela área de escape, caiu da liderança para a 5ª posição, atrás de Dovizioso. A transmissão de TV foi muito feliz ao capturar no momento a expressão de incredulidade do staff da Ducati pelo espanhol ter evitado a queda. Uma volta depois, ainda sem ter entregue a posição, Jorge Lorenzo caiu. Segundos depois aconteceu a queda de Dovizioso, acabando com as suas (pouquíssimas) esperanças.

Os episódios de Sepang e Valência alimentaram a curiosidade sobre os mapeamentos, software e como são utilizados. Todos os componentes dinâmicos ou sujeitos a variações de temperatura ou pressão em um protótipo de competição tem sensores de controle que indicam suas medidas instantâneas. Baseadas nestas amostragens diversos componentes podem ser calibrados para oferecer o máximo desempenho. Se, por exemplo, os sensores das rodas registrarem que a roda dianteira está mais lenta que a traseira, a central eletrônica unificada (ECU) entende que ela descolou do piso e aciona os procedimentos anti whellie, se a traseira está mais rápida, significa que está deslizando e o torque aplicado deve ser reduzido.

Todos os circuitos do mundial de motovelocidade são divididos em 4 setores, delimitados por balizas eletrônicas. As equipes definem para cada setor um conjunto de calibragens ideal para obter a maior eficiência de cada componente, motor, freios, suspensão e técnica do piloto. As condições de contorno podem alterar em função das variações que ocorrem por degradação dos pneus, redução de peso pelo consumo de combustível ou volume de tráfego.

A calibragem ideal para um setor pode mudar durante a prova, por isso as equipes de apoio produzem diversos mapas, que podem ser trocados por comandos do piloto. De acordo com desenrolar de uma prova o condutor pode alterar o mapa em uso, ou a retaguarda dos boxes pode sugerir um mapa para obter um resultado específico. Em uma corrida recente, faltando 6 voltas para terminar a etapa no Circuito das Américas, as motos #42 e #46 travavam uma disputa feroz pela liderança. O pessoal de apoio da Suzuki, analisando os dados da telemetria, identificou que em um dos setores a Yamaha do líder Valentino Rossi não tinha um bom desempenho. Sugeriram que Alex Rins utilizasse o “Mapping 3” que privilegiava o desempenho da moto #42 no setor, duas voltas depois Rins conseguiu a ultrapassagem.
Controles da MotoGP & F1

Fórmula 1 & MotoGP são dois esportes altamente competitivos, com poucas semelhanças além de cativar grandes contingentes de entusiastas em todo o planeta. Além da diferença óbvia de 2 e 4 rodas, o posicionamento e número de controles disponíveis identifica um perfil completamente diferente para os pilotos.  O volante de um Fórmula 1 é uma interface complexa, com múltiplas funções para adequar o comportamento do carro durante uma prova e a toca de informações é bidirecional com a equipe nos boxes.  Um piloto da MotoGP tem no máximo 6 botões e um painel de controle pouco maior que a tela de um iPhone, e só recebe as comunicações da equipe.  Se por um lado a exigência para um condutor de um Fórmula 1 é uma brutal concentração por um período em torno de 1 hora e meia, na MotoGP os pilotos trabalham durante um tempo menor, 40 a 45 minutos, mas uma atividade bem mais dinâmica mudando o posicionamento do corpo para alterar o centro de gravidade quando o equipamento é inclinado nas curvas.

Na MotoGP a maneira como um piloto se coloca em relação a sua máquina influi na eficiência da frenagem, tração e desgaste dos pneus, cada movimento tem uma consequência. Como a condução de um protótipo é muito física, os pilotos estão em constante movimento e os controles mecânicos são obrigatoriamente reduzidos. O “cockpit” é projetado para minimizar o maior inimigo dos tempos por volta, o arrasto aerodinâmico. Não é por coincidência que os pilotos ficam encolhidos atrás da bolha de acrílico da carenagem. Na posição agachada as ações são obviamente muito limitadas, a visão periférica é menor e existem poucas possibilidades de interagir com controles além dos óbvios, acelerador, embreagem e freio. Apesar do número limitado de controles, a troca de mapas não é um processo trivial e por vezes confunde os pilotos, como aconteceu com Lorenzo na largada da Argentina este ano.

A obrigatoriedade de uso do pacote de eletrônica padronizado foi uma das maneiras encontradas pelos organizadores para equalizar as condições de competitividade dos equipamentos da MotoGP. No tempo dos softwares proprietários havia uma disparidade de recursos e fabricantes com orçamentos mais robustos (Yamaha e Honda) eram hegemônicos. Para alguns foi uma mudança radical, Valentino Rossi quando o pacote foi implementado, declarou que sua funcionalidade era equivalente ao que a Yamaha utilizava dez anos atrás. O novo ambiente resgatou a necessidade de sensibilidade dos pilotos, no esquema antigo o condutor abria todo o acelerador e o software limitava os excessos, nos dias atuais a máquina responde de acordo com o que foi solicitado. Muito do salto de qualidade da Ducati nas últimas temporadas se deveu à visão de seus dirigentes, que contrataram engenheiros que participaram do desenvolvimento do software padrão para conhecer suas limitações e explorar melhor as suas possibilidades. Conhecer como o software interpreta as indicações dos sensores ajuda aos engenheiros das equipes criar mapas com as escolhas mais eficientes para cada setor de uma pista.