Nos primeiros anos do século anterior, quando a velocidade
máxima permitida em estradas inglesas era apenas 35 Km/h e disputas estritamente
proibidas, um grupo de entusiastas com o objetivo de testar os limites de
velocidade e resistência sobre motos convergiu para a Ilha de Man. A ilha é uma
dependência direta da Coroa Britânica situada no mar da Irlanda e com autonomia
administrativa, suas rodovias não tem limite de velocidade. A primeira corrida
organizada com um regulamento rudimentar foi realizada no dia 28 de maio de
1904, uma volta em um percurso de pouco mais de 15 milhas utilizando rodovias
públicas interditadas para o público, com participação exclusiva para motos de
estrada normais com todos os seus acessórios: silenciador, assento, pedais e
apara lama. Foi a origem do Isle of Man TT (Tourist Trophy).
A Federação Internacional de Motociclismo é uma entidade que
promove e administra competições motorizadas sobre duas rodas, representa mais
de uma centena de federações nacionais distribuídas em seis regiões
continentais. A FIM também está envolvida em muitas atividades relacionadas com
o esporte, sua segurança e políticas públicas relevantes. A origem da FIM pode
ser rastreada até 1904, ano em que o clube de motociclismo da França organizou
um evento internacional e convidou participantes da Áustria, Dinamarca, França,
Alemanha e Grã-Bretanha. A França foi declarada vencedora da competição por
impor regras que privilegiaram seus participantes e, para equalizar as
condições em futuros eventos os cinco países criaram um órgão centralizador, a
Fédération Internationale des Clubs Motocyclistes (FICM). A entidade teve vida
curta e foi desativada em 1906 por absoluta falta de consenso. A Auto-Cycle
Union, entidade britânica que administra o esporte de duas rodas na abrangência
do Reino Unido promoveu o renascimento do FICM em 1912, com o objetivo declarado
de criar e controlar os aspectos esportivos e de turismo do motociclismo. Os dez
países que atenderam à convocação são considerados membros fundadores do FICM:
Bélgica, Dinamarca, França, Grã-Bretanha, Itália, Holanda, Estados Unidos,
Alemanha, Áustria e Suíça. O ano seguinte acolheu o primeiro evento
internacional realizado sob o patrocínio da FICM e constou de diversas provas
de resistência e velocidade, o International Six Days Reliability Trial. Nos
anos que antecederam a segunda grande guerra o número de associações nacionais
participantes cresceu para três dezenas e em 1936 a entidade promoveu o seu
primeiro certame internacional atribuindo ao vencedor o título de campeão
mundial.
A segunda grande guerra entre 1939 e 1945 provocou a suspenção
das atividades esportivas no continente europeu, que foram retomadas em 1946,
ano em que a FICM foi rebatizada como FIM e passou, a partir de 1949, a
promover o mundial de motovelocidade.
O primeiro campeonato promovido pela Federação Internacional de
Motociclismo constou de 6 Grandes Prêmios (Ilha de Man, Suíça, Alemanha,
Bélgica, Irlanda e França). O primeiro GP realizado em um campeonato oficial foi
o Isle
of Man TT (Tourist Trophy), vencido pelo britânico Harold Daniell.
Nos dias atuais, depois de 70 anos e 3096 GPs disputados em campeonatos
mundiais, o motociclismo esportivo atingiu o ápice em termos de espetáculo e
disputa. Conquistou o público com multidões comparecendo aos circuitos e
cobertura mundial pela TV. Nunca na história houve tantos pilotos e
equipamentos em condições de vencer uma prova. Esta afirmação ao fim de um
campeonato onde o título foi decidido faltando ainda três provas para o final pode
parecer descabida, entretanto a análise dos últimos resultados e o comportamento
dos promotores, pilotos e chefes de equipe indica o contrário.
O histórico das
sete décadas de GPs identifica diversos ciclos com hegemonia de fabricantes ou
pilotos, em todas as provas havia um equipamento ou piloto largava como
favorito nas provas. Houve quase duas temporadas completas em que o vencedor
foi o mesmo, Giacomo Agostini, que disputava em duas categorias, 500cc e 350cc.
Assim como houve a era Agostini, aconteceram os anos com supremacia de pilotos
norte-americanos (Kenny Roberts, Wayne Rainey e Freddie Spencer)), os anos
comandados por um australiano Michael “Mick” Doohan (Aussie), a era de ouro de Valentino Rossi e a atual supremacia
espanhola (Márquez & Lorenzo). Entre 2007 e 20015 todas as vitórias, com
três exceções em um total de 160 GPs, ficaram com os pilotos de fábrica das
equipes com os maiores orçamentos, Honda e Yamaha.
O ponto de ruptura com este estado de coisas foi o uso coercitivo do
pacote eletrônico. A engenharia da Honda produzia motores com um desempenho
absurdo e contava um software proprietário para controlar os excessos,
administrando a potência e melhorando a dirigibilidade A Yamaha manifestou seu desagrado afirmando que em seu projeto houve um
retrocesso de pelo menos uma década. As outras fábricas não foram muito
afetadas e tiveram um aumento de suas chances de vitórias.
Esta migração para a equalização de desempenho está transformando a
MotoGP. As equipes independentes até pouco tempo atrás herdavam equipamentos
desatualizados apenas para aumentar o número de motos no grid. Na última
temporada houve o fortalecimento do conceito de parceria, explorado com sucesso
Ducati (Pramac) e Honda (LCR). Para o próximo mundial a Yamaha (Petronas) e KTM
(Tech3) investem em equipes satélites. Os pilotos de equipes associadas
utilizam equipamentos no mesmo nível de atualização dos oficiais de fábrica, participam
dos testes privados e contribuem aumentando o número percepções fornecidas para
os engenheiros de desenvolvimento.
Há, porém, um item que não tem como equalizar via regulamentação, o
talento e capacidade dos pilotos. Durante toda a temporada passada até as pedras
das áreas de escape dos circuitos sabiam que a RC213V não era tão eficiente
como as Desmosedici GP18, entretanto no final da temporada a fábrica nipônica contabilizou
10 vitórias e a marca italiana apenas 7. Enquanto as vitórias da Ducati foram
divididas entre seus dois pilotos, 4 com Dovizioso e 3 com Lorenzo, as da Honda
foram concentradas em Marc Márquez, 9 de 10, comprovando que a capacidade do
piloto consegue suprir o gap tecnológico entre equipamentos.
Marc Márquez tem um talento único, utiliza as seções de testes nos fins
de semana dos GPs para explorar ao máximo os limites do equipamento. Apesar de
ter vencido as três últimas temporadas, neste período acumulou 57 quedas e
deslocou o ombro várias vezes. Sua arrojada técnica de pilotagem exige muito
esforço concentrado na parte frontal da moto, razão pela qual ele quase sempre
opta pelos pneus mais resistentes (hard), que reconhecidamente tem limites de
tolerância a erros mais reduzidos que os componentes macios (soft).
Todos os pilotos com assento na MotoGP são eficientes, alguns
diferenciados e um número bem reduzido excepcionais. Uma regulamentação mais
detalhista pode tornar o desempenho dos equipamentos muito semelhante e os
esforços da engenharia endereçam pequenos detalhes para obter aumento de
performance. A grande diferença está no talento dos condutores, deste modo fica
fácil compreender os esforços da HRC em reunir no mesmo box Márquez e Lorenzo,
os vencedores de oito dos nove últimos mundiais.
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