quarta-feira, 20 de novembro de 2019

MotoGP 2019 – O exército de um homem só






Provavelmente nunca vai haver um consenso sobre quem foi (ou é) o melhor piloto do motociclismo esportivo mundial em todos os tempos, até por falta de um meio eficaz de comparação. O número de vitórias ou títulos nos remete à época em que Giacomo Agostini disputava em duas categorias (350cc e 500cc) e vencia em ambas. Se for analisada a importância na divulgação e popularização do esporte, acrescida de títulos e vitórias na pista, a carreira de Valentino Rossi não tem paralelos. Durante as sete décadas do mundial da Federação Internacional de Motociclismo surgiram diversos nomes representativos como Ángel Nieto, Mike Hailwood, Carlo Ubbiali, John Surtees, Phil Read, Geoff Duke, Jim Redman, Michael Doohan e nos últimos tempos Casey Stoner e Jorge Lorenzo, além de outros que apesar de nunca vencerem campeonatos, proporcionaram nas pistas espetáculos inesquecíveis como o americano Randy Mamola.


Em uma época onde todo o esforço dos promotores é realizado para equalizar as condições de competitividade, utilizando eletrônica padronizada e regulamentos draconianos, a superioridade dos resultados obtidos pelo espanhol Marc Márquez é extraordinária. Importando um jargão popularizado pela política brasileira, “nunca antes na história” um piloto destacou-se tanto entre os concorrentes. Em 2019 Márquez contabilizou 420 pontos em 19 etapas, doze vitórias seis segundas colocações e uma desistência, uma média ligeiramente menor que a de Valentino Rossi em 2002 e 2003, lembrando que na ocasião o italiano pilotava uma Honda RC211V quando a mudança de regulamento permitiu motores 4 tempos. A disparidade entre os equipamentos que competiam pode ser exemplificada pela performance do piloto tupiniquim Alexandre Barros, ele disputou a maioria das provas de 2002 com uma Honda NSR500 (2 tempos) sem nenhum resultado excepcional, recebeu uma RC211V (4 tempos) para as últimas quatro provas, venceu duas e obteve uma segunda e uma terceira colocação. Rossi em 2003 fez uma temporada quase perfeita, concluiu todas as provas e seu pior resultado foi um 3º lugar, venceu 9 e chegou em segundo 6 vezes. Importante ressaltar que a atual competitividade entre equipamentos era inexistente, o desempenho da RC221V era muito superior e havia ainda a disputa entre fornecedores de pneus com a participação da Michelin, Dunlop e Bridgestone.


A temporada de 2019 foi atípica. A tríplice coroa obtida pela Repsol-Honda é mais extraordinária porque foi obtida basicamente por um exército de um só homem, o titular da moto #93. Além do campeonato de pilotos, a Honda venceu o título de equipes com 458 pontos, 420 de Márquez, 28 de Jorge Lorenzo e 10 de Stefan Bradley, e o de construtores com 426 pontos, além da pontuação de Marc houve apenas a contribuição de Takaaki Nakagami da satélite LCR, 6 pontos obtidos no GP dos EUA. 


A equivalência de performance entre os protótipos atuais pode ser verificada pelos indicadores da última prova em Valência. Entre os dez melhores classificados houve representantes das seis fábricas, uma Honda (1º de Márquez), três Yamaha (2º de Quartararo, 6º de Vinales e 8º de Rossi), duas Ducati (Miller em 3º e Dovizioso em 4º), duas Suzuki (5º de Rins e 7º de Mir), uma Aprilia (Aleix Espargaro em 9º) e uma KTM (Pol Espargaro em 10º). O resultado final da temporada registra que as quatro melhores de colocações são de fábricas diferentes, Honda (Márquez), Dovizioso (Ducati), Vinales (Yamaha) e Rins (Suzuki). 


O clima frio e o vento no circuito no dia da prova foram protagonistas do espetáculo. Houve um festival de quedas nas três categorias, muito em função da baixa temperatura do piso que resulta em menor aderência dos pneus. Durante a prova da MotoGP havia um forte vento de cauda na reta prejudicando os pilotos na curva 1 e no ponto mais alto e mais vulnerável do circuito, curva 6 onde aconteceu uma sequência de acidentes estranhos. Na volta 14 Danilo Petrucci com uma Ducati foi o primeiro a cair e não sabe precisar a causa. Alguns segundos depois e poucos metros além foi a vez de Johann Zarco perder a frente da sua Honda, deslizou pela pista e foi parar na brita. O francês ficou desacorçoado com a queda e não percebeu que Iker Lecuona com uma KTM também caiu e o atropelou já no cascalho, felizmente sem maiores consequências. Nenhum dos três pilotos tem uma explicação razoável para três quedas independentes, na mesma volta e na mesma curva.

Foi mais um ano complicado para Valentino Rossi, que conseguiu apenas dois pódios (Rio Hondo e Circuito das Américas), no final da temporada ficou em sétimo, igualando a colocação de 2011 em seu primeiro ano de Ducati. O multicampeão italiano ficou atrás das Yamaha de seu colega de equipe Vinales (3º) e da satélite de Quartararo (5º).


A semana que antecedeu o GP de Valência tinha tudo para ser tranquila, todos os campeonatos já tinham seus vencedores definidos e o line-up de 2020 já estava encaminhado, então Jorge Lorenzo anunciou a sua aposentadoria. Foram dias profícuos para a rádio padock por onde circularam as mais variadas teorias. Na segunda depois da prova a Honda Racing Corporation emitiu um comunicado oficial efetivando o Campeão Mundial de Moto2 de 2019, Alex Márquez, como o novo piloto Repsol-Honda. Não é a primeira vez que irmãos competem na MotoGP (vide a clã Espargaro), mas a parceria dentro da mesma equipe é inédita. Apesar do velho mantra que o primeiro adversário a ser batido é o seu colega de equipe, existem fatores que indicam que pode dar certo, os dois sempre treinam juntos e dividem o mesmo preparador físico. Pessoas que convivem com os Márquez dizem que é inegável que Marc é superior nos treinos com motocross, porém em Dirty Tracks (pistas de terra) Alex eventualmente leva vantagem. A manchete que ninguém espera ver repetida foi a que anunciou os resultados dos tempos da primeira seção de treinos preparativos para a próxima temporada realizados em Valência na terça-feira depois da prova: “Márquez lidera, Márquez em último”.

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