Marc Márquez é a nova variável a ser considerada na programação do calendário da MotoGP. O fim das disputas muito antes da prova final não é bom para os organizadores, para os negócios, para o esporte, para os fabricantes e para os patrocinadores. Faltando ainda 5 etapas, o Campeonato Mundial que iniciou em março na prática já acabou, está decidido em favor do piloto da Honda. Sobraram as disputas por títulos secundários e todas as equipes já trabalham arduamente nos protótipos para a próxima temporada. Não há muito mais o que fazer em 2019.
A atual temporada pode ser considerada como um passeio no parque pelo piloto da Honda #93. Das 14 etapas já realizadas ele venceu 8, chegou 5 vezes em 2º lugar e em uma única oportunidade não pontuou, no GP dos EUA onde foi traído por um mau funcionamento do freio motor. Márquez e a Honda consideraram a falha mecânica como um evento fortuito. Muitos opinaram que sua queda no Circuito das Americas, onde nunca havia perdido um GP, foi provocada por soberba porque já tinha aberto uma lacuna de 4 segundos sobre o perseguidor mais próximo e continuava acelerando. Em nenhum momento o piloto justificou a queda como provocada pelo equipamento, classificou o evento como acidente por razões indeterminadas.
A mídia procura injetar ânimo no campeonato, festejando um novo herói cada vez que um piloto que consegue derrotar o campeão. Foi assim com Dovizioso na Áustria (A Ducati ressurge), com Alex Rins na Inglaterra (Lição de estratégia do piloto da Suzuki), com Petrucci na Itália e com Vinales em Assen, entretanto em todos os casos a presença de Márquez na disputa pela liderança é um fator invariável e, com exceção de Assen, sempre muito próximo.
Uma última tentativa de equilibrar o jogo é tentar tirar Márquez da Honda nas próximas temporadas. Os argumentos variam, ele nunca estará à altura de Valentino Rossi e outras lendas do esporte se competir sempre por uma única marca ou, talvez, com uma oferta financeira mirabolante de uma equipe concorrente.
A primeira hipótese não resiste a uma análise histórica, alguns dos maiores ídolos do motociclismo foram fiéis a um só fabricante. O australiano Mick Doohan pilotou para a Honda na classe 500cc durante toda a sua carreira entre 1989 a 1999, venceu 5 mundiais consecutivos entre 1994 e 1998. O norte americano Kenny Roberts participou de provas de motovelocidade entre 1974 a 1983 nas classes 250cc e 500cc, venceu 3 mundiais sempre com motos Yamaha. Seu compatriota Wayne Rainey competiu exclusivamente com a Yamaha entre 1988 e 1993 na 500cc, conseguiu um tricampeonato mundial.
A segunda incorre em um erro conceitual, embora a vitória sempre dependa da determinação e talento do piloto, há toda uma infraestrutura de apoio que não pode ser desconsiderada. A versão atual da RC213V foi desenvolvida especificamente para dar a Márquez as ferramentas que ele precisa para vencer, segundo suas especificações e adequada à sua técnica de pilotagem. Sua equipe nos boxes é a mesma desde as 250cc. A Honda ainda tem a amarga lembrança dos tempos de vacas magras entre os títulos de Nick Hayden em 2006 e Casey Stoner em 2011. A gestão da equipe está ciente de que nos títulos mundiais de Márquez a fábrica nunca colocou um equipamento na 2ª posição. No ano passado a melhor Honda classificada depois do campeão foi a de Cal Crutchlow em 7º. Este ano a fábrica tem a liderança do campeonato (Márquez, 300 pontos) e o companheiro mais próximo, o britânico, ocupa a 9ª posição distante inimagináveis 202 pontos.
Para a fábrica nipônica a MotoGP sem Márquez não é uma opção. A fábrica lidera o campeonato de construtores (só pontua a moto melhor classificada) com 306 pontos, Márquez é responsável por 300, 6 foram obtidos por Takaaki Nakagami em Austin. A Ducati tem 241 divididos entre Andrea Dovizioso, Danilo Petrucci e Jack Miller. Valentino Rossi, Maverick Vinales e Fabio Quartararo contribuíram para a os 228 Yamaha.
A disputa por equipes até agora é liderada pela Ducati com 357 pontos obtidos por Dovizioso e Petrucci, a Honda tem 333 somando Márquez, Lorenzo e Bradl (só pontua quando substituiu o titular). Márquez isolado tem mais pontos que as equipes Yamaha (284 marcados por Maverick Vinales e Valentino Rossi) e Suzuki (209 obtidos por Alex Rins e Joan Mir).
Não precisa muito esforço mental para perceber o que Marc Márquez representa para a Honda, portanto é altamente improvável que permita sua saída unicamente por motivos financeiros. A assessoria pessoal de Márquez também está atenta a outros detalhes, a contratação de Valentino Rossi pela Ducati em 2011 foi um desastre total. Anos depois, em 2017, a fábrica italiana investiu uma verdadeira fortuna em Jorge Lorenzo e os resultados começaram a surgir uma temporada e meia depois. Resta conjecturar se Marc Márquez quer se sujeitar a algum tempo de ostracismo ou permanecer no topo da onda. O retumbante fracasso de Johann Zarco, brilhante na Yamaha da Tech3 e uma decepção na KTM oficial é um exemplo recente.
Marc Márquez tem 25 anos, ou seja, talvez mais uns 10 anos para competir em alto nível na categoria mais importante do motociclismo esportivo. Canalizando toda a sua energia para a MotoGP, o espanhol tem plenas condições de bater todos os recordes atualmente existentes nos próximos anos. Seu atual colega de box, o pentacampeão do mundo Jorge Lorenzo, aceita que este é o desenvolvimento natural do esporte, as fábricas sempre privilegiam as solicitações do piloto mais rápido da equipe. Como Marc desenvolveu um estilo de condução especial, muito agressivo, equilibrando a moto em ângulos absurdos nas curvas e com frenagens violentas, a fábrica desenvolveu um produto capaz de trabalhar melhor para ele. Pilotos com outros perfis custam e por vezes não conseguem se adaptar.
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